Rita Penela, in o Observador
A Finlândia está a aplicar um programa ambicioso de realojamento de sem-abrigo que está a fazer baixar os números no país. O primeiro passo foi transformar sem-abrigo em inquilinos.
Até à aplicação do novo projeto, o processo de atribuição de casas a sem-abrigo era semelhante àquele que é usado na maior parte dos países: há que cumprir várias etapas até que lhe seja atribuída uma habitação. Agora a equação inverteu-se e estão a ser atribuídas casas a sem-abrigo que, através de contratos, se transformam imediatamente em inquilinos.
Juha Kaakinen é o responsável pela Y-Foundation, a fundação que atribui as casas e faz o acompanhamento dos sem-abrigo que são realojados, também através da atribuição de subsídios, sempre que a situação justifique. Para Juha Kaakinen era “necessária uma mudança radical” para que se passasse a assistir à diminuição do número de sem-abrigo nas ruas.
“Tínhamos que nos livrar dos abrigos noturnos e dos arrendamentos de curto prazo em hostels que fazíamos na altura. Havia um longo historial na Finlândia de processos desse tipo e todos podiam constatar que não era suficiente para retirar as pessoas das ruas. Decidimos inverter as suposições”, disse o responsável citado pelo The Guardian.
Com o apoio estatal foram construídos novos blocos de apartamentos e os abrigos temporários que existiam foram transformados em casas “confortáveis”, num investimento de mais de 250 milhões de euros. Desde 2008 foram já criadas 3500 casas e o número de sem-abrigo na Finlândia desceu mais de 35%. Na capital do país sobraram apenas 50 camas em abrigos noturnos.
Além de uma casa, os novos inquilinos têm também direito a apoios a nível social. Num dos exemplos, Rukkila, há lugar para 21 pessoas, 17 em estúdios e quatro nos dois apartamentos T2, que são apoiadas pela comunidade. Os apartamentos encontram-se nos 1.º e 2.º andares do edifício enquanto no rés-do-chão estão as infraestruturas que são partilhadas: cozinha e ginásio, por exemplo.
Uma das assistentes no projeto, Saara Haapa explica que o apoio prestado abrange várias áreas, como a orientação com a burocracia, o acesso à educação, a reaprendizagem das tarefas básicas do dia a dia, seja cozinhar ou fazer limpezas. “Muito do trabalho envolve conversar”, esclarece, explicando que tudo se torna mais fácil de abordar “quando se está envolvido a fazer alguma tarefa”.
Antes que o contrato de arrendamento se torne definitivo os inquilinos passam por um período de transição de “três meses”. Os contratos são permanentes e só serão quebrados se as regras forem infringidas ou a renda não for paga. A maior parte dos inquilinos fica durante sete anos ou mais, outros deixam os apartamentos ao fim de um ano ou dois.
Tatu Ainesmaa, um dos sem-abrigo que conseguiu um contrato de arrendamento num dos apartamentos diz que o projeto “é um milagre”. “Nunca tive a minha própria casa, isto é enorme para mim”, disse Tatu depois de explicar que quase todas as noites da sua vida viveu entre o sofá do irmão e abrigos onde também estavam toxicodependentes.
Em Helsínquia há 60 mil unidades de habitação social. Um em cada sete habitantes locais vive em casas que pertencem à cidade que administra a sua própria construtora e impõe limites à construção privada. O setor privado não pode ultrapassar os 45%, 25% são reservados a habitação social (sem teto máximo de renda) e 30% a compra subsidiada sendo que não pode haver diferenças visíveis no exterior dos edifícios que permita a sua distinção.