Paulo Lourenço, in "Jornal de Notícias"
Cães são treinados para ajudar pessoas com paralisia, diabetes, epilepsia e meninos autistas. Ajudam em tarefas do dia a dia e já salvaram algumas vidas.
"O Sinatra está doente. Sente picadas no corpo, dói-lhe a cabeça e às vezes a barriga". O Sinatra é um labrador de seis anos e o diagnóstico é feito pelo Miguel, um menino de quatro anos. Os sintomas que descreve são, porém, aqueles com que ele próprio se debate. Portador de autismo, sente grandes dificuldades na comunicação e, até há pouco tempo, nas consultas recusava-se a explicar aos médicos o que sentia. Agora, exprime-se através do cão, uma espécie de alter ego de quatro patas, em que projeta toda a sua vida. "É a ponte entre dois mundos. O dele e o nosso", resume a mãe, Mafalda Vaz.
Sinatra é um dos três cães de assistência treinados e certificados pela Associação Portuguesa de Cães de Assistência (APCA) e já distribuídos aos respetivos donos. Mais oito estão em treino e, em lista de espera, há mais de 350 interessados.
A APCA é a entidade em Portugal que certifica cães de assistência na área de "Medical Dogs", animais que apoiam pessoas com problemas de diabetes, mobilidade reduzida, epilepsia ou autismo.
No caso de Miguel, o Sinatra já pertencia à família, teve de receber apenas treino em obediência e espaço público, antes da respetiva certificação, que lhe garante o acesso a todos os locais públicos.
"Graças a isto, Miguel conseguiu ficar internado no hospital, deixou-se observar, tirar sangue e até comeu a comida que era fornecida, tudo coisas que eram totalmente impossíveis antes"
"Graças a isto, Miguel conseguiu ficar internado no hospital, deixou-se observar, tirar sangue e até comeu a comida que era fornecida, tudo coisas que eram totalmente impossíveis antes", conta ao JN o pai, Daniel Vaz. A ligação é tão profunda que o menino hoje até já vai ao cinema e treina numa escola de futebol. Sempre com o Sinatra ao lado. Uma história de amor entre um menino e um cão que lhe permitiu abrir portas de um mundo que, devido ao seu problema, parecia totalmente inacessível.
Nina, a cadela que abre janelas
O JN visitou também Diana Niepce, de 30 anos, bailarina e acrobata, que em 2014 sofreu um acidente que a atirou para uma cadeira de rodas. A jovem, moradora em Lisboa, é acompanhada diariamente pela Nina, uma cadela de raça weimaranter, que a ajuda em tarefas do dia a dia. "Dá-me uma segurança e apoio enormes. Ela ajuda a despir-me, tira-me o casaco, as meias, vai buscar-me a cadeira de rodas, abre-me e fecha-me janelas e apaga ou acende as luzes. Além disso, se eu cair, ela ajuda-me a levantar-me, deixando que me apoie sobre o seu corpo", descreve.
"Ela ajuda a despir-me, tira-me o casaco, as meias, vai buscar-me a cadeira de rodas, abre-me e fecha-me janelas e apaga ou acende as luzes."
Rui Elvas, presidente da APCA, conta ainda o caso de uma criança diabética que sofreu uma hipoglicemia grave na escola e que foi salva pelo cão de assistência: "Estavam 17 pessoas na sala e ninguém se apercebeu até o animal dar o alarme. Foi no momento certo".
"Criámos a associação, porque havia muitos interessados neste tipo de apoio e não havia ninguém que treinasse e certificasse estes cães", descreve Rui Elvas.
Um cão de assistência leva, em média de um e meio a dois anos a preparar. Além da especificidade da sua função, todos recebem treino em obediência e espaço público.
A aquisição, treino e certificação pode custar entre cinco e 15 mil euros, sendo que a maioria dos interessados não tem esta disponibilidade financeira.