29.1.21

Taxa de desemprego desce pelo quarto mês consecutivo. Mas há sinais de alerta

Sónia M. Lourenço, in Expresso

Em dezembro de 2020, a taxa de desemprego em Portugal recuou para 6,5% e está em queda desde setembro, indicam os dados do Instituto Nacional de Estatística. Mas a diminuição do emprego e o aumento do número de pessoas classificadas como inativas são sinais negativos

A taxa de desemprego em Portugal recuou para 6,5% em dezembro de 2020 e está em queda há quatro meses consecutivos, indica a estimativa provisória do Instituto Nacional de Estatística (INE). São boas notícias, mas devem ser lidas com cautela. É que os números do INE também dão alguns sinais negativos sobre a evolução do mercado de trabalho nacional.

Depois de atingir um pico de 8,1% em agosto (dados ajustados de sazonalidade), a taxa de desemprego em Portugal tem vindo consecutivamente a descer. E em dezembro voltou a recuar, ficando nos 6,5%, o que compara com 7,1% em novembro e é o valor mais baixo desde maio de 2020. A taxa de desemprego ficou até abaixo dos 6,7% registados um ano antes, em dezembro de 2019.

Ao mesmo tempo, a população desempregada medida pelo INE ficou nas 331,1 mil pessoas em dezembro (estimativa provisória), diminuindo 10,2% (menos 37,8 mil pessoas) em relação a novembro e recuando 4,8% (menos 16,7 mil) por comparação com o período homólogo de 2019.

O recuo da taxa de desemprego é sempre uma boa notícia, mas é preciso lembrar que uma parcela importante do emprego no país está a ser suportado por medidas públicas de apoio às empresas e ao emprego (como o apoio à retoma progressiva e, desde o regresso ao confinamento, em janeiro, pela reativação do lay-off simplificado), devido à crise provocada pela pandemia.

Mais ainda, deve ser lida com cautela face a outros dados que o INE também divulgou esta quinta-feira.

Um desses dados é o emprego. Segundo a autoridade estatística nacional, o desemprego desceu em dezembro, mas o emprego também recuou. A estimativa provisória do INE para a população empregada nesse mês é de 4,7934 milhões de pessoas, ou seja, menos 0,2% (redução de 10,3 mil pessoas) do que em novembro e menos 1,1% (menos 52,7 mil pessoas) do que um ano antes, em dezembro de 2019.

DE NOVO, OS INATIVOS

O segundo dado a ter em conta é o aumento do número de pessoas classificadas pelo INE como inativas, que em dezembro atingiu 2,6659 milhões, aumentando 1,9% (50,2 mil pessoas) em relação a novembro e subindo 3,7% (mais 95,3 mil pessoas) na comparação com dezembro de 2020.

Recorde-se que para uma pessoa sem trabalho ser classificada como desempregada pelo INE tem de simultaneamente procurar ativamente um posto de trabalho e estar disponível no imediato para aceitar uma vaga. Esta é a definição da Organização Internacional do Trabalho (OIT), seguida não só pelo INE, como pelo Eurostat, o gabinete de estatísticas da União Europeia.

Caso não cumpra estas condições em simultâneo, a pessoa é classificada como inativa e não como desempregada, mesmo não tendo um posto de trabalho. Ora, devido às características da pandemia de covid-19, por vezes essas condições não são cumpridas, em especial em períodos de confinamento.

Foi essa a razão que explicou a descida da taxa de desemprego em Portugal na primeira vaga da pandemia, na Primavera de 2020. Os dados mensais do INE, ajustados de sazonalidade, mostram que estava nos 6,4% em fevereiro de 2020, caindo depois até atingir um mínimo de 5,9% em maio. Isto numa altura em que a economia sofreu um forte tombo e os dados do Instituto do Emprego e Formação Profissional mostravam já um aumento do número de desempregados registados nos centros de emprego - o chamado desemprego registado.

A taxa de desemprego, apurada pelo INE só começou a subir nos meses seguintes, com o progressivo desconfinamento do país, até atingir o referido máximo de 8,1% em agosto, e começar a descer posteriormente.

Nota ainda para os apoios públicos ao emprego e à manutenção do emprego ao longo de 2020 (como o lay-off simplificado e o apoio à retoma progressiva) que sustentaram muitos empregos, travaram os despedimentos e, segundo os economistas, ajudaram a conter - e muito - a subida do desemprego.

Cama Solidária: como os portugueses se uniram para dar descanso aos heróis da saúde

Patrícia Naves, in Nit

Começou com a ideia de usar caravanas para que os profissionais repousassem. Agora, são verdadeiras casas.

Nos últimos dias, Portugal tem sido assolado por imagens que tão cedo não deverá esquecer: hospitais cheios, médicos e enfermeiros sobrecarregados, filas de ambulâncias às portas das principais unidades de saúde horas a fio, sem haver espaço ou lugar para os doentes entrarem. Ao ver essas imagens, em todos os noticiários, há quem fique triste, angustiado; há quem tenha tendência quase a dissociar-se daquilo a que assiste, por parecer tão irreal; há quem ainda ache tudo exagerado e mal contado, e não se coíba de o expressar nas redes sociais; e finalmente, mas não por último, há quem decida agir.

Ainda esta quinta-feira, 28 de janeiro de 2021, depois de mais uma noite de filas intermináveis de ambulâncias à porta do Hospital de Santa Maria, uma reportagem da TVI revelava que, espontaneamente, houve marcas a enviar pizzas, hambúrguers, para médicos, enfermeiros, bombeiros; e cidadãos comuns a lembrarem-se, ao assistir, de fazer sopa que depois foi entregue aos profissionais de saúde.

Nesta onda de solidariedade que parece trazer luz a um inverno particularmente difícil no nosso Pais, há um grupo que se destaca pela ajuda que tem dado aos combatentes da linha da frente contra a Covid.

Ricardo Paiágua faz parte desse grupo. Tem 38 anos, é lisboeta e fundador da agência de criatividade uppOut. Quando a NiT falou com Ricardo, por email, ele pediu desculpa pelas eventuais incorreções. Estava sem dormir há demasiado tempo. “É esta noite que tenho de descansar”, explicou.

Tudo começou há menos de dez dias, quando, como tantos outros portugueses, na quarta-feira, 20 de janeiro, assistia no conforto de sua casa às fotos e imagens de ambulâncias, paradas à porta de vários hospitais. Ficou impressionado, por isso, decidiu criar nessa mesma noite a “Cama Solidária“.

Ricardo começou a desenhar o projeto com Gonçalo Carvalho, 25 anos, designer da uppOut. No dia seguinte, o site já estava online e, em poucas horas, tinham sido doadas mais de 60 caravanas.

Manuel Palma, 25 anos, copy na agência, começou a colaborar nessa quinta-feira e nunca mais saiu do grupo. Luisa Fonseca, 31 anos, juntou-se na sexta, dia 22, e também nunca mais os largou. Diogo Maroco, 36 anos, marketing manager da Inventa, “ia buscar só uma caravana num sábado, foi enganado, e nunca mais saiu”, conta-nos Ricardo.

E no que consiste exatamente esta corrente solidária? “É muito simples: os profissionais de saúde que precisam de um espaço junto ao hospital, lar, centro de saúde, para dormir vão ao site www.camasolidaria.pt e expressam a sua necessidade”.

Do outro lado, uma pessoa que quer facultar uma autocaravana ou casa para esta causa vai também ao site, regista-se e diz a sua disponibilidade. Um voluntário que se queira juntar, segue os mesmos passos: entra na plataforma e expressa o que quer fazer. “Depois, os sistemas de informação e a Luísa Fonseca fazem a magia de cruzar toda a informação”, explica-nos o fundador da causa. A plataforma faz a ligação entre quem precisa de algo e quem o tem. Além de espaços para descanso — casas ou caravanas —, assegura comida, produtos de higiene e limpeza dos espaços. Tudo para que aos heróis da saúde não falte nada.

Em apenas oito dias, o crescimento foi impressionante. “A adesão foi brutal”, diz Ricardo. Primeiro, dezenas de caravanas foram disponibilizadas pela Federação de Autocaravanismo e por cidadãos comuns. Depois, veio o resto. “Voluntários temos acima de 1000. Caravanas mais de 600. Casas temos mais de 200”.

“Hoje, temos associação de empresas de aluguer de caravanas que fazem todo o processo operacional de entrega de caravanas. Temos a Leaseplan a emprestar carros; a Free Now a dar viagens para deslocações… Inúmeras entidades a facultar tudo. Está a ser incrível, mesmo”, acrescenta.

Se ao principio havia a questão da ser proibido dormir em autocaravanas quando estacionadas na cidade, também isso se resolveu com solidariedade: a EMEL disponibilizou os seus parques de forma gratuita.

Além das entidades, o criador da iniciativa não se cansa de elogiar os colegas: “A Luísa, por exemplo, é o maior Tinder solidário. A ela, devemos toda a gestão da parte operacional que tem realizado de uma forma única. Mesmo”.

Como se isto não bastasse, neste momento, o grupo tem também caravanas de recolha de donativos à porta de quase todos os grandes centros hospitalares em Lisboa e está a implementar o mesmo sistema noutras cidades. As caravanas começaram por ficar junto ao Hospital Santa Maria, mas estão a chegar ao Amadora-Sintra, Cascais, S. Francisco Xavier ou D. Estefânia. E daí para outros pontos do País.

Além de tudo isto, criaram um novo movimento que é a carta solidária: “As pessoas entregam-nos donativos, e nós não só damos os donativos, como lemos cartas com conforto”.

Entre os voluntários, há desempregados, gestores ou hospedeiros. “Tantas funções, todos a ajudar-nos de forma brutal, trabalham mais de 16 horas por dia. Sem receberem nada! O ser humano é incrível. E isto só existe porque temos voluntários como a Marta, Joana, Ines, Francisco, a Ana, todos”, frisa Ricardo.

Várias figuras públicas já se juntaram para ajudar a divulgar o projeto. “Não há nada apontar. Temos tudo para criar e superar tudo. Com disciplina, resiliência, paixão, integridade e muita atitude vamos ultrapassar todo este momento”.

A situação que motiva a causa está longe de resolvida. Esta quinta-feira, 28, as filas de ambulâncias continuam e os casos também: foi o pior dia de sempre em termos de evolução da pandemia, com mais 16.432 infetados e 303 mortes por Covid-19 em Portugal.

Um dia, espera Ricardo, tudo isto passará. “Nós queremos ser esquecidos já amanhã. Sim, no primeiro confinamento todos estavam a ajudar, houve inúmeros gestos solidários. Neste, estávamos adormecidos e sem resiliência não vamos ultrapassar este momento menos simpático. Daí que sim, queiramos ser esquecidos. Queremos que existam mais e mais movimentos. E que o nosso seja o movimento que ninguém se vai lembrar amanhã. Até porque toda a equipa de gestão, a Ricardo, Gonçalo, Luísa, Diogo e o Manuel têm os seus empregos e estão a fazer diretas atrás de diretas para fazer esta mega operação de “exército” acontecer”.

