31.10.14

Saúde com bom senso

in CM-Gaia

A Câmara Municipal de Gaia assinou com 41 farmácias um protocolo de distribuição gratuita de medicamentos a famílias carenciadas do concelho, e um outro destinado à atribuição de vacinas de rotavírus (gastroentrite) e pneumocócica a crianças até aos dois anos de idade. O Município concedeu ainda uma redução de 10% em taxas de publicidade às farmácias aderentes.

"É justificável dizer às farmácias que podemos não dar nada, mas pelo menos não vamos tirar tudo. É um reconhecimento justo. Hoje é um dia feliz pois, numa área fundamental que é o apoio social, mostramos que temos de deixar de carpir mágoas e estamos prontos a assumir o objetivo ativado de ir ao encontro aos problemas dos cidadãos, e tentar soluciona-los", salientou Eduardo Vítor Rodrigues, Presidente da Câmara Municipal, na sua intervenção.

Na cerimónia, que decorreu no Salão Nobre dos Paços do Concelho, Eduardo Vítor Rodrigues anunciou a intenção do Município em estabelecer a imagem de bom pagador na praça pública, e também a criação de um "portfólio de incentivos" a empresas que se instalem, ou reforcem a sua posição em Gaia. Benefícios em sede de DERRAMA, isenção total e/ou parcial de licenciamentos e redução de taxas de resíduos sólidos e de publicidade são algumas das medidas definidas no portfólio.

"Queremos incentivar as empresas a instalarem-se em Gaia. Não só porque tem boas condições, não só porque é um concelho bonito e com boas acessibilidades, mas também porque temos uma posição agressiva no que diz respeito ao tecido empresarial", explicou o Presidente da Câmara Municipal.

Para beneficiar dos protocolos, os cidadãos têm de ser previamente sinalizados por uma IPSS, ou pela respetiva Junta de Freguesia. No caso da vacinação - ambas as vacinas não fazem parte do Plano Nacional de Vacinação - o protocolo é universal, e abrange todas as crianças residentes no concelho nascidas em 2013 ou 2014.

Pais responsáveis por 45% dos casos de maus tratos a crianças até seis anos

Romana Borja-Santos, in Público on-line

Instituto Nacional de Medicina Legal examinou 279 casos de maus tratos a crianças em três anos. De bofetadas a queimaduras com cigarros, foram muitos os exemplos das agressões levadas a cabo pela família.

Bofetadas, agressões com objectos, empurrões ou mesmo queimaduras com cigarros. Estes são apenas alguns dos exemplos dos 279 casos de maus tratos a crianças com menos de seis anos que chegaram ao Instituto Nacional de Medicina Legal e Ciências Forenses (INMLCF) entre 2011 e 2013. Quase sempre, em mais 45% das situações, o alegado agressor foi um dos pais da vítima. Os dados fazem parte de um estudo antecipado ao PÚBLICO, coordenado pelo vice-presidente deste instituto, João Pinheiro, e que será apresentado nesta sexta-feira em Coimbra, no último dia da I Conferência do INMLCF.

O trabalho Maus tratos infantis e morte em Portugal: estudo retrospectivo de três anos, realizado por João Pinheiro com o apoio de Júlio Barata e Rosário Silva, também da Delegação do Centro do INMLCF, permite perceber que o número de casos de ofensas a crianças até aos seis anos que chegaram ao instituto em 2013 mais do que duplicou em relação a 2011. Nesse ano foram feitos 59 exames, um número que aumentou para 83 em 2012 e para 137 no ano passado – o que representa um crescimento de 130% no período em análise. “E estes números não traduzem o fenómeno dos maus tratos em Portugal, são apenas o resultado das crianças que vêm a exames nas nossas estruturas na sequência de uma queixa ou de uma denúncia”, sintetiza o também director da delegação do Centro do Instituto.

João Pinheiro esclarece, contudo, que “na literatura existem diversas definições sobre maus tratos, e o que foi seguido neste trabalho foi o critério que a lei determina”, numa referência ao que o Código Penal estipula como ofensas à integridade física simples ou grave, à violência doméstica e aos maus tratos. O médico legista ressalva também que o aumento de casos ao longo dos anos não é necessariamente sinal de que existam “mais crimes contra a integridade física, podendo igualmente significar que há mais gente a denunciar e que os serviços estão mais eficazes, como aliás também se passa com a violência doméstica”. “Mas a sinalização ainda é, de todas as formas, insuficiente”, adverte, atribuindo parte do problema à dispersão das vítimas por várias entidades.

Sobre as 279 situações registadas nos três anos, o médico legista salienta que “em 11 casos não foi possível documentar as lesões, pelo que fica por esclarecer se foi falso alarme”. Numa outra base de dados, referente às autópsias, foram ainda identificadas seis vítimas mortais com menos de seis anos e cuja causa da morte é atribuível a maus tratos como asfixia, intoxicação e lesões traumáticas, que o médico reforça que são as situações que retratam o lado mais “extremo e definitivo” destes crimes. “Há quase duas crianças que por semana, em média, vêm aos nossos serviços a exame por suspeita de maus tratos”, um número que preocupa João Pinheiro, mas que ainda assim representa menos de 1% do total de exames por agressão que o INMLCF tem de fazer no âmbito do direito penal.

Em termos de idades, em 18,6% dos casos as crianças tinham menos de um ano, em 22,9% tinham entre um e dois anos e em 21,9% já tinham entre três e quatro anos na data da agressão. No estudo, João Pinheiro procurou também perceber qual era a distribuição dos casos quanto à relação da vítima com o alegado agressor, esclarecendo que utiliza a palavra “alegado” por “em rigor não podermos dizer que foram os pais que bateram ou outra pessoa qualquer. São alegados agressores pois só se pode afirmar de forma segura depois de o tribunal determinar, ainda que nos casos das crianças a correspondência seja quase de 100%”. Da experiência do médico, os casos que se acabam por revelar errados dizem normalmente respeito a situações de divórcios complicados “em que os pais instruem os filhos para dizer que o outro lhes bateu”.

Ainda assim, a base de dados que suporta o trabalho indica que em 45,5% dos casos os pais das crianças terão sido os agressores e em 3,9% os padrastos ou madrastas. “Os progenitores masculinos são os que mais frequentemente agridem, o dobro das mães”, descreve João Pinheiro, referindo-se aos 30,5% de casos registados como sendo o pai o alegado agressor, contra 15% em que surge a mãe. Dados que, sublinha, “vão em sentido contrário ao que acontece em alguns países com estudos semelhantes, como os Estados Unidos, Finlândia, China e Chile, em que o acto é mais praticado pela mãe”. Registaram-se também 33% de casos com conhecidos, que em 20% das situações tinham uma relação familiar com a vítima, sendo na maior parte dos casos vizinhos, mas também avós, tios, irmãos e primos ou outros familiares não especificados. Há ainda 5,4% de situações atribuíveis aos cuidadores de crianças institucionalizadas e 12,2% a desconhecidos.

Em mais de 93% dos casos, completa João Pinheiro, “as ofensas foram contundentes, sendo que contundente significa tudo o que serve para bater”. “Mas numa queda, o cão chão também funciona como instrumento contundente”, exemplifica o especialista. Deste total, em 27,3% das crianças as lesões foram atribuídas a bofetadas, 20,8% a objectos variados, 20% a empurrões, 15,8% a “apertões, abanões, cotoveladas e puxões”, dizendo as restantes respeito a murros, pontapés, unhadas e mordeduras. Em 3,9% dos exames foram identificadas lesões feitas com objectos cortantes, 1,8% de queimaduras com cigarros e 1,1% de agressões com produtos tóxicos. “Embora os números sejam muito pequenos, as queimadoras são todas por cigarros, que quase se pode dizer que é tortura, mais do que maus tratos”, alerta o dirigente do INMLCF.

João Pinheiro diz que o contacto entre os médicos e os agressores é praticamente inexistente, seguindo um relatório para tribunal, que só chama os peritos em caso de dúvidas. Mas, em linha geral, as condenações dos agressores variam consoante se verifica uma ofensa à integridade física simples ou grave. “Uma fractura pode ser uma ofensa corporal simples se curar bem, mas também pode ser grave se tiver efeitos permanentes, como quando alguém parte uma perna e precisa de pôr uma prótese, ou fica com uma mutilação que a deixa desfigurada”, descreve. Em 90,3% dos casos analisados pelo instituto as agressões não tiveram consequências permanentes, mas houve 5,1% com consequências permanentes e 0,7% com perigo para a vida.

Os dados mais recentes da Comissão Nacional de Protecção de Crianças e Jovens em Risco (CPCJ), que constam do relatório anual relativo a 2013, indicam pelo contrário que os processos por maus tratos que chegam às CPCJ têm vindo a cair desde 2007, representando agora 5,5% do total, contra 8,9% há seis anos. Os maus tratos físicos que desencadearam a abertura de processos ocorreram na maioria dos casos em contexto de violência doméstica. Na maior parte das vezes as crianças tinham entre 11 e 14 anos (503 processos), e entre seis e dez anos (494 processos). Até aos seis anos – a mesma idade a que reporta o estudo do INMLCF – foram abertos 398 processos.

A conferência onde se insere este estudo, que começou na quinta-feira, em Coimbra, contou com mais de 450 inscrições para um total de quatro painéis, com 41 comunicações orais e 77 posters.

29.10.14

Henrique Pinto. O fundador da Cais que quer ilegalizar a pobreza

Por Rosa Ramos, in iOnline

Foi padre, viajou pelo mundo e fundou a "Cais". Quer criminalizar a pobreza e não há sem-abrigo em Lisboa que não o conheça. Aos 51 anos, nunca encontrou o amor

Há quem o acuse de perder tempo com utopias e até de viver noutro mundo. Os críticos não andam muito longe da verdade. Henrique Pinto, fundador da "Cais", é obcecado por impossíveis. Deixou a associação de apoio aos sem-abrigo em Junho e criou outra. A Impossible prepara-se para lançar uma petição pública para ilegalizar a pobreza. O objectivo é pôr o parlamento a discutir o fenómeno (ver texto secundário).

Nos 13 anos em que esteve à frente da "Cais" era raro o dia em que não saía à rua para falar com os sem-abrigo. Muitos continuam a telefonar-lhe, quase diariamente, para o telemóvel. Pedem-lhe coisas, contam como vai a vida, falam de projectos. "Os sem-abrigo têm sonhos que estão além do impossível", diz. Nos últimos dez anos, Henrique Pinto recebeu prémios das mãos de personalidades como Durão Barroso ou Martin Schulz - que o visitou duas vezes e elogiou o trabalho da associação. Quando pegou na "Cais", em 2002, era uma revista com uma dívida de 12 mil contos que às vezes já nem saía. As contas recuperaram, a "Cais" encontrou espaço e, nos últimos tempos, Henrique Pinto já conseguia viver do salário de director: cerca de 1300 euros por mês.


28.10.14

Itália quer abandonar missão de resgate a barcos de imigrantes

in Jornal de Notícias

As autoridades italianas estão a ponderar suspender a sua missão de resgate de embarcações com imigrantes, deixando o salvamento dos tripulantes unicamente a cargo da missão europeia, a ser lançada no próximo sábado.

Missão da União Europeia surge por receio que o número de vítimas mortais aumente, com a saída das equipas italianas.

