Ricardo Dias Felner, in Jornal Público
O Governo sugeriu que a interrupção da regularização de trabalhadores estrangeiros ilegais se devera a advogados sem escrúpulos. O bastonário Rogério Alves reagiu com violência
O bastonário da Ordem dos Advogados, Rogério Alves, classificou ontem a justificação dada pelo Ministério da Administração Interna (MAI) para interromper a legalização de imigrantes, no âmbito da nova lei de estrangeiros, como alusões "genéricas, imprecisas e infelizes" contra os advogados.
O MAI, através do secretário de Estado adjunto da Administração Interna, José Magalhães, comentando a notícia de anteontem do PÚBLICO (Governo trava legalização de imigrantes após avalancha de candidaturas), avançou que essa decisão se devera a "indícios da existência de pessoas que, enganosamente, procuraram difundir e influenciar imigrantes no sentido de os convencer de que o artigo 88º permitiria requerer ao Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) a sua regularização extraordinária", referiu à Lusa o governante.
No dia anterior, já um argumento parecido havia sido aventado ao PÚBLICO pelo chefe de gabinete de José Magalhães, que invocara a existência de "intermediários inescrupulosos" que estariam a "veicular a ideia de que a lei", afinal, abria "portas para uma regularização extraordinária".
Na resposta, Rogério Alves - assim como outros advogados e dirigentes associativos contactados pelo PÚBLICO - admitiu que o Governo se referia aos advogados. E contrapôs: "Não se entende a justificação dada pelo MAI, porquanto também não se entende que a falta de escrúpulos de alguns, não identificados, possa impedir o normal funcionamento do processo de legalização". E acrescentou: "Isto parece ser antes atribuível à incapacidade dos serviços de acolherem e tratarem os pedidos que lhes são dirigidos".
Para o bastonário, "se intermediá-rios sem escrúpulos, advogados ou outros, violam leis ou regras legais, eles devem ser detectados e julgados". Rogério Alves considera que o MAI, em vez de tomar esta atitude, fez "alusões genéricas, imprecisas e infelizes, pela sua arbitrária generalização". "Os advogados são uma profissão séria e de gente séria", afirmou.
As acusações a advogados que enganam imigrantes com promessas irrealizáveis de legalização são antigas e já geraram processos-crime, existindo escritórios a cobrar mais de mil euros por estes serviços.
Heliana Bibas, da Casa do Brasil, garante que "sabe de muitos casos". E esta prática é indicada por outros responsáveis ligados ao meio. Sucede que, também para a dirigente brasileira, esta não foi a verdadeira causa da suspensão das legalizações, decidida há duas semanas pelo Governo. "O que sucedeu é que houve uma avalancha de pessoas a ir aos serviços e o SEF não conseguiu lidar com a situação. Os imigrantes criaram expectativas legítimas de legalização, o que é normal e foi, aliás, motivado pelo Governo", observou.
A nova lei da imigração entrou em vigor no dia 3 de Agosto e logo nos primeiros dias os serviços e as linhas telefónicas de apoio aos imigrantes do SEF bloquearam, tendo sido cancelados novos atendimentos.