“Hoje, temos administradores de grandes centros hospitalares a ligarem-nos e agilizar todas as operações com as necessidades. Não há palavras para descrever o que está acontecer. Não há mesmo. Mas sim, os mentores do conceito precisam mesmo de descansar, mesmo. Pois estamos a trabalhar 72 horas seguidas, a Redbull, café, etc e sem comer. Mas o que nos motiva é o pequeno e curto obrigado que os grandes profissionais de saúde nos dão. E quando digo um profissional de saúde, digo o diretor de impressões, o segurança e até o administrador. Todos eles estão a fazer um trabalho brutal. Mas também preciso de descansar, precisamos de algum auxilio de cooperação talvez de uma grande organização”, apela.

E conclui: “Só queremos passar a mensagem que o ser humano é mágico e temos que ultrapassar tudo isto juntos. Vamos voltar a bater palmas, vamos voltar a fazer concertos à janela, vamos voltar a sorrir em casa. São só dois meses, o que estamos a sofrer é o paraíso comparado com quem está mesmo a sofrer”.

Trabalhadores têm de validar agregado familiar para pedirem a nova prestação social

Pedro Crisóstomo, in Público on-line

Para calcular o apoio, a Segurança Social tem de verificar os rendimentos médios do agregado familiar.

A Segurança Social emitiu uma nota a informar que os trabalhadores que precisarem de pedir o Apoio Extraordinário ao Rendimento dos Trabalhadores — a nova prestação social até 501,16 euros — têm de validar o seu agregado familiar e o nível de rendimento de cada um para poderem submeter correctamente o requerimento.

Este passo tem que ver com o facto de o novo apoio (não confundir com o instrumento original agora recuperado pelo Governo) ser atribuído mediante a avaliação da chamada “condição de recursos”, a regra segundo a qual um cidadão só acede a uma prestação se o rendimento mensal por adulto do agregado familiar não superar um determinado montante.

Como o Governo impôs esse requisito, a Segurança Social refere no seu site que “é imprescindível” a actualização do “agregado familiar e dos respectivos rendimentos” no site Segurança Social Directa.

Para um trabalhador cumprir a condição de recursos, é necessário que o rendimento mensal por adulto do agregado familiar seja igual ou inferior a 501,16 euros (na avaliação de rendimento e património não será tido em conta o valor da habitação permanente da família).

A Segurança Social avisa que o agregado familiar deve ser actualizado “mesmo que não existam alterações” e mesmo que o trabalhador seja o único elemento do agregado, pois só com essa informação validada é possível calcular a condição de recursos.

Declarar rendimentos de 2019 e 2020

Além disso, os trabalhadores têm de actualizar os rendimentos do ano passado, registando todos os valores “de cada elemento do agregado que não sejam do conhecimento da Segurança Social” — e só esses. Para isso, diz, cada um tem de actualizar os valores usando o seu número de identificação da Segurança Social (NISS) e a senha do site Segurança Social Directa. O instituto refere ainda que é “fundamental” declarar todos os rendimentos do trabalhado auferidos em 2019.

A nova prestação social abrange várias situações de desprotecção social, desde trabalhadores independentes a gerentes das micro e pequenas empresas, desempregados sem subsídio, trabalhadores informais sem acesso a qualquer instrumento de apoio ou estagiários que fiquem sem emprego depois de terminarem um estágio profissional.

Esta nova prestação, criada com o Orçamento do Estado para 2021, está a correr em paralelo com o apoio original à quebra de actividade, que também abrange trabalhadores independentes, empresários em nome individual, gerentes de empresas e membros de órgãos estatutários de fundações ou cooperativas, mas só os que estejam a enfrentar uma quebra de actividade decorrente da suspensão das actividades ou do encerramento de serviços decretados pelo executivo durante o estado de emergência.

Como entre os apoios há um cruzamento do universo dos destinatários, os trabalhadores que nas próximas semanas (ou meses — dependerá da decisão do Governo) beneficiarem do apoio original à quebra da actividade e mais tarde solicitarem o acesso à nova prestação irão ver deduzido o período de concessão desse primeiro apoio no novo instrumento.

Apesar de os indicadores não apontarem para uma recuperação rápida da economia — ainda na quinta-feira o Presidente da República admitia o cenário de uma “economia e sociedade destruídas com uma pandemia que vá até Outubro” —, o período de concessão dos apoios aos trabalhadores independentes com quebra de rendimentos só dura seis meses (seguidos ou interpolados).

Neste momento, existem quatro apoios em paralelo: esta nova prestação; e os três apoios que já existiam em 2020 e que o Governo decidiu recuperar nos primeiros dias do ano para quem está sujeito à suspensão de actividades ou ao encerramento de estabelecimentos por decisão governamental, ou seja, o apoio extraordinário à redução da actividade para quem tem pelo menos três meses de contribuições à Segurança Social, a “medida extraordinária de incentivo à actividade profissional” para os trabalhadores independentes isentos de contribuições ou sem os três meses de descontos, e ainda o “apoio à desprotecção social” para os trabalhadores independentes que não estavam enquadrados no regime da Segurança Social.

Produção industrial caiu 7% e comércio a retalho 4,1% em 2020

Rosa Soares, in Público on-line

Venda de bens não alimentares diminuíram 7,9% no último trimestre.

O índice de produção industrial caiu 7% em 2020, bem pior do que os negativos 2,3% no ano anterior, revelou esta sexta-feira o Instituto Nacional de Estatística (INE), dando conta que para a queda anual contribuíram todos os agrupamentos.

Relativamente ao último trimestre de 2020, o índice agregado registou uma variação homóloga de -2,4%, depois de, no trimestre anterior a variação ter sido -0,7%.

No último mês do ano, o índice de produção industrial diminuiu 4,4%, para a qual contribuíram contribuíram todos os grandes agrupamentos industriais, excepto o de bens intermédios, que cresceu 5,3%. O agrupamento de energia foi o que deu a maior contributo para a redução do índice total (-3,2 pontos percentuais).

Comércio a retalho inverte subida de 2019

No sector do comércio a retalho, o índice de volume de negócios diminuiu 4,1% em 2020, contra um crescimento de 4,3% em 2019. E os índices de emprego, remunerações e horas trabalhadas em 2020 registaram variação de 2,1%, 0,9% e -8,1% (a evolução tinha sido de 2,4%, 5,1% e 1,8%, respectivamente, em 2019).

No quarto trimestre de 2020, as vendas desceram 3,4% em termos homólogos (queda fora de 2,1% no 3.º trimestre), devido exclusivamente à forte redução de 7,9% do comércio a retalho de produtos não alimentares, uma vez que o comércio de produtos alimentares aumentou 2,3%.

Em Dezembro, a queda homóloga foi de 4,5%, em ligeira recuperação face aos 5,3% de Novembro, com uma contracção de 9,9% nos produtos não alimentares (10,1% em Novembro) e um aumento em 1,4 pontos percentuais, para 2,4%, nas nos bens alimentares.

Ainda no último mês do ano, os índices de emprego, remunerações e horas trabalhadas apresentaram, respectivamente, quedas de 4,6%, 4,1% e de 6,7%, em termos homólogos.


Directores preocupados com alunos que não têm condições para estudar em casa

Daniela Carmo, in Público on-line

Governo abre a porta a alterações nas datas de exames. “Existindo ajustamento será oportunamente anunciado”, disse o ministro da Educação.

Para os directores de escolas públicas e associações de pais o regresso ao ensino não presencial no próximo dia 8 de Fevereiro já era de esperar. Contudo, não é a possível falta equipamentos digitais que os preocupa mais, mas sim o facto de “alguns alunos não terem condições em casa”, em termos de ambiente familiar e de estudo, disse ao PÚBLICO Filinto Lima, presidente da Associação Nacional de Directores de Escolas Públicas (Andaep).

As escolas vão continuar encerradas até 5 de Fevereiro. E o ensino à distância regressa na segunda-feira seguinte. O anúncio foi feito pelo ministro da Educação e pela ministra do Estado e da Presidência, em conferência de imprensa, após reunião do Conselho de Ministros para decidir novas medidas de combate à pandemia. Depois de uma pausa lectiva de 15 dias, as aulas vão, assim, voltar a ser dadas online, desta vez ​com uma melhor preparação do que no ano lectivo passado, garante o Governo.

“Depois de termos distribuído mais de 100 mil computadores, de estarem mais 335 mil a caminho, de a sociedade civil se ter organizado, estamos naturalmente mais bem preparados”, assegurou Tiago Brandão Rodrigues. Apesar disso, reconheceu que há problemas logísticos relacionados com os computadores. A escassez de componentes tem criado dificuldades na indústria da tecnologia e os processos de exportação estão mais demorados, como efeito da pandemia, algo que se tem verificado também noutros países europeus.

A Andaep considera que esta é a falha mais visível do Governo. “No dia 9 de Abril, o primeiro-ministro prometeu que cada aluno ia ter um computador no arranque do ano lectivo e não cumpriu essa promessa porque só em Novembro ou Dezembro é que começaram a chegar às escolas os primeiros 100 mil computadores”, recorda Filinto Lima.

Apesar disso, e com os actuais números da pandemia no país, tanto os directores de escolas como a Confederação Nacional das Associações de Pais (Confap) concordam que o ensino à distância era “a solução possível neste momento”, como referiu ao PÚBLICO Jorge Ascenção, dirigente da Confap. Filinto Lima lembra, contudo, o que tem sido dito sobre o ensino à distância: ele acentua as desigualdades sociais.

Associações de pais pedem ensino misto em três semanas

Ainda que o Governo não tenha feito previsões relativas ao regresso às aulas presenciais — as medidas serão reavaliadas a cada 15 dias de forma a determinar se há a possibilidade de reabrir as aulas presenciais para alguns alunos —, Jorge Ascenção espera que dentro de três semanas já seja possível ter um regime de ensino misto. “Era bom que os mais pequenos já pudessem voltar [às escolas] com um ensino misto”, exemplificou.

Também o calendário escolar foi alterado. Nesse sentido, a interrupção lectiva do Carnaval (15, 16 e 17 de Fevereiro) será afinal de actividade escolar, “presencial ou não”, ainda não está decidido, confirmou Tiago Brandão Rodrigues. Já as férias da Páscoa vão ser mais curtas, “pelo menos o dia 25 e 26 de Março serão de actividades lectivas”. Por fim, será utilizada ainda mais uma semana no Verão para compensar e recuperar matéria. No que toca aos exames e às provas de aferição, o ministro da Educação assumiu que ainda não há datas fechadas e que uma decisão final está dependente da evolução da pandemia. “Existindo ajustamento será oportunamente anunciado”, disse. As creches vão continuar encerradas nos próximos 15 dias.

Com o regresso da escola à distância, os alunos que têm como encarregados de educação os trabalhadores de serviços essenciais vão ter as escolas abertas, tal como acontece actualmente.

