Por Marta F. Reis, in iOnline
Câmara de Cascais antecipou-se ao guião da reforma do Estado e já está a dar passos na descentralização da oferta de cuidados de saúde
Quantos concelhos sabem quanto o Serviço Nacional de Saúde gasta com os seus habitantes e em quê ou quais são as valências de que utentes e profissionais sentem falta? Pelo menos um: Cascais. Ricardo Baptista Leite, infecciologista e deputado na assembleia municipal e à Assembleia da República, acredita que esta recolha de informação a nível local é inédita. Foi pedida à Escola Nacional de Saúde Pública e desde que os investigadores entregaram o trabalho, em Outubro de 2012, a autarquia tratou de encontrar parceiros para resolver lacunas. Para o médico, este é um dos trilhos para a reforma da Saúde no país e coloca a autarquia um passo à frente na ideia de descentralização que surgiu recentemente no guião da reforma do Estado.
Ricardo Baptista Leite, que apoiou a autarquia no desenvolvimento do projecto de saúde nos últimos dois anos, explica que o primeiro passo, além do estudo, foi perceber que havia um edifício desactivado que poderia albergar respostas em falta, caso do antigo Hospital Ortopédico Dr. José de Almeida. Esta unidade, em Carcavelos, foi desactivada em 2009 com a abertura do novo Hospital de Cascais e estava desde então entre os imóveis sem utilidade na alçada do Ministério da Segurança Social.
A autarquia já assegurou a compra com um investimento de 3,5 milhões de euros, tendo neste momento um contrato de promessa de compra e venda com a Estamo, que ainda não foi ultimado por dificuldades no registo do edifício. Nos últimos meses, e na expectativa de que o processo de aquisição seja entretanto resolvido, têm sido negociados protocolos para pôr o plano em marcha. Baptista Leite acredita que a actividade no hospital possa arrancar em 2014 e exemplifica alguns usos já destinados: a câmara tinha encontrado um défice nos cuidados primários, sendo a zona de Carcavelos a única que não tinha beneficiado de obras nos equipamentos nos últimos anos. Nesse sentido, fez um acordo com a Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo e quer abrir no antigo hospital uma unidade de saúde familiar (USF) para utentes da Parede e de Carcavelos, com uma equipa de cinco médicos que se espera que venha a responder ao total de utentes sem médico de família, cerca de 20 mil.
Para os doentes crónicos, outra lacuna apurada, está a ser ultimada uma parceria com a Fundação Renal Portuguesa, que permitirá criar um centro de hemodiálise, com capacidade para seguir 200 doentes renais. Há também planos para acolher um centro de desenvolvimento pediátrico, numa parceria com a instituição local Progresso Infantil, do neurologista Nuno Lobo Antunes, para fazer investigação mas também acompanhar famílias do concelho, já que outra lacuna apurada foi a falta de serviços de saúde mental.
Baptista Leite explica que além de avançar com valências que vão ao encontro das necessidades da população, um dos conceitos na base do projecto é haver monitorização periódica, que permita ir ajustando as parcerias e percebendo os impactos. Na próxima semana haverá nova reunião para um acordo com a Universidade Católica Portuguesa, com vista à transferência para o antigo hospital do Instituto de Ciências da Saúde da instituição, com o qual a câmara quer trabalhar. Para o médico, mais que substituir a gestão central, trata-se de perceber que hoje o acesso à saúde já se faz por diferentes vias e com apoios locais, que ganham em estar envolvidas numa mesma estratégia a nível local, acreditando que mesmo a nível central devia haver mais integração entre hospitais e centros de saúde e que as câmaras podem ser interlocutores úteis. No caso da USF, diz, havia intenção de renovar o actual equipamento, instalado na Junta de Freguesia de Carcavelos, mas faltavam verbas, solucionadas com a proposta da autarquia de passar a valência para o novo pólo. "Pode ser mais fácil isto acontecer em alguns concelhos que noutros, mas o principal mérito deste projecto foi o esforço para encontrar parceiros."
Custos Serão comportáveis? Para Baptista Leite, tem de se pensar a prazo, e aqui Cascais terá outra vantagem. Com esta estrutura, o médico sublinha que há mais condições de entrar no mercado do turismo de saúde ou turismo sénior, com ganhos para o concelho, que a par da redução da carga da doença tenderão para saldo positivo. Mas avaliações só no final do mandato, isto é, do projecto. Para perceber os ganhos de saúde, será preciso esperar mais. "Quando falamos de impacto na saúde estamos a falar de anos."
A autarquia está também a ultimar o levantamento do esforço financeiro que implicarão todas as parcerias.