31.1.19

Em Aldoar 80% dos moradores do bairro vivem sem luz elétrica

in JN

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Portugal passa a ter política pública de participação dos ciganos

Ana Cristina Pereira, in Público on-line

Executado pela Letras Nómadas, programa será coordenado pelo Alto Comissariado para as Migrações e financiado pela Secretaria de Estado para a Cidadania e a Igualdade.

Vai haver uma política pública para promover a participação das comunidades ciganas na vida dos municípios. O tiro de partida do programa, que será executado pela associação Letras Nómadas, é dado esta quinta-feira de manhã, em Lisboa.

“Decidimos assumir esse modelo, que consiste na criação de grupos de acção comunitária, capacitação de líderes, de mediadores, das próprias comunidades”, adianta a secretária de Estado para a Cidadania e Igualdade, Rosa Monteiro. “É um trabalhado por dentro, das próprias comunidades.”

O programa foi lançado pelo Conselho da Europa e pela Comissão Europeia. Da primeira edição do Romed – Formação para mediadores ciganos 2011/2013 saíram 19 mediadores municipais, um mediador da área da saúde, três dinamizadores culturais do Programa Escolhas, um mediador da Santa Casa de Misericórdia e três mediadores escolares.

Só um terço das pessoas que se formaram encontrou um lugar de mediador no mercado de trabalho. O programa deixou, contudo, outros resultados: duas organizações de ciganos foram criadas, a Letras Nómadas, em 2013, e a Associação de Mediadores Ciganos Portugueses, em 2014.

A Letras Nómadas, fundada por Bruno Gonçalves e Olga Mariano, foi desafiada pelo Conselho da Europa e pelo Alto Comissariado para as Migrações (ACM) a ser a organização nacional de apoio do Romed 2. Além de formar mediadores, o programa impulsionou sete grupos de acção local.

Uma vez mais, os resultados superaram o previsto. Criaram-se condições para alguns jovens ciganos acederem ao ensino superior. E a Letras Nómadas, em parceria com o Plataforma Portuguesa para os Direitos das Mulheres, preparou o projecto Opré Chavalé, atribuindo um mentor e uma bolsa e oito jovens. O modelo já foi reconhecido pelo ACM, que atribui agora 30 bolsas por ano.

Governo aumenta para 30 o número de bolsas para alunos universitários ciganos
Nesta nova fase 2019/2020, o programa chama-se Romed – Governação democrática e participação comunitária através da mediação. Executado pela Letras Nómadas, será coordenado pelo ACM e financiado pela Secretaria de Estado para a Cidadania e a Igualdade.

Na linha de partida, estão agora oito municípios. Nem todos estão no mesmo patamar. “Alguns estão mais autónomos, podemos partir para outros”, diz Bruno Gonçalves, vice-presidente da Letras Nómadas, idealizando chegar entre 15 a 20 até ao final de 2020. “Não se desistirá de nenhum, pelo contrário. Haverá uma mobilização de um trabalho já feito para que possa inspirar e reforçar em novos territórios”, esclarece Rosa Monteiro. Será, resume a secretária de Estado, “um trabalho de continuidade e reforço”.



Mais de 100 milhões de pessoas enfrentam a pobreza na UE

De Isabel Marques da Silva, in EuroNews

Sian Jones, Coordenadora, Rede Europeia Anti-Pobreza

José, desempregado espanhol, e Eeva-Marie, trabalhadora a meio tempo finlandesa, estão entre os 113 milhões de pessoas que enfrentam a pobreza e a exclusão social na União Europeia, equivalente a 22,5 por cento da população do bloco comunitário (dados do Eurobarómetro, 2017).
Atualmente, a União Europeia é vista como estando a trabalhar em favor dos mercados, mas não das pessoas

Foram convidados a vir a Bruxelas pela testemunhar sobre o tema, terça-feira, numa sessão no Parlamento Europeu.

"Eu morava na Costa Rica e tive que voltar para Espanha com urgência porque o meu irmão estava doente, tendo acabado por falecer pouco depois de eu chegar. Tive que esperar que fizesse um ano de permanência em Espanha para poder começar o processo de pedir ajuda social. Agora temos, também, mais trabalhadores pobres, isto é, pessoas que têm um salário, mas que não lhes chega até ao final do mês", disse, à euronews, José Maria De Léon Civera.

Os trabalhadores já representam 9,6 por cento das pessoas em risco de pobreza, equivalente a cerca de 32 milhões de pessoas na União Europeia.
Para Eeva-Marie Grekula, investigadora universitária que tem, agora, um emprego a tempo parcial com que sustenta a filha mais nova, o problema é a crescente desigualdade.
"Na Finlândia, as pessoas ricas estão a receber benefícios fiscais e, ao mesmo tempo, estão a ser cortadas as ajudas sociais para os mais pobres. Os meus amigos e familiares têm-me ajudado, evitando que eu tenha problemas mais graves tais como perder o direito ao crédito", explicou à euronews.

Fatores que contribuem para a pobreza
Na sessão parlamentar será debatido o relatório de 2018 elaborado pela Rede Europeia Anti-Pobreza.

Entre as razões que contribuem para o aumento de pobres, a organização menciona:
salários mais baixos
contratos de trabalho precários
mais difícil acesso à habitação
preços mais altos para energia, comida e saúde

No caso de Portugal, o relatório dá como exemplo o facto de, entre 2010 e 2016, o custo da habitação para as famílias mais pobres ter aumentado 40 por cento e dessas famílias terem de gastar 35,1 por cento do seu rendimento para pagar esta despesa.

"Atualmente, a União Europeia é vista como estando a trabalhar em favor dos mercados, mas não das pessoas", disse, à euronews, Sian Jones, coordenadora da Rede em Bruxelas.
"Precisamos de maior justiça tributária, precisamos de sistemas de redistribuição que permitam investir na dimensão social do Estado e nos mecanismos necessários para criar empregos de qualidade", acrescentou.
A pobreza na União Europeia ainda é quatro por cento mais alta do que antes da crise financeira de 2008.

Cantinas escolares têm de ajustar quantidades às idades dos alunos

Ana Maia, in Público on-line


Em causa está um estudo feito em escolas de Santarém e Alpiarça. Ministério da Educação lembra a actualização das quantidades de alguns dos alimentos para os alunos do pré-escolar e do primeiro ciclo.

A quantidade de comida servida nas escolas não está ajustada à idade, facto que limita que as refeições possam estar mais próximas das necessidades nutricionais de crianças e jovens, aponta um estudo publicado pelo Instituto Nacional Dr. Ricardo Jorge (Insa). A análise foi desenvolvida depois de um programa de intervenção em 25 escolas dos municípios de Santarém e Alpiarça que conseguiu reduzir o sal na comida e melhorar os teores energéticos e de hidratos de carbonos em algumas faixas etárias.

O projecto Eat Mediterranean tinha como objectivo contribuir para a redução das desigualdades nutricionais em meio escolar, através da promoção da dieta mediterrânica. Promovida pela Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo, a iniciativa incidiu em três agrupamentos escolares, num total de 25 escolas, dos municípios de Santarém e Alpiarça nos anos lectivos de 2015/2016 e de 2016/2017 e abrangeu crianças e jovens dos 2 aos 21 anos.

O trabalho de análise ficou a cargo do Insa, que concluiu que se no teor de gordura os níveis já estavam dentro dos padrões recomendados, o mesmo não acontecia em relação ao sal — por exemplo, na faixa etária dos 2-5 anos estava 40% acima da dose diária recomendada —, no teor de energia, hidratos de carbono e proteínas. A intervenção permitiu reduzir a quantidade de sal em todas as faixas etárias, aproximar os teores de energia e hidratos de carbono dos valores de referência para os 2-5 anos e 6-10 anos. Também na faixa etária dos 16-21 anos houve uma melhoria nos valores de proteína.

“Todavia, houve alguns resultados que não foram atingidos”, diz o estudo, dando o exemplo da proteína que ficou acima das quantidades recomendadas para as crianças mais novas e dos hidratos de carbono abaixo do recomendado para os 16-21 anos. O que faz sobressair outra conclusão: “Muito embora as refeições escolares tenham que obedecer a capitações pré-estabelecidas compreendendo as necessidades nutricionais por faixa etária, entende-se que as escolas servem refeições para todos os níveis de ensino de forma semelhante, principalmente no que se refere à quantidade servida (porções) independentemente da idade da criança, dificultando, por essa razão, qualquer correcção de desvios nutricionais registados”.
Mariana Santos, investigadora do Insa e uma das responsáveis do estudo, salienta os resultados positivos conseguidos, ao mesmo tempo que destaca o muito trabalho que ainda há a fazer. “Na questão do sal, por exemplo, era muito importante passarmos pela introdução de medidas para controlar as quantidades. Também é importante a conjugação de alimentos para podermos atingir quer os níveis de proteína quer dos hidratos carbono. A adequação das porções é fundamental”, diz ao PÚBLICO, referindo que porções desadequadas à idade podem significar excesso para uns e quantidade insuficiente para outros.

“Este projecto demonstra é que é importante que haja um acompanhamento contínuo” para garantir que há uma consolidação do que foi ensinado, diz Mariana Santos. Um dos objectivos, refere, é que o Insa possa reactivar o projecto até para perceber a realidade noutras zonas do país.
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Câmara de Lisboa prepara mudanças nas refeições escolares
Em resposta ao PÚBLICO, o Ministério da Educação lembra que no ano passado foram publicadas novas orientações sobre ementas e refeitórios escolares. “Uma das principais alterações face às orientações anteriores é precisamente a actualização das capitações [quantidades] de alguns dos alimentos, estabelecendo valores precisos para as crianças da educação pré-escolar e para os alunos do 1.º ciclo do ensino básico”, explica. As directrizes são tanto para os refeitórios geridos directamente pelas escolas como para aqueles que estão concessionados a empresas.
O novo documento foi elaborado com o apoio da Ordem dos Nutricionistas e da Direcção-geral da Saúde, refere o ministério, assim como Pedro Graça, director do Programa Nacional para a Promoção de uma Alimentação Saudável da Direcção-geral da Saúde. “Por exemplo, num prato cuja base sejam ervilhas, a recomendação são 30 gramas para o jardim-de-infância e 120 gramas para o secundário. As quantidades são adaptadas aos valores médios de necessidades energéticas das crianças.” O responsável lembra que daqui resultaram propostas de ementas vegetarianas e mediterrânicas, passando à prática o que é ensinado nas aulas.



30.1.19

Álcool está a levar mais jovens às Comissões de Protecção

Natália Faria, in Público on-line

Em 2016 e 2017, foram sinalizados 607 casos de crianças e jovens que tiveram ou estiveram expostos a comportamentos nocivos relacionados com o álcool. As mulheres continuam a beber mais e as mortes por overdose também aumentaram: 38, contra as 27 do ano anterior.

Estão a aumentar os jovens que chegam às Comissões de Protecção de Crianças e Jovens (CPCJ) por terem ou estarem expostos a comportamentos relacionados com bebidas alcoólicas que afectam o seu bem-estar e desenvolvimento. Foram sinalizados 607 casos, na soma de 2016 e 2017. E estes dois anos apresentam “os valores mais altos” dos últimos cinco, segundo o relatório do Serviço de Intervenção nos Comportamentos Adictivos e nas Dependências (SICAD) que é esta quarta-feira apresentado na Assembleia da República.

Nos três anos anteriores, os casos que chegavam às CPCJ rondavam as duas centenas. Em 2016 e 2017, aumentaram para os 305 e 302, respectivamente, ainda segundo o SICAD, cujo relatório volta, uma vez mais e sem apontar causas, a acentuar a tendência para o agravamento dos consumos problemáticos de álcool e de cannabis entre as mulheres.

