por Rita Carvalho, in Diário de Notícias
Ministério Público abriu inquérito ao caso dos dois recém-nascidos abandonados em sacos na rua nos últimos quatro dias.
No ano passado foram abandonadas 173 crianças com menos de cinco anos em Portugal. Bebés como o João Vasco, que foi deixado num saco numa rua em Cascais na sexta-feira e está internado no Hospital de Cascais, mas também os que as mães entregaram para adopção logo na maternidade. No entanto, a grande maioria dos casos seguidos pelas comissões não são de recém-nascidos, mas de crianças entregues a si próprias pelos pais.
O Ministério Público abriu ontem a investigação ao caso de João Vasco, deixado à porta de um prédio em Cascais com apenas algumas horas de vida e ao de outro recém-nascido, encontrado morto no domingo num saco de supermercado junto à ribeira do Jamor, em Oeiras.
A autópsia ao bebé deveria ter sido feita ontem, mas, ao que o DN apurou, a ordem do Ministério Público só chegou ao final da tarde. Por isso, os exames forenses devem realizar-se hoje (ver texto ao lado). Já no caso de João Vasco - nome escolhido para o bebé pela equipa do Hospital de Cascais e que reúne o nome do médico do INEM que o tratou [João] e o da mascote da unidade de Cascais [Vasco] - serão colhidas amostras de ADN.
Em Portugal são raros os casos de bebés tão pequenos encontrados na rua. "Os abandonos de recém-nascidos assim na via pública são raros", afirmou ao DN Armando Leandro, presidente da Comissão Nacional de Protecção das Crianças e Jovens em Risco (CNCJR).
Quando as mães decidem encaminhar o bebé para a adopção logo após o parto, o caso pode ser sinalizado pelas comissões como abandono, mas já não é crime.
Isto porque, explicou ao DN fonte da CNCJR, nessas situações há uma demissão das responsabilidades parentais, mas a criança, que fica no hospital, não é deixada em perigo. É imediatamente encaminhada para os serviços da Segurança Social, enquanto aguarda que o tribunal decrete a adopção ou outra medida de acolhimento.
No total, em 2009 foram acompanhados 535 casos de abandono, sendo que é entre os zero e os cinco anos que se registam mais crianças, precisamente na idade em que são mais dependentes e frágeis.
Entre os 6 e os 10 anos foram sinalizadas 129 situações e nas crianças mais velhas, dos 11 aos 14, mais 109. Com mais de 15 anos, ocorreram ainda 124 casos.
As comissões de menores sinalizam como abandono as crianças deixadas entregues a si próprias. São as escolas, autoridades de saúde e muitas vezes os vizinhos que alertam para o problema, chamando as autoridades. Mas, entre as problemáticas que põem em perigo os menores, o abandono representa apenas 2,1%. A maioria são negligenciadas (36%), expostas a comportamentos desviantes (17,4%) como, por exemplo, a violência doméstica, ou sujeitas a maus tratos psicológicos (14%).
O abandono tem uma pena de um a cinco anos de prisão, revela o Artigo 138.º do Código Penal. A pena agrava-se se o crime for praticado por ascendente ou adoptante, passando a ser punido no mínimo com dois anos de cadeia. Se do abandono resultarem danos graves para o bebé, a pena é de três a dez anos.