Por seu lado, o Reino Unido anunciou, esta terça-feira, que não planeia apoiar a União Europeia no desenvolvimento destas operações de resgate, argumentando que vai criar um "efeito de atração" aos migrantes, incentivando-os a aventurarem-se nas perigosas travessias marítimas.

Os esforços da marinha e da guarda costeira italianas já salvaram este ano cerca de 150 mil homens, mulheres e crianças que tentavam chegar ao país vindos do norte de África.

A entrada em funcionamento da missão europeia "Triton" acontece numa altura em que tudo indica que a missão italiana "Mare Nostrum", criada há um ano, depois de dois naufrágios mortais, vá ser muito reduzida ou mesmo cancelada.

"A Mare Nostrum está a ser encerrada. Vai haver uma decisão formal durante uma das próximas reuniões do gabinete", disse recentemente o vice-primeiro ministro e ministro do Interior, Angelino Alfano.

No entanto, Alfano destacou que as duas operações são "totalmente distintas", já que a "Triton" vai permanecer em águas territoriais europeias e a "Mare Nostrum" resgata pessoas do Estreito da Sicília até à costa da Líbia.




Empurrado para a Europa

in RR

A noite vai alta e uma enorme massa preta funde o céu e o mar. À volta, o rugir de uma imensidão de água. O movimento constante do barco não permite focar os olhares que se cruzam no escuro, mas o medo é palpável como a borracha do barco que os separa do Mediterrâneo.

Nas primeiras horas daquela segunda-feira, algures no Outono de 2013, Samu tem mais de 90 pessoas à volta mas está sozinho. Durante os dois dias e duas noites que se seguem, ouve aquele som difuso de água e de gente a chorar, mas a sua cabeça não está ali. Tinha ficado presa às margens líbias.


Samu mede quase dois metros e tem uma estatura atlética. Joga futebol e é um espectador atento das equipas portuguesas - pergunta imediatamente pelo “FC Porto”. Os olhos e a voz denunciam um homem com uma história mais pesada que os seus 29 anos.

Quando saiu do Gana, em 2008, não imaginava que a viagem o levaria ao sul de Itália, algures no coração da ilha da Sicília. Fugiu do seu país “por causa de um problema pessoal” que diz que não pode contar e fez mais de 2.800 quilómetros até à Líbia. Passou lá cinco anos a trabalhar nas obras e foi assistindo a um agravamento da situação no país e a um consequente crescimento do perigo para quem tivesse a sua cor de pele.


Agora, "a Líbia é o sítio mais perigoso” que alguma vez conheceu. Os negros são o alvo preferencial para apontar a imensidão de armas envergadas por “pequenos rapazes e pessoas que não deveriam ter estas coisas nas mãos”.

Antes da revolução que virou o país do avesso em 2011 e que culminou na queda de Muammar Khadafi, Samu “dificilmente via um líbio pegar numa arma, porque eles tinham medo”. Depois do caos instalado, “muita coisa mudou”. “Podem disparar contra nós. Podemos estar a caminhar, sem fazer nada, e sermos espancados e vítimas de todo o tipo de tratamento. Se eu tirasse as minhas roupas, veria uma marca aqui nas minhas costas, feita com uma faca. Compreende?"

Samu repete a pergunta no fim de cada frase. “Compreende?” Como quem sabe que o que está a contar é de difícil apreensão para a bagagem de vida comum de um europeu.

Em meados de 2013, “não havia comida, não se podia sair à rua… E, no entanto, também não podia voltar à minha terra, porque tinha problemas lá”.

Samu foi-se deixando ficar enquanto tinha emprego. Quando se deu “o segundo momento mais triste” da sua vida, o episódio que o fez fugir de novo, ainda trabalhava nas obras, numa casa em El Agheila, uma pequena cidade na costa líbia, virada para o Mediterrâneo, a 650 quilómetros de Trípoli.

Nunca chegaram ao supermercado. Samu conseguiu fugir e pedir ajuda ao “mudir”, o patrão da obra na qual estava a trabalhar. O amigo estava morto por causa de uns trocos.

Passaram uns dias. “Já tínhamos quase terminado o trabalho naquela casa em El Agheila e aqueles rapazes foram lá à minha procura”. Samu estava aterrorizado. Nessa mesma noite, o “mudir” meteu-o num carro e levou-o para “um lugar onde havia muitas pessoas”. Trocou umas palavras que Samu não compreendeu “com umas pessoas que estavam armadas” e que o mandaram sentar junto dos outros.

“Pensei que me iam matar e estava com medo. O ‘mudir’ disse-me para ficar ali, que ele regressaria. Não sabia de nada. Duas ou três horas depois disseram que tínhamos todos de ir. Era perto do mar. Estava lá um barco e pediram a toda a gente para entrar. Não podia recusar, porque estava com muito, muito medo."

Samu não sabe se o patrão pagou para que ele tivesse um lugar naquele “barco de borracha”. Passou dois dias no mar sem saber bem para onde ia e acabou por ser salvo “por um barco muito grande”.

“Deram-nos o pequeno-almoço, água e um sítio para nos lavarmos. Como estávamos muito cansados, puseram-nos num sítio para dormir. Eu não consegui, porque ainda estava a pensar no que tinha acontecido antes de aqui chegar. Estava a pensar na minha vida e no meu amigo, que foi atingido e morto por aqueles rapazes”.

Um dia depois estava a desembarcar na Sicília. Foi directamente para o Centro de Acolhimento para Requerentes de Asilo (CARA) de Mineo, onde está há quase um ano. Nunca tinha planeado vir para a Europa.

Samu aponta para a professora de italiano, parada à porta da sala onde conversamos, a fitá-lo com olhos de pressa. A entrevista já lhe roubou mais de meia hora de aula e cada minuto a aprender essa língua “difícil” é mais um passo em direcção a uma nova vida.

A prioridade, agora, é ser aceite como refugiado. “Depois de ter os documentos, posso continuar a estudar, posso fazer muitas coisas”. Pode até retomar os planos que tinha quando acabou o ensino secundário, no Gana, para se tornar “um economista muito bom”.


Seis anos depois de a vida lhe ter trocado as voltas, Samu voltou a sonhar.

Falta de literacia financeira dificulta escolhas acertadas

Por Margarida Vaqueiro Lopes, in iOnline




O Plano Nacional de Formação Financeira nasceu em 2011. Reguladores querem mais e melhor literacia financeira em Portugal




A falta de literacia financeira é um problema que se tem arrastado em Portugal durante as últimas décadas. Muitas são as pessoas que ainda têm dificuldade em entender alguns conceitos aplicados pelos bancos, por exemplo, condição indispensável para fazer escolhas acertadas e responsáveis.

Foi neste contexto que em 2011 o Conselho Nacional de Supervisores Financeiros decidiu lançar o Plano Nacional de Formação Financeira (PNFF), um instrumento que, nas palavras dos seus responsáveis, quer "contribuir para elevar o nível de conhecimentos financeiros da população e promover a adopção de comportamentos financeiros adequados". Desta forma, espera-se, população e sistema financeiro ganham com atitudes mais conscientes e responsáveis.

O PNFF tem como plataforma base o site www.todoscontam.pt. Neste portal é possível encontrar ajuda para alguns gestos essenciais, como planear o orçamento familiar, fazer pagamentos, poupar e investir, fazer um seguro e mesmo para criar uma empresa.

Vários simuladores podem ajudá-lo se quiser calcular a sua taxa de esforço, os seus rendimentos e despesas, ou mesmo se quiser saber quanto deve poupar por mês para chegar a um determinado objectivo.

Mas o PNFF também o pode ajudar a prevenir a fraude e a esclarecer dúvidas sobre produtos de investimento, além de apoiar entidades quer do sector público quer do sector privado que promovam iniciativas de formação financeira. E não são poucas as entidades que têm criado programas nesta áreas. Todos os bancos têm já programas - por norma apoiados em portais na internet - que ajudam a esclarecer dúvidas e a aprender conceitos relacionados com literacia financeira. Muitas das acções são também desenvolvidas junto dos mais novos, uma vez que se acredita que na infância é mais fácil criar hábitos e rotinas de poupança ou responsabilidade financeira.

Nota para as várias iniciativas desenvolvidas pelos bancos, como os sites Saldo positivo, da Caixa Geral de Depósitos, o Ei-Montepio, do Montepio Geral, os programas Fazer contas à vida, do Barclays, ou a Fundação Millennium BCP, do banco com o mesmo nome. E estes são apenas os projectos listados pela Associação Portuguesa de Bancos (APB). No entanto, o BBVA, por exemplo, tem também um programa educativo orientado para os três ciclos do ensino básico. O Valores de Futuro, que está implementado nos Estados Unidos, na América Latina e em Espanha, tem chegado a mais de 100 mil alunos por ano.

Mas também a Associação Portuguesa de Bancos (APB) tem o seu próprio portal ( www.boaspraticasboascontas.pt), onde pode encontrar uma espécie de manual de boas práticas financeiras, que não só esclarece muitas dúvidas como também disponibiliza um glossário dos termos financeiros mais úteis. Ou seja: não há desculpas do cidadão para não haver melhores práticas financeiras no país.


“Os portugueses são bons a gerir o seu dinheiro”

Susana Albuquerque, secretária-geral da ASFAC

Diz-se popularmente que “é de pequenino que se torce o pepino”. No que diz respeito à educação financeira, Susana Albuquerque não podia estar mais de acordo. A secretária-geral da Associação de Instituições de Crédito Especializado (ASFAC) é especialista em educação financeira e frisou, em entrevista ao i, que, “com as crianças, se trabalharmos a base estamos a formar comportamentos”, e isso é mais fácil “que alterá-los, como acontece com os adultos”. Basicamente, “cada criança tem direito a ser bem alimentada e protegida. Mas isso torna as crianças activamente responsáveis por respeitarem os seus recursos, por pouparem água, e por aí em diante”. O importante é fazê-las perceber que “o dinheiro é um recurso. Explicar qual é a sua função primeira, que é ser um meio de troca. E depois perceber como é feita a gestão deste recurso”, diz a especialista, notando que “esta é a linha que tem comprovadamente mais resultados”.

Desde 2005 que a ASFAC tem vários programas de formação e educação financeira, tendo estabelecido diversas parcerias com escolas, desenvolvido uma plataforma de e-learning para pais e formadores que querem saber como podem educar financeiramente os filhos e mantendo um programa de apoio a famílias que precisam de uma ajuda mais individualizada.

Questionada sobre se os portugueses não sabem efectivamente gerir o seu dinheiro,Susana Albuquerque é peremptória: “Os portugueses são bons a gerir o seu dinheiro. Claro que houve pessoas que tiveram dificuldades e que ainda têm, mas por dois grande motivos: a perda de emprego e a diminuição de rendimentos. Isto tem um impacto enorme no estilo de vida e na capacidade financeira das famílias.” Mas a verdade, sublinha, é que os dados do Banco de Portugal revelam que “assim que estalou a crise as pessoas passaram a consumir menos e a poupar mais”, conclui.

Bruto da Costa. Pobreza infantil não será resolvida sem combater pobreza da família

in iOnline




Bruto da Costa advertiu ainda que, se isso não for feito, corre-se um “grande risco”, o risco de não se passar de “medidas assistenciais”




O presidente da Comissão Nacional de Justiça e Paz, Alfredo Bruto da Costa, alertou hoje que o problema da pobreza infantil nunca será resolvido se não forem combatidas as causas da pobreza da família.