Os indicadores de 2017 em que se baseia o relatório que faz o diagnóstico do país em matéria de droga e dependências também mostram que as mortes por overdose aumentaram 41% (38, contra as 27 do ano anterior).
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Mas nem tudo são más notícias: o relatório aponta a diminuição dos internamentos hospitalares devido a hepatite ou cirrose alcoólicas. E, entre os mais jovens, parece haver uma maior percepção do risco associado ao consumo de substâncias. Além disso, os consumos, nomeadamente da cannabis, tendem a iniciar-se em idades mais avançadas.

No tocante ao álcool, o último grande inquérito nacional feito em 2016/17 a 12 mil pessoas com idades entre os 15 e os 74 anos já mostrava que cerca de 2,8% da população apresentava padrões de consumo nocivo ou dependência. Se recuarmos a 2012, “aumentou a frequência do binge [consumo de cinco ou mais bebidas alcoólicas num único dia ou momento] e houve um agravamento dos consumos de risco ou dependência”.
Acresce que este padrão global “encobre evoluções negativas particularmente preocupantes como as do grupo feminino e das faixas etárias mais velhas”, acentuam os autores do relatório, para reivindicarem mais atenção a estes grupos no planeamento da acção para o ciclo 2017/2020.

Utentes readmitidos aumentaram 53%
Mas as preocupações relacionadas com a excessiva ingestão de álcool não se ficam por aqui: segundo o relatório, as infecções com o vírus da Hepatite C aumentaram entre os utentes que iniciaram tratamento por problemas relacionados com o uso de álcool. E, em 2017, os utentes readmitidos para tratamento em ambulatório por problemas relacionados com o álcool aumentaram em 53%: 1047 pessoas no total. Isto apesar de os 13.828 utentes que estiveram em tratamento ao longo do ano traduzirem uma estabilização. E de os novos utentes terem diminuído em 11%.

Por outro lado, apesar de os internamentos hospitalares com diagnóstico principal atribuível ao consumo de álcool estarem a diminuir (4425 em 2017, menos 18% do que em 2016), as mortes por doenças atribuíveis ao álcool estão a aumentar. Em 2016 (o relatório não dispõe de números referentes a 2017) houve 2515 óbitos por doença derivada do abuso de álcool. Foram mais 9% do que em 2015 e o valor mais alto dos últimos cinco anos.

Equipas de rua vão poder administrar medicamento anti-overdose
O número médio de anos potencialmente perdidos por doenças atribuíveis ao álcool aumentou também ligeiramente: 13,6 anos contra os 13,1 de 2015.
Onde se encontra também os valores mais altos dos últimos cinco anos é no número de pessoas que em 2017 morreram em acidentes de viação quando estavam sob a influência do álcool. Foram 170. Destas, 80% eram condutores. Ainda assim, aquele número está longe das 242 vítimas mortais de acidentes de viação sob influência do álcool registadas em 2010.

Mais mortes por overdose
No tocante à mortalidade por consumo de substâncias ilícitas, as 38 mortes por overdose de 2017 inscrevem-se no universo de 259 óbitos em que o Instituto Nacional de Medicina Legal detectou a presença de substâncias ilícitas. Apesar do aumento de 41% face a 2016, ano em que se registaram 27 overdoses, os números estão aquém das 40 mortes por overdose que tinham sido registadas em 2015. O relatório frisa ainda que, nos últimos sete anos, os valores das mortes por overdose mantêm-se abaixo dos registados entre 2008 e 2010. Na maioria dos casos, substâncias como opiáceos, cocaína e metadona surgiram misturados com álcool e benzodiazepinas.

Toxicidade da cannabis está a aumentar. É melhor legalizá-la?
No tratamento no ambulatório da rede pública por problemas relacionados com o uso de drogas estiveram 27.150 utentes. É uma diminuição relativamente ao ano anterior (27.834), numa descida que, de resto, acompanhou o decréscimo no número de novos utentes (1769 em 2017, contra os 2090 do ano anterior). Mas nem aqui o cenário é muito risonho já que, tal como no álcool, as readmissões aumentaram para os 1538 utentes, contra os 1204 de 2016. E este aumento nas readmissões, refira-se, “contraria a tendência de descida verificada nos quatro anos anteriores”.
Entre os novos doentes em ambulatório, a cannabis é uma vez mais, e pelo sexto ano consecutivo, a droga de consumo mais referenciada. Isto apesar de, na maioria das estruturas de tratamento, a heroína continuar no pódio das drogas mais consumidas. Em segundo lugar, aparece a cocaína. O facto de a cannabis ser a droga principal mais referida pelos novos utentes em ambulatório pode ser lido como resultado de uma melhoria das respostas às necessidades específicas desta população.

Quanto aos internamentos por problemas relacionados com drogas, os números mantiveram-se estáveis: 719 pessoas deram entrada em unidades de desabituação e 2046 em comunidades terapêuticas.
Por último, e, porque os casos de VIH de transmissão associada à toxicodependência continuam a ter um diagnóstico mais tardio do que nas restantes categorias de transmissão, o coordenador nacional do SICAD, João Goulão, aponta a importância de se apostar no diagnóstico precoce. Em 2017, ano em que os casos de infecção por VIH associados ao uso de drogas representavam 34% do total acumulado, foram diagnosticados 1068 casos de infecção por VIH (2% relacionados com a toxicodependência) e 234 casos de Sida (11%).

É pela cor da minha pele?
Naquele ano, aumentaram também as detenções de indivíduos julgados por terem sido apanhados com drogas ilícitas em quantidades superiores às tidas como necessárias para o consumo durante 10 dias. Houve 1631 processos-crime, envolvendo 2136 indivíduos, dos quais 88% foram condenados. A pena de prisão suspensa surge como a mais aplicada (44% dos casos), logo seguida da aplicação de multa efectiva (34%).
Ainda assim, nas prisões, os 1950 reclusos condenados ao abrigo da Lei da Droga representavam o valor mais baixo dos últimos sete anos e um decréscimo de 12% face ao ano anterior. No total, a 31 de Dezembro de 2017, os reclusos detidos por crimes relacionados com droga, sobretudo tráfico, representavam 17% do universo de detidos nas prisões.


Portugueses já consomem mais álcool do que os russos. OMS quer preços mais altos

Alexandra Campos, in Público on-line

Organização Mundial de Saúde defende aumento da taxação e estabelecimento de preço mínimo para bebidas alcoólicas, além da diminuição da exposição à publicidade e ao marketing.

Os europeus, em geral, estão a consumir menos bebidas alcoólicas mas a Europa continua a ser a região com maior consumo per capita de álcool no mundo. Ao mesmo tempo, nos países do Sul da Europa os níveis de consumo não se alteraram de forma significativa nos últimos anos, ao contrário do que aconteceu em alguns países do Leste, onde se observou uma quebra acentuada. Um fenómeno que fez com que vários países — e Portugal está incluído neste grupo — já tivessem ultrapassado os russos no que ao consumo de álcool puro per capita diz respeito, enfatizou esta segunda-feira Carina Ferreira Borges, do gabinete regional da Organização Mundial da Saúde (OMS) para a Europa, num encontro em Santo Tirso.

São as estimativas mais recentes (relativas a 2016) da OMS. O último estudo da organização, que foi apresentado no final do ano passado, indicava que o consumo nacional anual per capita de álcool puro (a partir dos 15 anos) era então de 12,3 litros por ano (9,8 na região europeia) e de 11,7 na Federação Russa. No topo estava a República da Moldova, com 15,2 litros per capita.

À margem de um encontro com representantes de organizações da sociedade civil para discutir o grau de implementação do Plano Europeu de Acção para a Redução dos Malefícios Associados ao Consumo de Álcool 2012-2020, a perita da OMS recordou este e outros dados para sublinhar que "ainda há muito a fazer" nesta área.

Carina Ferreira Borges defendeu, logo à cabeça, o aumento da taxação e o estabelecimento de um preço mínimo para as bebidas alcoólicas. Foi graças a medidas deste tipo que a Rússia conseguiu diminuir o consumo de bebidas alcoólicas, apesar de a Escócia ter sido o primeiro país a avançar com o estabelecimento de um preço mínimo, “com muita resistência por parte da indústria das bebidas alcoólicas, e que levou a grandes discussões ao nível dos tribunais”, recordou.​

A outra área de acção prioritária para a OMS passa pela diminuição da exposição à publicidade e ao marketing das bebidas alcoólicas, sobretudo nas redes sociais. Oito anos após o arranque deste plano de acção — que foi aprovado por 53 Estados-membros —, a terceira área específica em que a organização preconiza um maior investimento é a que está relacionada com a disponibilidade e o acesso a bebidas alcoólicas (nomeadamente nas escolas).

Portugal é o oitavo país da União Europeia com mais mortes causadas pelo álcool
São três das dez áreas para a acção definidas pela OMS no plano europeu e que são "curiosamente" aquelas em que são menores os índices de concretização, lamenta. "São áreas onde menos foi feito e que têm um impacto extremamente importante" na mortalidade associada ao consumo de álcool, reforça, advogando que Portugal discuta a introdução deste e de outro tipo de medidas porque fazem com que o álcool - que "não é uma substância igual a qualquer outra" — seja menos acessível.

Três dezenas de organizações

O encontro com três dezenas de representantes de organizações da sociedade civil de 15 países europeus em Portugal segue-se a uma consulta efectuada aos Estados-membros sobre esta matéria, na semana passada. "Queremos perceber onde estamos, o que podemos fazer para melhorar, quais são os desafios", sintetiza a especialista, lembrando que um milhão de pessoas morre todos os anos na Europa devido ao consumo de álcool, doenças cardiovasculares na sua maior parte, mas também cancros, cirroses, acidentes.

"As áreas do marketing e do preço das bebidas terão um grande impacto em termos da redução da mortalidade ligada ao álcool e Portugal tem uma mortalidade que é importante e que precisa de ser mudada", nota. "Quem está exposto consome mais, e nos jovens [este nível de exposição ao marketing] é extremamente problemático, porque não só consomem mais como de uma forma diferente, com maiores danos".

Consumo de álcool entre os jovens de 15 anos desceu para metade em 12 anos
De acordo com um comunicado divulgado no encontro (que é organizado pela Câmara de Santo Tirso), o número de mortes ligadas ao álcool é elevado entre jovens — "uma em cada sete mortes entre os 15 e os 19 anos" e "uma em cada cinco mortes entre os 20 e os 24". No ano passado, porém, o SICAD (Serviço de Intervenção nos Comportamentos Adictivos e Dependências) lembrava, a propósito deste relatório da OMS, que a taxa global de problemas associados ao álcool é inferior em Portugal quando comparada com a média da União Europeia (UE), tal como a mortalidade — que era (em 2016) de 282 por milhão de habitantes no país, contra 383 na UE.

"Temos hoje suficiente evidência científica que nos permite dizer que há coisas que têm de ser mudadas. Não podemos manter os mesmos discursos", argumenta Carina Ferreira Borges. No encontro, que termina terça-feira, vão estar ainda em debate medidas como a da alteração da rotulagem das bebidas alcoólicas. A Irlanda aprovou em 2018 aprovar um pacote de medidas que inclui a equiparação na rotulagem das bebidas alcoólicas ao tabaco (risco de cancros). Isto não será ir demasiado longe? "Há evidência científica de que o consumo de álcool está ligado a uma maior risco de cancro", diz. Sublinhando que o consumidor tem direito a ser informado, a especialista dá um exemplo: "A maior parte das mulheres não sabe que o álcool é um dos factores de risco para o cancro da mama".

28.1.19

"O poema mais bonito que o meu pai escreveu foi o SNS"

Miguel Midões, in TSF

Em vida, António Arnaut escreveu mais de 40 livros, entre poesia e prosa, ligados às áreas cívica, jurídica e maçónica.

