Por Cristina Lai Men, in TSF
No primeiro relatório sobre a equidade na saúde, a OMS alerta que as diferenças agravaram-se, em algumas regiões. Quem vive em zonas pobres e tem menos instrução, arrisca-se a morrer mais cedo.
As mulheres com menos anos de escolaridade podem morrer até sete anos e meio mais cedo do que aquelas com maior grau de instrução. Nos homens, a diferença é ainda maior. No pior cenário, os homens com menos anos de escola podem morrer entre três a 15,5 mais cedo do que quem tem mais estudos.
A conclusão surge no primeiro relatório da Organização Mundial da Saúde (OMS) sobre a equidade no setor, divulgado esta terça-feira. O documento revela que apesar das medidas adotadas pelos governos europeus, as desigualdades na saúde não melhoraram. Em alguns casos, houve mesmo um agravamento.
A coordenadora do estudo, Christine Brown, lembra que "aqueles que estão a morrer mais cedo, pagaram impostos e contribuíram para o sistema de pensões, mas não chegam a beneficiar do investimento que fizeram. Já os que têm mais recursos e que vivem mais tempo, vão ter esse benefício. Por isso, é também uma questão de justiça social".
O relatório realça que o lugar onde se nasce e se vive pode ter impacto logo nos primeiros anos de vida. A taxa de mortalidade infantil em 35 dos 53 países analisados mostra que nas zonas mais pobres, morrem mais 41 bebés em cada mil logo no primeiro ano de vida. Christine Brown admite que os investigadores ficaram "bastante chocados com os resultados. E não são apenas os bebés. Em quase 75% dos países analisados, a diferença entre a esperança de vida entre as regiões mais e menos desfavorecidas não mudou na última década e em alguns casos, a situação agravou-se".
As disparidades verificam-se entre conjuntos de países. Questionada pela TSF, a coordenadora da OMS para o investimento na saúde e desenvolvimento na Europa destaca que em Portugal e noutros países do sul da Europa, "as mulheres com rendimentos mais baixos apresentam os níveis mais elevados de uma saúde mental fraca".
As desigualdades acentuam-se à medida que os europeus envelhecem. O risco de doenças cardiovasculares, diabetes, tabaco e obesidade é maior nas classes mais desfavorecidas e há grupos em maior risco: os jovens que abandonam a escola mais cedo estão mais sujeitos a doenças mentais e à pobreza, devido à insegurança no mercado de trabalho e por enfrentarem mais períodos de desemprego. Christine Brown avisa que "é assunto que temos de levar muito a sério, porque existe um risco de uma epidemia no futuro. Existe um grupo invisível de pessoas que são os trabalhadores pobres".
Para reduzir as desigualdades, a OMS defende medidas em cinco áreas consideradas críticas:
- Segurança e protecção social;
- Condições de habitabilidade, que incluem por exemplo, a iluminação das ruas, mais espaços verdes, incentivos para senhorios e inquilinos para melhorar o aquecimento das casas;
- Capital social e humano, relacionado com o isolamento, a desconfiança ou a violência contra as mulheres;
- Acesso e qualidade dos cuidados de saúde;
- Emprego e condições de trabalho, no qual se incluem o aumento de salários, a redução de stress, o fim das horas excessivas de trabalho e a redução do trabalho precário.
Christine Brown salienta que "não estamos a dizer que as diferenças vão desaparecer totalmente em quatro anos. O que dizemos é que num tempo médio de duração de um governo, podemos assistir a uma redução das desigualdades entre o topo e os que estão no fundo da tabela". As contas são feitas no relatório: "o investimento de 1% do PIB na protecção social, no mercado de trabalho, na habitação social, num país de 3 milhões de pessoas representa uma melhoria de vida para 10 mil vidas, em quatro anos. Num país de 144 milhões de pessoas, são meio milhão de vidas e creio que em Portugal, para uma população de 10 milhões e 300 mil pessoas, a melhoria de vida com esse investimento de 1% do PIB, beneficiaria 40 mil pessoas".