No regime a vigorar a partir do próximo dia 8 aplicam-se as regras previstas para o modelo não presencial aprovadas em Julho do ano passado em que se mantêm as respostas sociais em curso (apoios terapêuticos por exemplo) e a disponibilização de refeições a alunos da acção social escolar (só na quarta-feira foram servidas mais de 20 mil refeições, disse o ministro). As novas medidas decididas esta quinta-feira fazem parte do novo período de estado de emergência que irá vigorar a partir das 00h de 31 de Janeiro.

Texto editado por Andreia Sanches

União Europeia tem 92 milhões de pessoas em risco de pobreza — ONU

in Visão

Na União Europeia (UE) existem 92 milhões de pessoas em risco de pobreza, sobretudo mulheres, disse hoje o relator especial da ONU sobre pobreza extrema e direitos humanos, Olivier De Schutter

O especialista admitiu ainda que os planos que os governos europeus estão a preparar para receber de Bruxelas os fundos de recuperação possam não ter medidas suficientes para reverter a situação.

“Em 2010, a UE adotou um objetivo ambicioso de reduzir a pobreza em 20 milhões de pessoas até 2020. Fracassou (…) em grande medida porque o crescimento e a criação de emprego durante este período não beneficiaram pessoas com baixos níveis de educação ou com deficiência”, disse Schutter.

O relator especial das Nações Unidos falava hoje no Comité Económico e Social Europeu, onde apresentou as linhas gerais de um relatório que realizou sobre a situação atual da pobreza extrema na União.

Schutter indicou ter podido comprovar que “os planos de recuperação tiveram de ser improvisados devido ao sentido de urgência (…), tendo sobrado pouco tempo para consultas significativas aos agentes sociais e às organizações não-governamentais”, o que permitiria incorporar os seus pontos de vista.

“Assim, não há garantia de que os planos de recuperação que estão a ser preparados e que devem ser apresentados à Comissão Europeia até final de abril sejam instrumentos eficazes para combater a pobreza e reduzir as desigualdades”, disse, segundo a agência noticiosa espanhola EFE.

O especialista indicou a meta de reduzir em 50% o número de pessoas em risco de pobreza até 2030, adiantando que os Estados membros têm três grandes dificuldades para combater eficazmente a pobreza extrema: a evasão de impostos e o ‘dumping’ fiscal, a redução dos custos laborais e as metas de redução do défice definidas pelo Pacto de Estabilidade e Crescimento.

A evasão de impostos e o ‘dumping’ fiscal entre os 27 representa para vários Estados membros a “perda de significativas receitas públicas e torna muito difícil alcançar a justiça social”, enquanto a redução dos custos laborais “leva a uma situação em que o crescimento económico não beneficia muitos trabalhadores de baixos rendimentos”, argumentou Schutter.

A propósito, indicou existirem cerca de 20 milhões de pessoas com trabalho, mas em risco de pobreza por terem empregos precários.

Em relação ao Pacto de Estabilidade e Crescimento, Schutter apelou a que se aproveite a reflexão em curso na UE sobre o assunto para garantir que pelo menos 2% do produto interno bruto (PIB) dos países fique fora dos objetivos do défice e possa ser aplicado em despesa social.



PAL // ANP

Palavras-chave:
ONUpobrezaUnião Europeia (UE)

"Pobreza é estrutural também porque o elevador social não funciona "

Leonídio Paulo Ferreira, in DN

A Fundação Francisco Manuel dos Santos vai apresentar neste ano os resultados de dois grandes estudos, um sobre a pobreza em Portugal e outro sobre os impactos económicos, políticos e sociais da covid-1, revela Gonçalo Saraiva Matias, diretor de estudos da FFMS.

Entre os projetos que a fundação tem para 2021 há dois grandes estudos - um sobre a pobreza em Portugal e outro sobre o impacto da covid-19. Neste momento, eles não são praticamente a mesma coisa? A covid-19 não vai influenciar decisivamente a pobreza em Portugal?
Sim. Há claramente uma relação entre o problema da covid e da pandemia e a pobreza, embora estes estudos tenham âmbitos muito diversos. O estudo da pobreza cobre o problema da pobreza em Portugal mesmo antes da covid-19. Infelizmente, o problema da pobreza em Portugal não é um problema recente, não começa com a covid-19, muito longe disso. Esse estudo é feito ainda antes da pandemia e vai estudar - é por isso que ele é muito interessante e é isso que traz de inovação em relação a outros estudos sobre este tema - trajetos de pobreza. Portanto, ele vai olhar para pessoas, vai olhar para famílias, e vai perceber como é que essas famílias estão em pobreza, como é que evoluíram na sua situação de pobreza e como é que algumas puderam sair dela, ou não, e outras entraram na pobreza. Nós vamos olhar para percursos e projetos específicos de pessoas e perceber como é que elas evoluíram nessa situação. No seguimento que faremos do estudo, vamos olhar para esses perfis no contexto da pandemia e perceber como é que a pandemia influenciou esses perfis. Agora, infelizmente, temos de concluir - e a área da pobreza e da desigualdade é uma área a que a fundação se tem sempre dedicado muito -, temos de reconhecer que as questões de pobreza e de desigualdade são muito radicadas em Portugal e que só podem ter agravado com a pandemia. O estudo da pandemia, nesse aspeto, vai olhar para as consequências económicas e familiares da pandemia.

Olhando para o estudo da pobreza, quando diz que estudaram percursos de indivíduos ou de famílias, consegue antecipar se a pobreza em Portugal é muito transmitida geracionalmente? É possível dizer que o elevador social em Portugal funciona mal?
Exatamente. Podemos dizer que temos em Portugal uma pobreza endémica, uma pobreza que é estrutural. É estrutural, em parte, também por isso, porque o elevador social não funciona. Nós vemos nesses perfis, nesses percursos de pobreza, uma enorme dificuldade de as novas gerações saírem da pobreza. Algo que, há algumas décadas, estava a funcionar melhor, também porque nós partimos de um patamar mais baixo e a educação tinha um efeito multiplicador na saída da pobreza e no acesso aos bens económicos. Hoje, vemos que esse elevador social é muito mais difícil de funcionar - alguns dizem até que ele está avariado.

Nessa pobreza endémica que há em Portugal, o fator geográfico, ou seja, viver na grande cidade ou na periferia, viver no litoral ou viver no interior, explica-a ou ela encontra-se espalhada por todo o país?
Infelizmente, ela encontra-se espalhada por todo o país. Nós tivemos na experiência da anterior crise económica - 2011 a 2014 - já uma pobreza no contexto urbano. Portanto, hoje podemos encontrar perfis de pobreza quer no contexto rural quer no contexto urbano, e a lição que tirámos da anterior crise económica que, infelizmente, agora está a ser vivida novamente, é de que a pobreza em contexto urbano é ainda mais grave do que a pobreza em contexto rural.

Consegue explicar esse conceito de grave?
Sim. Se olharmos para a distribuição do rendimento, é evidente que temos muito mais rendimento no litoral e nas grandes cidades do que no interior, obviamente que o interior é mais pobre e produz menos riqueza. Quanto a isso não temos dúvidas, mas quando olhamos para os perfis de pobreza, quando olhamos mais em detalhe, vamos encontrar pobreza nos dois contextos. Porque é que a pobreza no contexto urbano é mais grave do que a pobreza em contexto rural, como eu dizia há pouco? Porque no contexto rural há ainda uma economia de subsistência. Temos uma população mais envelhecida e que está muito habituada, até por tradição, a ter uma economia de subsistência. Portanto, apesar de ter uma pobreza que em termos absolutos até pode ser mais acentuada, é uma pobreza que em termos individuais acaba por não ser tão penalizadora como a urbana porque as pessoas têm a sua subsistência própria, têm a sua leira de terra, têm o seu cultivo de subsistência e, portanto, essa pobreza acaba por ser atenuada de alguma forma por esse modo de vida. A pobreza urbana é mais penalizadora porque as pessoas não têm essa economia de subsistência e há uma rede de solidariedade muito mais frágil do que aquela que existe no contexto rural - o contexto de vizinhança, de solidariedade, de família, é muito mais desagregado no contexto urbano do que no contexto rural. Nós encontrámos - e isso é uma lição da crise muito dura, a pobreza no contexto urbano é quase absoluta - situações em que as pessoas - e isso vê-se nas cidades - voltaram a procurar no lixo, voltaram a procurar formas de alimentação e estão em situações de subnutrição muito, muito graves. Depois, há também aquilo que se pode designar como uma pobreza envergonhada no contexto urbano. Enquanto no contexto rural há muito mais essa partilha das condições de vida, no contexto urbano há quase uma valorização também da imagem e do modo como as pessoas se projetam para o exterior muito mais do que no contexto rural. Essa pobreza envergonhada leva a que as pessoas não procurem convenientemente ajuda, não procurem as suas redes de suporte, não procurem essa ajuda na família.

Esse estudo da pobreza foi feito antes da chegada da pandemia, mas há outro estudo grande feito neste ano pela fundação que mede os impactos económicos, sociais, da pandemia. Fazendo ainda a ligação com a pobreza, o facto de alguns tipos de trabalhadores poderem estar em teletrabalho e outros não; o facto de as condições das crianças em casa divergirem muito e estarmos num sistema em que não há aulas ou são online, tudo isso potencia o agravamento das desigualdades?
Sim. Antes de mais, gostava de enquadrar este estudo. Penso que é o maior estudo e o mais profundo sobre esta matéria em Portugal. Nós entendemos na fundação que um evento como este da pandemia que estamos a viver justificava, ou quase exigia de uma instituição como a nossa, que pudéssemos lançar um grande estudo até para ficar para memória futura - é muito importante a ideia da memória futura -, pois nós daqui a 15 ou 20 anos vamos querer saber o que é que se passou na pandemia, quais foram os efeitos que a pandemia teve, uma vez que isto é um evento único nas nossas vidas e, certamente, vai mudar o nosso país para sempre. Nós achámos que era fundamental este estudo para memória futura. O estudo vai assentar em três áreas - na área económica; na área das instituições e, aqui, também no contexto internacional; e na área da sociedade. Vai ser um estudo transversal. Não vamos fazer estudos parcelares, não vamos fazer o estudo económico da pandemia ou o estudo social da pandemia ou o estudo político da pandemia, vamos fazer um estudo transversal que é para perceber em temas e eixos fundamentais qual é o impacto da pandemia. É claro que há uma área muito importante e à qual nós damos destaque neste estudo, que é precisamente a área social. A pandemia tem e vai ter impactos sociais muito relevantes, nomeadamente nas famílias. Já está a ter - nós vemos o crescimento do número de divórcios, vemos o crescimento dos problemas da saúde mental porque, de facto, a nossa sociedade não está estruturada, as nossas famílias, as nossas casas, não estão estruturadas para aguentar um período de confinamento...