António Arnaut faria esta segunda-feira 83 anos. No dia do seu aniversário é apresentado em Coimbra um livro de poemas inéditos que escreveu já numa fase final da sua vida. São 50 poemas em 130 páginas e que foram escritos, quase na totalidade, enquanto esteve internado no IPO e no Centro Hospitalar Universitário de Coimbra.

O advogado, político e escritor, que foi grão-mestre do Grande Oriente Lusitano - a Maçonaria Portuguesa, no início do século, é assim homenageado em livro pelos dois filhos.
Uma homenagem a António Arnautt, o pai, que o filho já leu e releu o livro por diversas vezes.

É uma forma de estar mais perto de quem ainda está muito presente.

O livro é de poemas, mas o melhor poema que António Arnautt escreveu não faz parte do livro. O filho lembra qual foi: "o meu pai costumava dizer que o Serviço Nacional de Saúde (SNS) foi o poema mais bonito que ele escreveu, mas estes tem a ver com o pensamento de alguém que pressente que se aproxima o fim desta vida terrena e quer deixar alguns pensamentos escritos sobre as mais diversas coisas", diz.
Com a emoção ainda à flor da pele, o filho sabe o que pode e deve honrar a memória do pai e isso vai muito além do lançamento de um livro. "A Lídia Jorge diz que só morre quem desaparece da memória. O meu pai, pelo que fez, nunca irá desaparecer. Honrar a memória do meu pai é agora os deputados do PS votarem a lei de bases apresentada pelo governo e não permitirem adulterar o caráter público do SNS. Isso é que é honrar a memória do meu pai", acrescenta.

Um recado emocionado aos socialistas, no dia em que os poemas são de "Outono e de Inverno", acerca da finitude de um homem.
Em vida, António Arnaut escreveu mais de 40 livros, entre poesia e prosa, ligados às áreas cívica, jurídica e maçónica. "Poemas de Outono e Inverno" é um livro editado pela Minerva Coimbra porque era essa a vontade do autor.

Instituto Politécnico de Setúbal cria Roteiro para educação antirracista

in DN

Uma equipa de docentes da Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Setúbal criou o Roteiro para uma Educação Antirracista para, através de vários seminários, desmistificar a "narrativa racial" ainda presente na sociedade portuguesa.

"Este roteiro é a possibilidade de, até junho, termos todos os meses um espaço de debate sobre como desconstruir o racismo dentro da educação em diferentes áreas", explicou hoje à Lusa uma docente e investigadora responsável por esta iniciativa, Cristina Roldão.

A propósito do tema, o auditório da Escola Superior de Educação de Setúbal debateu hoje "como descolonizar a narrativa nacional", onde Fernando Rosa, professor da Universidade Nova de Lisboa, mostrou que a "memória" da história portuguesa, sejam os descobrimentos, a colonização ou a guerra em África, persistem atualmente como uma "ideologia".
"Há uma narrativa que não é memória, é uma ideologia, é um discurso cultural sobre o passado enraizado na cultura portuguesa. Temos um passado glorioso, Portugal deu novos mundos ao mundo e tornou visível a existência de civilizações que, na realidade, eram muito mais antigas do que Portugal como nação. Há um discurso colonizador, de que as coisas existem porque o colonizador as encontrou, uma ideia de superioridade", explicou.

Um dos conceitos mais utilizados ao longo de todo o debate foi a "narrativa luso-tropicalista", referente à década de 50 e à justificação do racismo no brasil, dizendo que não existiu porque "Portugal tem capacidade para se misturar com os outros povos".

Para Fernando Rosas, estes discursos "penetraram profundamente na democracia portuguesa" e "não há ninguém que possa dizer" que não há racismo no acesso à habitação, ao emprego, na política, nas forças de segurança ou no ensino".

O assessor parlamentar do Bloco de Esquerda também esteve presente neste debate onde defendeu a necessidade de romper com o luso-tropicalismo em todas as áreas: "é preciso desconstruir, falar sobre a questão do privilégio branco e olhar para o processo histórico que resulta na descriminação de pessoas".

A mudança de perspetiva nos manuais escolares de história foi um dos contextos mais abordados, e Cristina Roldão, revelou que após uma análise, foi possível perceber vários "discursos racistas" nestes livros.
"Um deles é a ausência total de uma história sobre África, como tendo organizações políticas, culturais, económicas próprias e sofisticadas antes da presença dos portugueses. Falam sempre como o local onde os portugueses captaram recursos e população escravizada. E mesmo na atualidade é vista como um sítio de miséria, de crise humanitária e isso é o que vai ficando no imaginário dos manuais de história. Precisamos de transformar isto", sublinhou.

Um debate que ganhou atualidade tendo em conta os desenvolvimentos da última semana, após a intervenção da PSP no bairro da Jamaica, no Seixal.
"Não sonhamos que este momento ia acontecer numa altura tão polémica, mas ao mesmo tempo tão reveladora. É como se estivesse sempre escondido debaixo de terra e nestes dias ele rebentou, saiu cá para fora. É um momento muito oportuno e principalmente para a Margem Sul", frisou Cristina Roldão.

Até junho, realiza-se uma vez por mês uma conferência com esta temática, em vários espaços do concelho, como a biblioteca municipal, a Escola de Hotelaria e Turismo ou o cinema Charlot, e que apesar de ter como público-alvo os professores, educadores e alunos, está disponível para a comunidade em geral.

Neste âmbito, está ainda agendada uma visita para 28 de setembro à descoberta da "presença negra na região de Setúbal".

"É uma das partes mais interessantes. Sabemos da presença de população negra escravizada na região de Setúbal, em Alcácer do Sal, de confrarias antigas de homens negros na cidade de Setúbal, mas o mapeamento ainda está em construção e é surpresa. A ideia é que Setúbal não fique com uma história silenciada da presença negra na região", revelou Cristina Roldão.

Crime, Silêncio e Preconceito

in SicNotícias

Duas mulheres sobreviventes de violação dão à Grande Reportagem SIC dois corajosos e poderosos testemunhos. Que nos obrigam a reflectir sobre a forma como lidamos, enquanto sociedade, com as vítimas e com os agressores de um dos mais graves crimes que pode ser cometido contra alguém. Estaremos, todos nós -- os que julgam nos tribunais e os que se sentem no direito de julgar fora deles -- a promover o silêncio das vítimas e a impunidade dos agressores? Crime, silêncio e preconceito alimentam-se mutuamente

Ser cuidador informal é aceitar "um segundo turno que não tem horário"

Joana Gonçalves, in RR

Cristina Borges viu-se obrigada a abandonar o emprego para assegurar cuidado permanente aos pais, com quem foi viver. Durante seis meses, assumiu um trabalho sem limite de horário ou remuneração. Não se sentia preparada. Em dia de debate da Lei de Bases da Saúde, no Parlamento, Cristina deixa um apelo a todos os partidos.

Ser cuidador informal é aceitar "um segundo turno que não tem horário"
Aos 53 anos, João Maria Cipriano Quitério, até então gerente bancário, decidiu dizer adeus à gravata e ao relógio. Libertou-se do horário fixo das 9h00 às 17h00 e abraçou a reforma.
Iniciou, então, um período de férias, na companhia de Maria da Graça Faria Franco, com quem é casado há mais de cinco décadas. Já não consegue precisar a data, mas recorda-se bem dos sete anos de namoro que precederam o pedido de casamento.

Adorava conduzir, apesar de não fazer viagens longas, e raramente “visitava a província”. O desporto era o seu único passatempo. Praticou voleibol, natação e ginástica, mas “nunca nada a sério”.

Pai de Cristina Borges, educadora de infância em Carcavelos, João Maria chegou a assumir o cuidado dos netos, Diogo e Catarina, “quase gémeos, com apenas 13 meses de diferença”.

“O meu pai ia buscar os meus filhos à escola, levava-os à natação, era como um segundo pai para eles. Era o meu porto de abrigo”, conta Cristina à Renascença. Mas tudo mudou em 2012.
“O mundo virou-se ao contrário”
Há pouco mais de seis anos, João Maria foi operado à próstata e a uma hérnia inguinal. A operação, conta a família "correu mal”.

Esteve deitado durante 21 dias. Quando finalmente se tentou levantar, já não conseguiu. Depois da intervenção, João Maria esperava ver melhorada a sua qualidade de vida, mas em vez disso enfrentou uma lesão dos nervos, com perda de mobilidade dos membros inferiores.
Durante várias semanas a família viveu um pesadelo. “Achámos que o meu pai tinha uma doença do neurónio motor, ficámos muito abalados”, recorda a filha.

As suspeitas acabaram por não se verificar; o pai de Cristina sofria afinal de uma neuropatia diabética, uma das mais prevalentes complicações tardias da diabetes.

Desde então, João Maria nunca mais voltou a andar. A mulher, Maria da Graça, também com mobilidade reduzida, não foi capaz de assegurar o cuidado do marido. Cristina passou, por isso, a assumir o papel de cuidadora de ambos. “O mundo virou-se ao contrário. Senti-me a mãe dos meus próprios pais”, desabafa.
Um turno sem horário
Com a mãe e o pai dependentes, Cristina passou a assumir um segundo turno de trabalho, “sem horário”.

Às 8h30 entrava ao serviço, no Jardim Escola João de Deus, em Lisboa. Mas o dia começava bem antes, horas antes, quando tinha de assegurar a alimentação e a higiene pessoal dos pais. Por volta das 13h00 regressava a casa para lhes preparar o almoço num ápice antes de voltar para a escola. Às 17h00 abandonava o emprego, mas nem por isso deixava de trabalhar.

Durante seis meses viveu em casa dos pais. Sem experiência em geriatria, Cristina sentiu-se “encurralada”. “Eu não sabia fazer uma transferência, não sabia mudar uma fralda, não sabia fazer montes de coisas necessárias e importantes para um doente com estas patologias."

Começou por adaptar a casa à condição do pai. Para poder transportá-lo na cadeira de rodas teve de reduzir o número de móveis do quarto e da sala. Depois vieram as obras na casa de banho. A banheira deu lugar a um polibã e seguiu-se a compra de uma cadeira para o duche. Às fraldas, medicamentos e fisioterapia, acresciam os cremes, babetes e consultas.

Fora a cadeira de rodas e o andarilho, Cristina não conseguiu qualquer apoio. O subsídio por assistência de 3.ª pessoa, no valor de 108,68€, era a única opção, mas nem dele João Maria pôde beneficiar.
Este apoio social é atribuído a pessoas em “situação de dependência, que necessitem do acompanhamento permanente de 3.ª pessoa” e que apresentem um rendimento mensal igual ou inferior a 420,64 €, se for casado(a), ou a 210,35 € se for solteiro(a), divorciado(a) ou viúvo(a).

A situação começava ficar insustentável. “As pessoas não têm bem a noção de quanto se gasta com uma pessoa com mobilidade reduzida. Só uma cadeira para o banho de 150€ acaba com o 'plafond'. Garantir uma boa qualidade de vida a uma pessoa nestas condições implica um enorme investimento.”

Cristina viu-se obrigada a abandonar o emprego a tempo inteiro. “O que eu aprendi com isto tudo é que tinha de me cuidar muito bem, porque se eu fosse internada não havia ninguém para cuidar deles, para gerir esta situação. Porque não há ninguém que consiga ficar 24 sobre 24 horas com um casal com mobilidade reduzida e com a doença do meu pai, não existe”.

Em 2015 a família arranjou uma solução: transformar a casa de João Maria e Maria da Graça num alojamento local. Foi a alternativa que arranjaram à venda do imóvel.

