24.10.22

Pobreza: inflação está a ‘encolher’ salário mínimo de €705 para €639 por mês

Raquel Albuquerque, in Expresso

Portugal tem pela frente a meta de retirar 600 mil pessoas da situação de pobreza até 2030. Mas a inflação, que chegou quando ainda muitos tentavam resolver o impacto da pandemia, veio agravar a situação. Esta segunda-feira assinala-se o Dia Internacional para a Erradicação da Pobreza

Com o peso da inflação, quem recebe o salário mínimo de 705 euros por mês vê agora esse rendimento encolhido para €639. Não fica muito distante do limiar de pobreza (€554) e é bastante escasso para pagar as despesas básicas, como uma renda, água, luz e gás, além de alimentação e transportes, mostram os dados partilhados pela Pordata esta segunda-feira, quando se assinala o Dia Internacional para a Erradicação da Pobreza.

O cenário é ainda mais duro para quem recebe uma pensão mínima de velhice e invalidez (€278,05) e que vê o seu poder de compra descer para €252 mensais. É essa a realidade perante a inflação de 9,3% em setembro, segundo os dados do INE.

"Os números da pobreza em Portugal, ainda que sejam atenuados com muitos apoios sociais e medidas do Governo, não deixam de refletir vidas com muitas dificuldades económicas", sublinha Luísa Loura, diretora da Pordata.

Segundo os dados mais recentes da pobreza em Portugal, referentes a 2020, cerca de 18,4% dos portugueses viviam em risco de pobreza por terem menos de 554 euros mensais. São 1,9 milhões de pessoas. E a pandemia agravou a situação, tanto a nível da pobreza como das desigualdades.

“É CONFRANGEDOR”

Os dados partilhados pela Pordata mostram que, em 2021, 72% dos pensionistas de velhice e 87% dos pensionistas de invalidez viviam com menos do que o salário mínimo nesse ano (€665). E é já claro que a pandemia agravou a pobreza entre os mais idosos, embora os grupos mais afetados sejam as famílias com filhos, os desempregados e as crianças.

Quando muitos portugueses estavam ainda a recuperar dos efeitos económicos da pandemia, com despesas que ficaram por pagar, a inflação veio piorar o cenário, sobretudo para quem vive com salários já muito baixos. “Quando olhamos para os rendimentos em 2020, com base nas declarações de IRS, a repartição pelos escalões é confrangedora”, refere Luísa Loura.

Dos quase 5,5 milhões de agregados familiares com declaração de IRS em 2020, cerca de duas em cada cinco famílias vivem, no máximo, com €10.000 por ano. “Por outras palavras, perto de 40% dos agregados familiares auferiam aproximadamente €833 mensais”, aponta a Pordata.

PORTUGAL COM A 8.ª PIOR TAXA

Em 2021, Portugal passou a ser o 8.º país da União Europeia com maior percentagem de população em risco de pobreza ou exclusão social (22,4%), um indicador europeu, mais abrangente, que inclui as pessoas que vivem com menos de €554 mensais, as que estão em situações de privação material ou com vínculos frágeis com o mercado de trabalho.

Os 22,4% da população portuguesa nessa situação superam a média europeia (21,7%). Roménia, Bulgária, Grécia, Espanha, Letónia, Itália e Lituânia são os únicos países com um cenário pior do que o de Portugal.

Consciente das metas assumidas perante a União Europeia no sentido de tirar 660 mil pessoas da pobreza em Portugal até 2030, o Governo aprovou em dezembro do ano passado a Estratégia Nacional de Combate à Pobreza. Contudo, até então, apesar de algumas das medidas propostas terem já avançado pontualmente, não foi definida qualquer comissão de acompanhamento nem se conhece qualquer indicador de monitorização da Estratégia.