Por Isabel Arriaga e Cunha, Bruxelas, in Jornal Público
Berlim exige maior consolidação orçamental na zona euro para aceitar reforço e alargamento do fundo de socorro da moeda
Portugal deverá ter de reduzir este ano o défice orçamental para valores mais baixos do que os 4,6 por cento do PIB prometidos pelo Governo, no quadro do "pacote abrangente" que está a ser negociado entre os países da União Europeia (UE) para o reforço e alargamento do campo de acção do fundo de socorro do euro.
Esta perspectiva está praticamente adquirida depois de dois dias de negociações entre os ministros das Finanças da zona euro, na segunda-feira, e da UE, ontem, sobre os contornos de uma resposta sistémica à crise da dívida soberana capaz de acabar com a especulação dos mercados financeiros contra a moeda única.
No rescaldo destas discussões, ficou claro que a resposta sistémica, ou "abrangente", na expressão preferida da Alemanha, engloba três vertentes: o reforço e flexibilização do fundo de estabilidade financeira do euro (EFSF), a aceleração da consolidação das finanças públicas e um endurecimento do Pacto de Estabilidade e Crescimento (PEC), o colete de forças orçamental.
"Queremos um pacote abrangente e isto significa, naturalmente, além das medidas de curto prazo, uma melhoria do pacto de estabilidade e crescimento e da coordenação económica" dos países europeus, disse ontem o ministro alemão das Finanças, Wolfgang Schäuble.
As negociações revelaram-se algo difíceis no que se refere ao alargamento do campo de acção do EFSF, que foi concebido em Maio para contrair empréstimos no mercado, garantidos pelos Dezassete e disponibilizados aos países com dificuldades de financiamento. A Alemanha, sobretudo, opõe-se à compra de títulos de dívida soberana no mercado secundário pelo EFSF em substituição do Banco Central Europeu, cujo programa tem conseguido manter os juros dos países mais frágeis relativamente controlados. O fornecimento de linhas de crédito é outra possibilidade em estudo.
Ao invés, já nenhum Governo põe em causa a necessidade de reforçar a capacidade de financiamento do EFSF para a totalidade dos 440 mil milhões de euros que lhe foram atribuídos a título indicativo, embora as modalidades concretas estejam por definir. Actualmente o fundo só pode garantir empréstimos até 250 mil milhões, ficando o resto reservado a título de garantias para a obtenção da notação financeira máxima e baixas taxas de juro.
"Há uma grande especulação sobre se há meios suficientes [no EFSF] para ajudar Portugal e sobre o que acontece se outros países" seguirem o mesmo caminho, disse Didier Reynders, ministro belga das Finanças, defendendo que "é preciso ter os bolsos suficientemente profundos para travar a especulação". Mas, frisou, "isto só tem sentido se se acelerar a consolidação dos nossos orçamentos". Ou seja, enfatizou, é preciso reduzir os défices mais depressa do que o previsto, a começar já este ano.
"O que precisamos agora é que os países com défices elevados ultrapassem as expectativas do mercado", confirmou o ministro sueco, Anders Borg, defendendo que a falta de disciplina orçamental "é a principal causa" da especulação.
A preocupação belga
De acordo com o que o PÚBLICO apurou, Teixeira dos Santos não assumiu, por enquanto, compromissos mais ambiciosos de redução do défice orçamental do que a meta de 4,6% do PIB prevista para este ano, apesar da pressão a que foi submetido pelos pares para credibilizar a estratégia de consolidação. O ministro, que participou em parte da reunião de segunda-feira num intervalo do périplo no Médio Oriente em que acompanha o primeiro-ministro, José Sócrates, recusou-se a falar com a imprensa.
Interrogado sobre a questão, o ministro belga deu sinais de alguma preocupação sobre a situação de Portugal - o país que continua na linha da frente da especulação. "É preciso ver até que ponto [Portugal] poderá convencer os mercados" com a sua estratégia orçamental, e "ver até que ponto o BCE pode continuar" a comprar dívida soberana, alertou, frisando que uma eventual "intervenção [do EFSF] se destina a permitir um melhor financiamento" dos países que a pedem. Reynders reconheceu que um passo destes "é muito sensível politicamente", mas insistiu que poderá ser uma possibilidade a ponderar, "se for possível ter um financiamento melhor" e "evitar transferir para as empresas e as famílias o peso" dos custos da dívida. O governante alertou, aliás, para o facto de, apesar de a colocação de dívida portuguesa há uma semana no mercado ter corrido bem, ser preciso "olhar para as taxas de juro".
O ministro belga garantiu, por outro lado, que o "pacote abrangente" terá de estar concluído até ao fim de Março. Os seus pares preferiram não se comprometer com calendários, mas alguns não excluem a possibilidade de um acordo na cimeira de lideres da UE de 4 de Fevereiro.