Cristina gere agora este pequeno negócio, que lhe assegura rendimento suficiente para garantir a estadia dos pais na Amera, uma residência sénior, localizada no Seminário da Torre d’Aguilha, em S. Domingos de Rana, Carcavelos.

“Lá ele sente-se muito mais acompanhado, porque tem enfermeiros e tem médicos a tempo inteiro”, assegura.
As despesas são muitas, mas Cristina recuperou o fôlego e os pais visitam a casa várias vezes por mês.

O apelo de uma cuidadora informal. "Isto é uma coisa apartidária"
Uma questão apartidária
A nova Lei de Bases da Saúde, aprovada em Conselho de Ministros no passado mês de dezembro, deixou cair o estatuto do cuidador informal.
Em Portugal, segundo a EuroCarers, haverá 827 mil cuidadores informais, perto de 207 mil a tempo inteiro e os restantes a tempo parcial. Um trabalho não remunerado que valerá, no nosso país, quase 333 milhões de euros por mês, cerca de 4 mil milhões de euros por ano, de acordo com um estudo encomendado pelo Governo e revelado em 2018.

Em breve, o número de pessoas dependentes de um cuidador vai ultrapassar a oferta. Assim conclui um estudo da Comissão Europeia, também publicado no ano passado.

O mesmo estudo revela ainda que cerca de 80% dos cuidados em toda a Europa são assegurados por 125 milhões de pessoas não remuneradas nem treinadas para tal.

Ansiedade, depressão, exaustão, isolamento e risco agravado de pobreza são, segundo o mesmo documento, as principais características que retratam um cuidador informal, na sua maioria mulheres com mais de 45 anos, à semelhança de Cristina.

Mas qual é a proposta da Comissão Europeia para fazer face a este cenário alarmante?
Apoio financeiro, benefícios fiscais, horário flexível e contagem do tempo de prestação de cuidadores informais, em casa, para a reforma. Uma resposta simples, mas que parece ser um desafio permanente.
Esta quarta-feira, dia do debate da Lei de Bases no Parlamento, Cristina Borges quer deixar uma mensagem a todos os deputados - um apelo que garante não ser só dela.
“Eles já nos deram muito quando eram novos. Agora chegou a nossa vez. Eles merecem ter qualidade de vida. Isto é uma coisa apartidária, não tem partido.”

Portugal entre os países em que as prestações sociais mais pesam

Ana Cristina Pereira, in Púbico on-line

Novo relatório da OCDE indica que “Itália, Polónia e Portugal canalizam mais de 70% das despesas sociais para as prestações sociais”, como pensões.

As despesas com prestações sociais e serviços sociais e de saúde têm em Portugal um peso no PIB maior do que a média dos 36 países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE). O país destaca-se pela porção que canaliza para prestações sociais, em particular pensões.

Neste prédio de “contornos finos”, a Foz do Douro esconde-se atrás de portadas
De acordo com o relatório publicado esta quarta-feira por aquela organização internacional, a França lidera a tabela, com a maior fatia de despesa pública nesta área (acima de 30% do PIB). A Áustria, a Finlândia, a Bélgica, a Dinamarca, a Alemanha, a Itália e a Suécia também atribuem um quarto do PIB ou mais.

No outro extremo, o México, o Chile, a Coreia do Sul, a Turquia, a rondar os 10% ou abaixo. Portugal ficou-se pelos 22,6% em 2018, acima da média estimada para o total de países da OCDE, fixada em 20%​.

Este conjunto de países gasta mais com prestações sociais (12%) do que com serviços sociais ou de saúde (8%). “Itália, Polónia e Portugal canalizam mais de 70% e a Grécia mais de 80% das despesas sociais para as prestações sociais”, refere o documento, como subsídios de desemprego, de apoio à família, de alívio da pobreza, mas, sobretudo, vários tipos de pensões.

OCDE vê sistemas de pensões mais fortes mas recomenda mais poupança
O pequeno relatório chama a atenção para o facto de a recuperação económica já ter conduzido a uma queda da despesa com as várias prestações de desemprego. Na prática, “caírem de 1% do PIB em média em 2010 para 0,7% do PIB, em 2015”. E isso nota-se, de forma mais acentuada, na Bélgica, na Alemanha, na Islândia, na Irlanda, na Espanha e nos Estados Unidos.
Pelo contrário, a despesa pública com serviços sociais, como lares de idosos ou centros ocupacionais para pessoas com deficiência, tem aumentado continuamente. E isso não será alheio ao envelhecimento da população.


“A Europa será social ou não existirá”

Teresa de Sousa em Viena, in Público on-line

Criou em Berlim o European Democracy Lab, um “laboratório” onde jovens investigadores constroem a República europeia. Vai contra a corrente da falta de ambição reinante sobre o futuro da Europa. A sua ideia é simples: depois do mercado único e da moeda única, falta construir a República dos cidadãos. Antes disso, é preciso tirar as lições da crise financeira e mudar de paradigma. A começar por Bruxelas. Segunda de uma série de dez entrevistas sobre a Europa e o Presente.

“O pepino é igual perante a lei europeia. O euro é a igualdade da moeda. Oferecemos liberdade e igualdade para bens, serviços, mercados, mas não para os cidadãos.” Sem meias palavras, Ulrike Guérot — que, para além do European Democracy Lab, dirige em Viena o Departamento de Política Europeia e de Estudo da Democracia na Danube-University — desmonta muitas das ideias-feitas sobre o que pode ou não pode ser feito na Europa para resgatar a integração. Não há ricos e pobres, há centro e periferia. Há os soberanistas e os europeístas, mas sobre esta divisão há uma outra, de classes — os que vivem bem e os que ficaram para trás. Macron acabou com a esquerda e a direita, mas governa para a esquerda que vive bem e para a direita que vive bem. De fora estão os deserdados da modernização e as zonas rurais. Todos os países europeus estão divididos por esta fractura — foi ela que deixou o espaço vazio que os populistas ocupam. A democracia liberal já deixou de o ser, na medida em que os cidadãos deixaram, em boa medida, de poder escolher. A solução só pode ser encontrada a nível europeu, com a igualdade política entre os cidadãos — o fundamento de uma nova identidade, a única forma de combater a ascensão do populismo identitário. Utopia? É melhor do que uma distopia que destrua a liberdade e a democracia.


A Europa atravessa uma crise existencial profunda, creio que ninguém discorda disso. Em cada dia que passa temos notícias que revelam essa crise. Só as mais recentes: Macron, o salvador, está a braços com uma enorme crise interna; vários países europeus não quiseram participar no Pacto Global para as Migrações; o “Brexit” provocou uma crise política enorme no Reino Unido e ninguém sabe ainda como esta história vai acabar. Mesmo com estas más notícias, não desiste de ter uma perspectiva optimista sobre o futuro da Europa, assente em ideias que são novas. Porquê?

Quer a resposta verdadeira? Porque tenho dois filhos, com 25 e 27 anos, e porque quero deixar-lhes uma Europa que funcione. Segunda parte da resposta: porque me sinto de certo modo responsável — não individualmente, porque me tornei adulta nesses dias gloriosos do Tratado de Maastricht [1992] e de todas as expectativas de uma Europa forte e unida que tínhamos na altura. Antes disso, tinha sido a adesão de Portugal e Espanha [1986], o Acto Único Europeu [1986], a democracia para todo o continente, a prosperidade, a coesão — eram estas as promessas. Nasci em 1964. E tenho o sentimento de que a minha geração não estragou o projecto europeu, mas também não cuidou dele o suficiente. Pensávamos que a Europa estava feita. Tínhamos o Tratado de Maastricht, já não era preciso preocuparmo-nos com o futuro. Como dizia o Candide de Voltaire: “É preciso cultivar o nosso jardim.” Nós não cultivámos o jardim. Perdemos a ambição europeia e creio que foi essa falta de ambição que acabou por criar um vazio, que foi ocupado progressivamente por este populismo identitário e pelos movimentos nacionalistas.

O que é a sua República europeia? Diz nos seus ensaios que não se trata de construir os Estados Unidos da Europa, mas a República europeia. Qual é a diferença?
A minha ideia é uma mudança de paradigma na própria linguagem, porque as palavras contam muito. Andamos às voltas com os Estados Unidos há quase 70 anos e não chegámos lá. Talvez seja tempo de mudarmos de designação. E temos razões para isso. Primeiro, não queremos imitar os Estados Unidos da América; segundo, porque não funcionou; finalmente, porque os estudos empíricos provam que a palavra “República” tem uma conotação emocional positiva na História europeia. Tem raízes na cultura política europeia. Se for ao site do meu departamento, encontrará um estudo linguístico, que acabei de publicar, em que demonstro através de dados empíricos que quando digo República as pessoas reagem intuitivamente de forma diferente da forma como reagem à expressão “Estados Unidos da Europa”. A palavra “Estado” contém uma obrigatoriedade vinda de cima. A palavra “República” transmite a ideia de cidadania. De uma coisa que é minha, tua, nossa. O projecto político europeu é nosso, é o projecto dos cidadãos europeus e não o projecto dos Estados. E esta mudança de paradigma envolve muito mais a ideia de cidadania, de identidade directa. Se dissermos: nós, os cidadãos, somos responsáveis pela República da Europa, também passamos a ser, num certo sentido, a Constituinte.

O que é que isso significa exactamente?
Nós aceitamos obedecer às mesmas leis e somos iguais perante a lei. Se quer que diga numa frase o que é a República europeia, é colocar todos os cidadãos europeus para lá da etnia nacional, numa situação de igualdade perante a lei, em relação às coisas que são importantes para eles: o voto, os impostos e o acesso aos direitos sociais.

Como é que isso se concretiza?
Hoje temos uma estrutura da União Europeia que oferece as quatro liberdades de movimento: para as pessoas, mercadorias, serviços e capital. Na prática, o Mercado Único é a igualdade para as mercadorias. O pepino é igual perante a lei em todos os países. O euro é a igualdade da moeda. A directiva dos serviços diz que o trabalho de uma pessoa é igual perante a lei. Oferecemos liberdade e igualdade para os bens, para os mercados e para os serviços

Mas não para as pessoas.
Não para as pessoas ou, melhor, para os cidadãos no sentido que a República lhes confere. Por isso, enquanto cidadãos e embora sejamos os portadores da soberania, somos os únicos que, na actual estrutura, não beneficiamos de igualdade legal. Creio que é isto precisamente que devemos completar, garantindo aos europeus que são iguais no seu direito de voto, iguais perante os impostos e iguais perante os direitos sociais. A partir daqui, digo: um mercado, uma moeda, uma democracia. E se queremos uma democracia, a condição é o princípio da igualdade política. Devemos considerar todos os cidadãos europeus iguais perante a lei como um único corpo eleitoral.

Da lei europeia, não da lei nacional, perante a qual eles são iguais.
Mas, se eu mudar de Portugal para a Polónia ou para o Reino Unido, serei diferente. Precisamos de fazer a distinção entre os países da zona euro e os outros. Quando digo um mercado, uma moeda, uma democracia, não abranjo todos os países. Preciso de fazer esta distinção. Até porque uma união monetária já é um contrato social. Mas ainda não completamos esse contrato social. A segunda questão é que estamos a fazer da nacionalidade uma ferramenta de concorrência assente nos cidadãos uns contra os outros — seja no dumping social, no dumping salarial, na fiscalidade. Andamos envolvidos numa corrida para o fundo que se está a tornar sistémica, transformámos os instrumentos legais nacionais para fazer melhor do que os outros, como a Alemanha fez em relação à França.
Em matéria salarial.

