in Diário de Notícias
Portugal começa esta semana a negociar o resgate financeiro com instituições internacionais. Mas economistas, advogados e politólogos portugueses temem que o plano de apoio vise apenas o pagamento da dívida e não a reestruturação da economia de modo a que o país volte a crescer.
O resgate pedido por Portugal e as divergências entre políticos estão hoje em destaque no International Herald Tribune (IHT), que também salienta que a União Europeia (UE) e o Fundo Monetário Internacional (FMI) exigem consenso partidário, de médio prazo, para concederem o auxílio e que na base das negociações estarão as medidas do quatro Pacto de Estabilidade e Crescimento (PEC), rejeitadas pelo parlamento luso e que levaram à queda do governo.
Miguel Morgado, professor de ciência política na Universidade Católica, diz que, "pela primeira vez em três gerações, os portugueses estão a ser forçados a aceitar de que poderão ter de viver pior que os seus pais, o que é um grande choque sobre o qual ninguém quer assumir as culpas", ou seja, nenhum partido político.
Outro politólogo, Rui Ramos, da Universidade de Lisboa, diz mesmo que, " se o fardo não for bem distribuído, há o risco genuíno de que o ressentimento envenene todo o projecto europeu": "A Alemanha e outros têm de reconhecer que os problemas dos países da Europa do Sul como Portugal devem-se também aos empréstimos excessivos" concedidos pelos bancos da Europa mais rica. Rui Ramos diz que a adesão à UE foi benéfica, mas lamenta que tenhamos "criado um ambiente em que investir e trabalhar se tornou menos atractivo que viver de subsídios e empréstimos".
O receio de que este resgate resolva os problemas financeiros imediatos mas não a longo prazo preocupa tanto os credores internacionais como os economistas portugueses. António Nogueira Leite, conselheiro económico do PSD, lembra que "as hipóteses de a Grécia não ser obrigada a reestruturar a sua dívida não são muito mais altas que há um ano e isso tem de ser tido em conta pelos negociadores quando discutirem as taxas de juro apropriadas".
Mas a recuperação económica é mesmo a maior preocupação dos economistas portugueses. "Serão precisos muitos anos para colocar a economia portuguesa de novo a crescer mesmo com o resgate, porque o objectivo do resgate é de que nós paguemos as nossas dívidas antes resolver os nossos problemas estruturais", afirmou Vasco d'Orey ao IHT, jornal que destaca como problemas de Portugal os muito rígidos mercados de arrendamento, que levou ao endividamento das famílias, e de trabalho, que fez aumentar o desemprego de 4 para 11,2%.
Além disso, a economia portuguesa continua muito baseada no financiamento estatal de obras. Duarte Schmidt Lino, advogado da PMLJ, dá como exemplo as parcerias público-privadas, em que as garantidas dadas aos operadores privados "mantêm um sistema cujo princípio é o de que o Estado cobre todos os riscos, independentemente dos custos". Nogueira Leite, também membro do conselho de administração da Brisa, lamenta que nos últimos 15 anos "75% do crédito tenha ido para a construção de infra-estruturas e casas, cenário que exige uma mudança radical". Portugal tem a maior densidade de autoestradas da Europa Ocidental, "o que é claramente irracional, para usar um termo suave".
O IHT diz que os poucos sectores que melhoraram em Portugal foram a aposta nas energias renováveis e o aumento das exportações, 15,7% em termos nominais no ano passado, com uma aposta dos empresários portugueses em mercados emergentes, como Angola.

