8.10.13

A maior violência nas estações é a exclusão social

Patrícia Carvalho, in Público on-line

A violência, sobretudo a violência juvenil, é uma realidade que está concentrada nas estações ferroviárias europeias? E são estes espaços sítios, efectivamente, violentos? Estas perguntas estiveram no ponto de partida do projecto Violence in Transit que, durante cerca de dois anos, analisou e desenvolveu planos de experimentação social nas estações ferroviárias de S. Bento, no Porto, de Pescara, em Itália, e na estação de camionetas Estació del Nord, em Barcelona (Espanha). As conclusões foram apresentadas esta semana, em Roma.

Se a primeira resposta fosse de sim ou não, a resposta do Porto e de Barcelona seria claramente negativa.

"Esta foi uma preocupação que nasceu da experiência italiana e que não parece apropriada às duas organizações ibéricas que participaram no projecto", concluiu o sociólogo catalão Jordi Estivill, na análise comparativa que fez ao trabalho desenvolvido pela EAPN Portugal - Rede Europeia Antipobreza e pela Fundación Apip-Acam (em Itália, o projecto esteve nas mãos da associação On the Road).

De facto, enquanto em Pescara os resultados da pesquisa feita revelaram que 75% das pessoas envolvidas em actividades classificadas como "desviantes" (prostituição, mendicidade, consumos de droga e álcool, pequenos roubos e sem-abrigo) tinham menos de 30 anos (e 14,8% do total menos de 15 anos), o retrato traçado no Porto é muito diferente. A estação portuense, integrada no centro histórico classificado como Património da Humanidade pela Unesco, é muito mais um território de velhos. Velhos pobres, que passam ali os dias, sem nada que fazer. Velhos que procuram as prostitutas da Rua do Loureiro, ou os prostitutos e as tascas da Rua da Madeira.

Em Barcelona, foi preciso sair da estação e percorrer os terrenos em volta para encontrar as prostitutas, os sem-abrigo e os poucos grupos de jovens que transmitem uma sensação de insegurança que, se revela, muitas vezes falsa. Até porque o aumento da presença de forças de segurança nas estações é real, e a lógica tem sido a expulsão destas pessoas, condenando-as à invisibilidade.

Os investigadores italianos chamaram mesmo à estação de Pescara "a estação invisível" e Liliana Pinto, que esteve envolvida nas várias actividades de inclusão desenvolvidas no Porto, diz que um dos pontos que mais a marcou foi poder retirar os excluídos da zona de S. Bento da "invisibilidade" a que estavam votados.

Se há ponto em que as três experiências parecem tocar-se é que a violência que passageiros e trabalhadores das estações referem, como indicativos da insegurança que dizem sentir, é, de facto, pouca e quase nunca lhes é dirigida. Quando ela ocorre, as vítimas são, frequentemente, aqueles que já sofrem a violência da exclusão.

Replicar a experiência

E como se combate esta violência? A resposta foi única. "O aspecto estético é importante, ele é uma ferramenta", disse Sérgio Aires, coordenador do projecto em Portugal. Através da arte (seja a fotografia, o teatro ou a pintura de graffitis), envolvendo as pessoas excluídas, em vez de as empurrar para a invisibilidade, e pondo as associações a trabalhar em rede, pode-se mudar algo, acreditam os intervenientes no Violence in Transit. Na conferência de encerramento, Nadir Fernandes, da Refer, garantiu que a empresa pública quer "replicar a experiência feita no Porto noutras estações".

E no Porto ouviram-se utentes e excluídos, fez-se teatro, exposições de fotografia, foi contada a história de prostitutas e imigrantes, fez-se uma mostra social e criaram-se pontes entre agentes sociais. E isto, para Sérgio Aires, foi o mais importante: "Percebemos que o espaço da estação é uma imensa possibilidade e que as organizações estão mais dispostas a trabalhar e planear juntas". O caminho, disse-se em Itália, é por aí.