O alerta de Bruto da Costa surgiu no final da apresentação do relatório do Comité Português para a Unicef “As crianças e a crise em Portugal – Vozes de crianças, políticas públicas e indicadores sociais, 2013”, a que estava a assistir como convidado.

O documento faz uma análise aprofundada das políticas de resposta à crise e ao modo como estas estão a afetar o dia-a-dia dos agregados familiares com filhos, e dá a conhecer testemunhos, opiniões e estratégias para enfrentar a crise de crianças e adolescentes que vivem em Portugal.

“A pobreza é uma situação de privação por falta de recursos. Nós temos a descrição da privação, pouca análise da falta de recursos e do que ainda falta de recursos”, sublinhou Bruto da Costa, comentando os dados do estudo.

O economista explicou que uma criança nunca é titular de recursos e, como tal, “cientificamente não há nada a que se chame pobreza infantil”.

“O que há é privação infantil e situações de pobreza das famílias em que as crianças vivem e quem é titular dos recursos são os pais”, sustentou.

Desta situação surge uma “consequência científica imediata”: “Por mais que façamos pelas crianças, se não olharmos para as causas da pobreza da família, nós nunca resolvemos o problema da pobreza infantil”, frisou.

Bruto da Costa advertiu ainda que, se isso não for feito, corre-se um “grande risco”, o risco de não se passar de “medidas assistenciais”.

Este risco, “em certo sentido, perpassa tudo o que se tem feito em termos de pobreza em Portugal, nos últimos 50 anos”, frisou.

“Nós temos tido o condão, nos últimos 50 anos, de reduzirmos palavras fortíssimas como ‘empoderamento’, participação, dar a voz aos pobres (…) e de reduzirmos estes fatores de mudança social fortíssimos a questões totalmente inócuas. Damos a voz sem nada acontecer”, lamentou.

O presidente da Comissão Nacional de Justiça e Paz colocou o desafio à Unicef de continuar este trabalho, encontrar os fatores explicativos para estas situações, “que estão muito bem caracterizadas e, a partir daí, ver que tipo de desdobramento ou complemento poderia ter na lista das recomendações que fazem”.

“As recomendações podem ser extremamente válidas, mas um leitor qualquer também pode lê-las numa linha meramente assistencial”, apesar de a intenção não ser essa.

No entanto, “permitem essa leitura e esse é um risco muito grande da sociedade em que vivemos, porque é um traço cultural da nossa sociedade reduzir a pobreza à assistência social”.

Também a assistir à apresentação do relatório, a antiga ministra da Saúde e pediatra Ana Jorge realçou duas conclusões do documento: “Sem um sistema global integrado de recolha de dados e de uma política transversal a todas as áreas e a todos os direitos das crianças, não é possível chegar a elas e esse é um contributo muito importante para sairmos do assistencialismo para os direitos”.

Nesse sentido, Ana Jorge defendeu uma “política para a infância” integradora de todos os setores da sociedade, desde as autarquias, à economia, às famílias, ao emprego, à saúde e à educação, porque sem isso não se consegue que as crianças tenham os seus direitos.

“Aquilo que se tem vindo a passar na área da educação é pôr-se em risco o futuro destas crianças”, apontou como exemplo Ana Jorge.

O outro meio caminho para a pobreza

editorial, in Público

Cortar a eito nas prestações sociais pode abrir uma ferida difícil de sarar a longo prazo

Ontem foram publicados dois relatórios sobre Portugal; um da OCDE sobre a economia e um outro da Unicef sobre o impacto que a crise está a ter nas crianças. Sendo dois relatórios distintos, tocam-se e cruzam-se num ponto essencial: a importância das prestações sociais.

[leia aqui o artigo na íntegra]

Unicef. Crianças são o grupo etário em maior risco de pobreza

Por Marta Cerqueira, in iOnline

Dados de 2011 revelam que 21,8% das crianças em Portugal viviam em famílias com rendimentos per capita inferiores a 416 euros por mês

"Quando não há comida, os meus pais fazem isto: deixam de comer para nos dar à gente." Este é o relato de uma das 77 crianças ouvidas no âmbito do relatório "As Crianças e a Crise em Portugal", criado pela Unicef para analisar o modo como as crianças observam a crise e a forma como as dificuldades económicas influenciam as suas vidas.

O documento mostra que, desde 2008, as crianças são o grupo etário em maior risco de pobreza em Portugal e que a crise trouxe um maior fosso entre as famílias com e sem crianças, já que o risco de pobreza nas famílias numerosas é de 41% e nas famílias monoparentais é de 31%. Dados de 2011 revelam que havia em Portugal 412 mil crianças em risco de pobreza, o que corresponde a dizer que 21,8% das crianças viviam em famílias com rendimentos per capita inferiores a 416 euros por mês.

Naquele que é o primeiro relatório da Unicef sobre o impacto da crise entre crianças e adolescentes portugueses, pode ler--se que a taxa de privação material infantil - quando não existe acesso a três ou mais itens definidos a nível europeu e que englobam o pagamento de empréstimos, ter televisão a cores em casa ou ter carro - atingiu o seu valor máximo, 27,5%, em 2010, ano em que foram adoptadas as primeiras medidas de austeridade. Segundo os dados disponíveis, "este valor tem vindo a decrescer desde 2010, não deixando, no entanto, de ser o mais elevado comparativamente a outros grupos etários", adianta o texto. Já quando se fala em privação grave (quatro ou mais itens de privação material), a percentagem de crianças atingida tem vindo a aumentar de forma sistemática desde 2008, com 222 mil crianças sinalizadas nesta situação em 2011.

Recurso aos avós Nos relatos das crianças e jovens fica patente a preocupação com os impactos da crise, sendo os temas ligados ao emprego e ao consumo das famílias os mais frequentemente referidos durante as entrevistas. As crianças de famílias mais vulneráveis referem cortes no consumo de alimentos como carne, peixe ou iogurtes, cortes em vestuário e calçado, assim como mudanças de casa e cortes nas actividades extracurriculares. Em algumas destas situações, são os avós o recurso em situações de atraso no pagamento de contas ou contracção de dívidas. No entanto, o estudo refere que a geração dos avós está a ter mais dificuldade em assegurar o apoio às gerações mais novas devido a problemas económicos.

Estratégia O comité português para a Unicef defende a criação de uma Estratégia Nacional para a Erradicação da Pobreza Infantil. Além disso, e para colmatar a falta de informação sobre a situação real das crianças, pede que seja criado um sistema de recolha de dados que abranja todos os aspectos da sua vida e que cubra todo o seu período de vida até aos 18 anos. Defende igualmente que haja um investimento na educação na primeira infância, especialmente entre os zero e os três anos, garantindo o acesso gratuito às famílias com baixos rendimentos.

O testemunho de uma arquiteta várias vezes no desemprego

Sandra Henriques, in RTP

O presidente da Ordem dos Arquitetos revelou em entrevista à Antena 1 que o desemprego na profissão atinge quatro vezes mais pessoas do que em 2009. Ana Neves viveu esta estatística na pele. Licenciada em Arquitetura há 11 anos, já esteve no desemprego várias vezes.

Ana Neves é uma das milhares de pessoas que assinaram a petição pública apoiada pela Ordem dos Arquitetos no início do mês contra duas propostas de lei em estudo no Parlamento. Estes profissionais acreditam que a mudança da legislação vai desvalorizar os arquitetos ao permitir que outros técnicos assinem projetos.

Número de crianças em instituições em Portugal "é uma anomalia sem paralelo na Europa"

Ana Dias Cordeiro, in Público on-line

Por ocasião do 25º aniversário da Convenção dos Direitos da Criança,procuradores, psicólogos, médicos e especialistas de várias áreas estiveram reunidos numa conferência dedicada ao tema Os Direitos da Criança - Prioridade para quando? que terminou esta terça-feira em Lisboa.

Em Portugal, das 8500 crianças retiradas das suas famílias, 8142 estão institucionalizadas. Estes já eram números conhecidos, referentes a 2013 e incluídos no Relatório CASA de Caracterização Anual da Situação de Acolhimento das Crianças e Jovens, da Segurança Social e do Instituto de Segurança Social, que foi publicado em Abril. Mas na Conferência Os Direitos da Criança – Prioridade para quando? organizada em Lisboa pelo Instituto de Apoio à Criança (IAC) foram apresentados numa perspectiva comparativa.


Assim se concluiu que Portugal está no topo dos países da Europa Ocidental, se se considerar a proporção de crianças institucionalizadas. Ou no fundo da lista, se se tiver em conta a percentagem de crianças acolhidas em famílias temporárias: apenas 4%, quando em Espanha 30% das crianças separadas da família estão a viver em acolhimento familiar e em França 66%. Essa percentagem ganha ainda maior expressão no Reino Unido, onde 77% das crianças retiradas à família biológica estão em situação de acolhimento familiar.

O número de crianças em instituições em Portugal, que corresponde a 96% das situações de perigo, “é uma anomalia sem paralelo na Europa”, considerou Manuel Araújo, presidente da associação Mundos de Vida, um dos oradores do painel dedicado ao tema Desinstitucionalização – Os Afectos e os Laços.

“Apenas 4% estão em famílias de acolhimento”, insistiu Manuel Araújo para defender que “é preciso mudar o sistema de protecção” através de uma maior qualificação das respostas e dos recursos, ou seja, explicou depois ao PÚBLICO, através de famílias capazes de proporcionarem um enquadramento e acolhimento de qualidade. É isso que falta em Portugal, referiu. Através de campanhas nacionais, é possível criar uma “bolsa de famílias”, a partir da qual seja depois possível encontrar “a família certa para uma criança” em função das suas necessidades.

“Às vezes é preciso intervir no superior interesse da criança mas o superior interesse da criança não é a institucionalização”, insistiu o fundador da associação com sede em Famalicão, e que entre 2006 e 2014 formou 112 “famílias aptas” para acolher crianças em perigo.

Em última análise, seria possível “não haver institucionalização”, defendeu se por um lado se apostasse na qualificação de respostas, reunindo mais e melhores famílias de acolhimento, ou se, como defendeu por seu lado Eugénio Fonseca, presidente da Cáritas Portuguesa, existisse “uma política para a família”, que não existe, criticou. “A desinstitucionalização está no trabalho da prevenção”, frisou. “E em não permitir que crianças nasçam em ambiente desfavorável economicamente e afectivamente por gerações consecutivas.”

Os participantes no mesmo painel concordaram pelo menos num ponto: a institucionalização é “uma medida de último recurso”, como disse Eugénio Fonseca, quando outras falharam e essa é a única forma de proteger a criança de uma situação de perigo.

Mas enquanto Manuel Araújo salientou a necessidade de se dar a oportunidade à criança de fazer “uma alfabetização das emoções” através do acolhimento, mesmo que temporário, numa família, Sandra Veiga, representante da Casa Pia, apresentou uma visão quase oposta: “Mais vale uma boa instituição do que uma má família”, disse. responsável garantiu que “a institucionalização já evoluiu muito” no sentido de contrariar “os efeitos nefastos” que podia ter nos seus jovens.