Portanto, não é só a questão das desigualdades sociais, quando fala aqui do social também se está a referir a outro tipo de fenómenos, nomeadamente, os divórcios e outros tipos de comportamentos familiares.
Exatamente. Vamos olhar para a sociedade em termos micro e em termos macro e perceber qual é o impacto que isto tem na nossa sociedade. Claro que, em termos de desigualdade, uma situação como esta também agrava essa desigualdade. Por um lado, agrava a pobreza porque nós temos uma crise económica muito acentuada e essa é uma outra dimensão que o estudo vai analisar, mais uma vez a nível macro e micro, não é só o impacto económico que isto tem no país como o endividamento, mas também qual é o impacto que tem nas famílias, no emprego. Há uma crise económica muito acentuada e há uma perda muito acentuada de emprego e, depois, ainda por cima não há uma afetação do emprego por igual, pois há áreas que estão especialmente afetadas com o é o caso do turismo, das pequenas empresas, dos prestadores de serviços, daqueles que têm menor estabilidade, que sofrem o impacto brutal desta crise económica em resultado da pandemia. Todas essas desigualdades vão acentuar-se, há uma perda de rendimento muito significativa e, evidentemente, nas famílias é muito diferente um confinamento - isso foi muito discutido em certa altura - que é vivido numa casa com todas as condições e com uma divisão para cada pessoa ou num pequeno apartamento onde uma família numerosa tem de conviver. As consequências que isto tem no plano do desenvolvimento individual, do desenvolvimento das crianças e até num assunto que é hoje fundamental que é o da saúde mental, é completamente diferente. Alguém que vive meses e meses a fio confinado com uma família numerosa num pequeno espaço vai sentir consequências psicológicas e de desenvolvimento individual que são duradouras, até na própria convivência entre as pessoas, como digo, a questão dos divórcios é uma questão que está muito agravada por isto.

Vou passar para a sua componente de professor de Direito Constitucional - neste contexto de que estamos a falar, da pandemia, as próprias instituições, o próprio Estado, a própria Constituição, tiveram aqui um desafio tremendo com esta pandemia, ou seja, nós não tínhamos a experiência de viver em estado de emergência. As respostas têm sido as possíveis?
Sim. De facto, isto para um constitucionalista é um desafio único, porque nós não tínhamos tido em toda a vigência da nossa Constituição, nos últimos 45 anos, um estado de emergência. A última vez que tivemos foi em 1975, antes da vigência da Constituição, e por razões e num contexto muito diferentes. Não nos passava pela cabeça, ninguém em Portugal sabia o que era viver em estado de emergência, tivemos de nos adaptar e de aprender um pouco como fazer. Há um primeiro aspeto que eu gostava de destacar em termos institucionais no que respeita ao estado de emergência, que é importante e que resulta da nossa Constituição - eu acho que a nossa Constituição respondeu muito bem a este desafio. Esse primeiro aspeto tem que ver com a necessidade de consenso institucional para a declaração do estado de emergência, que era uma coisa que nós só conhecíamos na teoria e que depois, na prática, acabou por funcionar bem. O que é que eu quero dizer com isto? Estamos a viver nesta semana a décima declaração de estado de emergência e para cada uma delas, destas dez declarações de estado de emergência, é necessário haver uma declaração que é feita pelo Presidente da República; é necessário haver uma não oposição ou um parecer do governo favorável; e é necessário haver uma autorização da Assembleia da República. Portanto, temos os três principais órgãos do Estado - Presidente da República, Assembleia da República e Governo - a estarem de acordo quanto a esta declaração. Quando falo em Assembleia da República estou a referir-me naturalmente a todos os partidos que lá estão representados, portanto há também esse consenso político que tem de resultar aqui. Ora bem, isto é fundamental, pois a pior coisa que podíamos ter num contexto pandémico, num contexto de estado de emergência, era uma falta de sintonia institucional. Numa primeira fase, aliás, Portugal foi muito elogiado por isso. Houve outros países nossos vizinhos que lidaram de forma muito mais tardia e pior com a crise, justamente porque não tinham esse consenso institucional. Acho que esse consenso institucional, em boa medida, foi promovido pela Constituição e pelo modo como nós desenhámos o estado de emergência que, num certo sentido, forçou toda a gente a pôr-se de acordo, forçou toda a gente a ter de se pronunciar. Claro que nem tudo correu bem, claro que tivemos depois momentos de falta de sintonia, mas esses momentos de falta de sintonia aconteceram mais quando a pandemia, num certo sentido, abrandou, o que correspondeu ao período do verão. Alguns até disseram que era bom o regresso da política, porque esta tinha estado como que adormecida durante o tempo inicial, de choque do estado de emergência. Depois, quando houve um certo relaxamento, voltou a política, voltou a controvérsia, voltou o debate. Essa controvérsia manteve-se ali durante os meses de verão, mas quando a pandemia volta a piorar o consenso volta.

Pegando nessa sua palavra -"consenso" - em relação à pandemia, aquilo que se notou em Portugal, mas até mais noutros países, foi talvez uma falta de consenso em relação ao perigo que trazia esta pandemia, com um campo quase negacionista. Aqui aproveitava a sua experiência de investigação nos Estados Unidos, e nós sabemos que a clivagem muito forte existente nos EUA já vinha de antes de Donald Trump, mas provavelmente acentuou-se com ele. É possível dizer que a pandemia veio tornar ainda maior essa divisão na sociedade americana, nomeadamente quase que aparecia um campo republicano negacionista e um campo democrata mais pragmático?
Penso que sim, claro que sim. Essa crise é uma crise que não nasce com a pandemia, vem de muito antes. Eu acho até que a grande clivagem hoje - e não é só nos EUA, ela também está presente na Europa, na América Latina e um pouco por todo o mundo - é entre os moderados e os radicais, muito mais do que uma clivagem ideológica entre esquerda e direita, republicanos e democratas, é uma clivagem entre os moderados e os radicais. Claro que Donald Trump liderou, até em termos mundiais, esse movimento de radicalização. É um movimento que é muito potenciado pelas redes sociais, pelo antagonismo, até pelo combate à globalização, contra o internacionalismo, contra o multilateralismo, a favor do unilateralismo no fundo. Esse antagonismo, que é uma guerra de trincheira, uma guerra tribal, parte muito de um combate sobre factos radicais e sobre factos que, muitas vezes, partem de uma base falsa. Por isso é que a missão da Fundação Francisco Manuel dos Santos e de instituições como a nossa é hoje muito mais importante do que alguma vez foi. Pelo menos, os factos têm de ser reais. O problema desta clivagem radical é que parte de factos absolutamente falsos, e Donald Trump cresceu muito na base disso, na base de factos falsos e da criação de antagonismos. Isso agrava-se com a pandemia porquê? Porque a pandemia tem todos os ingredientes. Antes de haver pandemia, o que é que provocava este antagonismo? Era a imigração, era a insegurança, era o terrorismo, portanto, tudo aquilo que instila medo nas pessoas. O medo traz irracionalidade, o medo leva a que as pessoas acreditem em qualquer coisa por mais fácil e diabólica que ela seja. Ora, a pandemia é o caldo ideal para isso, porque a pandemia traz medo e, com ela, factos que são absolutamente falsos. Nós temos de partir de factos reais, nem mais nem menos do que aquilo que eles são. Convido todos os leitores a visitarem o site da Pordata onde estão os números da crise e os factos. Estão lá os factos em relação a Portugal e em relação ao mundo. Isso é que me parece fundamental. Nos Estados Unidos, apesar de tudo, a eleição de Joe Biden traz um horizonte de esperança, porque há um regresso ao multilateralismo, o que significa um diálogo profícuo no mundo, que era algo que Donald Trump tinha abandonado, e, por outro lado, há também um regresso a uma política de verdade.


Seguros de saúde estão a crescer há seis anos consecutivos

Rosa Soares, in Público on-line

Associação de seguradores diz que as novas subscrições ou reforço de apólices já existentes revelam “a preocupação dos portugueses com a sua saúde e com o acesso a cuidados médicos”.

A contratação de seguros de saúde cresceu 8,3% em 2020, período em que o volume da produção de seguro directo em Portugal registou uma queda de 18,7%, totalizando 9,9 mil milhões de euros. O ramo de seguros de saúde ou doença foi o que mais cresceu no ano passado e já está a crescer desde 2015, quer na vertente dos chamados seguros de grupo ou de empresa quer nos contratados pelos particulares.

Os seguros de saúde estão incluídos no ramo não vida, juntamente com os acidentes de trabalho, incêndio, automóvel e outros, que no conjunto representaram 54% da produção nacional seguradora em 2020, com um crescimento de 3% face a 2019.

Os dados, ainda provisórios, divulgados recentemente pela Autoridade de Supervisão dos Seguros e Fundos de Pensões (ASF), referentes às empresas que estão sob a sua supervisão e às sucursais de empresas com sede na União Europeia, mostram que o rimo de crescimento verificado no ano passado ficou ligeiramente abaixo do registado em 2019 face a 2018, que foi de 8,6%, mas acima dos 7,4% de 2018 face a 2017. O crescimento mais expressivo nos últimos seis anos verificou-se em 2016, ao atingir 9,6%.

O crescimento deste tipo de seguros “não pode ser directamente associado à pandemia de covid-19”, adiantou ao PÚBLICO a ASF, uma vez que, defende, a produção desta cobertura “tem apresentado um crescimento consistente ao longo dos anos, não se registando disrupções a esse padrão”.

A Associação Portuguesa de Seguradores (ASP), que diz representar mais de 99% do sector, destaca que, “tal como havia sucedido também no período da crise económica, que teve início em 2008, o crescimento deste ramo tem sido uma constante nos últimos anos e evidencia, obviamente, a crescente preocupação da população portuguesa com a sua saúde e com o acesso a cuidados médicos”.

Apesar de ainda não dispor de informação estatística que o comprove, a APS adianta que “é provável que este crescimento se deva não apenas a uma maior procura de seguros, mas também à inclusão de novas coberturas e ajustamento de capitais seguros nos contratos já existentes”.

E quem está mais dinâmico na contratação daqueles seguros? A autoridade de supervisão do sector segurador refere que ainda não dispõe desta informação relativamente a 2020, mas que em 2019 verificou-se um crescimento de 9,2% no número de pessoas abrangidas por seguros de grupo e de 7% nas abrangidas por seguros individuais. Este último é, segundo a ASF, “predominante”, representando 55,9%.

Já a associação que representa os seguradores refere que o crescimento registado, neste caso já relativamente a 2020, foi maior nos seguros de grupo ou de empresa (8,6%) face aos individuais (7,9%). Ainda referente ao ano passado, e em relação ao montante de prémios (e não em número de pessoas como os dados da ASF), refere que continua a existir “uma ligeira prevalência dos seguros de grupo (52%) face aos prémios de seguros individuais (48%).

Sobre o tipo de coberturas mais procuradas, a ASF diz não recolher essa informação de forma sistemática. No entanto, da recolha de informação feita recentemente, embora relativa a informação de 2019, adianta que “o internamento hospitalar e a assistência ambulatória (consultas, exames, etc.) são as coberturas que integram mais frequentemente os contratos disponibilizados em Portugal”.
Seguros de saúde versus cartões de descontos

Os seguros de saúde (ou doença) cobrem riscos relacionados com a prestação de cuidados de saúde, conforme as coberturas previstas nas condições do contrato, estando associados a uma seguradora. Nestes produtos, a seguradora pode reembolsar o tomador do seguro pelas despesas realizadas com cuidados de saúde, pagar directamente a quem preste o serviço de saúde, ou combinar as anteriores modalidades. E são acautelados riscos, como, por exemplo, o da necessidade de internamento e outras valências.

