2.3.16

Sérgio Aires: “Não chegam 100 Fundações Montepio para cobrir os buracos da proteção social”

in Montepio

Sérgio Aires, presidente da Rede Europeia Anti-Pobreza (EAPN), lamentou hoje a falta de respostas do Estado relativamente à proteção social, criticando a transferência dessa responsabilidade para os privados. Falando na conferência que celebra os 20 anos da Fundação Montepio, o responsável alertou que “os buracos da proteção social são tão grandes que não chegam 100 Fundações Montepio para os cobrir”.

“A responsabilidade do Estado antes de mais nada”, defendeu Sérgio Aires, presidente da Rede Europeia Anti-Pobreza (EAPN) desde 2002, na conferência comemorativa dos 20 anos da Fundação Montepio que decorre hoje, no auditório do Montepio, alertando que os “espaços vazios agigantaram-se muito nos últimos anos e, portanto, os buracos da proteção social são tão grandes que não nos chegam 100 Fundações Montepio para os cobrir”.

Sérgio Aires aproveitou a ocasião para manifestar o seu desejo de que “houvesse mais responsabilidade social do Estado, criticando, ao mesmo tempo, aqueles que pensam que “toda a proteção social pode ser privada, que a água pode ser privada”.

O responsável enalteceu também o papel das fundações, e, em particular, o da Fundação Montepio, no atual contexto de crise económica e financeira e de recuo do investimento na proteção social, em termos europeus e no panorama nacional, em que “alguma parte da intervenção social foi considerada um luxo, porque as prioridades foram outras e a emergência foi muita”.“As fundações têm servido de motor de arranque, em muitos casos, e de lubrificador, noutros, cumprindo um papel crucial num momento complexo, desde as iniciativas mais básicas, até às que estão debaixo do grande guarda-chuva da inovação social que se tornam hoje muito visíveis”, reconheceu.

No entanto, para Sérgio Aires, “era preferível que a nossa proteção social não estivesse ameaçada, que algumas coisas que a Fundação Montepio está a apoiar e a dinamizar não fossem necessariamente assim, porque quereria dizer que estaríamos num modelo de desenvolvimento das nossas sociedades muito mais sustentável”. “No caso português, em particular, tem sido muito importante que haja instituições desta natureza”, destacou.

Na ótica do também diretor do Observatório de Luta Contra a Pobreza na Cidade de Lisboa, o grande desafio na área da proteção social é fazer com que aquilo que é dinamizado pelas fundações, influencie as políticas públicas e a formatação de novas respostas aos novos problemas. “Aquilo que se faz enquanto experiência, que tentamos aprender em determinados contextos, deve depois ser transferido ou para a responsabilidade do Estado ou então ter continuidade noutras esferas da nossa sociedade. Experimentar, formatar ideias e modelos para depois serem generalizados. Este é um grande desafio”, rematou.

Sobre a temática da pobreza, Sérgio Aires considerou importante demonstrar quais as suas verdadeiras causas. “Temos uma parte substancial dos nossos cidadãos a acreditar que ser pobre é derivado a características individuais: má sorte, ter nascido pobre, castigo divino. Explicações que não têm fundamento nenhum. Isto tem sido parte do problema”, disse.

É precisamente essa ideia de que a pobreza é inata que está na base do menor investimento nesta área de intervenção, quando comparado com outras áreas, como a deficiência e o envelhecimento. Contando uma conversa que teve com alguém sobre o motivo pelo qual a área da deficiência foi sempre acarinhada, o comentário foi: “É que deficiente, particularmente físico, ainda pode acontecer a qualquer um de nós, por um infortúnio. Cigano, já não, já se nasce”.
Sergio Aires
Saiba mais sobre Sérgio Aires

Sérgio Aires é Presidente da Rede Europeia Anti-Pobreza (EAPN) desde 2012 (reeleito em 2015), é ativista desta associação deste 1994. Simultaneamente, é diretor do Observatório de Luta Contra a Pobreza na Cidade de Lisboa. Anteriormente, o sociólogo assumiu ainda funções como Coordenador Técnico da EAPN Portugal e Coordenador Nacional da Rede Europeia SASTIPEN (Saúde e Comunidade Cigana).