por Bruno Simões, in Negócios on-line
Inquérito do Parlamento Europeu à actuação da troika em quatro países, incluindo Portugal, aponta diversos erros e faz críticas a algumas das decisões que foram tomadas. Mas também destaca a inevitabilidade dos resgates.
O relatório do Parlamento Europeu sobre a actuação da troika, que tem como relatores o socialista Liam Hoang Ngoc e Othmar Karas, do Partido Popular Europeu, lança várias críticas ao impacto do ajustamento causado pelos resgates financeiros.
O documento realça, por exemplo, o facto de os “cortes nas prestações e serviços sociais” e o “desemprego crescente”, que resulta das “medidas contidas nos programas” estar a “aumentar os níveis de pobreza”. Mas também sustenta que as consequências sociais “seriam piores” sem o resgate da troika.
A troika provocou “níveis inaceitáveis de desemprego”, quer de longo prazo, quer jovem. No caso dos mais novos, isso “põe em causa as oportunidades para o desenvolvimento económico futuro”, como o comprova o “fluxo de jovens migrantes do sul da Europa e da Irlanda”, o que “pode causar uma fuga de cérebros”.
Aliás, as medidas incluídas nos resgates “são o exacto oposto da política de modernização delineada na estratégia de Lisboa e na estratégia Europa 2020”. O relatório “lamenta, nos programas da Grécia, Irlanda e Portugal, a inclusão de algumas receitas detalhadas para a reforma do sistema de saúde e cortes na despesa”. E também “lamenta o facto de a os programas não estarem vinculados à Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia”.
Mas não é só. Os relatores também lamentam “os pressupostos por vezes demasiado optimistas assumidos pela troika, especialmente no que diz respeito ao crescimento e desemprego”. Um factor que “afectou a relação entre a consolidação orçamental e o crescimento”. Como resultado, “as metas orçamentais não puderam ser atingidas dentro do tempo previsto”.
Em Portugal, as metas do défice já tiveram de ser revistas por diversas vezes. No ano passado, o Executivo quis colocar a meta de 2014 nos 4,5%, ao invés dos 4% previstos. Mas a troika não permitiu alterar este objectivo orçamental.
“Tem sido dada muito pouca atenção ao alívio dos impactos sociais e económicos negativos das estratégias de ajustamento”, acrescentam ainda. E lamentam “que por demasiadas vezes a abordagem de uma solução universal para a gestão da crise não teve inteiramente em conta o equilíbrio entre o impacto social e económico das medidas”, destacam os deputados.
Sem resgate, consequências seriam piores
Porém, também se defende que o resgate era mesmo a única solução. “As consequências económicas e sociais teriam sido piores sem a assistência técnica e financeira da União Europeia e do FMI”, contrapõem os relatores. Aliás, o resgate “atingiu o objectivo de, no curto prazo, evitar um incumprimento desordenado da dívida soberana que teria tido consequências económicas e sociais extremas, que seriam sem dúvida piores do que as actuais”, por causa dos efeitos colaterais (spillover), que seriam de “magnitude incalculável”.
O relatório de inquérito à troika, que assume a forma de proposta de resolução, vai ser debatido esta tarde em Estrasburgo, e votado amanhã. Como os socialistas e o PPE (direita) foram os responsáveis pela elaboração do documento, ele terá aprovação garantida com os votos dos eurodeputados destas duas famílias políticas.
* Em Estrasburgo, a convite do Parlamento Europeu