Bem diferentes são os chamados planos de saúde, ou cartões de desconto, que permitem aceder a um conjunto de serviços de saúde a um custo mais reduzido, que varia em função do prestador de cuidados de saúde seleccionado. Em muitos casos, como reconhece a ASF, os consumidores não conhecem as diferenças entre os dois produtos.

Como não são seguros de saúde, nem as seguradoras nem a ASF dispõem de dados sobre os planos de saúde, comercializados por empresas particulares e alguns deles associados a estratégias de fidelização dos clientes.

Contudo, há alguns seguros de saúde associados a produtos financeiros, como cartões de crédito ou as chamadas contas-pacote, que têm a oferta complementar de coberturas neste ramo. Mas, nestes casos, estão ligados a uma seguradora. Segundo a ASP, estima-se que, em 2019, cerca de 9% das pessoas seguras estavam cobertas ao abrigo daquilo que designam por “contratos associados a cartões”. Salvaguarda, no entanto, que estes contratos associados a cartões de crédito e outros não são equivalentes aos chamados cartões de saúde.
Seguros de vida em queda

A produção de seguros em 2020 no ramo vida, que engloba seguros de vida, de risco de morte, seguros ligados a fundos de investimento e operações de capitalização, estão em forte queda.

Mesmo em ano de crescimento na taxa de poupança dos particulares, a produção de seguros no ramo vida caiu 34,8%. Isolando o segmento dos seguros de vida (ou de risco de morte), incluindo alguns planos de poupança reforma, os mais conservadores, a queda foi de 49,9%, para 2649 milhões de euros (5284 milhões de euros em 2019). A queda é ainda mais expressiva quando comparada com 2018, ano em que se verificou um forte crescimento, com a produção a atingir 6354 milhões de euros (4900 milhões em 2017). Só os seguros ligados a fundos de investimento, habitualmente com maior risco, subiram 12%, para 1909 milhões de euros.

A queda das taxas de juros de mercado para valores negativos ajuda a explicar o menor interesse verificado por este tipo produtos, pensados para incentivar a poupança de médio e longo, nomeadamente na situação de reforma.

Os planos de poupança-reforma (PPR) são instrumentos criados com o objectivo de incentivar a poupança de médio e longo prazo destinada a satisfazer as necessidades financeiras inerentes à situação de reforma.

Poucos alunos deixaram de pagar propinas, mas o ensino superior perdeu 80 milhões em receitas

Samuel Silva, in Público on-line

A pandemia teve pouco efeito nos níveis de incumprimento de pagamento por parte dos alunos. A diminuição das prestações de serviço e o adiamento de projectos internacionais explicam a redução nas verbas recebidas pelas universidades e politécnico.

As universidades e institutos politécnicos perderam 81 milhões de euros em receitas próprias face ao que tinham previsto em 2020. A pandemia levou a uma diminuição das prestações de serviços a empresas e outras organizações e também a um adiamento de projectos de investigação internacionais, o que explica em grande medida este resultado. Já a receita com propinas manteve níveis de cobrança semelhantes aos registados no ano anterior, o que parece afastar um efeito significativo da crise económica sobre o sector.

As instituições de ensino superior tinham uma previsão inicial de receitas próprias de quase 577 milhões de euros no ano passado e receberam pouco mais de 496 milhões de euros. Os dados constam do Relatório de Execução Orçamental do sector, relativo a 2020, que foi agora publicado pela Direcção-Geral do Ensino Superior (DGES). Segundo o mesmo documento, a cobrança de receitas próprias foi de 86% face ao previsto, o que significa uma diminuição de 8% em relação ao ano anterior.

“Há uma redução derivada da prestação de serviços a empresas e outras organizações”, contextualiza o presidente do Conselho Superior dos Institutos Superiores Politécnicos, Pedro Dominguinhos. Essa quebra afectou tanto a atracção de novos projectos como a execução de tarefas que já estavam planeadas, acrescenta.

Este reflexo fica a dever-se aos constrangimentos que a pandemia provocou na actividade económica e da generalidade das organizações. Também houve uma quebra nas receitas com projectos de investigação financiados por fundos internacionais. Por causa das restrições provocadas pelo combate à covid-19, houve iniciativas previstas para 2020 que foram adiadas para este ano. “Como não houve execução física, não pudemos pedir as transferências das verbas respectivas”, explica Dominguinhos.

Já as propinas têm um impacto residual na diminuição da cobrança de receitas próprias. Temia-se que a crise económica motivada pela pandemia fizesse aumentar o número de estudantes a entrar em situações de incumprimento, mas os dados recolhidos pelo PÚBLICO junto das instituições de ensino superior parecem afastar esse cenário.
Incumprimento dos alunos inferior a 10%

“Não podemos considerar que tenha havido aumento das taxas de incumprimento, para além de pequenas alterações de ano para ano, que são normais”, valoriza o presidente do Instituto Politécnico de Bragança, Orlando Rodrigues. A avaliação é transversal a todas as instituições contactadas, com taxas de incumprimento no pagamento das propinas que são inferiores a 10%.

Mesmo instituições, como o Politécnico de Setúbal, que reportam um aumento no número de alunos que não pagaram as propinas, têm indicadores relativamente baixos – 5,3% de incumprimento, mais de 4 pontos percentuais do que no ano anterior.

A análise feita compara as taxas de incumprimento nos pagamentos dos alunos, tendo em conta que o valor das propinas diminuiu no último ano. As contas das instituições de ensino superior tinham uma previsão de quebra de receitas na ordem dos 43 milhões de euros, esperados em resultado da diminuição do valor das propinas nos Orçamentos do Estado para 2019 e 2020. O impacto dessa medida foi compensado por um aumento das transferências do Estado para as universidades e politécnicos, que totalizou 47 milhões de euros.

“Não houve uma quebra tão grande quanto isso” no cumprimento do pagamento das propinas, avalia o reitor da Universidade do Porto, António Sousa Pereira. Naquela instituição foram criados “vários mecanismos de ajuda” para alunos em dificuldades económicas e que “foram menos procurados do que o esperado”. O PÚBLICO questionou também as instituições de ensino superior sobre os níveis de abandono verificados no ano passado. Os números recolhidos apontam para uma estabilidade face ao ano anterior.

Na semana passada, numa audição parlamentar, o ministro da Ciência e Ensino Superior foi também questionado pela deputada do PCP Ana Mesquita sobre os os impactos da crise económica ao nível do abandono escolar, tendo garantido que à DGES só chegaram dois casos de pedidos de auxílio de emergência devido a dificuldades económicas neste ano lectivo e que o recurso à linha de empréstimos para estudantes sofreu uma diminuição em 2020. “Seguramente, devido à resposta que foi dada pela acção social”, referiu, lembrando as alterações ao regime de acesso a bolsas de estudo, que permitiu abranger mais alunos.

Ainda há homossexuais impedidos de dar sangue

Sara Gerivaz, in JN

Há homens homossexuais que estão a ser impedidos de doar sangue, mas nem todos são barrados. Tudo depende da porta à qual vão bater.

O mais recente apelo do Instituto Português do Sangue e da Transplantação (IPST) voltou a deixar a descoberto uma norma que abre espaço a diferentes interpretações, o que fez disparar as denúncias. O IPST confirma as queixas, mas garante que "não questiona a orientação sexual dos dadores" e que, em breve, serão conhecidas as conclusões de um grupo de trabalho, criado já em 2019, para discutir os critérios de doação de homossexuais. A Provedoria da Justiça também confirma a receção de queixas.

O problema persiste há vários anos e voltou a ser exposto pela ILGA. A associação de apoio à comunidade LGBTI constata que, sempre que há um apelo à doação de sangue, as denúncias aumentam e "os números não são residuais". De uma queixa de dois em dois meses, a ILGA passa a receber três denúncias por semana.

Bruno Gomes d"Almeida foi o impulsionador da mais recente discussão sobre o caso, após ter partilhado nas redes sociais a discriminação da qual foi alvo no último sábado. O arquiteto de 32 anos superou o "pânico de agulhas" e juntou-se à enorme fila no exterior do IPST, em Lisboa.

Depois de quatro horas à espera, preencheu um formulário sobre os eventuais comportamentos de risco e foi questionado por um técnico de saúde sobre "o número de parceiras sexuais". Bruno corrigiu: "não são parceiras, são parceiros". E a partir daí, a "bolha de privilégios" na qual pensava viver, rebentou. A resposta foi categórica. "Então não pode doar sangue".

NORMA É OMISSA, ADMITE IPST

Atónito, Bruno exigiu esclarecimentos e garante que, no IPST, explicaram-lhe que as "normas internas" ditam que "homens que fazem sexo com homens" tinham que estar em abstinência durante um ano. Situação que não está prevista na atual norma (ler perguntas e respostas nesta página). Bruno sentiu-se humilhado.

"O que estas pessoas fizeram foi pegar na minha orientação sexual e avaliá-la, por si só, como um comportamento de risco. É uma raiva enorme", desabafa ao JN.

Pedro Silva teve mais "sorte". Com 30 anos, o professor de dança é dador há mais de oito. Em Gondomar, nunca lhe foi negada a doação . Quando é questionado sobre as "companheiras", Pedro retifica para as "pessoas", sem nunca ter dito objetivamente que se relacionava com homens. Os profissionais de saúde nunca insistiram. "A discriminação vem de quem atende as pessoas".

"Há uma grande arbitrariedade e discricionariedade que não é compatível com um Estado de direito democrático e respeitador dos direitos humanos", acusa Marta Ramos. A diretora-executiva da ILGA afirma que a dualidade de critérios acontece porque não há "uma clarificação da norma, que leva não só a dúvidas de interpretação como a práticas diferenciadas no terreno". Ao JN, o IPST sublinha que "a norma é omissa" em relação ao período de suspensão para "homens que têm sexo com outros homens" e reconhece que "necessita de clarificação". As queixas que chegam ao instituto são esclarecidas internamente e os reclamantes informados.


Perguntas e Respostas

Qual é a norma que regula a dádiva de sangue em Portugal?

A norma da Direção-Geral da Saúde 09/2016 e atualizada em fevereiro de 2017 permitiu que, pela primeira vez, homossexuais pudessem doar sangue. Não tem referência à expressão "homens que fazem sexo com homens". O Instituto Português do Sangue e da Transplantação (IPST) garante que "todo e qualquer cidadão pode candidatar-se a dar sangue, sem quaisquer diferenças de género ou orientação sexual". É um critério internacional.

Quem é que está impedido?

Estão impedidos os parceiros de indivíduos portadores de VIH e pessoas que tiveram contacto sexual com indivíduos com risco infecioso acrescido nos últimos 12 meses ou, ainda, pessoas com novo contacto ou novo parceiro sexual nos últimos seis meses.

Qual é a razão da discordância?

