por Marta F. Reis, in iInformação
Só a discussão do assunto pode trazer ganhos de saúde, defendeu ontem ao i o bastonário da Ordem dos Médicos. Ontem num evento público moderado pelo ministro da Saúde, Paulo Macedo, José Manuel Silva propôs um imposto especial sobre a fast food, entre hambúrgueres, batatas fritas, refrigerantes e todos os alimentos com excesso de sal, gordura e açúcar. Ao i o bastonário adiantou que uma taxa justa e útil rondaria os 10%, a somar ao IVA. Neste momento as cadeias de fast food estão sujeitas ao IVA da restauração, na taxa intermédia de 13%, mas já foi noticiado que uma revisão da carga fiscal poderá no futuro pôr os restaurantes a pagar a taxa máxima. Contactado pelo i, o Ministério da Saúde disse que não comenta a proposta e que qualquer imposto é da alçada do Ministério das Finanças e da Assembleia da República, e não de Paulo Macedo. O gabinete do ministro das Finanças também recusou comentar a ideia ou o eventual aumento do IVA na restauração. Silêncio portanto para uma medida que lá fora não é inédita - na semana passada, por exemplo, foi adoptada na Hungria - e para José Manuel Silva significa apenas alargar um "princípio inteligente" já utilizado nos impostos sobre o tabaco ou nas multas por falta de cinto de segurança.
Na Hungria, a lei que entrou em vigor a 1 de Setembro aumenta os alimentos com excesso de gordura e açúcar 35 cêntimos. A medida, que abrange batatas fritas, barras de chocolate e hambúrgueres, estava aprovada desde Julho e impõe ainda um aumento de 10% no imposto sobre álcool e bebidas refrigerantes. Segundo a imprensa internacional, a perspectiva é que a iniciativa renda qualquer coisa como 111 milhões de euros por ano, destinados a cobrir um terço do défice da saúde húngara (371 milhões de euros).
Em Portugal, José Manuel Silva diz que não consegue prever os ganhos de um imposto semelhante, mas sublinha que este mercado deve ascender anualmente a "milhares de milhões de euros". Uma fatia poderia contribuir para a redução das dívidas da saúde a fornecedores, que, segundo os últimos dados disponíveis, ascendem a 2,7 mil milhões de euros. "Isto já acontece com o tabaco, em que uma parte do imposto financia equipamento hospitalar, nomeadamente no Instituto Português de Oncologia. Estamos numa situação financeira complicada e temos de ser inovadores. Só a discussão desta questão pode encaminhar para comportamentos mais saudáveis e reduzir doenças crónicas como a hipertensão, a diabetes e o colesterol. Já o imposto seria uma renda muito apreciável para o SNS, além dos resultados em termos de saúde pública."
Na análise de José Manuel Silva, a mudança de hábitos permitiria eliminar e prevenir 90% dos casos de diabetes tipo 2, uma das causas principais de transplante renal. "Os custos estão todos ligados, seria um efeito em cascata. Hoje em dia as doenças crónicas consomem 80% do orçamento da saúde."
Mas como taxar? Para o bastonário, os critérios para a imposição do imposto teriam de ser definidos por uma comissão de peritos. "A ideia não é taxar uma cadeia de fast food mas alimentos e produtos. Algumas já têm menus com poucas calorias. Vendem garrafas de água que não seriam taxadas." Voltando ao exemplo húngaro - a primeira legislação do género da Europa, na esteira de iniciativas semelhantes nos Estados Unidos ou Japão -, a cafeína foi outro dos ingredientes afectados. O "imposto das batatas fritas", como foi cunhado pela imprensa húngara, tem sido considerado vago pela indústria alimentar e está a provocar uma revolução no mercado, com o aparecimento de novos produtos como chocolate com mais cacau e menos açúcar, versões "diet" de bolachas ou novas receitas.
No caso das bebidas, a lei diz que todas as que tenham menos de 25% de sumo de fruta por decilitro e 8 gramas de açúcar passam a pagar mais. No pacote de batatas, o sal não pode exceder 1% do conteúdo.