Exactamente. E o que eu digo é: se queremos ser uma República, então nos 19 que já fazem parte do euro, queremos também ser iguais perante a lei, enquanto cidadãos.
Verificamos que esta crise do euro aumentou as divisões e as diferenças, não aproximou os cidadãos. Nomeadamente, abriu um fosso profundo entre os países ricos do Norte e os países menos ricos do Sul. Não apenas com os programas de austeridade, mas também com os preconceitos. Os cidadãos do Sul foram tratados como preguiçosos. E mesmo agora, quando já todos os países saíram dos programas de ajustamento e que estão a fazer os que lhes disseram para fazer, as divisões continuam visíveis. Como vê esta situação?
Essa é a realidade que nos descrevem. Nunca foi o Norte contra o Sul, devedores contra credores. Posso mostrar-lhe alguns mapas que provam que o que existe são nações divididas e que a desigualdade de rendimentos aumentou em todos os países.

Dentro deles?
Dentro deles. Na Alemanha, na França, em toda a parte. Não é a rica Alemanha contra a pobre Itália; é a rica região de Essen e o Norte de Itália contra o pobre Brandeburgo e a pobre Apúlia. Se olharmos para os indicadores da zona euro, vemos que as divisões socioeconómicas não são entre nações, entre o Norte e o Sul, mas são entre o centro e a periferia, entre as áreas urbanas e rurais. O centro é bom e as periferias são más, as áreas metropolitanas são boas e as rurais são más. Acontece que a Alemanha tem muitas zonas urbanas e está no centro [do continente], o que torna a Alemanha boa. A França, por exemplo, só tem duas grandes áreas urbanas, Paris e Lyon, e tem muitas áreas periféricas sobretudo ao longo do Atlântico. Isto reforça o meu argumento de que precisamos urgentemente de sair da maneira de pensar assente nos agregados nacionais, quando olhamos para as coisas. Quando olhamos para os números do desemprego, vemos que a França está nos 10%, mas isso faz pouco sentido na medida em que Paris e Lyon têm 4% de desemprego, estão economicamente muito bem; são os territórios rurais e das periferias que criam os gilets jaunes. O Norte de Itália está muito bem e o Leste da Alemanha não está nada bem. Temos de sair desta armadilha com que olhamos para a realidade.

É também nessa lógica que assenta a sua República europeia?
Temos de pensar de forma diferente e isso implica reconhecermos que nunca podemos encontrar boas soluções quando olhamos para as coisas com as lentes nacionais em vez de vermos as reais discrepâncias de rendimentos.
E esta nova geração europeia consegue ver as coisas desta maneira? Quando votam, dividem-se por crenças muito diferentes.
Não há essa coisa dos jovens. O que vemos hoje é que a crise social, as divisões de mobilidade, de educação — menos educado, sem grande mobilidade versus juventude Erasmus — criam duas juventudes diferentes. Tem os jovens mais urbanos, mais educados e com grande mobilidade, que são, na sua maioria, totalmente europeus; e depois tem os mais identitários, menos educados, com menos possibilidade de movimento, que, como disse, tendencialmente votam nos populistas.

Seguindo o que se passa com o resto da população.
O que podemos concluir é que a crise social de hoje é a crise europeia de amanhã. Podemos ver o que se passa na Polónia e na Hungria, mas podemos ver também o que se passa em Paris. Emmanuel Macron não tem a juventude com ele. No grupo etário entre os 18 e os 25 anos, Marine Le Pen tem mais 8% do que na média da população. A crise social determina a forma como se olha para a Europa também na juventude. E aqueles que não fazem parte da bolha europeia têm, infelizmente, a tendência para deixarem de considerar a democracia como o melhor sistema politico, têm uma forte tentação autoritária e nem sequer são contra um regime militar. Estes são os números que pode encontrar em muitos estudos de opinião.

O que disse reflecte também a crise das democracias liberais. A sua ideia é que esta crise das democracias também pode ser resolvida — ou só pode ser resolvida — a nível europeu?
A primeira resposta é que me apetece dizer que também sou populista. É uma palavra nobre. São as classes populares de Jean Jaurés e é com elas que os políticos se deviam preocupar. No Jeu de Paume, em Paris, há uma pintura que representa a República — é uma mulher que está a amamentar os cidadãos. A República preocupa-se. Toma conta. [A designação] “Classes populares” deve ter uma conotação positiva. É bom cuidar do povo. Esta ideia da elite versus o povo é uma generalização. Temos uma elite do espírito e temos uma elite do dinheiro. Posso argumentar que sou membro de uma elite do espírito, mas não tenho lá muito dinheiro, como a maior parte dos académicos não têm. Trump é a elite do dinheiro, mas sem qualquer ésprit. E se Trump não tivesse sido apoiado por parte do establishment dos EUA, nunca estaria onde está. É totalmente errado chamar-lhe um populista e dizer que a sua candidatura emanou do povo. Trump é a elite do dinheiro apoiado por parte do establishment.

A democracia liberal é o segundo problema que colocamos de forma errada. As elites estão deste lado e querem a Europa, o povo está do outro e não a quer. A democracia liberal foi ontem. Porque hoje, o que há é liberalismo, que já não é democrático — é, por exemplo, a União Europeia chegar com a troika e o com o memorando e dizer que é isto que têm de fazer. É liberalismo sem muita democracia, porque os gregos puderam votar à vontade contra ele, mas mesmo assim tiveram de engoli-lo. É o que alguns chamam de pós-democracia. Podemos sempre votar mas não temos escolha. A ausência de escolha é o problema da democracia liberal hoje. Ou o liberalismo vem sem democracia ou a democracia vem sem o liberalismo. É Orbán. Ele tem os votos e a partir daí é ele que decide.
Se reconhecemos isto, então não podemos dizer que a democracia liberal tem de ser defendida contra o populismo. Durante demasiado tempo, dissemos que a União Europeia não tinha alternativas, que não podia ser criticada e que tínhamos de defendê-la contra os populistas. O que é que estamos a defender?

A ideia de Europa, de partilha...
Defendemos o sistema que instalou uma agenda neoliberal em cada pedaço da sua circunscrição? Temos um Mercado Único que não se preocupa com os cidadãos. Temos uma União Europeia que resiste a avançar no sentido dos direitos sociais. O que é que há para defender? Creio que, pelo contrário, o maior erro foi, durante demasiado tempo, as chamadas elites liberais-democráticas não terem mais nada para oferecer do que defender a Europa contra os populistas, em vez de compreenderem que, quando se aponta um dedo aos populistas, haverá três dedos a apontar de volta. Há dez anos, depois da crise financeira, a Europa devia ter acordado e ter admitido que se calhar estava com um problema. Devia ter pensado que, se calhar, tinha mesmo de construir uma dimensão social ou uma união política, se calhar tinha de avançar para os euro-bonds e para um esquema de protecção do desemprego comum. Nada aconteceu. Numa década, nada aconteceu. Temos planos para uma união económica e monetária genuína. Vamos completá-la. Vamos avançar para uma união fiscal.

Regressando ao nível nacional que é onde a crise das democracias se manifesta, não há ninguém que tenha compreendido os problemas?
Macron não é de esquerda nem de direita. Mas são agora os gilets jaunes que estamos a ver. Porquê? Macron está a governar a França com a parte da direita que vive bem e com a parte da esquerda que vive bem, mas perdeu os trabalhadores à esquerda e perdeu os agricultores e o pequeno artesanato à direita. Isso não pode funcionar. O que estou a dizer é que o novo paradigma já não é esquerda e direita, de facto, mas é uma parte europeia que vive bem contra uma parte que foi deixada para trás. São os gilets jaunes.

Se queremos enfrentar esta realidade, temos de renovar o sistema político trazendo de volta a direita e a esquerda, mas só conseguimos fazer isso ao nível europeu e é esse também o meu ponto para a República europeia. Hoje, em traços gerais, todas as nações da União Europeia estão divididas em duas partes. Os leavers e os remainers, as áreas rurais contra Londres. Temos o Pegida e temos Frankfurt. Temos a Liga e o Cinco Estrelas contra o resto da Itália.

Abertura e fechamento, soberanistas e europeístas — é esta a divisão que é hoje importante?
O que lhe digo é que, sob esta divisão entre soberanistas e europeístas, há uma linha de divisão entre classes. Os pobres contra os ricos. E assim a Europa não pode funcionar. Tiro uma conclusão fundamental: a Europa ou se torna social ou não existirá. E, se vier a ser social, a minha resposta volta a ser a República europeia, precisamente porque Respublica quer dizer “bem comum”. O Mercado Único é algo de muito diferente. A República tem de se preocupar com os seus cidadãos.

O Mercado Único criar as condições para a competição.
Não defendo o fim do Mercado Único ou do euro, precisamos de ambos para a arena internacional. Nenhum país ficaria melhor com o regresso da sua moeda. Mas não chega para colocar os cidadãos numa posição de igualdade perante a lei, o que significaria que, na Europa ou pelo menos na zona euro, evitarmos a actual situação em que os cidadãos competem uns contra os outros. Precisamos de ter coisas como um salário mínimo europeu, standards idênticos, sistemas de protecção ao desemprego, saúde pública — que até pode ser privada ou garantida por seguros. Mas, se queremos garantir e aumentar a mobilidade, se levarmos em conta os cerca de um milhão de bebés Erasmus que já nasceram, precisamos que a dimensão social siga o Mercado Único.

Os cidadãos vêem outra coisa. Por exemplo, quando os governos aceitam o que Bruxelas determina, os mercados ficam eufóricos. Quando o Governo italiano, por boas ou más razões, disse que queria um défice maior para estimular a economia, os mercados penalizaram imediatamente os juros da dívida italiana. As pessoas podem olhar para isto e pensar: eu ainda tenho escolha? Como se responde a isto? É possível quebrar este círculo vicioso?
Concordo consigo. Há uma questão fundamental sobre o futuro do capitalismo financeiro, uma questão fundamental sobre até que ponto tornar os Estados dependentes das agências de rating. Conhece como eu autores como o francês Emmanuel Todd que diriam simplesmente: cortem a dívida. Eu seria muito mais prudente e diria que ainda não encontrámos a resposta. Mas sabemos que, formalmente, a definição de um Estado é poder cobrar impostos. É por isso que não cai na bancarrota, fica fora do julgamento sobre a sua capacidade de pagar. Os EUA estão sobreendividados, o Japão também.
E não se preocupam muito.

Não se preocupam. Porque é que havemos de fazer a dívida italiana dependente da disposição dos mercados? Mas há outra questão talvez mais fundamental que é saber o que é hoje um Estado. Se a definição do Estado era a possibilidade de cobrar impostos, isso hoje já não é assim. Há offshore, paraísos fiscais. E se está limitado na sua capacidade fiscal também não pode redistribuir. E é esta a pressão. O que é um Estado? O que é que pode fazer? E até que ponto está dependente dos mercados financeiros devido à sua dependência do serviço da dívida.

Mas aí Bruxelas não serve para proteger os Estados-membros.
Eu sei. Concordo com o que diz e não sou a única. A Alemanha viveu uma situação interessante com Friedrich Merz, durante a campanha para a sucessão da chanceler Merkel, contra a candidata que ganhou: Annegret Kramp-Karrenbauer (AKK). Apenas 37 votos impediram a Alemanha de cair na armadilha do capitalismo financeiro. É errado dizer que Merz tinha uma experiência e uma competência empresarial. Ele tinha apenas a competência dos mercados financeiros, o que é completamente diferente de dirigir um negócio num ambiente concorrencial. Macron está a falhar pela mesma razão. Também ele vinha de um banco de investimento, carregando essa imagem de um liberal para uma nação de start-ups. Mas também vinha dos mercados financeiros. O problema hoje é esta desconexão entre a economia real e os mercados financeiros.