A norma não discrimina, mas ficou dependente de um estudo para clarificar critérios de suspensão. Criado em 2019, o grupo de trabalho é constituído pelo IPST, Instituto Ricardo Jorge, Direção Geral de Saúde e ILGA, mas está parado. IPST diz que clarificação será conhecida "em breve".

Face às reclamações de dadores, houve alguma tomada de posição pública?

Sim, 447 pessoas assinaram uma petição criada esta semana, após as denúncias que viralizaram nas redes sociais. Também o PAN e o JS defenderam, esta semana, a eliminação da discriminação.

BORDA D’ÁGUA DA PANDEMIA: GUIA DE RECURSOS PARA PESSOAS IDOSAS ISOLADAS

Por Revista Dignus 

Os Núcleos Distritais de Bragança, Coimbra, Guarda e Vila Real da EAPN Portugal (Rede Europeia Anti-Pobreza)elaboraram a publicação ‘Borda D’Água da Pandemia: Guia de Recursos para Pessoas Idosas Isoladas’.

Os Núcleos Distritais de Bragança, Coimbra, Guarda e Vila Real da EAPN Portugal (Rede Europeia Anti-Pobreza)elaboraram a publicação ‘Borda D’Água da Pandemia: Guia de Recursos para Pessoas Idosas Isoladas’.

A construção deste Guia, efetuada ao longo dos últimos meses de 2020, contou com a participação de algumas entidades dos 4 distritos (IPSS, Municípios e Universidades), mediante a reunião de vários conteúdos já testados pelos parceiros e organizados em temas, procurando adaptar os mesmos para as pessoas idosas, sempre com o foco na promoção de estratégias para fomentar a sua saúde física e mental.


Este Guia pode e deve ser disseminado pelas pessoas idosas, mas também pelas instituições e projetos que o queiram utilizar para o dinamizar junto dos seus utentes.

Que esta possa ser mais uma ferramenta que contribua efetivamente para combater o isolamento e solidão das pessoas idosas nesta fase de pandemia que vivemos.

Informações e download em: www.eapn.pt/publicacao/233/borda-dagua-da-pandemia-guia-de-recursos-para-pessoas-idosas-isoladas

Técnicos dos centros de emergência de apoio a sem-abrigo denunciam precariedade

Cristiana Faria Moreira, in Público on-line

Técnicos dos centros de acolhimento de emergência para pessoas em situação de sem-abrigo foram dispensados ou viram baixar os seus salários quando mudou a gestão destes espaços municipais.
28 de Janeiro de 2021, 9:25 actualizado a 28 de Janeiro de 2021, 11:38

A gestão dos quatro centros de acolhimento de emergência para pessoas em situação de sem-abrigo mudou no início no ano e, com isso, grande parte dos técnicos que lá trabalhavam foram dispensados, apesar de o seu posto de trabalho não ter sido extinto. Quem ficou, queixa-se de ter agora um salário mais baixo para executar as mesmas funções. O relato foi feito por duas técnicas, agora desempregadas, na reunião de câmara desta quarta-feira.

Quando a pandemia de covid-19 começou a atacar o país em Março do ano passado, a Câmara de Lisboa criou um espaço para acolher quem não tinha tecto ou um local para se resguardar do vírus. Começou por adaptar o Pavilhão Desportivo do Casal Vistoso, no Areeiro, a centro de acolhimento de emergência e a procura começou a ser tal que foi necessário alargar esta resposta. Foram então abertos mais três centros e, com isso, surgiu a necessidade de ter técnicos especializados na área das ciências sociais — psicólogos, sociólogos, assistentes sociais — a trabalhar nessas respostas.

Assim, a Câmara de Lisboa fez um protocolo com o ISCTE - Instituto Universitário de Lisboa para a selecção e contratação de recursos humanos qualificados para estes centros. No final do ano passado, o ISCTE decidiu pôr fim a este contrato com o município, o que empurrou para um futuro incerto os postos de trabalho de cerca de 50 trabalhadores.

Ao PÚBLICO, o ISCTE explica que a sua participação “decorreu na fase de arranque do programa, no quadro de uma resposta rápida a uma situação de emergência e com um horizonte temporário limitado”. “Os contratos, inicialmente previstos para durarem três meses, foram prolongados mais que uma vez, tendo cessado no final de Dezembro”, nota a instituição de ensino superior não avançando contundo com um motivo para a cessação destes.

“Apesar de este tipo de acções não se enquadrarem na missão do ISCTE, o programa ofereceu a cerca de uma centena de estudantes a possibilidade de uma experiência no terreno e um contacto com realidades que fazem parte dos planos de estudo da universidade”, diz ainda a instituição de ensino superior.

Depois de o ISCTE ter anunciado a intenção de não renovar o protocolo com a autarquia, foi lançado um concurso para que a gestão dos centros passasse para associações que fazem trabalho na área. Assim, a partir de 1 de Janeiro, a Vitae passou a estar responsável pelos centros montados no Complexo Desportivo Municipal Casal Vistoso e na Casa dos Direitos Sociais, a Ares do Pinhal pelo centro montado na Pousada da Juventude do Parque das Nações e a AMI pela Casa do Lago.

No entanto, dos 49 técnicos que estavam a trabalhar nos centros em Dezembro, ao abrigo deste protocolo, apenas uma pequena parte continuou a trabalhar nestes equipamentos de emergência sob a gestão das associações. E, em vários casos, com remunerações mais baixas para executar o mesmo tipo de funções no mesmo horário. A Câmara de Lisboa diz agora que está a dialogar com as associações para que os salários se mantenham, mas não garante novas contratações.

O relato foi ouvido na reunião pública da Câmara de Lisboa desta quarta-feira pelas vozes de duas antigas técnicas superiores, que trabalharam na Pousada da Juventude de Lisboa. Henriqueta Sampaio e Gizela Almeida foram dispensadas no final do ano passado, apesar de os seus postos de trabalho não terem sido extintos. Estão desempregadas. Segundo disseram, o mesmo aconteceu a cerca de 75% dos técnicos que tinham sido contratados ao abrigo deste protocolo.

“A nossa contratação foi feita através de uma ‘barriga de aluguer’, o ISCTE, e no nosso contrato havia uma cláusula, que previa [a sua continuidade] enquanto os centros de emergência existissem, facto que ainda se verifica, infelizmente”, disse Henriqueta Sampaio. Por estes centros, diz a autarquia, já passaram mais de 700 pessoas em situação de sem-abrigo.
“Falta de transparência”

Segundo relatou, foi em Outubro do ano passado que a câmara informou que, a partir de Janeiro de 2021, os contratos seriam assinados com outras instituições, que estavam ainda por definir. Apesar de o contrato ter sido assinado com o ISCTE, esta instituição tratava apenas da parte “burocrática”. Era sempre com a câmara com quem contactavam, uma vez que os centros são da sua responsabilidade.

“A expectativa criada era que haveria uma transferência de pelo menos 80% dos então 47 técnicos superiores dos quatro centros de emergência. Outros poderiam continuar como monitores. Mas, de qualquer modo, continuaríamos no projecto”, continuou Henriqueta, lamentando que o município não tenha acautelado a manutenção dos seus postos de trabalho.

Segundo as contas das antigas técnicas, apenas continuaram nos centros 12 trabalhadores dos que já lá estava. Desses, “quase todos viram a sua categoria profissionais rebaixadas, com redução salarial, embora continuem a exercer as mesmas funções”.

O que Gizela Almeida critica sobretudo é a “falta de transparência no processo de transferência da gestão dos centros de emergência”. “Sempre nos foi dito que os nossos trabalhos estavam garantidos”, notou, sublinhando que estiveram até aos últimos dias de Dezembro sem saberem se seriam ou não contactados pelas instituições que passariam a assumir a gestão dos espaços dali a dias.

Além do que foi exposto pelas duas técnicas, o PÚBLICO tem recebido ao longo das últimas semanas mais relatos de situações idênticas nos outros centros. Mesmo quem continuou a trabalhar confirma a descida no salário em pelo menos um quarto para desempenhar as mesmas funções: passou de um salário mensal bruto de cerca de 1100 euros para 800, descendo da categoria de técnico superior para monitor.

“Temos uma responsabilidade, senão jurídica, ética e moral”

Este assunto foi levantado pela vereadora eleita pelo PSD, Teresa Leal Coelho, numa reunião de câmara ainda no final do ano passado. “Temos uma responsabilidade, senão jurídica, ética e moral relativamente às pessoas que foram contratadas pelo ISCTE”, disse a social-democrata, já após ouvir o relato das duas técnicas.

Também o vereador do PCP, João Ferreira, lembrou que a gestão dos centros de emergência deveria, desde o início, ter tido um enquadramento diferente. “Logo aí vimos que este expediente da ‘barriga de aluguer’ servia para garantir trabalhadores a baixo custo e expô-los a uma situação mais precária que agora está à vista”, disse.

Na resposta às questões levantadas pelas técnicas e pelos vereadores da oposição, o vereador que tem o pelouro dos Direitos Sociais, Manuel Grilo, disse não ser possível “obrigar uma associação a contratar uma pessoa em concreto”. “Cada associação encetou os contactos que entendeu no sentido de reforçar as suas equipas e manter os equipamentos de emergência a funcionar correctamente”, disse o vereador.

Tendo conhecimento que as instituições acabaram por recrutar apenas alguns trabalhadores para categorias inferiores, logo, com salários também mais baixos, diz estar a dialogar com as novas entidades gestoras. “Apercebo-nos de que haveria distinções salariais e diminuição dos vencimentos, que estariam a provocar algumas recusas na contratação. Estamos a trabalhar com as associações para que não haja alteração dos salários das pessoas contratadas do ISCTE agora com estas novas associações”, disse.

“O regime levou tudo” mas os sírios ainda preparam o futuro

Sofia Lorena, in Público on-line

A Síria revoltou-se e a dimensão da resposta foi tão avassaladora que às vezes parece ter sobrado pouco. Mas nenhum regime dura para sempre. “Serão precisas várias gerações para sarar”, mas quem sobreviveu não desiste.
Sofia Lorena

Ao contrário que acontecia em vários dos países árabes que viveram revoltas ou amplos movimentos de protesto no início de 2011, para a esmagadora maioria dos sírios a crítica ao regime não era uma opção. Muitos dos que se juntaram à revolução contam como só nesses dias perceberam que os próprios pais não estavam contentes com a vida que tinham.

“Estávamos em silêncio mas nenhum sírio podia mais”, disse-nos Amani, síria refugiada na Jordânia que em 2011 tinha 28 anos. “Nem queria acreditar quando os meus pais começaram a dizer mal de Bashar e do pai. Explicaram-me que nunca tinham dito nada porque que tinham medo que nós soubéssemos que a vida não era boa.”

Para os sírios, a descoberta de liberdade foi extraordinária. E a forma como o regime de Bashar al-Assad respondeu a essa descoberta foi inimaginável. Passaram dez anos, é difícil recordar tudo em pormenor. Kholoud Helmi, jornalista, conta que decidiu participar no documentário Cries from Syria, de 2017, precisamente para não esquecer. “É a minha história. E aconteceram tantas tragédias, tantas atrocidades, às vezes parece que nos vamos esquecendo das anteriores. Há sempre uma tragédia nova.”