“São crianças que vêm muito traumatizadas e a necessitar de uma intervenção técnica terapêutica”, defendeu a representante da Casa Pia, instituição que já chegou a ter 700 crianças em acolhimento e agora tem 250. Mais do que uma família, “temos de ser profissionais com elas”, privilegiou Sandra Veiga, depis de Manuel Araújo ter dito que “quando uma criança chega a uma família de acolhimento, traz tantas perdas embrulhadas na sua vida", para realçar a função “reparadora” do afecto de uma família de acolhimento, mesmo que deixando em aberto o regresso dessa criança à família biológica.

A psicóloga clínica Fernanda Salvaterra lembrou que “a separação da família é uma medida extrema”, necessária quando uma família coloca em perigo a criança, que “não deve ser temida pelos profissionais”. E realçou que “o que deve estudar”, nestas situações em que “a separação é exigível", será "a qualidade da vinculação” na fase seguinte, sendo a solução melhor para a criança “a família adoptiva”. “Só numa família definitiva e estável se faz o bom desenvolvimento da criança”, disse relativamente a casos em que não há perspectiva de a criança voltar a viver com os pais biológicos. Nalguns casos, “as crianças não podem esperar eternamente que os pais se reabilitem”, lembrou.

Protocolo entre CIM-Ave e Segurança Social retira oito mil pessoas da pobreza

Miguel Viana, in Correio do Minho

A Comunidade Intermunicipal do Ave (CIM do Ave) e a Segurança Social (SS) de Braga assinaram ontem um acordo de compromisso no âmbito do Plano Estratégico para o Crescimento Inclusivo.

O acordo tem em vista a união de esforços para a criação de condições de inclusão social e o incremento de projectos locais de desenvolvimento.

O objectivo “é aumentar o rendimento de oito mil pessoas em situação de pobreza, através da capacitação para a inclusão com recurso ao trabalho inter-organizacional feito em rede”, disse Maria João Ferreira, a técnica responsável pelo projecto, que vai ser aplicado com recurso aos fundos do programa europeu de apoios Portugal 2020.

O acordo permite, ainda, obter maior articulação entre as entidades envolvidas, através do desenvolvimento de parcerias, cooperação e partilha de responsabilidades. Está previsto, também, o princípio da participação, que permite aos intervenientes participar no planeamento e realização de programas e projectos para o território.

As áreas principais de intervenção são as da saúde mental e da deficiência. “Na saúde mental, não existem respostas na região. Na deficiência, existem algumas respostas mas não estão articuladas”, explicou a mesma técnica.

Manuel Baptista, presidente da CIM do Ave, referiu que o acordo é uma “experiência que vai trazer vantagens” para a região e que resulta de uma colaboração existente há já algum tempo.
“É fruto de um trabalho que temos feito e estamos, assim, em condições de responder melhor aos desafios feitos”, disse Manuel Baptista.

Rui Barreira, director do Centro Distrital de Braga da SS, acrescentou que o acordo ontem assinado “tem como objectivo trabalhar um plano que possa incluir respostas de futuro. Vai permitir à Segurança Social e às autarquias, em conjunto, chegar ao conhecimento real dos problemas.”

Apesar do acordo só ter sido formalizado ontem, o responsável máximo da Segurança Social no distrito de Braga, acrescentou que já está a ser desenvolvido um plano em conjunto com os municípios “que vai permitir a que façamos um plano de desenvolvimento social da CIM. Já estamos a colaborar no terreno. Este acordo é só a selagem desse compromisso.”

Na assinatura do acordo, para além do presidente da Câmara Municipal da Póvoa de Lanhoso e da CIM-Ave (Manuel Baptista) estiveram também presentes os autarcas de Guimarães (Domingos Bragança), Vila Nova de Famalicão (Paulo Cunha), Cabeceiras de Basto (China Pereira), Vieira do Minho (António Cardoso), Fafe (Raúl Cunha) e Vizela (Dinis Costa).

Salário mínimo português é dos mais baixos da Europa ocidental

Ana Sofia Rodrigues, in RTP

A análise é da OCDE, que acrescenta que o número de trabalhadores que recebem o salário mínimo em Portugal quase duplicou entre 2007 e 2011.

O relatório bianual da OCDE Economic Survey: Portugal considera que o salário mínimo português é relativamente alto no “âmbito de uma comparação internacional (…), mas é o mais baixo na Europa ocidental”.

Entre 2007 e 2011 a percentagem de trabalhadores a receber o salário mínimo passou de seis para 11,3 por cento. O salário mínimo nacional “cresceu significativamente” (de 485 euros para os 505 euros no início deste mês).

No mesmo relatório sobre a economia portuguesa, a Organização para a Cooperação e Crescimento Económico defende, tal como o Governo de Passos Coelho e Paulo Portas, que os aumentos no salário mínimo devem ser definidos em linha com o crescimento da produtividade e com a inflação.

“Excesso de funcionários”

A OCDE recomenda, por outro lado, que Portugal continue a apostar na redução do número de funcionários públicos para “melhorar a eficiência dos serviços” e reduzir o peso da despesa com salários da Administração Pública.

A Organização defende que há “um excesso de funcionários em áreas específicas, como as forças de segurança e a educação”. Com mais de 450 polícias por 100 mil habitantes, “a polícia portuguesa é a segunda maior força na Europa”.

Já na educação, a OCDE considera que as turmas são “pequenas” e defende por isso que “a qualidade dos professores é mais importante no processo de aprendizagem do que o tamanho das turmas, sobretudo no ensino secundário e ensino superior”.

O relatório reconhece, no entanto, que o emprego público caiu cerca de oito por cento desde 2012.

Teto nas prestações sociais

É também defendido no relatório um limite máximo sobre as prestações sociais acumuladas pelas famílias. Uma forma, diz a OCDE, de garantir que a acumulação das prestações sociais “não gera um desincentivo ao trabalho”. Recomenda por isso às autoridades portuguesas que “examinem o efeito cumulativo desses programas e a sua racionalização, quando necessário.”

Quanto ao Rendimento Social de Inserção, a instituição defende uma alteração das regras de atribuição do Rendimento Social de Inserção. Entende que os limites de referência do RSI devem ser alterados, uma vez que “40 por cento dos desempregados vivem abaixo da linha de pobreza.”

A OCDE assinala que os benefícios do RSI são baixos em Portugal e recomenda que “seja dado às crianças um peso mais generoso para efeitos de cálculo na atribuição” do apoio.

A Organização defende ainda um reforço dos mecanismos de controlo antifraude, por forma a tornar mais eficazes os programas de inclusão social.
OCDE recomenda fortalecimento da segurança social e prioridade às crianças

Em causa está a luta contra a pobreza. A organização considera que a pobreza e o número de famílias pobres “estão a aumentar, com as crianças e os jovens a serem particularmente afetados”.

Para contrariar esses dados, a OCDE propõe que Portugal fortaleça a rede de segurança social, reduzindo a sobreposição entre os vários programas e assegurando uma melhor orientação. Isso poderia gerar recursos para, eventualmente, aumentar o nível de benefícios do Rendimento Social de Inserção.

Por outro lado, o relatório sugere que o país dê prioridade ao apoio dado a crianças e jovens, aumentando, por exemplo, o peso das crianças no cálculo do RSI ou aumentando o abono de família.

A OCDE defende ainda que os subsídios de desemprego devem ser independentes da idade e que se reduz os requisitos de elegibilidade, de forma a alargar a sua cobertura. A educação de adultos seria ainda uma forma de reduzir a pobreza.

(c/Lusa)



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Um só diploma vai regular tudo o que tem a ver com adopção de crianças

Andreia Sanches, in Público on-line

O novo regime jurídico deverá regular diferentes intervenções: do Ministério Público, dos tribunais, da Segurança Social, da Agência para a adopção internacional. O PÚBLICO falou com um casal que entregou os papéis em 2011. O filho chegou este ano a casa.

Ângelo e Leonor iam desistir em Agosto. Quando saíssem de Torres Vedras a caminho das férias no Algarve, com a filha de oito anos, passariam por Lisboa. Dariam um salto à Segurança Social para anular a candidatura à adopção. Não aguentavam mais estar sempre na expectativa, à espera de ouvir o telefone tocar. Tinham-se disponibilizado para receber uma criança de qualquer etnia. Tinham colocado duas condições: não ter problemas de saúde e ter até 36 meses. Tinham-se organizado para isso. Já tinham uma filha biológica mas queriam alargar a família. A adopção parecia um bom projecto.

O casal Félix — ele educador social, ela educadora de infância — tomaram a decisão de adoptar há cinco anos. Depois passaram quase dois anos até formalizarem a intenção — “porque a informação está em Lisboa, fora de Lisboa andamos empurrados de um lado para o outro, andei meses a pedir informações”, diz Ângelo. Em 2011 entregaram os papéis. Depois esperaram — “Às vezes telefonávamos ao técnico que nos acompanhava que, para além do nosso, tinha mais 300 processos. ‘Esqueceram-se de nós?’ Eles dizem, e bem, que não andam à procura de uma criança para a família, mas sim de uma família para a criança, é um processo complexo, leva tempo...” Mas tanto tempo assim, levou-o a querer desistir — a criança vem? Não vem? Ângelo falou ao PÚBLICO dias depois de o ministro da Solidariedade e da Segurança Social, Pedro Mota Soares, dizer no Parlamento que haverá mudanças no sistema de adopção.

“Como há famílias que aguardam melhor resposta da adopção, permitam-me anunciar o seguinte: iremos melhorar todos os seus mecanismos para que sejam mais lestos, para que não durem, preferencialmente, mais que um ano na instrução do processo”, declarou Mota Soares na quarta-feira. A intenção passará por reunir num único diploma toda a matéria processual relativa à adopção, criar um regime jurídico do processo de adopção que abranja o processo judicial e o processo administrativo e que regule quer a adopção nacional, quer a internacional.

O diploma deverá contemplar as diferentes intervenções: do Ministério Público, dos tribunais, da Segurança Social e da Autoridade Central para a Adopção Internacional. Pretende-se a qualificação do processo e da informação a disponibilizar às pessoas.

O filho chegou em Junho
O PÚBLICO conheceu Ângelo e Leonor em Junho de 2011, numa reportagem sobre o Plano de Formação para a Adopção, promovido pelo Instituto de Segurança Social (ISS), uma obrigação que tinha sido introduzida havia pouco tempo. Estavam a fazer a formação, acharam útil, mas passou esse ano. E outro. E outro. E... já tinham decidido que Agosto deste ano era o limite quando numa quinta-feira do passado mês de Maio o telefone tocou.

Cinco anos depois da decisão e três anos depois da formalização da candidatura foram chamados a ler o processo de Rui (nome fictício), um menino “de etnia negra que tinha sido entregue a uma instituição depois de nascer”, em Dezembro de 2012, conta Ângelo. Leram a sua história, analisaram os exames médicos... a fotografia só lhes foi mostrada depois de dizerem que o aceitavam. “E é tão giro...” O filho “chegou em Junho”. Uma “loucura” — depois de anos de espera, é “parto e gravidez em 15 dias”, costuma dizer Ângelo a rir.

“A família está feliz”, diz. Continua a ser acompanhada pelos técnicos da Segurança Social. E está a correr bem, afirma. Foi duro esperar mas, sobretudo, continua, foi duro terem feito esperar também o filho. “Em Novembro de 2013 um tribunal decretou uma medida de adoptabilidade, só em Maio de 2014 a decisão transitou em julgado”, conta Ângelo. “Não percebo por que tem que passar tanto tempo, foram mais cinco meses que ele esteve institucionalizado do que acho que seria necessário, o que nesta idade é uma brutalidade”.