Isso quer dizer que ninguém aprendeu nada com a crise de 2008?
Eu colocaria a questão de outra maneira. Concordo que ainda estamos no mesmo paradigma de antes da crise. Bruxelas não mudou. Mas estamos agora a uma década da crise financeira, temos uma década de literatura, temos boas análises, as ciências sociais trabalharam muito e bem, aliás trabalharam melhor do que as ciências económicas, que ainda não compreenderam totalmente a lição de que os mercados são uma espécie de arbitragem psicológica. As ciências sociais têm hoje uma boa leitura do que foi a crise dos mercados financeiros, das mudanças nas nossas sociedades, incluindo o facto de o Estado ter perdido o seu poder de redistribuição da riqueza e das consequências sociais dessa realidade.

Se nos lembrarmos de que a ciência leva quase sempre uma década a começar a ter efeitos práticos, creio que estamos agora nesse momento em que aquilo que a ciência produziu na década passada começa a ter o seu efeito na sociedade. Os gilets jaunes, por exemplo. Creio que só as pessoas que não liam as análises sociais sobre as consequências do capitalismo dos mercados financeiros é que não conseguiam entender o que se poderia passar. Penso que é justo dizer que Bruxelas está ainda no mesmo paradigma, mas também é justo dizer que há cada vez mais gente que entende que é preciso fazer alguma coisa. Hoje, já se pode dizer que a agenda neoliberal que dominou nas últimas décadas tem de mudar, que temos de retirar os Estados das mãos dos mercados financeiros, sem sermos apelidados, como há dez anos, de radicais revolucionários. Hoje há políticos mainstream [na Alemanha], da CDU, do SPD, dos Verdes a dizer a mesma coisa. Esta a tornar-se cada vez mais mainstream que é preciso acabar com esta amálgama entre os mercados financeiros e o Estado, e que é preciso fazer alguma coisa, se não queremos perder os nossos sistemas políticos para o populismo.

Mas para isso é preciso líderes políticos que se ergam à altura dessa necessidade, o que não é fácil.

Eles estão todos aí. O problema é que os que estão a entrar em campo não agem em conjunto. Aparentemente, a atomização da sociedade foi tão longe como isso. É também por isso que emergem líderes como Macron ou Sebastian Kurz, que lideram movimentos e não partidos e os movimentos funcionam com líderes, os partidos com muita gente. Estamos a mudar de um sistema de partidos para um sistema de líderes. Ninguém consegue agregar estas tendências num movimento de esquerda-liberal-verde, que acaba por ter uma larga maioria à sua disposição. Porque os chamados populistas são a minoria audível de uma maioria silenciosa. Onde quer que sejam medidos, os populistas representam 30 a 35%, mais ou menos um terço. O que quer dizer que dois terços querem alguma coisa muito diferente. Querem Europa, liberalismo, social-democracia, ecologia.
Sobretudo nos países mais ricos, as pessoas não estão a viver pior do que viveram nas últimas décadas e mantêm uma protecção social elevada. O problema novo é que têm medo do futuro — da incerteza sobre as suas vidas e as dos seus filhos. A percepção conta muito.

Concordo completamente. A insegurança vem de muitos factores — factores externos, como o que se passa nos EUA, Putin, a ascensão da China, e depois há o novo mundo digital. Em tempos de insegurança, o que as pessoas querem é estabilidade e ordem. Os únicos que fornecem uma oferta apropriada de ordem são os populistas. Às vezes, a brincar, digo que estamos a sofrer agora as dores do pós-estruturalismo — a esquerda desconstruiu de tal maneira tudo, o Estado, as instituições, a sociedade, até o género, deixou de haver sexos, que se perdeu o conjunto. Sou mulher ou não sou mulher. Sou membro de um sindicato ou não tenho representação. O problema é que a esquerda se esqueceu das classes — é tudo sobre identidade, tudo sobre racismo, minorias, lésbicas, judeus, hispânicos, negros, eu sei lá. As pessoas comuns não recebem qualquer mensagem e a classe social deixou de estar no radar.

E no momento em que apenas falamos de soberanistas e de europeístas, esquecemo-nos de que a força condutora fundamental da sociedade é a divisão de classes. Hoje é assim. Um pouco menos de um quarto da população europeia pode considerar-se pobre. É demasiado. E agora temos a ligação entre a classe e a insegurança. Se as nossas análises estão certas, existe essa divisão de classe. As classes mais altas são a favor da Europa, do euro, da austeridade. E depois temos pessoas que não querem perder a sua segurança, as suas referências, o seu ambiente social. Há duas opções. Ou encontramos uma forma de República europeia que implica uma solução europeia que deixe de pôr as pessoas umas contra as outras, compatibilizamos mercado e a dimensão social, criamos um corpo político.
A questão é saber porque é que isto não está a acontecer, longe disso.

Não está a acontecer porque não tem uma força motora económica, porque custa alguma coisa. A diferença está em que o Mercado Único e a moeda única tinham uma lógica económica forte, porque as indústrias e os bancos queriam as duas coisas e ganharam muito com elas — e por isso os políticos passaram a querer também. Faltam os cidadãos. Estamos pela primeira vez neste continente perante a tarefa de organizar a democracia europeia, no sentido da igualdade das pessoas perante a lei, sem termos uma lógica económica por detrás. No sentido que lhe dá Habermas, a igualdade das pessoas perante a lei tem um preço. Pagar o mesmo subsídio de desemprego de Portugal a Berlim tem um preço.

E, pelos vistos, ninguém o quer pagar.
Isso não está a acontecer porque o capital alimenta o populismo, porque se dá bem com ele — é a resposta mais barata. O que aconteceu com Trump quando foi eleito? Os mercados ficaram apreensivos? Não. Regozijaram. O que sabemos do passado é que o capitalismo foi compatível com o fascismo e hoje verificamos que o populismo é perfeitamente compatível com o capitalismo. Creio que esta é a batalha do futuro.

A questão principal é saber como é que os partidos do centro vão reagir. Os socialistas e sociais-democratas estão em queda. O centro-direita perde força. Uns tentam encostar-se à esquerda, os outros à direita. Não se vê claramente que andem à procura de um outro paradigma que defenda as democracias liberais.

Essencialmente, a questão está em convencer o centro de que ou cai para o lado dos populistas ou cai para o lado da esquerda. Precisamos de encontrar uma lógica económica também para isso. Nenhum sistema é de graça. Podemos dizer que subsídios europeus ou euro-bonds são muito caros. Mas podemos dizer que a escolha é pagar o preço pela Europa ou pagar o preço da não Europa. Que será pago não apenas em moeda, mas na perda da liberdade e da democracia. Este argumento pode acabar por fazer inclinar a balança do centro para a ideia de que é preciso pagar um preço para uma Europa social. É o que querem dizer os gilets jaunes, mas também os italianos, os gregos. Este pode ser o argumento ganhador: pagar pela utopia em vez de pagar pela distopia. Dito isto, todas as análises económicas indicam que a guerra tem uma lógica económica e que a paz não tem. Pode ganhar-se imenso com a segurança. Há 40 anos, falávamos do complexo militar-industrial. Hoje devíamos estar a falar do complexo tecnológico que nos levará cada vez mais para o negócio da segurança, como o anterior nos levou para a militarização excessiva.

Há também o novo fenómeno das empresas tecnológicas que concentram um poder tal que ninguém consegue sequer taxá-las, como se vê agora na Europa. Estou a referir-me às quatro grandes.
Elas podem fixar-se onde quiserem, na Irlanda ou na Holanda ou ter a sede no Panamá. E há outra explicação: os EUA conseguiram destruir a Standard Oil mas não podem destruir a Google. Os EUA não admitiam a existência de um monopólio. Eu não tenho nada contra a economia de mercado assente na concorrência leal, com regulação social. Mas temos uma nova estrutura monopolista que pode ignorar os Estados. Krugman já disse inúmeras vezes que a Amazon devia ser destruída, como a Standard Oil foi destruída. O problema é que não é hardware, é software. Não é fisicamente destrutível.
Não podemos tocar a nuvem. Mas há também as consequências sociais e políticas das novas tecnologias. Bolsonaro foi eleito praticamente sem ter de recorrer aos jornais ou à televisão, que o tratavam bastante mal, apenas às redes sociais. O gilets jaunes dificilmente existiriam sem os media sociais. Há coisas boas mas também há consequências inesperadas e potencialmente negativas.
Há paralelismos históricos. Foi apenas graças à impressora que as pessoas começaram a ler no século XVII e que, no século XVIII, houve revoluções — as pessoas conseguiam ler panfletos. Os novos media têm sempre uma natureza igualitária. Hitler não ascendeu ao poder porque escrevesse bons artigos nos jornais, mas porque tinha a rádio à sua disposição. A rádio era o novo meio igualitário que o establishment não levava a sério. Preferia ler jornais. Hoje é a mesma coisa. A Internet é o novo momento igualitário do povo. Em cada um dos três grandes períodos tivemos momentos revolucionários. A Revolução Francesa, a revolução radiofónica, que acabou muito mal, com Hitler e Mussolini, e agora não sabemos.
Escreveu um ensaio antes das eleições de 2013 dizendo que a Europa queria que a Alemanha tivesse um papel liderante, mas que não deviam esperar isso da Alemanha. A crise acabou por traduzir-se em mais poder para Berlim e nem sempre esse poder foi exercido da melhor maneira durante a crise do euro. Mesmo assim, quase toda a gente aprecia a chanceler. Qual é a explicação?
Tenho um enorme respeito pela chanceler Merkel. Ela trabalha imenso, foi admirável em tempos difíceis. Do ponto de vista da Alemanha, liderou muito bem o país durante a crise do euro mas só liderou bem para a Alemanha. Houve um preço que outros países pagaram para que a Alemanha se saísse muito bem da crise. Pode publicar esta afirmação na imprensa portuguesa, mas vê-a raramente num jornal alemão. Talvez para ser simpática para com Merkel, eu diria que ela não podia salvar a Europa porque tinha um dever em relação à Alemanha. Mas claro que todo este dumping salarial, a austeridade, as regras rígidas, apertaram o pescoço a muitos outros países e aos seus sistemas partidários. A Alemanha saiu bem da crise do euro às costas dos outros países. Mas, porque os alemães nem lêem os jornais estrangeiros nem conhecem os efeitos da crise, podem pensar que Merkel fez tudo bem.

Mas alguma coisa terá feito bem para receber o apreço que hoje tem. Ou então é por comparação.
Há outra questão. Não ignoro que há muitos europeus que também gostam de Merkel. Talvez por causa daquela ideia de ser a única líder que sobrava do mundo livre, depois de Obama. Quem senão ela? Mas Merkel não representa a Europa e a chanceler da Alemanha não tem autoridade para falar em nome da Europa. Ora, hoje é ela que fala directamente com Trump, com Putin, com Xi. E não devia ser assim. Devia ser a Europa. A minha pergunta é: gostam dela ou respeitam-na? Penso que há bastante respeito, porque toda a gente precisa de impressioná-la favoravelmente. Creio que é mais respeito do que outra coisa.

Merkel liderou bem nalguns domínios e noutros liderou mal. Já falei do euro. Ao nível da Europa dos 28, a chanceler fez o que devia em relação a Putin e manteve a Europa unida. Também fez bem na crise dos refugiados. Já a sua liderança da crise do euro não se pode dizer que tivesse sido boa. Podemos discutir se a responsabilidade foi dela ou se foi de [o anterior ministro das Finanças] Wolfgang Schäuble — talvez ela não tivesse sido tão implacável.

Curiosamente, ela argumentou que uma das razões para fazer o que fez em relação à crise do euro foi para evitar que se constituísse um partido de extrema-direita antieuropeu na Alemanha. Podemos hoje dizer que esse objectivo falhou redondamente. Apenas por causa da crise dos refugiados?
É muito importante recordar que a AfD foi criada como reacção à crise do euro e não aos refugiados. O FDP estava a boicotar o seu próprio governo [de coligação com a CDU] e não queria aceitar os mecanismos de bail-out, lançando uma grande discussão sobre uma “Europa de transferências” em que os alemães pagavam a toda a gente e não deviam pagar. O que é um disparate porque não é sequer verdade. Esta vitimização dos alemães, que pagavam tudo, foi muito negativa — foi mesmo um desastre — mas manteve durante muito tempo.