Tem sido assim a vida de sírio. De massacre em massacre, da repressão à política de terra queimada, das bombas-barris (barris, de petróleo ou garrafas de gás cheios de explosivos e fragmentos de metal) aos ataques químicos, dos doenças e do frio aos cercos destinados a matar cidades inteiras à fome. Nos últimos dez anos morreram cerca de 500 mil sírios, 6,5 milhões abandonaram o país, 100 a 250 mil foram detidos ou desapareceram.

Helmi estava na Síria quando a revolta começou. Aos 26 anos, na sua cidade dos subúrbios de Damasco, Darayya, já tinha ouvido falar dos massacres de 1982, quando as forças governamentais cercaram a cidade de Hama e mataram pelo menos 30 mil pessoas para esmagar uma tentativa de insurreição da Irmandade Muçulmana. Mesmo assim, entusiasmada pelo que via estar a acontecer na Tunísia, no Egipto ou no Iémen, decidiu participar numa manifestação, a primeira de que soube, em Damasco.

Não era muita gente. Quem estava cantou, nem sequer gritou. “Liberdade”, “mudança”, nem sequer “o povo quer a queda do regime”, a frase que haveria de repetir-se por todo o país. Bastou isso para sentir que “flutuava”. Hoje, não tem como saber se foi nesse momento que se entregou à revolução, se foi mais tarde, quando os amigos começaram a ser mortos e a desaparecer.

Rafif Jouejati não estava na Síria, aliás levava uma vida “ocupada com tudo que não tem a ver com a Síria”. A empresa de consultadoria de gestão, o casamento, os dois filhos nascidos nos Estados Unidos. Nos anos anteriores tinha acreditado, como tantos, que “o popular Bashar al-Assad, aquela figura educada no Ocidente, ia trazer mudanças”.

“Tenho ideia que foi durante uma manifestação em Daraaya a primeira vez que dispararam munições reais. Eram miúdos, adolescentes. E eles dispararam, não foram balas de borracha, não foi gás lacrimogéneo, foram balas reais”, diz. Para Jouejati, foi nesse momento que percebeu que não podia ficar parada. “E quando nos juntamos a um movimento deste tipo com um regime assim não se pode estar meio dentro e meio fora. É tudo ou nada. No meu caso foi tudo.”

Começou por trabalhar com os Comités Locais de Coordenação, a rede de grupos locais que nasceu por todo o país para organizar os protestos, depois a resistência. Primeiro foi tradutora, depois porta-voz, entretanto aproximou-se dos dirigentes, “principalmente de Razan Zeitouneh”, desaparecida desde Dezembro de 2013, foi assumindo projectos cada vez maiores e juntou-se à direcção dos comités.

Os dias bons

“Esses eram os dias bons. Quando ficávamos devastados se morressem 20 pessoas, quando a maioria dos activistas ainda acreditava em manifestações pacíficas, quando a criatividade dos sírios era assombrosa”, diz. Jouejati ainda acredita na resistência pacífica e hoje dedica-se, em parte, a tentar fazer passar estratégias de não-violência para dentro da Síria.

Percebe que “o regime militarizou tanto a resposta que as pessoas tiveram de se defender”, sabe que “usou tácticas destinadas a promover sentimentos de vingança, castigos colectivos, para além de enviar infiltrados para os protestos, de provocarem divisões”. A verdade é que “era isso que o regime queria”, “era uma armadilha à qual não se podia fugir”.

Os sírios revoltaram-se, depois resistiram. Quando lhes entraram em casa pegaram em armas para salvar os filhos. Foi assim que Taman Esselum, professor de Árabe tornado resistente em Hama, membro dos Comités Locais, nos explicou, em 2012, durante uma viagem à Turquia, para pedir ajuda à oposição no exílio. “Assad é estúpido, mas não é louco. O problema foi que o mundo lhe deu luz verde para nos matar. Revoltámo-nos contra Assad. Mas afinal temos de derrotar o mundo todo.”

Jouejati sabe que foi assim. Acompanhou de perto o processo de negociações patrocinado pela ONU, esteve nos encontros de Genebra. Viu como o regime “assinava documentos e ainda a tinta não tinha secado já fazia cercos para matar comunidades à fome”. Como “a comunidade internacional começou a ficar dormente, como se se tivesse instalado uma apatia e toda a gente ficasse paralisada”. A seguir, viu como “o ónus da prova deixou de estar do lado do regime e passou para os activistas, e isso foi devastador”.

Milhões de workshops

Entretanto, a diáspora não parou de crescer. Helmi está em Istambul, para onde o jornal que ajudou a fundar na Síria, o Enad Baladi se mudou, em 2014. Jouejati está em Madrid, é responsável do Partido Liberal Sírio na Europa e colabora com várias organizações. Defende que os EUA, a União Europeia e a ONU “podiam ter encontrado formas de pressionar a Rússia, de negociar com o Irão”. Em vez disso, “disponibilizaram ajuda humanitária e muita assistência em termos de construção de capacidades e treino, milhões de workshops…”, afirma. “Agora temos milhões de sírios peritos em sociedade civil, só não temos um país.”

Nem uma nem outra desistiram de uma nova Síria. Mesmo se às vezes parece ter sobrado pouco. “Às vezes perguntam-me o que é que os sírios precisam. A resposta é tudo. Tudo nos foi levado, o regime levou tudo, com mundo a assistir. Por isso, agora precisamos de tudo”, diz Jouejati.

Como vários analistas, Jouejati acredita que o regime está cada vez mais sozinho e fraco. “Agora temos agitação civil na Rússia, o Irão tem problema gigantesco com a covid-19, muita gente com fome, a viver nas ruas, está a ferver”, enumera. “Depois da pandemia, ninguém vai poder gastar dinheiro”, concorda Marwan Muasher, ex-ministro dos Negócios Estrangeiros da Jordânia, actual vice-presidente de Estudos do Programa do Médio Oriente do think tank Carnegie Endowment for International Peace.

“Quando o regime se vir completamente sozinho vai entrar em colapso”, diz Jouejati. E é aí que os milhões em workshops podem fazer a diferença. “A dimensão do trauma é indescritível, serão precisas várias gerações para começar a sarar”, admite. “Mas os sírios têm amadurecido politicamente. Trabalharam os conceitos de liberdade, de democracia. Vamos ter de criar uma democracia nova, a partir da cultura síria. Vai demorar, mas vamos lá chegar. Temos é de dar o primeiro passo, vermo-nos livres do regime de Assad.”

É preciso "aceitar que não se está bem" no novo confinamento

in SicNotícias

Especialistas alertam que o prolongamento do confinamento, aliado à "incerteza do momento", estão a ser "causadores de ansiedade nas pessoas".

O novo confinamento, aliado a alterações das rotinas e do estilo de vida, vai agravar e prolongar o sofrimento psicológico dos adultos, preveem os especialistas ouvidos pela Lusa, defendendo que é preciso "aceitar que não se está bem".

O "grande problema" não é voltar a casa para um novo confinamento, mas sim a alteração de rotinas que têm prevalecido nos últimos meses, acredita Miguel Ricou, presidente do Conselho de Psicologia Clínica e da Saúde da Ordem dos Psicólogos.

"Andamos a alterar rotinas e tentar recuperá-las há mais de 10 meses", referiu o psicólogo, salientando que o ser humano se "adapta por natureza" às circunstâncias, mas só o faz porque "conhece a realidade".

"Uma das dificuldades que temos é que conhecemos muito pouco da realidade, não sabemos bem o que aí vem e não sabemos bem quanto tempo dura", afirmou.

Perante isto, "é fundamental aceitarmos que não nos vamos sentir tão bem nesta altura".

"Temos de aceitar que andamos mais nervosos, mais tristes à vezes, mais irritados, mais tensos e que isso é normal", referiu.

As mudanças no estilo de vida das pessoas permanecem e é espetável que "agravem" a condição psicológica dos adultos, defendeu a psicóloga Inês Guimarães.

"A quarentena e o isolamento vão agravar o sofrimento psicológico, porque vão mexer com algumas facetas importantes da saúde mental, como a liberdade pessoal e os nossos movimentos no dia-a-dia", explicou.

O "prolongamento" do confinamento, aliado à "incerteza do momento" serão "causadores de ansiedade nas pessoas", considerou Irene Carvalho, psicóloga e docente na Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP).

"Uma coisa é termos um horizonte próximo que sabermos que termina. Outra, é termos um horizonte próximo que se alarga indefinidamente sem sabermos quando será o fim", salientou.

Sintomas depressivos, ansiosos e, em alguns casos, de 'stress' traumático, são algumas das mazelas que os especialistas admitem que se intensifiquem.

Em particular, naqueles que viram o seu rendimento reduzido ou que ficaram sem emprego, salientou Irene Carvalho, advertindo que para essas pessoas, estar confinado é "extraordinariamente ansioso".

A par das perdas financeiras, a disrupção do dia-a-dia, a perda de liberdade, as perturbações de sono e o sedentarismo também poderão ser "fatores de risco para um bem-estar emocional e para a doença mental", disse Inês Guimarães.

Para "mitigar os efeitos negativos", Irene Carvalho considera desejável que se tentem manter algumas rotinas, ainda que isso "não assegure que as pessoas não vivam a situação com grande ansiedade, frustração e desgaste".

Para Miguel Ricou, manter as rotinas é importante, primeiro porque "ajuda a gerir o tempo" e, depois, porque "nos distraem de nós próprios".

Inês Guimarães salientou a importância de se manter uma "conexão com os outros", sejam amigos ou familiares.

"Distanciamento social não significa necessariamente distanciamento emocional", reforçou a psicóloga, apontando a necessidade de se procurar "manter algum grau de perspetiva", especialmente quanto à socialização.

"As pandemias, embora possam ter alguma duração, historicamente acabaram, afirmou.

E quando acabar a pandemia, será que vamos voltar a socializar sem barreiras? "A história diz-nos que, em princípio, sim", referiu Irene Carvalho, investigadora do CINTESIS.

Também Miguel Ricou acredita nessa possibilidade, especialmente, porque pertencemos a um país onde o clima é mais quente e as pessoas "são fisicamente conectadas".

Inês Guimarães também não duvida disso, mas avisa que para um processo "gradual".

28.1.21

Fadiga pandémica: a outra doença que está a fazer cada vez mais vítimas em Portugal

Inês Garrido dos Santos, in Nit.pt

Estar farto da pandemia pode ter várias explicações e não é o mesmo que ter uma depressão.

Cansaço, falta de energia ou pouca vontade de fazer seja o que for. Tem-se sentido assim? Saiba que não está sozinho. Milhares de pessoas passam por isto todos os dias. E a culpa pode ser da pandemia, mas não tem nada que ver com o vírus propriamente dito.

Claro que estar infetado com Covid-19 ou ter passado por esse processo cansa e pode fazer os sintomas persistirem durante várias semanas, mas não é exatamente disso que falamos. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), à “desmotivação para seguir comportamentos de proteção, que emerge ao longo do tempo e é afetada por um número de emoções, experiências e perceções”, chama-se fadiga pandémica.

