Sérgio Aníbal, in Jornal Público
O PIB cresceu 1,3 por cento, mas o RNB - que não inclui os rendimentos obtidos por estrangeiros em Portugal - diminuiu 0,1 por cento.
a A economia portuguesa acelerou no ano passado, mas os agentes económicos que efectivamente residem no país viram o seu rendimento diminuir pelo segundo ano consecutivo. Os números são do Instituto Nacional de Estatística (INE) e mostram a cada vez maior dependência que a economia portuguesa tem face ao estrangeiro para conseguir crescer.
Os dados das contas nacionais publicados na passada sexta-feira apontam para um crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) de 1,3 por cento. No entanto, o Rendimento Nacional Bruto (RNB), que, em relação ao PIB, retira das contas o rendimento obtido em Portugal por estrangeiros e acrescenta os rendimentos recebidos do resto do Mundo por residentes no país, caiu 0,1 por cento em termos reais. No ano anterior, tinha-se verificado uma contracção de 0,2 por cento.
A diferença entre o PIB e o rendimento nacional é que o primeiro conceito mede a riqueza obtida dentro do território português (quer por residentes ou não-residentes), enquanto o segundo se concentra nos resultados registados (em Portugal ou no estrangeiro) pelos agentes que vivem efectivamente em Portugal.
Seguindo esta lógica, por exemplo, os rendimentos obtidos por uma multinacional estrangeira por via de um investimento directo que tenha realizado em Portugal são contabilizados no cálculo do PIB, mas não do rendimento nacional. No sentido inverso, todos os rendimentos obtidos por uma empresa com sede em Portugal que tenha realizado um investimento directo no estrangeiro são registados no rendimento nacional, mas não no PIB.
Durante o ano de 2006, os rendimentos pagos ao resto do Mundo ascenderam a 17.590 milhões de euros, uma subida acentuada face aos 13,844 milhões do ano anterior. Em contrapartida, os rendimentos recebidos do resto do Mundo foram menores (11.413 milhões de euros) e cresceram bastante menos. No cálculo da variação real do rendimento nacional foi utilizado o deflator do PIB, uma vez que o INE não produz um deflator próprio para este indicador.
Ainda longe da Irlanda
Portugal está entre os países em que, ano após ano, o PIB supera o valor do RNB. Isto acontece às economias que são o destino de um volume significativo de investimento por parte de empresas estrangeiras e que, em contrapartida, não investem muito no exterior. Estão neste caso, por exemplo, países como a Irlanda e a Hungria, que apresentam um rendimento nacional que não atinge sequer os 90 por cento do PIB. É por isso que alguns economistas colocam em causa a verdadeira dimensão do sucesso irlandês, uma vez que grande parte do crescimento económico registado é devido aos rendimentos retirados pelas empresas multinacionais norte-americanas que se instalaram no seu território.
Em Portugal ainda se está longe dos níveis registados na Irlanda ou Hungria. No entanto, em 2006, o valor do RNB em percentagem do PIB atingiu o seu mínimo das últimas décadas (96 por cento), superando os 96,9 por cento de 2001.Outra forma de ver este problema é analisando a evolução da balança de rendimentos portuguesa. O Banco de Portugal já tinha revelado, no Boletim Estatístico de Fevereiro, que este indicador tinha atingido um novo máximo negativo.
Uma das principais razões para este resultado estava relacionada com o aumento dos rendimentos obtidos por entidades estrangeiras através dos juros que cobram pelos empréstimos realizados a residentes em território português. Os mais endividados face ao estrangeiro - e a sentir a subida das taxas de juro - são os bancos que procuram financiamento para eles próprios emprestarem às famílias e empresas nacionais.
A ligeira recuperação da economia em 2006 não foi acompanhada por uma maior velocidade no crescimento da produtividade dos portugueses. Uma combinação dos dados das contas nacionais com os do inquérito do emprego, ambos realizados pelo Instituto Nacional de Estatística, mostra que a produtividade nacional cresceu, durante o ano passado, apenas 0,5 por cento, exactamente o mesmo valor que tinha registado em 2005 e abaixo dos 1,2 por cento de 2004. A produtividade é aqui medida como o PIB por pessoa empregada.Isto significa que, em 2006, apesar de a economia ter crescido a um ritmo mais elevado, a utilização dos recursos (neste caso o factor trabalho) manteve uma evolução bastante fraca quando comparada com os anos anteriores.
Em 2004 e 2005, o crescimento económico de 1,3 e 0,5 por cento foi feito com variações praticamente nulas da população empregada. Ou seja, as taxas de crescimento foram atingidas graças exclusivamente a uma maior eficiência dos agentes económicos. Pelo contrário, durante o ano passado, uma parte significativa da variação do PIB é explicada pelo aumento da população empregada em 0,7 por cento. Se a criação de emprego é positiva (principalmente quando o desemprego se mantém a níveis muito altos), a má notícia está no facto do contributo da produtividade para o crescimento se ter mantido inalterado face ao ano passado.Por sectores, destaca-se a variação positiva - a primeira desde 2000 - da produtividade nos serviços, o sector com mais peso na economia. Neste caso, o crescimento do emprego abrandou e o Valor Acrescentado Bruto (VAB) acelerou ligeiramente.
No entanto, o bom desempenho nos serviços teve como contraponto o resultado bastante mais fraco na variação da produtividade na indústria, que cresceu 0,6 por cento contra 2,2 por cento no ano anterior. Na construção, um sector em crise, o VAB por pessoa empregada voltou a cair de forma acentuada. Na Agricultura, pescas e silvicultura, verificou-se um ano positivo com a recuperação da produtividade perdida em 2005.
17.590
Valor em milhões de euros dos rendimentos pagos ao resto do Mundo durante 2006. Uma subida face aos 13.844 de 2005 e um sinal da dependência da economia face ao exterior