Quando o ministro diz que se vai mexer na legislação, o que sugere este pai? Que os tribunais sejam mais rápidos a decretar a situação de adoptabilidade das crianças, quando se entende que o melhor para elas é que sejam adoptadas.

Já Luis Villas-Boas, director do Refúgio Aboim Ascensão, em Faro, que presidiu o Grupo de Trabalho para a Agenda Criança, defende que não é na demora da Justiça que está o problema. “O problema é que não há intervenção precoce”, que permita detectar o perigo o mais cedo possível e intervir junto das crianças e das suas famílias.

Quanto mais cedo se intervém, mais cedo se percebe se a criança pode ficar com a família biológica ou se a solução é rncminhá-la para a adopção. “Se não há uma intervenção precoce, tecnicamente envolvente, os tribunais não têm hipótese de decretar a adoptabilidade”, diz Villas-Boas — a lei define que uma criança pode ser adoptada até aos 15 anos.

Família passa fome à espera do tribunal

Por Secundino Cunha, in Correio da Manhã

Acidente de trabalho parado no Ministério Público. Viúva ainda sem indemnização.

Têm sido um martírio os dias de Fabiane Araújo e dos dois filhos, um rapaz de 17 e uma menina de três anos, desde que o marido, Augusto Monteiro, de 35 anos, morreu esmagado na construção do maior centro comercial de França, nos arredores de Paris.

O acidente de trabalho ocorreu em dezembro de 2012 e, até agora, nem a viúva nem os filhos receberam um único cêntimo de ajuda ou indemnização. Tudo porque, diz Fabiane, o processo esteve quase dois anos parado no Tribunal de Barcelos.

"Eu já perdi a conta às vezes que fui falar com o senhor procurador e uma vez até chorei lá, porque já estava há três dias sem água em casa. Ele disse ao secretário que era preciso andar com o processo, mas não andou", diz a viúva de Augusto Monteiro.

O facto de o processo nunca ter sido despachado e entregue à seguradora fez com que a habitual sessão de tentativa de acordo nunca tenha ocorrido e que nem sequer as despesas de funeral tenham sido pagas.

"Temos passado fome, eu e os meus filhos. Estes dias não tinha leite para dar à menina no pequeno-almoço e tive de a mandar para a escola com os sapatos apertados, que até lhe fizeram inchar os pés. Acho que não é justo os meus filhos passarem por estas coisas por causa do atraso do tribunal", diz.

Fabiane Araújo mostra-se ainda "cansada" de bater a todas as portas a pedir ajuda, IPSS ou Segurança Social, e de receber sempre resposta negativa.

Mais de 35% dos casais criam conflitos por questões financeiras

in SicNotícias

Um questionário realizado por um projeto de investigação do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra mostra que mais de 35% dos casais com filhos criam conflitos em torno de questões financeiras.

Cerca de 80% referem que a crise afetou "significativamente" o orçamento familiar, tendo quase dois terços dos inquiridos referido que "deixaram de sair ou de se divertir" e mais de 25% "procura mais vezes o médico por problemas emocionais, de ansiedade ou insónias", disse à agência Lusa Lina Coelho, coordenadora do projeto "FINFAM - Finanças, Género e Poder: como estão as famílias portuguesas a gerir as suas finanças no contexto da crise?".

O projeto, que apenas se centra em casais com filhos, conclui também que 50% das famílias "tiveram que recorrer às poupanças para despesa corrente", tendo 27,5% dos inquiridos referido que "a crise os levou a endividarem-se".

Dos que se endividaram, cerca de metade recorreu ao banco e metade à família, tendo havido também o recurso de famílias aos dois meios, explica Lina Coelho.

Nesta "radiografia dos impactos da crise nas famílias", mostra-se que mais de 50% das famílias reduziram a despesa no vestuário, viagens, restaurantes e aparelhos eletrónicos e eletrodomésticos e cerca de 10% cortaram na saúde e na educação.

Um dado "preocupante" é também a redução de gastos nos serviços de apoio a dependentes, idosos e pessoas com deficiência.

Segundo o questionário do projeto, dos mais de 200 inquiridos (de 1.001) que tinham a seu cargo pessoas com deficiência ou idosos, 40% "afirmam que reduziram nos serviços de apoio, o que significa que estes cidadãos terão sido muito penalizados pela crise", frisa a investigadora.

Também na alimentação, 20% dos casais referiram que reduziram a despesa, tendo também um terço das famílias registado uma diminuição nos transportes e em comunicações.

No plano laboral, cerca de 24% dos casais passaram a trabalhar mais horas e um terço viu o seu salário ser reduzido, aponta ainda o projeto de investigação.

Das 1.001 famílias questionadas, 73% pagam prestação de empréstimos, sendo 87% dos mesmos para crédito à habitação, avança Lina Coelho, sublinhando que mais de metade dos inquiridos declara que a prestação é "um fardo pesado ou muito pesado".

Os 20% que referem que a crise não afetou o seu orçamento "são de baixa escolaridade" e a grande maioria está empregada, sendo "pessoas que já viviam num limiar de sobrevivência e que no contexto da crise não são muito afetadas".

Contudo, "há um impacto enorme de crise", observa a economista, sublinhando que as famílias com filhos - o objeto de estudo do projeto - "têm sofrido bastante" nos últimos três anos.

Numa altura em que se fala de políticas de promoção de natalidade, "tudo leva a crer que ter filhos tem um custo muito elevado" no atual contexto, sendo "arriscadíssimo ter filhos" por "pôr a qualidade de vida dos casais e dos filhos em risco", afirmou.

O projeto FINFAM, que começou em 2013 e termina em 2015, reúne uma equipa transdisciplinar de sociólogos, economistas, psicólogos e uma jurista.

27.10.14

Movimento Erradicar a Pobreza faz hoje desfile silencioso entre o Chiado e o Rossio

in Visão

Lisboa, 24 out (Lusa) - O Movimento Erradicar a Pobreza promove hoje um desfile silencioso, entre o largo do Chiado e o Rossio, em Lisboa, para alertar para a necessidade de combater a pobreza, que constitui uma "violação os direitos humanos".

A iniciativa, que começa às 17:30 com uma concentração no largo do Chiado, insere-se na semana "Pela erradicação da pobreza", disse à agência Lusa Deolinda Machado, uma das coordenadoras do movimento.

"É preciso lembrar a pobreza todos os dias", chamando a atenção para as suas causas, como as más condições de vida, a falta de recursos e o desemprego, a maioria de longa duração, adiantou a coordenadora.

Professores de escola do Cerco, Porto, apelam ao Governo para travar insegurança

in o Observador

“Como é que acontece um pai entrar na escola, chegar ao sítio mais recôndito onde está a professora e a agride?”, interrogou-se um professor depois de um episódio de violência no início desta semana.

Professores da Escola Básica e Secundária do Cerco, no Porto, onde na terça-feira uma docente foi agredida pela mãe de uma aluna, apelaram hoje ao Governo para resolver os problemas de insegurança “em todas as escolas públicas”.

“Queremos tentar que estes casos não aconteçam em lado nenhum. Todas as pessoas têm de estar seguras no seu local de trabalho. Não vamos isolar os casos. São vários episódios em que a tutela nada faz para melhorar a situação. Os professores querem que a escola pública vá para a frente, mas com condições dignas”, alertou João Pereira, professor de Educação Musical, em declarações aos jornalistas.

“Pela não violência e convivência escolar” foi o mote da iniciativa que, durante o intervalo das 11:40, levou professores e alunos a darem as mãos num enorme cordão humano dentro da escola, ao mesmo tempo que duas funcionárias se esforçavam por controlar as constantes entradas e saídas dos estudantes, sem se aperceberem que os mais pequenos e magros passavam através das grades do estabelecimento para o exterior, onde vários pais empunhavam cartazes e gritavam “Não à violência” e “Somos todos iguais”.

Fonte do Comando Metropolitano da PSP do Porto disse na terça-feira à Lusa que uma mulher de 33 anos, mãe de uma aluna de 12 anos da escola do Cerco do Porto, agrediu pelas 12h45 a professora da filha com “murros e puxões de cabelos” depois de, no fim da aula, a docente ter recusado devolver o telemóvel à estudante.

“Como é que acontece um pai entrar na escola, chegar ao sítio mais recôndito onde está a professora e a agride”, questionou o professor Rui Santos, admitindo que, depois do episódio, é normal que os docentes pensem que algo semelhante “pode acontecer a qualquer momento”.

Rui Santos leciona há nove anos na Escola do Cerco, onde estima que estudem mil alunos, e diz nunca ter tido “nenhum problema” com estudantes ou pais. O docente reconhece, contudo, que há insegurança na escola e que já existiram “outros episódios [de violência] entre alunos”.

Nas declarações à comunicação social do lado de fora dos portões da escola, o outro professor, João Pereira, frisou que “o problema de segurança existe em todas as escolas” e que casos como o de terça-feira “acontecem com toda a gente”.

Pai da aluna de 12 anos envolvida no episódio de terça-feira, Adriano Cabreira, de 36 anos, disse à Lusa que “a professora não chegou a ser agredida”. “Ela é que agrediu a minha filha. Já viu o que é ter um arranhão de cima a baixo no braço? Ela chama animais aos alunos ciganos e não os deixa ir à casa de banho, quando deixa os outros que não são de etnia cigana”, lamentou o encarregado de educação, ele próprio de etnia cigana. “O que é isto? É racismo”, sublinhou.

O pai responsabiliza a direção da escola pelo problema com a filha, porque “há 15 dias, a mesma professora encostou a cabeça de um aluno cigano à parede e ameaçou-o com dois estalos”.

Carla Fontes, mãe de duas crianças que frequentam o quinto ano, queixa-se de “violência todos os dias, desde que começou a escola”. “Espancaram a minha filha e o meu filho mais do que uma vez. Já lá vai um mês e não resolvem nada. E não foram ciganos, foram portugueses”, afirmou.

Albertina Sousa, de 56 anos, é avó de uma aluna do 6.º ano e considera que o problema é que “as empregadas olham por alguns e o resto é lodo”.

Sabe o que significa envelhecimento ativo?

in RR

A Organização Mundial da Saúde, definiu o Envelhecimento Ativo como o processo de otimização das oportunidades de saúde, participação e segurança, de forma a melhorar a qualidade de vida das pessoas que envelhecem.

Ter saúde e ser autónomo são dois fatores que determinam a qualidade de vida de quem passa pela terceira idade.
Estimativas recentes revelam que a população acima dos 60 anos vai triplicar até 2050. E em alguns países europeus, a esperança de vida ao nascer ultrapassa já os 80 anos, para as mulheres, e 75 anos, para os homens.

O progresso e desenvolvimento social do mundo atual melhoraram muito a qualidade e a expetativa de vida ao nascer. Ainda assim, uma vida mais longa também implica um aumento nas doenças crónicas e maiores necessidades de acompanhamento da população idosa.

Viver um envelhecimento saudável permite que, mulheres e homens, mantenham uma vida integrada na sua comunidade, mesmo numa idade mais avançada.