Este conceito está associado a uma reação natural e expectável à incerteza que vivemos a nível global e que, além de nos levar à desmotivação e falta esperança nos cuidados contra a Covid-19, pode também ser desencadeada ou conduzir a outros tipos de emoções. Para perceber melhor o conceito, como é que ele se aplica à sociedade portuguesa e o que podemos fazer para evitar este tipo de fadiga, a NiT falou com a psicóloga Mara Chora.

“Apesar de existir uma convergência geral para este sentimento, cada pessoa é afetada pela sua experiência pessoal, pelas suas emoções e pelas perceções que tem em relação à situação vivenciada e que podem estar relacionadas com vários aspetos, entre eles o estado de saúde (física e psicológica, diretamente ligado ou não à Covid-19), o suporte social que recebe de familiares, de amigos ou da comunidade, as restrições aplicadas à sua área de residência e os fatores socioeconómicos (como a perda de rendimentos, precariedade laboral ou habitacional, etc.)”, diz.

A fadiga pandémica poderá levar a que a perceção dos riscos vá diminuindo à medida a que a pandemia se prolonga por mais tempo, a que nos desleixemos nos cuidados como lavar as mãos ou usar máscara de proteção. Ainda assim, pode ser distinguida de outros problemas psicológicos como a depressão, na medida em que esta pode caracterizar-se por “um humor invulgarmente triste, irritável e/ou pela diminuição de interesse ou prazer nas atividades e tarefas diárias, durante um período relativamente prolongado e que causa sofrimento à pessoa ou dificuldades no seu funcionamento social”.

A depressão pode ainda ser acompanhada por outros sintomas como o aumento ou perda de apetite ou peso, problemas de falta ou excesso de sono, dificuldades de concentração, falta de energia, desvalorização própria ou sentimentos de culpa.

Quando falamos de ansiedade, a especialista explica que esta, quando em excesso, pode fazer-se notar quando “as perturbações de ansiedade implicam que a pessoa experiencie frequentemente estados de ansiedade e preocupação mais intensos e prolongados, do que aquilo que seria expectável no dia a dia, causando mal-estar, sofrimento e défice no funcionamento social e ocupacional”. Isto poderá levar a pessoa a ter comportamentos de evitamento ou de repetição de pensamentos como forma de tentar aliviar o mal-estar que sente.

No que diz respeito à tristeza, Mara Chora explica que esta é “um estado emocional que resulta da interação entre os sistemas cognitivo, afetivo, fisiológico e comportamental”. É uma resposta a um determinado acontecimento e, por isso, é “um estado passageiro e dirigido a algo específico”.

Uma vez que a fadiga pandémica é também ela uma consequência da pandemia que vivemos, ainda não é possível perceber que riscos é que esta pode trazer para cada um ou para a sociedade. Estamos a passar por tempos incertos em que não é possível prever com exatidão o que vai acontecer, vemos algumas liberdades serem restritas, pessoas a ficarem sem emprego, sem alguns familiares e uma crise socioeconómica que ainda virá. Ainda assim, a psicóloga alerta: “Também é certo que muitos de nós sairemos mais resilientes e com uma grande capacidade de adaptação”.

Em Portugal ainda não há estudos isolados que abordem apenas a questão da fadiga pandémica, mas é provável que possam sair em breve. No entanto, há outros dados que podem ajudar a compreender esta questão, principalmente ligados aos impactos da pandemia e do confinamento na saúde mental, questões de ansiedade ou características que nos tornam mais vulneráveis à fadiga no geral.

No estudo “O Que Pensam e o Que Sentem as Famílias em Isolamento Social”, do qual Mara Chora também fez parte, os resultados indicam que “pais e crianças apresentam níveis normativos de ansiedade, depressão e stress, ou seja, são valores expectáveis para as vivências e acontecimentos do dia a dia”, ainda assim, há um conjunto de pais e crianças que apresentam valores mais elevados e que estão relacionados, o que quer dizer que “pais mais ansiosos, deprimidos e stressados, têm filhos mais ansiosos”.

Para evitar os sintomas da fadiga pandémica ou com isso levar a outros problemas de saúde mental como depressão ou ansiedade, a psicóloga recomenda que se recorra a fontes de informação fidedignas e claras, evitando assim as fake news.

“Por muito realistas que possam parecer as correntes nos chats com teorias da conspiração ou dicas e truques para fintar o vírus, isso só provoca mais desinformação e não nos ajuda a combater eficazmente ou a prevenir o contágio.”

Por outro lado, quando a informação for excessiva e nos causar incómodo, a especialista recomenda que nos permitamos afastar um pouco, sem deixar de manter alguma atualização. Ou seja, não precisamos de ver todas as notícias que há, mas é necessário mantermo-nos informados.

Para ajudar a passar o tempo, convém encontrar atividades de que gostemos e não descurar os cuidados pessoais, “sejam eles momentos de relaxamento, fazer desporto, ler” ou outros. Conversar sobre aquilo que nos preocupa com pessoas da nossa confiança também é uma boa estratégia. Se necessário, não devemos duvidar em procurar ajuda de um profissional especializado.

“Apesar do estigma que continua a existir, não é motivo de vergonha reconhecermos que o momento atual pode estar a ser demasiado exigente.”

Incentivo ao emprego nas áreas rurais precisa de quadruplicar para 240 milhões

Luísa Pinto, in Público on-line

A medida foi lançada com uma dotação de 90 milhões de euros, 60 milhões só para as áreas rurais. Neste segmento vão ser necessários 240 milhões, de acordo com as estimativas da Federação A Minha Terra.

Os apoios à criação de emprego em territórios rurais no âmbito da medida +CO3SO Emprego têm de chegar aos 240 milhões de euros para acomodar cerca de 2400 candidaturas para a criação de 4700 novos postos de trabalho. É esta a estimativa de Ana Paula Xavier, presidente da Federação A Minha Terra (FMT), a associação de Grupos de Acção Local (GAL) que, em cada território, analisou a maior parte destes avisos.

A medida foi lançada no Verão com um montante de 90 milhões de euros e destinava-se a apoiar com uma verba, que podia chegar aos 1900 euros por mês, a fundo perdido, cada posto de trabalho criado, inclusive a criação do próprio emprego, tendo a procura superado a dotação dos avisos lançados em todo o território.

“A procura excedeu todas as expectativas e obrigou a um esforço complementar”, começa por referir a presidente da FMT, para logo sublinhar os aspectos positivos trazidos pelo interesse acrescido dos promotores. “Esta resiliência é importantíssima e a coragem que as empresas têm de se predisporem a criar emprego e a continuarem a sua actividade numa altura como a que atravessamos é um sinal extremamente positivo, que revela que o Estado pode contar com as empresas para a retoma económica de que tanto precisamos”, afirma Ana Paula Xavier.

A FMT congrega todas as entidades reconhecidas como Grupos de Acção Local (GAL) rurais no continente e nas regiões autónomas – são 60 GAL, que representam no seu conjunto 94,3% do território nacional e dizem directamente respeito a 5,2 milhões de portugueses, residentes nas áreas rurais. De acordo com Ana Paula Xavier, o somatório dos avisos lançados pelos associados da FMT chegava aos 60 milhões de euros. Os restantes 30 milhões que faltam para a dotação da medida foram lançados por GAL urbanos, pelas áreas metropolitanas, algumas comunidades intermunicipais e até Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional.

A ministra da Coesão Territorial já assumiu que os 90 milhões de euros não serão suficientes para aprovar todos os projectos e admitiu a intenção de fazer um reforço orçamental, embora ainda não o conseguisse quantificar. No entanto, só para as GAL rurais, diz Ana Paula Xavier, vai ser preciso quadruplicar a dotação de 60 milhões de euros. “Não há forma mais rápida, directa e eficaz de colocar os apoios no terreno e baixar o número de pessoas desempregadas transformando-as em contributivas”, argumentou Ana Paula Xavier.

Para esta engenheira, que assumiu a presidência da FMT em representação da Adriminho — Associação de Desenvolvimento Rural Integrado do Vale do Minho, terá de haver “um esforço acrescido para que estas candidaturas sejam aprovadas”. E que só pode ser essa a resposta à “mensagem positiva de resiliência e de empenho” que chegou do território nacional. “Será difícil justificar porque não se aprovam projectos com mérito, cujos promotores estão dispostos a criar emprego numa época de crise como a que atravessamos”, argumentou.

As candidaturas que surgiram em territórios rurais estão, segundo Ana Paula Xavier, muito vocacionadas para a transição digital, o turismo, alojamento, animação, restauração e indústria. Mas a caracterização final e a análise mais fina a todo este universo de candidatos só poderão avançar quando o processo estiver fechado, as candidaturas assinadas e, de preferência, “o dinheiro comece a chegar às pessoas”.

Os avisos estiveram abertos até final de Setembro e, de acordo com o Ministério da Coesão Territorial (MCT), surgiu uma vaga de 5250 candidaturas para a criação de mais de dez mil postos de trabalho e pedidos de apoios de mais de 500 milhões de euros. Quando estavam 42% das candidaturas analisadas, a taxa de rejeição situava-se nos 75%.

O processo de análise por parte dos Grupos de Acção Local às candidaturas já está concluído e estão agora a passar pelo crivo de supervisão das Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR) e pela própria tutela, que passa pelo Ministério da Coesão Territorial. De acordo com o gabinete do MCT, o processo deverá estar todo encerrado a 15 de Fevereiro.

Consultores pedem celeridade nas análises

A ACONSULTIIP – Associação dos Consultores de Investimento e Inovação de Portugal recebeu durante o ano de 2020 “muitas manifestações de preocupação dos consultores relativamente às avaliações das candidaturas e dos prazos de análise” no âmbito do Portugal 2020. E assume que entre as mais numerosas estão as candidaturas ao Programa CO3SO, “gerando um grande desconforto aos consultores”.

“Foram ultrapassadas, em muito, as dotações previstas, tendo sido recusados muitos projectos com avaliações que parecem não estar suficientemente fundamentadas e justificadas”, avisa a associação.

Em comunicado, a ACONSULTIIP defende “uma maior exigência na apresentação das candidaturas, um desenho mais rigoroso e adequado dos programas de apoio e uma avaliação que não ponha em causa as expectativas dos investidores, empreendedores e consultores”.

"Para que um investimento tenha lógica financeira, o seu rendimento deve ser, no mínimo, igual ao custo de oportunidade. Infelizmente este não tem sido o caminho escolhido pela maioria dos programas, promovendo uma avalanche de candidaturas, muitas das quais sem qualquer valor acrescentado para os promotores para além do improvável incentivo financeiro que iriam receber", refere a associação.

Os consultores consideram que o modelo seguido até aqui “apresenta limitações há muito identificadas e que urge serem ultrapassadas”. “A demora na implementação das acções correctivas necessárias condena de forma impiedosa, agravada pela crise que atravessamos, o processo de requalificação e desenvolvimento sustentado da nossa economia e do nosso sector produtivo”, argumentam.