12.12.09

Aumento salarial de 3,7 por cento opõe governos da União Europeia a eurocratas

Por Isabel Arriaga e Cunha, Bruxelas, in Jornal Público

Vários países são contra um valor destes em tempos de crise. Os funcionários das instituições europeias ameaçam com greves


Milhares de funcionários europeus preparam-se para fazer greve na próxima semana devido à recusa dos governos da União Europeia (UE) de lhes conceder um aumento salarial de 3,7 por cento em plena crise económica.

Este valor resulta de uma proposta da Comissão Europeia, que a justifica não como uma opção política, mas enquanto mera aplicação de um regulamento aprovado pelos governos e que, segundo garante, tem de ser respeitado. "É um regulamento do Conselho [de Ministros da UE] e temos de aplicar a lei", justificou Durão Barroso, presidente da Comissão Europeia, em resposta aos jornalistas à margem da cimeira de líderes dos Vinte e Sete que ontem terminou em Bruxelas.

Este regulamento determina que os salários dos mais de 40 mil funcionários da Comissão Europeia, Conselho de Ministros e Parlamento Europeu estão ligados à evolução dos salários da função pública dos seis países fundadores da UE - França, Alemanha, Itália, Bélgica, Holanda e Luxemburgo -, a par da Espanha e Reino Unido, em conjunto com a inflação de Bruxelas. "Se os Estados-membros aumentam os salários, esse aumento aplica-se no ano seguinte aos funcionários europeus", frisou Barroso.

O problema é que a esmagadora maioria dos países da UE enfrenta este ano uma grave recessão económica e a obrigação de aplicar medidas de austeridade para travar os défices orçamentais galopantes, o que levou muitos a congelar ou mesmo diminuir os salários da função pública. Em Portugal, por exemplo, o aumento da função pública em 2009 fixou-se nos 2,9 por cento.

O mesmo regulamento permite à Comissão apresentar uma proposta diferente da que resultaria da aplicação das regras em caso de "deterioração séria e súbita da situação económica e social" na UE, o que esta, por agora, não deu sinais de querer fazer. Os governos, por seu lado, não têm qualquer possibilidade de impor unilateralmente o valor do aumento, a menos que o decidam por unanimidade. O que por agora se afigura impossível, já que vários defendem, como a Comissão, que é preciso aplicar a lei.

Em contrapartida, catorze países - França, Alemanha, Itália, Reino Unido, Holanda, Áustria, Dinamarca, Finlândia, Grécia, República Checa, Eslováquia, Estónia, Letónia e Chipre - opõem-se terminantemente a este aumento, reunindo um número de votos mais do que suficiente para impedir a aprovação da proposta.

"Ninguém falou desta questão durante a cimeira, mas claro que toda a gente está de acordo em considerar que, nesta altura, os acordos salariais têm de ser razoáveis", frisou o primeiro-ministro britânico, Gordon Brown.

Perante o impasse, grande parte dos funcionários da Comissão e do Conselho anunciou, à laia de aviso, uma greve de três horas na segunda-feira de manhã, enquanto que os do Parlamento Europeu decidiram perturbar algumas das votações dos eurodeputados previstas para a sessão plenária da próxima semana.