E o seu enfermeiro pode ajudá-lo, a si e á sua família, na manutenção da qualidade de vida!
Esta é uma mensagem dos enfermeiros da Secção Regional do Sul.

https://www.facebook.com/pages/SRS-Ordem-dos-Enfermeiros/186629888045221?fref=ts

Cidade italiana acusada de apartheid devido a autocarro só para ciganos

in Público on-line

Presidente da câmara recusa acusações de xenofobia e diz que "é uma questão de segurança e legalidade”.

O autocarro número 69 da cidade italiana de Borgaro tornou-se um incómodo tão grande que o presidente da câmara só vê uma solução: ter duas linhas. Uma para ciganos, a outra para a restante população.

A linha 69 tem como destino o aeroporto de Turim e passa por um acampamento de ciganos onde vivem cerca de 500 pessoas, nos arredores da cidade de Borgaro, Norte de Itália, e que é conhecida pela frequência de assaltos e problemas.

Os habitantes da cidade de 13 mil pessoas queixam-se de roubos e abusos, como passageiros que dizem ter sido alvo de cuspidelas, uma rapariga a quem foi cortado o cabelo, outra a quem encostaram uma faca à cara, ou, o último incidente, um miúdo de 13 anos vítima de uma tentativa de roubo, com violência, do telemóvel. Foi na sequência deste caso que o pai pediu uma reunião com o presidente da câmara, e se seguiu um encontro comunitário.

Claudio Gambino, o presidente da câmara e do Partido Democrático (centro-esquerda), fez então a sua proposta: “Duas linhas. Uma para nós e outra para eles”, disse, segundo relatos nos media italianos. As duas linhas teriam o mesmo ponto de partida em Turim mas acabariam em pontos diferentes, uma no acampamento, outra em Boraro.

A proposta foi recebida com aplausos. “Vou falar nisso ao comissário da polícia. Parece ser a única solução”, continuou. “Assim resolveremos o problema sem ninguém ficar a perder.” O responsável disse que já foram tentadas várias hipóteses, como polícia à paisana. Mas não era possível ter presença policial permanente no autocarro.

Fora do conselho, a ideia dividiu opiniões. Políticos de centro-esquerda classificaram-na como “indecente” e “inaceitável”. A Liga Norte criticou a “hipocrisia da esquerda” e sugeriu medidas semelhantes em Roma.

No diário La Stampa, em editorial, Massimo Gramellini, natural de Turim, defende a ideia: “É apartheid, ligado não a preconceitos raciais mas sim a comportamentos ilegais”. E acrescentou que “há muitos anos o autocarro é o pesadelo dos habitantes de Turim”.

“Rejeito qualquer acusação de racismo”, insistiu Gambino. “Não é uma questão de xenofobia, é uma questão de segurança e legalidade.”

OCDE defende subida do Rendimento Social de Inserção

Sérgio Aníbal, in Público on-line

É necessário combater níveis elevados de desigualdade e pobreza em Portugal, afirma.

O valor do Rendimento Social de Inserção (RSI) é demasiado baixo quando comparado com o que acontece nos outros países e deve recuperar algum do terreno perdido nos últimos anos, como forma de combater os elevados níveis de desigualdade e pobreza que se registam em Portugal, defende a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Económico (OCDE).

No relatório sobre Portugal publicado esta segunda feira, a OCDE assinala que o RSI deixou de beneficiar tantas pessoas nos últimos quatro anos e a ter um valor mais baixo e defende que “com 40% dos desempregados a viver abaixo da linha de pobreza, esta redução do rendimento de último recurso para os pobres deve ser revertida”. O relatório da organização sedeada em Paris afirma ainda que “comparado com o salário mínimo ou com a linha de pobreza, os benefícios de rendimento mínimo em Portugal são baixos face ao estrangeiro”.

A OCDE faz esta recomendações como uma resposta às tendências negativas que observa ao nível da desigualdade e da pobreza. O relatório nota que Portugal é um dos países europeus com uma maior desigualdade na distribuição do rendimento e que a tendência de diminuição deste problema parou com a entrada do país em crise a partir de 2010. Desde esse momento, os indicadores de desigualdade quase estabilizaram.

Em relação à pobreza, a OCDE afirma que os indicadores disponíveis mostram um agravamento, que se faz sentir de forma particular entre a população em idade activa, crianças e jovens. O aumento do desemprego, em particular do desemprego de longa duração, é um dos principais motivos para este resultado.

Apesar de afirmar que a política fiscal seguida pelo Governo pode ter contribuído para aliviar os níveis de desigualdade, a OCDE diz que é preciso fazer mais.

Em primeiro lugar diz que na política de benefícios sociais para os mais pobres há sobreposição de vários instrumentos. Propõe por isso que se crie um tecto para os benefícios que um pessoa pode receber, uma medida que o Governo já prevê no OE para 2015.

No entanto, para além disso, propõe que o RSI seja reforçado e que o subsídio de desemprego se torne mais acessível a determinadas camadas da população. Em particular, a OCDE defende que “a ligação entre a idade e a duração do subsídio deve ser eliminada, ao mesmo tempo que as condições de elegibilidade devem tornar-se menos exigente, para estender a cobertura deste benefício, especialmente para os trabalhadores mais jovens”.

Criar um “tecto” para as prestações sociais é “uma falácia” impossível de concretizar em 2015

Natália Faria e Raquel Martins, in Público on-line

Poupar 100 milhões de euros com a criação de um tecto para as prestações sociais não contributivas é possível? O Governo parece acreditar que sim, mas não explica como. Especialistas dizem que nem pensar.

A introdução de um tecto global para as prestações sociais não contributivas substitutivas de rendimentos de trabalho, prevista no Orçamento de Estado para 2015, sustenta-se numa filosofia clara q.b.: “Assegurar que os beneficiários das prestações sociais não recebem mais do Estado do que receberiam se auferissem rendimentos do trabalho.”

A medida, embrulhada numa lógica de incentivo à valorização do trabalho e à mobilidade social, corresponderá a uma poupança de 100 milhões de euros e coube ao ministro do Emprego e da Segurança Social, Pedro Mota Soares, responder às dúvidas que se seguiram:

— Que beneficiários serão abrangidos, ou seja, de que prestações sociais não contributivas estamos falar? — questionou a deputada socialista Catarina Marcelino, durante uma audição no Parlamento.

Pedro Mota Soares deu “o exemplo de uma família que recebe de Rendimento Social de Inserção (RSI) cerca de 375 euros, de abono de família mais de 70 euros, de apoios à renda de casa cerca de 250 euros, um conjunto de apoios à área da educação de 280 euros; recebe um conjunto de apoios e, no final, o rendimento desta família é, muitas vezes, superior ao rendimento de uma família de um trabalhador médio não qualificado”.

O ministro esclareceu ainda que aquele conjunto de prestações sociais vai contar para a condição de recursos (o conjunto de condições que o agregado familiar deve reunir para poder ter acesso às prestações) mas a redução só incidirá nas prestações sociais que substituem rendimentos. “O subsídio social de desemprego é um caso desses, o subsídio social de doença é um caso desses, o RSI é um caso desses”, precisou Pedro Mota Soares.

Sem confirmar a informação adiantada pela ministra das Finanças, Maria Luís Albuquerque — segundo a qual esse tecto poderia fixar-se nos 600 euros —, o ministro remeteu a definição do valor para o Instituto Nacional de Estatística (INE) e esclareceu que os cortes só se aplicarão a pessoas em idade de trabalhar e que a análise dos casos concretos terá de ser feita em articulação com as autarquias e com as instituições sociais.

“Um pretexto para agravar cortes”?
Dito isto, Pedro Mota Soares nada mais adiantou sobre o assunto. Ficou-se assim sem perceber de que fala o ministro quando alude, por exemplo, ao “subsídio social de doença”.

“A não ser que tenha sido criado agora, é algo que não existe. Parece-me mais uma demonstração da ligeireza com que estas coisas são feitas”, reagiu ao PÚBLICO Edmundo Martinho, que presidiu ao Instituto de Segurança Social (ISS), entre 2005 e 2011. O ex-ministro da Segurança Social e do Trabalho, Bagão Félix, admite que Mota Soares se quisesse referir ao subsídio social de parentalidade. “Que é residual”, declarou.

O investigador do Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG), Carlos Farinha Rodrigues, que se tem dedicado ao estudo das políticas públicas de combate à pobreza, desigualdades e exclusão social, também desconhece a existência de uma prestação com aquela designação. “Receio que tudo isto não passe de um pretexto para agravar os cortes que têm existido nos últimos anos, até porque grande parte destes apoios já têm condição de recursos.”

Nos dias que se seguiram ao anúncio do Governo, o PÚBLICO remeteu várias questões a Pedro Mota Soares. Que prestações serão contabilizadas para apurar o total de contribuições recebidas pelos beneficiários? Que apoios em espécie serão contabilizados? De que forma? Que prestações serão afectadas pelo tecto? Como é que o valor [do tecto] será apurado? Que excepções serão tidas em conta? Quando é que o Governo conta ter a medida no terreno? Até à hora de fecho desta edição, não obtivemos respostas. Sendo que às perguntas colocadas pelo PÚBLICO, se somam outras, do ex-presidente do ISS. “Como se faz o cruzamento da informação entre a Segurança Social e as autarquias? Considera-se ou não a utilização das cantinas sociais? E quanto aos apoios em espécie?”, interroga-se Edmundo Martinho, para considerar desde logo que “o cruzamento da informação com as autarquias é, se não impossível, seguramente muito difícil de se fazer, porque não há um sistema que ligue todas estas instituições”.

Mesmo que o caminho siga no sentido de se criar uma plataforma de cruzamento de todos estes dados, “a complexidade administrativa e operacional seria de tal modo”, reforça o ex-ministro Bagão Félix, “que nunca seria possível tê-la a funcionar a 1 de Janeiro”, data da entrada em vigor do Orçamento de Estado. E se assim é, “como é que o Governo consegue ser tão preciso na previsão de poupança de 100 milhões de euros?”

“Para inglês ver”
Para este independente que integrou um governo PSD/CDS-PP, trata-se “de uma previsão orçamental para inglês ver”. Tanto mais que Pedro Mota Soares “junta feijões com batatas”, isto é prestações não contributivas com outras que o são e com apoios que “não são monetarizáveis” sem se correr o risco de entrar no campo da “pura subjectividade”. “Quanto é que custa o transporte a uma câmara que leve os meninos à creche em Ponta Delgada? E em Lisboa?” Por outro lado, prossegue Bagão Félix, “não se pode somar o abono de família às prestações, porque o abono de família não resulta de substituição de rendimentos de trabalho mas do encargo de se ter filhos”.

Acresce que “a proposta de Orçamento de Estado fala em prestações não contributivas substitutivas de rendimento de trabalho, o que, tecnicamente falando, é um conjunto vazio. Porquê? Porque as prestações substitutivas de rendimento de trabalho são todas contributivas, mesmo o subsídio social de desemprego, uma vez que só pode aceder a ele quem tiver descontado”, argumenta, para concluir: “É uma proposta tão confusa e mal preparada, em que não se sabe sequer qual vai ser o tecto. Apesar disso, saber-se que se vai poupar 100 milhões é quase extravagante”.

Descontado aquilo que qualifica como “voluntarismo inconsequente” do actual ministro da Segurança Social, Bagão Félix ressalva que concorda com a preocupação em acabar com a duplicação de subsídios para o mesmo risco social. “Pode acontecer a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa e a Segurança Social darem apoios pecuniários para o mesmo risco social, portanto, concordo com tudo o que evite duplicações de apoio para o mesmo problema social”. E concorda também o princípio de que é preciso “não potenciar o risco moral, ou seja, o desincentivo ao trabalho”.