A AfD foi fundada por um tipo que, por acaso, estudou comigo na universidade e que representava a burguesia alemã — jornalistas, membros de associações industriais, professores de economia — que não tinha nada que ver com as classes populares. Qualquer movimento social apenas pode funcionar se várias condições estiveram reunidas. Olhe para os Verdes. Nos anos 1970 eram o movimento pacifista, o movimento feminista, o movimento ambiental — três movimentos que se juntaram e criaram os Verdes. Hoje já só há uns 3% de alemãs que se dizem nazis. Mas, para além deles, vieram os perdedores da modernização, pessoas que não beneficiaram da globalização e, somando-se a elas, veio esta elite burguesa que achava que não tinha de pagar pelos outros. Em poucos meses, conjugaram-se três grupos diferentes do ponto de vista societal.

Os neonazis, que existiam desde sempre, mas com muito pouca expressão, os perdedores da modernização, mais esta burguesia que se sentia traída pelo euro. Começaram por conseguir cerca de 5%. E só três anos depois, com o pico da crise dos refugiados, conseguiram passar para uma votação muito mais expressiva. A crise dos refugiados funcionou como o catalisador que fez a AfD passar de 5 para cerca de 14%. Mas é importante lembrar que já lá estava. Foi o momento em que a AfD aprendeu a andar. Tinha apenas uma perna, a perna antieuro. Passou a ter duas, com a perna anti-imigração. Com duas pernas, eles começaram a andar.

Qual é hoje o debate político na Alemanha sobre o euro e a Europa? A Alemanha continua a sentir a Europa como antes da unificação? Uma garantia de contenção do seu poder no centro da Europa? Ou, como disse Schroeder, sente-se cada vez mais como uma nação normal?
Se queremos ter margem de manobra contra os chineses, contra a concorrência da China nos mercados, só o podemos fazer porque ainda representamos um quarto da economia mundial e 500 milhões de consumidores relativamente ricos, mas precisamos de instrumentos europeus para fazer a redistribuição. Se continuarmos a funcionar apenas a nível nacional, não conseguiremos grande coisa. Nós, alemães, não me parece que tenhamos grande possibilidade de sair desta lógica. Creio que com AKK compramos algum tempo. Mas também creio que ainda não estamos a salvo, que também há um deslizamento. Não sabemos o que acontece em Maio, com várias eleições para os parlamentos regionais do Leste. O que vejo é que temos na Alemanha uma agenda nacional e que a verdadeira questão já não é Europa ou soberanismo, mas se vamos seguir o caminho nacional social ou nacional neoliberal. Merz teria sido a visão neoliberal mas nacional, tudo pela competitividade da economia alemã; AKK vai mais no sentido nacional social. Mas em ambos os cenários é uma agenda fechada, nacional. Não vejo muita discussão europeia nem falar-se muito da Europa. Já devíamos ter respondido a Macron há um ano e isso não aconteceu.

Não há motor?
A próxima Europa não é sobre a Alemanha, a França ou Portugal. A próxima Europa, se houver Europa, terá de ser sobre os cidadãos europeus. E, quer seja portuguesa, finlandesa, eslovaca ou alemã, a questão fundamental será: é a favor de direitos iguais para os cidadãos europeus, por uma verdadeira cidadania europeia?

O povo só saberá apreciar a liberdade se tiver a República, disse [Georges Jacques] Danton. O futuro da Europa será decidido na resposta à pergunta: seremos capazes de institucionalizar a democracia europeia da mesma maneira que institucionalizámos a moeda e o Mercado Único? E seremos capazes de o fazer na base da igualdade dos cidadãos perante a lei? Tal como a moeda e os mercados beneficiam da igualdade legal? Se, enquanto cidadãos, soubermos dizer sim, então poderemos estar no “momento Mayflower” de Hanna Arendt. Aceitamos a mesma lei como cidadãos e isso fará de nós um corpo político. E a partir daí poderemos discutir se queremos mais direitos sociais ou mais protecção do ambiente, haverá o combate político entre liberais e conservadores ou verdes.

Há um livro fantástico de Marcel Mauss que foi agora republicado na Alemanha, La nation, ou le sens du social, que ele escreveu em 1923 e que oferece uma magnífica definição sobre o que é uma nação. Não é a etnicidade, nem sequer a língua — os bretões e os corsos são cidadãos franceses. Qual é a definição dele? “Solidariedade institucionalizada.” Temos de conceber um novo projecto europeu em que pelo menos aqueles que já estão hoje na zona euro criem um sistema de solidariedade institucionalizada, que acabe a ideia de que aquilo com que pode contar cada cidadão europeu depende apenas da sua nacionalidade. Esta definição cívica da nação é etimologicamente congruente com a República.

E a alternativa?
O capital a alimentar o populismo e o populismo a limitar a liberdade. Bertolt Brecht disse: “O próximo fascismo chegará de fato.” E é por isso que não lhe prestamos atenção. Um pesadelo que até pode parecer agradável com o acesso aos bens de consumo e a vida a correr sem novidades. Mas a pior distopia é aquela que não conseguimos reconhecer.
tp.ocilbup@asuos.ed.aseret

Casas para a classe média em bairros sociais: fim do estigma ou engodo?

João Pedro Pincha, in Público on-line

Autarquia lisboeta e associações de moradores congratulam-se por "combate à guetização" dos bairros. Perdem-se casas para os mais pobres e falta oferta intermédia, alertam especialistas.

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Ao incluir nestes sorteios casas que foram, quase todas, construídas originalmente com o propósito de realojar pessoas que viviam em barracas e cujos habitantes pagam, em média, rendas muito inferiores às que vão pagar os futuros moradores, a autarquia diz querer “tornar cada vez mais una a malha urbana”, “procurando combater a guetização e o desenvolvimento desigual na cidade”.

A estratégia não é nova e não é consensual. Há quem lamente que, por falta de investimento público na habitação para a classe média, tenham de ser as casas destinadas aos mais carenciados a suprir essa necessidade. Há igualmente quem diga que isto é como vender gato por lebre às classes médias. E também há esperança, de quem se habitou a viver com preconceitos, de que o futuro possa mesmo ser melhor.

“Eu moro em Marvila há 43 anos e não gostaria que esta freguesia só fosse conhecida pelos bairros sociais”, comenta Manuel Saraiva, da Associação de Moradores do Bairro das Amendoeiras. Neste concurso de renda convencionada não houve fogos atribuídos neste bairro, mas Manuel conhece bem Marvila. E diz que ela ainda “sofre algum estigma”, a seu ver injustificada. “Há muita gente desempregada, uma grande percentagem de pessoas nem-nem, que não trabalham nem estudam, mas é uma freguesia de gente séria e trabalhadora”, garante.

“Tudo o que for no sentido de trazer gente nova é positivo”, afirma Saraiva, acreditando que, mesmo nos locais mais problemáticos, a presença de novos moradores, com hábitos e rendimentos diferentes, pode ser uma alavanca de mudança. “A partir dos bons exemplos, as coisas podem melhorar.”

O problema não está aí, diz Manuel Saraiva, secundado por um membro de outra associação de moradores, esta do Bairro do Condado. “O problema é que há imensas casas fechadas”, diz esta pessoa, que prefere não se identificar. “Precisamos de acordar os bairros sociais e tirar-lhes o estigma. Eles deviam era ter mais casas disponíveis”, continua. Para Manuel Saraiva, que também diz existirem “muitas casas vazias”, “a câmara tem de agilizar alguns processos para recuperar património habitacional”.

Faltam respostas intermédias
Recentemente, depois de a autarquia ter entregado as chaves de uma casa num bairro social a um vencedor do sorteio de renda convencionada, muitas pessoas foram protestar para as redes sociais. A lista de espera para uma habitação municipal com renda apoiada é extensa e, por isso, “obviamente que isto pode gerar algum tipo de conflito”, comenta Gonçalo Antunes, investigador em políticas de habitação da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova (FCSH).

Apesar de a autarquia se referir à habitação municipal como um todo, os programas de renda convencionada e de renda apoiada têm regras e destinatários diferentes. No primeiro, a câmara define uma renda para o fogo e os interessados podem candidatar-se se esse valor corresponder a entre 10% e 40% do seu rendimento mensal. Depois há um sorteio, com toda a gente em pé de igualdade, em que qualquer um pode ganhar. Na renda apoiada, os candidatos são avaliados consoante um conjunto de critérios (rendimento, agregado, etc.) e recebem uma pontuação. Quanto mais alta for, mais rapidamente recebem uma casa.
Neste último sorteio de renda convencionada, a Quinta do Ourives era o bairro com mais casas. Segundo a Gebalis, empresa que gere a habitação municipal, ali a renda média é de 60,87 euros. Os futuros moradores vão pagar pelo menos 215.

“A câmara, na prática, está a roubar casas às pessoas mais desfavorecidas. É uma política pública de segmentação da cidade”, critica Leonor Duarte, porta-voz do movimento Morar em Lisboa. “Se a classe média fica com rendas convencionadas e vai para bairros sociais, quem é que irá para o Programa de Renda Acessível?”, questiona.

“Se isto vai tirar algumas casas que deviam estar disponíveis para outras prioridades? Vai”, diz Gonçalo Antunes. Mas “a política de renda convencionada pode contribuir para que a homogeneidade social dos bairros possa ser diversificada”, argumenta.

Para o investigador, cuja tese de doutoramento se focou nas políticas públicas de habitação dos últimos 200 anos, há um problema de fundo: “O parque habitacional público é muito reduzido e foi quase todo construído para os programas de realojamento. Não existe nada intermédio entre o que foi construído para a população carenciada e a população que não pode candidatar-se a habitação social, porque tem rendimentos superiores, mas não consegue arrendar ou comprar no mercado privado.”

Combater o estigma
Já não é a primeira vez que estes bairros entram na geografia do Programa de Renda Convencionada. “A estratégia tem tido resultados positivos, nos pontos onde já aconteceu, na medida em que vem contribuir para a abertura e para a maior integração dos bairros municipais na cidade, ajudando a quebrar estereótipos que ainda marcam alguns destes núcleos habitacionais”, diz a câmara. “Historicamente, a construção de Lisboa assenta numa mistura de estratos sociais, num convívio que é desejável para todos e que sempre existiu. Queremos contribuir para uma cidade de diálogo e coesão.”

“Há estudos empíricos que revelam que, apesar de as pessoas estarem próximas no bairro, não há construção de rede social”, alerta Luís Mendes, investigador do Instituto de Geografia e Ordenamento do Território (IGOT), da U. Lisboa. “Quando temos uma classe média com mais rendimento, melhor capacidade de mobilidade e capital cultural, estas pessoas fazem a vida fora do bairro. O bairro é apenas o sítio onde moram”, diz ainda.
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“Se a câmara tem um orçamento bastante confortável e imenso edificado devoluto, porque é que não o recupera ao serviço da população?”, pergunta este académico. Uma preocupação que é também a de Manuel Saraiva: “Tudo demora muito”, lamenta.
Desde que o Programa de Renda Convencionada foi lançado, em 2013, foram atribuídas 375 casas. Houve mais de 20 mil candidatos. Segundo a autarquia, no ano passado foram atribuídas 625 casas em todos os programas, uma subida de 45% face a 2017. Para este ano, disse Fernando Medina há dias, o objectivo é “recuperar casas mais rápido para entregar às famílias, incluindo o esforço de construir mais habitação”.
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Vila Verde combate isolamento dos idosos com novas tecnologias

Nuno Cerqueira, in Diário do Minho

Projeto Idade Maior – Intervenção em Rede.

