Por Hugo Rodrigues, Sul informação
Os números não mentem, mas, por vezes, podem ser enganadores. Loulé é, sem dúvida, um concelho rico e os seus indicadores económicos colocam-no no topo das listas nacionais, neste campo. Mas para o jornalista Idálio Revez, que nasceu e vive no barrocal louletano, há também um lado pobre no concelho, no que à economia diz respeito, o seu vasto território interior, onde as assimetrias persistem e se agravam.
No fundo, há dois concelhos, um que anda nas bocas do mundo, com empreendimentos turísticos, grande geração de receitas e uma economia pujante, situado junto ao litoral. O outro, que até é bem mais vasto em termos territoriais, está esquecido e à espera de soluções que teimam em não chegar.
Partindo dos dados fornecidos pela Pordata e resumidos na infografia que publicamos acima, o Sul Informação pediu ao jornalista do «Público» que fizesse um retrato do concelho de Loulé, onde nasceu e sempre viveu.
«As assimetrias entre o litoral e o interior são brutais e até aqui não tem havido políticas que permitam inverter esta situação», defendeu Idálio Revez.
Na visão deste louletano, o «grande problema de Loulé é de ordenamento do território». «O concelho não pode ser visto pela curta faixa de litoral, que representa menos de um terço do território. Não se pode fazer políticas a pensar naquela zona que, para quem olha do exterior, é a mais rica, do ponto de vista económico direto. Loulé tem de ser visto como um todo», considerou.
Para alguém como Idálio Revez, que sempre viveu na aldeia de Querença, no barrocal, a visão de que a riqueza de Loulé está apenas na sua faixa litoral e nos empreendimentos turísticos de luxo não podia ser mais errada. Isto porque, «se por um lado, temos uma grande pujança turística [no litoral], o interior dá-nos aquilo que o litoral já não tem: a qualidade ambiental e de vida».
A solução passa, acredita, pela tomada de «medidas concretas de afirmação dos territórios de baixa densidade». Lembra, inclusivamente, que houve uma altura em que a riqueza de Loulé se concentrava, em grande medida, no interior do concelho. «Se recuarmos pouco mais de meio século, verificamos que a freguesia do Ameixial, que fica bem no interior, junto à fronteira com o Alentejo, tinha mais população do que Quarteira», recordou.
«O diagnóstico é conhecido, resta aplicar a terapia necessária para debelar esta “doença”, que também traduz as políticas dos nossos tempos: o que dá lucro imediato chama a atenção dos poderes instituídos, o que não dá lucro é visto como o quintal de quem tem de gerir os destinos de um concelho ou de um país», resumiu.
Ainda assim, Idálio Revez não tem dúvidas em afirmar que Loulé é um concelho em crescimento, após analisar os dados da Pordata.
«Em 2015 [ano a que se reportam os dados], ainda estávamos a viver o período da recessão, o país estava sob uma grande incerteza. Mas, apesar desse contexto depressivo, quer do ponto de vista psicológico da população, quer da economia, estes números indiciam que Loulé é um concelho em expansão», afirmou.
Isso reflete-se no aumento do número de empresas, algo que é mais percetível «na área tecnológica». «A zona industrial de Loulé e o crescimento que tem conhecido é um exemplo da dinâmica empresarial do concelho», considerou.
«Apesar de ter sentido muito o efeito da crise, Loulé acabou por ser aquele concelho que mais se aguentou, a nível regional. É preciso não esquecer que foi um dos municípios que esteve sob assistência económica [ao abrigo do PAEL – Plano de Apoio à Economia Local], mas também foi o primeiro a amortizar a dívida ao Estado. Isto traduz a dinâmica económica de Loulé», disse.
Agora, há que encontrar forma de levar esta dinâmica ao interior do concelho. Algo que não é uma utopia, na visão de Idálio Revez, como prova a crescente procura de casas no barrocal e na serra por parte de cidadãos estrangeiros.
«Com as novas tecnologias, hoje pode-se trabalhar à sombra de um alfarrobeira ou de uma sobreira e estar ligado ao mundo, com qualidade de vida. E pode-se ir tomar banho no pego na Fonte da Benémola, sem deixar de estar perto da cidade e da praia», ilustrou.
No fundo, é precisamente isto que o jornalista do «Público» faz. Apesar de admitir que Querença tem vantagens únicas, por se encontrar «a dez minutos de Loulé», esta aldeia não deixa de estar à beira-serra e de sofrer dos mesmos males que outras congéneres do interior do concelho, como o envelhecimento da população e a desertificação.
Ainda assim, tem sido possível criar aqui dinâmicas próprias. Basta olhar para a Fundação Manuel Viegas Guerreiro, ali sediada, e de cujos corpos diretivos Idálio Revez faz parte, mas também para a crescente procura turística, que acontece ao longo de todo o ano e não apenas no Verão.
Tendo em conta que já há quem venha de fora para conhecer o interior de Loulé, o que falta, acredita, «é a vontade de comunicar as potencialidades que o concelho tem». E essas potencialidades passam, também pelo setor turístico, ainda que por formas diferentes de encarar esta atividade económica. Mas continua a ser difícil encontrar gente com visão para as aproveitar.
«Acho que devem ser os poderes públicos os catalisadores dessa mudança de mentalidade. Têm de ter a capacidade de comunicar para o exterior o que verdadeiramente representa um concelho que podia ser exemplar na Europa das regiões», disse.
NOTA: O Sul Informação está a publicar uma série de 16 artigos denominada «Raio-X dos Concelhos», dedicados a cada um dos 16 municípios algarvios.
As infografias, desenvolvidas pelo nosso jornalista multimédia Nuno Costa, usam dados estatísticos da Pordata.
As pessoas escolhidas para comentar os dados em cada um dos concelhos não estão, tanto quanto possível, ligadas a partidos políticos e residem, têm negócios, trabalham ou nasceram nos municípios em causa.