O ex-presidente do ISS reconhece também que “há sempre margem para atribuição indevida das prestações sociais, como nas baixas por doença e nas prestações não contributivas”. Porém, sustenta que o fenómeno é “absolutamente marginal”, dados “os mecanismos em vigor”. Por outro lado, o ex-presidente do ISS recorda que, para a atribuição do RSI, por exemplo, a habitação social já conta como rendimento. “O cálculo da prestação leva em consideração, não aquilo que a pessoa paga pela sua casa, mas o valor técnico da renda”.

4 vezes “pobreza”
Assim, e sublinhando perceber a pertinência de se fazer um cruzamento de informações sobre as diferentes prestações sociais de modo a evitar sobreposições, Edmundo Martinho conclui que não é “com este tipo de limitação artificial” que se travam os abusos. “Aquilo que se está a dizer, no fundo, é que, como as pessoas não trabalham, têm que ver os seus direitos limitados. E, depois de tudo o que se passou — com as limitações ao RSI, ao subsídio social de emprego e ao Complemento Solidário para Idosos — o que nos apresentam são intenções difusas e genéricas que visam apenas poupar algum dinheiro à custa dos que têm menos. Até admito que se possa repensar o modo como os apoios sociais são atribuídos, mas isso tem que ser feito de forma muito séria e ponderada, nunca com base em impulsos de carácter ideológico”.

O provedor da Santa Casa da Misericórdia do Porto, António Tavares, também considera que, “num país com uma taxa de desemprego de dois dígitos, não é por se impor um tecto nas prestações que se vai conseguir aumentar a mobilidade social”.

E Carlos Farinha Rodrigues recorda, por seu turno, que “de 2010 até ao presente, foram expulsos cerca de 47% dos beneficiários do RSI”. “Tudo isto é uma falácia. É verdade que esquemas como o RSI podem gerar desincentivos ao mercado de trabalho, é dos manuais, mas em Portugal esse perigo é fortemente minimizado pelos valores do RSI”, considera.

Considerando que estas transferências sociais, “que são insignificantes no quadro do orçamento da Segurança Social, deveriam ser preservadas enquanto estabilizador mínimo de coesão social”, o investigador do ISEG vaticina: “O que está aqui em causa é mais uma etapa no processo de desresponsabilização do Estado em relação à necessidade da sua intervenção no combate às situações, já não digo de pobreza, mas de pobreza extrema”.

Já o ex-ministro Bagão Félix admite que tenha subjazido ao anúncio dos cortes uma tentativa de desviar as atenções. “Está a haver um excesso de medidas e de preocupações para atacar situações de desajustamento ou até mesmo fraude, que certamente existem, como se o problema das finanças públicas estivesse centrado nesta questão. Numa altura em que andamos a discutir se os contribuintes vão pagar o BES, a questão dos swaps, do BPN, de uma série de maus investimentos de milhões e milhões, o Governo de repente recentra o debate como se o cancro social estivesse nas prestações contributivas. E sabe quantas vezes aparece a palavra pobreza nas 300 páginas do relatório do Orçamento? Quatro”.

Balanço das prestações sociais

— Abono de Família

Em 2013, o abono de família abrangia 1.294.132 beneficiários, bem abaixo dos 1.837.603 beneficiários de 2003. A diminuição decorre da descida de natalidade, mas também da eliminação do 4.º e 5.º escalão e da alteração das condições de elegibilidade que deixou muita gente de fora. Entre as crianças e jovens que se mantêm beneficiários, cerca de um milhão situa-se no 1.º e 2.º escalões, ou seja, provêm de famílias em que o total de rendimentos líquidos de todo os elementos do agregado a dividir pelo número de crianças mais um é igual ou inferior a 419,22 euros mensais. Em 2015, o abono de família vai continuar a sofrer cortes — de 1% —, o que significa que a prestação social vai perder 6,49 milhões de euros. No total, vai contar com 639,04 milhões de euros, contra os 645,53 milhões de 2014.

— Rendimento Social de Inserção

O Rendimento Social de Inserção, a medida destinada a atenuar a pobreza dos pobres com mais baixos rendimentos, tem sido alvo de sucessivos cortes. Em 2009, havia 485.750 beneficiários. Em 2013, 360.153. Por outro lado, se em 2009 o primeiro e o segundo adulto do agregado familiar recebiam 187,18 euros mensais, o terceiro 131,03 e cada criança ou jovem 93,59 (112,30 euros, a partir da terceira), a partir de 2013 o primeiro adulto passou a receber apenas 178,15 euros, o segundo e seguintes adultos 89,07 euros e cada criança/jovem 53,44 euros. Por outro lado, terminaram em 2010 os apoios extra em caso de gravidez. A despesa do Estado com esta prestação reduziu-se em cerca de 40%, passando de 519,9 milhões em 2010 para 315,12 milhões de euros em 2013. Em 2014, o montante desceu ainda mais para os 299,90 milhões. E a proposta de Orçamento de Estado para 2015 prevê um novo corte de 2,8% que significa menos 8,30 milhões de euros. E uma dotação global disponível de 291,6 milhões.

— Subsídio social de desemprego

Foi a prestação que mais contribuiu para a diminuição da protecção social aos desempregados. Entre 2008 e 2013 registou-se uma variação negativa de 16,3% no número de beneficiários deste subsídio, em grande parte devido à alteração das condições de elegibilidade introduzidas em Novembro de 2010. No Orçamento de Estado para 2015 este valor não vem discriminado, mas sabe-se que haverá menos 243 milhões para subsídios de desemprego e apoio ao emprego, numa redução que o Governo sustenta numa previsão da diminuição da taxa de desemprego para 13,4%.

Fonte: Relatório Principais Desenvolvimentos das Políticas de Família em 2013, do Observatório das Famílias e das Políticas de Família; proposta de Orçamento de Estado para 2015

Cortes que agravaram a pobreza infantil em Portugal

Natália Faria, in Público on-line

No abono de família: 546.354 crianças perderam o direito à prestação

Deixou de ser universal em 2003, ano em que passou a depender dos rendimentos das famílias de acordo com cinco escalões de rendimentos. Em 2010, sofreu outro corte, com a exclusão das famílias dos 4.º e 5.º escalões de rendimento, o que, na prática, fez com que 546.354 crianças tivessem deixado de receber então o abono de família. Foi o equivalente a 30% dos beneficiários. Em 2010 ainda, acabou a majoração de 25% sobre o valor do abono de família no 1.º e 2.º escalões e também a 13.ª prestação paga em Setembro para ajudar os pais a custear os encargos escolares. Actualmente, a 13.ª prestação paga-se apenas às crianças do 1.º escalão. Mantiveram-se os apoios extra (mais 20%) para as famílias monoparentais e para as famílias mais numerosas. Quanto à variação das prestações, entre 2009 e 2012, fica apenas um exemplo: o valor mensal atribuído por criança até um ano de idade diminuiu de 174,72 euros para 140,76 euros no 1.º escalão e de 144,91 euros para 116,74 euros no 2.º escalão – recorde-se as crianças incluídas nestes escalões inserem-se em agregados familiares com rendimentos inferiores a 419.22 euros mensais. Dos 826.709 milhões de euros gastos em abono de família em 2010, o Estado baixou bruscamente para os 555.497 milhões em 2011 e, mais ligeiramente, para os 532.105 milhões em 2012.

No abono pré-natal: menos 35.396 abonos, entre 2009 e 2011
Criado em 2007, é atribuído às mulheres grávidas a partir da 13.ª semana de gestão e termina com o nascimento do bebé, altura em que entra em vigor o abono de família. Entre 2009 e 2011, deixaram de ser atribuídos 35.396 abonos pré-natais, o que equivale a uma diminuição de 28%.

No Rendimento Social de Inserção (RSI): valor por criança desceu de 93,59 para 53,44 euros
É a prestação que mais cortes tem sofrido desde 2010. Não só em termos do número de beneficiários mas também nos montantes mensais atribuídos. Em 2009, os beneficiários do RSI recebiam por criança 93,59 euros mensais (112,30 euros, a partir da 3.ª criança/jovem). Em 2010 termina a majoração da 3.ª criança. Em 2012/2013, o valor que o Estado paga de RSI por criança desceu para os 53,44 euros. E, em 2012, o Governo “expulsou” da medida todos os que possuíssem património imobiliário ou bens móveis (automóveis, embarcações, motociclos…) de valor superior a 25 mil euros. À semelhança do abono de família, o conceito de agregado familiar passou a incluir todos os elementos do agregado até ao 3.º grau em linha recta vertical. Exemplo: uma família composta por três adultos e duas crianças poderia ter acesso ao RSI se tivesse um rendimento mensal inferior a 692,57 euros. Em Novembro de 2010, esta mesma família só tinha acesso ao RSI se o seu rendimento mensal fosse inferior a 644,36 euros. Desde meados de 2010 e, sobretudo, a partir do início de 2013, já só mantiveram direito ao RSI os detentores de um rendimento mensal inferior a 463,17 euros. Assim, em 2013, 37.649 crianças e adolescentes perderam o direito àquela prestação, no universo de 149.921 crianças e adolescentes que dele usufruíam no ano anterior.

Na Acção Social Escolar (ASE): comparticipação dos passes escolares deixou de ser universal
Apoia crianças e jovens estudantes oriundos de famílias carenciadas que frequentam a escolaridade obrigatória. Abarcam desde alimentação aos transportes escolares, passando pelo alojamento, bolsas de mérito e auxílios económicos. No ano lectivo de 2010/2011, a ASE abrangia, por exemplo, 43,8% dos alunos matriculados no 1.º ciclo do ensino básico e 51,4% dos alunos matriculados no 2.º ano. Entre 2009 e 2012, a despesa pública do Estado com a ASE manteve-se praticamente inalterada. Manteve-se a comparticipação anual em livros e em material escolar de cerca de 30 euros para os alunos do escalão A (1.º escalão do abono de família) e de 15 euros para os alunos do escalão B (2.º escalão do abono). No 2.º e 3.º ciclos do básico e no secundário mantêm-se também as comparticipações anuais em livros e material escolar em valores que oscilam entre os 130 e os 60 euros, consoante o escalão. A comparticipação do Estado no valor dos passes escolares, porém, diminuiu. Em 2011, a comparticipação em 50% do valor dos passes deixou de ser universal e passou a dirigir-se apenas às crianças e jovens de famílias pertencentes aos escalões A e B da ASE. Nos casos do escalão A, a comparticipação aumentou para os 60%, porém, diminuiu para os 25% no caso dos alunos do escalão B.

Fundo de garantia de alimentos: limite de rendimentos baixou dos 485 para os 419 euros
Para que, após o divórcio/separação dos pais, as crianças não fiquem sem pensão de alimentos, quando o progenitor que está obrigado a fazê-lo por tribunal não cumpre esse dever, o Governo passou a assegurar o pagamento daquela prestação nas famílias carenciadas. A partir de 2013, o acesso a este fundo ficou mais restrito, pois o limite de rendimentos a partir do qual a criança tem direito a esse apoio baixou de 485 euros para os 419,22 euros. Entre 2010 e 2012, as crianças a receber pensão de alimentos por via deste fundo aumentou cerca de 35% (13.294 crianças em 2010 e 17.915 em 2012). Porém, tendo-se tornado o acesso mais restrito, os autores do relatório prevêem que muitas crianças carenciadas possam ficar sem esse apoio.