O município de Vila Verde vai promover um projeto pioneiro que permitirá acompanhar os idosos em situação de isolamento através do recurso às novas tecnologias.

O projeto Idade Maior – Intervenção em Rede consubstancia-se numa plataforma digital que permite partilhar informação relevante sobre a situação de idosos, em tempo real, mercê da existência de um sistema de alertas urgentes que envia mensagem para os representantes das entidades mais indicadas para resolver a situação específica.

“Isto é racismo”: Vídeo mostra violência policial

por Mariana Branco e Diogo Barreto, in Sábado

Duas turistas filmaram uma detenção da PSP em Lisboa. "Ele só estava a andar, pararam-no e disseram-lhe ‘tens um ar suspeito’", diz uma das mulheres.

"Sabem o que isto é? Racismo", dizem duas turistas que filmaram uma detenção da PSP em Lisboa. No vídeo, partilhado nas redes sociais, ouve-se o homem dizer que não fez nada e que ia apenas jantar com os filhos. "Eu não fiz nada de mal", diz ainda. Contactada pela SÁBADO, a PSP disse ainda não ter conhecimento do caso. Remeteu declarações para mais tarde.

Poucos segundos após o início do vídeo, um dos quatro polícias começa a pontapear as pernas do homem numa tentativa de o colocar no chão.

Ouve-se ainda uma mulher a explicar que aconteceu em Portugal, na passada semana, uma manifestação contra a violência policial. "É o mesmo pelo mundo inteiro, é horrível", responde a turista.
"São precisas quatro pessoas para revistar uma pessoa?", pergunta uma das mulheres.
O vídeo termina com os agentes a levar o homem, algemado.

25.1.19

Igreja e Centro Social de Arroios alertam para consequências do não apoio aos sem-abrigo

João Cunha, com Ângela Roque, in RR

O financiamento da autarquia baixou de 75 mil euros por ano para apenas 15 mil, o que obrigou a abandonar o projeto do "Núcleo de Apoio Local".

A Câmara de Lisboa está a desinvestir nos programas de apoio à população sem-abrigo e isso já está a ter consequências visíveis. O alerta é lançado pelo Centro Social e Paroquial de S. Jorge de Arroios, que não conseguiu manter o "Núcleo de Apoio Local", que acolhia e alimentava quem vivia na rua, na freguesia, assegurando também o acompanhamento com técnicos especializados.
O financiamento da autarquia baixou de 75 mil euros por ano para apenas 15 mil, o que obrigou a abandonar o projeto, explica à Renascença o diretor do Centro Social e Paroquial, que lamenta a decisão de acabar com esta parceria, que já tinha provas dadas.

“Era um projeto integrado. Nós estávamos lá e tínhamos a permanência dos técnicos de segunda a domingo, os sete dias da semana, entre as 8h00 da manhã e as 10h00 da noite. E, durante o dia, alguns dos técnicos também faziam a ronda na freguesia, criavam alguma relação com as pessoas, e nesse sentido foi muito bom, até porque os dados indicaram que por ano tivemos uma enorme taxa de sucesso”, explica Pedro Raul Cardoso.

Estes dados positivos não chegaram, todavia, para manter o projeto em funcionamento. Sem financiamento suficiente, o Centro foi obrigado a acabar, repentinamente, com o projeto, e os problemas de quem vive na rua não só se mantiveram, como se agravaram. O espaço onde os sem abrigo iam mantém-se, mas a instituição que o gere só fornece refeições. Durante o dia, os utentes deambulam pela zona da Rua de Arroios, perto da Igreja, junto à qual passam as noites. E há relatos de distúrbios constantes e ameaças aos residentes.
“O ambiente tornou-se insuportável. Dá uma imagem péssima e não pode continuar a ser assim”, desabafa um dos residentes na zona, interpelado pela Renascença, quando ia a caminho do trabalho. Outro dá como exemplo o que tem acontecido junto à capela mortuária da Igreja, quando há velórios. “Estão aí enquanto as pessoas estão a velar corpos. É muito mau ambiente, mesmo”.

Outra habitante da freguesia passeia o cão, manhã cedo, no pequeno jardim frente à Igreja de Arroios. Diz que não deixou de a frequentar, mas já lá não vai tantas vezes, porque o que vê, incomoda-a. “Fazem necessidades à nossa frente, mesmo aqui no jardim. Não têm qualquer pudor com as pessoas, e não se pode dizer nada, porque se se diz alguma coisa ainda nos descompõem”, conta.

Aos ouvidos do pároco de Arroios, o padre Pedro Manuel Nunes Pedro, já chegaram muitos relatos de problemas, que têm afastado os paroquianos da Igreja. “Temos sentido isso, que as famílias e as pessoas se queixam de não poder participar tranquilamente nas atividades da igreja, e é verdade que algumas se têm afastado, e isso é um problema que nos preocupa muito.”

Desde a passada semana que a Renascença está a tentar contactar o vereador responsável pela ação social na câmara de Lisboa, mas só ao final da manhã desta segunda-feira surgiu uma reação, por parte do assessor do vereador.

"Não houve corte nenhum neste mandato e está a preparar-se um reforço da resposta em Arroios no próximo mandato. O Centro Social de Arroios geria o Núcleo de Apoio Local - estrutura montada no anterior mandato - com um financiamento limitado até ser aberto um concurso público. Infelizmente, decidiram não se candidatar ao concurso público quando este abriu, tendo ficado a gestão do Centro Social sob responsabilidade do CASA (Centro de Apoio aos Sem Abrigo), uma IPSS nacional. Os termos deste concurso, que são públicos, implicavam uma redução da resposta para uma resposta sobretudo alimentar. A decisão de reduzir à resposta de distribuição alimentar será provavelmente reequacionada no próximo Programa Municipal desta área, este sim da nossa competência."

Esta segunda-feira à tarde haverá uma reunião entre a autarquia, o Centro Social e Paroquial e o pároco de Arroios, para analisar a situação e perceber o que se pode fazer para melhorar a situação dos sem-abrigo, e dar de novo paz aos residentes naquela zona da cidade.

Opinião: Sem-abrigo em Portugal - A realidade dura dos números

Por Manuel Dias (*), in SapoteK

Em Portugal Continental há cerca de 3.500 sem-abrigo e mais de 11.000 pessoas em risco de o vir a ser. Manuel Dias faz a análise dos números

No início de um novo ano e após uma altura acentuadamente consumista, em que os Portugueses, entre levantamentos e compras, movimentaram 7,6 mil milhões de euros entre 27 de novembro e 31 de dezembro, segundo dados da SIBS - poucas são as referências a um problema inerente à nossa sociedade e sem fim à vista – o das Pessoas Sem-Abrigo.

E ainda que se registem algumas ações de sensibilização, e em particular as que contam com a participação ativa do Presidente da República, impera a inexistência de informação detalhada sobre esta realidade. E sem dados avoluma-se o desconhecimento sobre causas, evolução do processo ao longo dos anos e ações concretas que têm sido efetuadas para erradicar o problema.

O Censos 2011 contabilizava cerca de 700 Pessoas Sem-Abrigo em território nacional: 241 em Lisboa, 218 na região Norte, 113 no Algarve, 66 no Centro do país, 25 no Alentejo, 22 na Madeira e 11 nos Açores.

Em 25 de julho de 2017 foi criada a Estratégia Nacional para a Integração das Pessoas em Situação de Sem-Abrigo 2017-2023 (ENIPSSA 2017-2023), com o objetivo de definir uma abordagem de prevenção e intervenção, centrada nos Sem-Abrigo, com três eixos de ação: um centrado no conhecimento do fenómeno, outro no reforço da intervenção e um terceiro centrado na coordenação e avaliação. Uma das ações levadas a cabo por este grupo, foi um inquérito sobre os Sem-Abrigo, realizado entre fevereiro e maio de 2018, abrangendo todos os 278 concelhos do Continente. Os resultados deste inquérito foram apresentados no passado mês de Dezembro e estão disponíveis publicamente acessível neste link.

Com base nestes resultados, os únicos disponíveis à data de hoje em Portugal, e com o objetivo de evidenciar a importância desta informação bem como simplificar a forma como ela é transmitida aos cidadãos em geral, poderá aceder neste link a um dashboard feito em Power BI onde poderá explorar os dados da forma que melhor entender.


De acordo com os dados foram identificadas cerca de 3.500 Pessoas Sem-Abrigo em Portugal Continental, das quais 1.443 Pessoas sem Teto, a viver na rua, em espaços públicos, abrigos de emergência ou locais precários, e 1.953 Pessoas sem Casa, a viver em equipamento onde a pernoita é limitada.

Algumas das conclusões evidenciadas pelo estudo são:
Como é expetável são nas áreas metropolitanas que se verificam a maioria das situações.

A Área Metropolitana de Lisboa tem quase metade das Pessoas sem Casa (857) e cerca de 45% do total das Pessoas sem Teto (644 pessoas).

O Alentejo e Algarve apresentam valores baixos, apesar do Algarve ter um número bastante mais elevado de Pessoas sem Teto (15%).

Os 20 concelhos com mais Sem-Abrigo representam 80% do total de pessoas nessa situação.

Pessoas sem Casa

Outra área importante é a distribuição de Pessoas sem Casa, destacando-se o seguinte:

Das 1.953 pessoas sem casa, a maioria (57%) vive em centros de alojamento temporário.
Seguem-se as pessoas a viver em pensões ou quartos pagos (32%) e as pessoas a viver em alojamentos específicos (11%).

O maior número de casos regista-se na Área Metropolitana de Lisboa e na região Norte.

Relativamente às pessoas em risco habitacional, identificaram-se mais de 11.000 pessoas nestas condições, que se distribuem por 7 categorias em cada região da seguinte forma:

Ações de Intervenção

No que toca a ações concretas de intervenção em curso ou planeadas, na sua maioria dirigem-se à satisfação das necessidades básicas dos Sem-Abrigo, seguindo-se a Saúde e os Direitos Sociais:
As ações para satisfação de necessidades básicas englobam a disponibilização de cantinas sociais, refeitórios, balneários, acesso a tratamento de roupas, lavandarias, higiene pessoal, acesso a medicação, apoio em vestuário, mas também a intervenção das equipas de rua e apoio financeiro.

O acesso a outros direitos sociais inclui dois tipos de apoio: apoio no acesso a prestações sociais e apoio na regularização de documentação, respostas fundamentais não apenas para a sobrevivência das pessoas em situação de sem-abrigo, mas também para a sua inserção social.

A área da saúde inclui todas as respostas identificadas ao nível dos cuidados de saúde primários (os mais frequentes), cuidados de saúde mental e outros cuidados de saúde especializados.
A referência a duas últimas categorias de cuidados especializados recolhe um número significativamente menor de referências por parte dos municípios respondentes.

Reflexão Final
Apesar da importância do inquérito realizado, este estudo peca pela falta de informação detalhada sobre todo o contexto económico e social inerente ao fenómeno dos Sem-Abrigo e sobretudo peca pela apresentação de soluções concretas para o problema, que em si é complexo. Não se trata apenas de questões económicas, existem outros factores que levam as pessoas a cair na rua. Por isso a resposta não pode ser apenas económica, a responsabilidade é da sociedade em geral, mas cabe ao estado a principal responsabilidade, ao governo e às autarquias, resolver o problema.

Numa sociedade onde a digitalização e o empreendedorismo marcam a agenda, não é aceitável ter milhares de pessoas espalhadas pelos pelos recantos obscuros a dormir enrolados em jornais e trapos. Nenhum de nós pode ficar indiferente!