Cheque-dentista: valor baixou dos 40 para os 35 euros
Criado em 2008 para as crianças até aos 13 anos que frequentam o ensino público ou privado não lucrativo, beneficiou em 2012 cerca de 400 mil crianças. Por razões orçamentais, o Governo suspendeu a emissão dos cheques-dentista por dois meses em 2012. Retomou-o em 2013, mas com alterações: o valor de cada cheque diminuiu de 40 para 35 euros, embora, por outro lado, a cobertura do programa tenha sido alargada às crianças até aos 15 anos.

Fonte: “As Crianças e a Crise em Portugal: Vozes de Crianças, Políticas Públicas e Indicadores Sociais 2013”, do Comité Português para a Unicef, e proposta de Orçamento do Estado para 2015

Trabalhos Forçados

Por: Ricardo J. Rodrigues, in Notícias Magazine

Há cada vez mais reformados que precisam de trabalhar para conseguirem sobreviver.

Orçamento do Estado para 2015 prevê aumentos de um por cento nas pensões mais baixas, mas esse ajuste não vai evitar que haja muitos reformados que têm de continuar a trabalhar. Porque a pensão não chega, porque têm de ajudar os filhos, pagar comida, contas, medicamentos. Vinte por cento dos idosos portugueses continuam ativos – um dos valores mais elevados da União Europeia. Uns porque querem. A maioria porque não tem opção. Envelhecimento ativo nem sempre é uma expressão bonita.

No final de 2009, Elídio Almeida reformou-se. Tinha chegado aos 65 anos e passara os últimos vinte a fa zer o que gostava. Todos os dias de manhã apanhava alunos em casa e levava-os de autocarro para a escola. Ao fim da tarde, cumpria a rota ao contrário, por Lis boa. Os rapazes com quem ralhava são agora homens feitos. As meninas tornaram-se senhoras crescidas, muitas já têm fi lhos. Às vezes, Elídio apanha alguns desses miúdos, agora no táxi que conduz. São sempre encontros felizes, dez minutos no trânsito servem para atualizar muita memória. As conversas começam com uma pergunta: «Ainda trabalha, senhor Elídio?» O homem só pode dar uma resposta: «Tem de ser.»

Aos 70, Elídio cumpre o turno da manhã nos táxis, desperta às quatro e meia da madrugada e só para depois de almoço. «É puxa do, lá isso é.» Anda cansado, mas não pode abrandar. Os filhos não arranjam emprego. Já passaram os 30, são ambos doutorados, estu daram os dois Bioquímica, mas os centros de investigação onde tra balhavam perderam o financiamento e os seus contratos não foram renovados. «O rapaz voltou a casa, tenho de o ajudar com tudo.» A fi lha, já casada e com filhos, tenta sustentar a sua própria família com menos um salário. «Fazemos-lhe as compras da semana.» Suspira.

Segundo uma investigação da União Europeia chamada Active Ageing Index (Índice de Envelhecimento Ativo), Portugal é o segundo país do continente onde as pessoas trabalham até mais tarde, atrás apenas da Roménia. Da população entre os 65 e os 69 anos, 24 por cento permanecem no ativo e dos 70 aos 74 a percentagem é de 19,1. E isso não tem o sentido positivo que tantas vezes se lhe atribui. Já em 2012, Asghar Zaidi, coordenador deste estudo e professor de Política Social Internacional na Universidade de Southampton, alertava na Fundação Calouste Gulbenkian para uma situação de emergência em Portugal. «O país está num extremo. As pessoas trabalham não por escolha mas por falta de alternativas, devido a pensões de reforma baixas», disse então ao Jornal de Notícias. «E o mais preocupante é que Portugal está no topo dos países onde os idosos têm menos autonomia, dependendo do estado, das famílias ou das instituições para sobreviver.» O governo anunciou na semana passada um aumento das pensões mínimas: um por cento para quem ganha até 259 euros, ou seja, mais 2,59 euros. Daí para cima, as reformas ficam congeladas. Nos valores mais altos, acima de quatro mil euros, voltam a sofrer cortes.

ESTE PAÍS É PARA VELHOS, SIM, DESDE QUE NÃO SEJAM PORTUGUESES.

Desde 2013, há um acréscimo acentuado de reformados suecos, franceses, holandeses, britânicos, italianos e suíços a viver em Portugal – não há dados oficiais. Foi nessa altura que entrou em vigor a lei de 2009 que garante isenção fiscal a aposentados e residentes não habituais, durante dez anos. A Associação dos Profissionais e Empresas de Mediação Imobiliária lançou recentemente um estudo em que assinala que, só no primeiro trimestre de 2014, 3,5 mil cidadãos estrangeiros – no grosso, europeus – investiram no imobiliário português. Isso representa 14 por cento do mercado. As pensões no Reino Unido e na França, no escalão mais baixo, rondam os 700 euros mensais. Na Alemanha, no patamar mínimo, os cidadãos fazem 1263,15 euros por mês. E em Portugal? Este ano, a reforma média para oitenta por cento dos aposentados era de 365 euros, segundo o Ministério das Finanças. Há 2,5 milhões de pensionistas no país. Um milhão e novecentos mil estão no limiar da pobreza.

Era aqui que Elídio Almeida estaria se não se tivesse agarrado ao volante e feito ao asfalto, em 2010. Lisboeta, conhecia bem as ruas da cidade e, antes de ter sido motorista dos transportes escolares, já tinha sido taxista – na altura por conta própria. Pedro Lopes, presidente da Retalis – a maior cooperativa de táxis lisboeta –, diz que o número de reformados a conduzir na capital tem aumentado nos últimos anos. «Neste momento são entre 30 a 40 por cento dos motoristas da cidade.» E garante que há pessoas com mais de 80 anos ainda a trabalhar.
É verdade que quando Elídio se reformou equacionou a hipótese de deixar de trabalhar. Tinha uma pensão de 440 euros e com a mulher ainda a trabalhar, a casa na Margem Sul paga, ele nunca fora homem de vícios, só um café de manhã e outro a seguir ao almoço… «Dava para uma vida sem grandes confortos.» Depois… depois veio a crise, e ele ainda se sentia com forças. «Achei que devia fazer qualquer coisa.» Agora já o preocupa o dia em que tiver de parar. Não tanto por ele, mais pela família. «Diga-me lá, se eu não continuar a dar no duro, como é que vamos viver com um mínimo de dignidade?» Não era este o plano. Nem os sonhos. O dele era levar a mulher aos Açores. «Sempre que vejo os Açores na televisão penso que aquilo é que deve ser bonito.»

A SUSTENTABILIDADE DAS REFORMAS é uma das questões económicas estruturais do nosso tempo.«Teremos de ir au mentando a idade da reforma ao mesmo tempo que vai aumen tando a esperança de vida», diz José Vieira da Silva, ministro do Trabalho e da Solidariedade no primeiro governo Sócrates e da Economia no segundo. «Mas estes anos de crise criaram um problema conjuntural. O desemprego, a inatividade e a emigra ção atiraram dois milhões de pessoas para fora do mercado de trabalho.» É gente que não contribui fiscalmente e acentua um problema que já existia. «O sistema poderia equilibrar-se mi nimamente quando houvesse uma retoma financeira, mas se emigrarem, por exemplo, 400 mil portugueses e não voltarem, como é que vamos pagar as reformas?»

Maria João Valente Rosa, socióloga e autora de O En velhecimento da Sociedade Portuguesa, deixa um aler ta: «Já há mais de um milhão e meio de reformas abai xo do salário mínimo e a tendência é de agravamento. Teremos mais idosos, menos população ativa e cada vez mais gente no limiar da sobrevivência. E não estamos a fazer nada para mudar.» Vieira da Silva não discorda, o caso português é complicado: «Temos muita gente com carreiras contributivas baixas. Os mais antigos, que trabalharam a vida inteira no regi me anterior, não faziam muitas vezes descontos. Há muita gen te que passou vinte ou trinta anos fora do país e não declarou rendimentos.» Também por isso que há tantas reformas baixas.
A história de Elídio Almeida, taxista, tornou-se per versamente banal – existe um país inteiro a trabalhar até ao li mite das forças. São os nossos pais e os pais dos nossos amigos, são os nossos vizinhos do lado. Têm de acrescentar biscates à reforma para ajudar os filhos, pagar medicamentos, comida e rendas de casa. Há gente muito cansada.

CUSTÓDIA BARROS DIZ QUE NÃO AGUENTA MAIS.
Tem 81 anos e uma prótese na anca que lhe dá dores que não a deixam dormir. Não fosse o reumático já um suplício. Tem de caminhar com muletas – e custa-lhe muito baixar-se para raspar e encerar o chão da casa onde faz limpezas todas as sextas feiras. «Já lá estou há 55 anos. Antes ia todos os dias, mas já não consigo tanto. Agora é só uma vez por semana.» Os 120 euros que ganha mensalmente como mulher a dias são preciosos para juntar à reforma de 259,45. Trata do chão e limpa o pó, faz as camas e deixa comida no congelador para a semana inteira. «Só os braços é que me matam a fome, pernas já não as tenho de jeito.»

Nunca na vida conheceu outra coisa que não fosse trabalho. Mora nas Presas dos Currais, Porto, chegou aos 12 anos de Braga, para ser vir em casa de uma senhora da Foz. Quando era gaiata passava os dias a arear pratas e a sacudir tapetes. Aos 20 conheceu o pai dos filhos, nunca se casaram mas viveram juntos – numa casa na Areosa que ti nha quintal e três quartos. Tiveram quatro filhos. Quando o mais no vo nasceu, o marido foi para Angola. Morreu num acidente de carro quando o bebé tinha 6 meses. «Como não era casada não tive pensão de viuvez. Tinha 40 anos e tive de trabalhar muito.»
Manhãs, tardes e noites, só parava ao domingo. Nunca descontou, é de outro tempo. Trabalho de limpezas é pago com dinheiro vivo. Conseguiu pôr os miúdos a estudar, dois emigraram, um é motorista de autocarros no Porto, uma vive em Braga. Quando se reformou, começaram os problemas. O filho mais novo ganha o salário mínimo, nunca saiu da cepa torta. A neta, a crescer, começava a pedir coisas, e era a avó que acabava por dar-lhe os mimos. Até que Custódia deixou de conseguir trabalhar. Antes da reforma fazia oitocentos euros por mês, safava-se. «Vieram os problemas na anca, tive de ficar hospitalizada. Durante meses fiquei só com o dinheiro da reforma.» Acabou por ter de se mudar da Areosa para um barraco húmido, sem casa de banho mas com a renda a dez euros que conseguia pagar. Com o que agora passava a ganhar era tudo o que conseguia.

O casebre era a antiga arrecadação de um quintal. Uma cozinha numa divisão interior, onde mal cabe um fogão. Quarto e sala juntos na mesma divisão. Um colchão em cima de um estrado, por cima uma estrutura onde estão empilhados os cobertores para o inverno. Um armário para a roupa. Duas cadeiras, uma televisão, bibelotse fotografias dos netos. «Gasto 10 euros na renda, mais 50 de luz, porque a casa é muito fria e tenho de me aquecer. De gás vão 27, mais 15 para a água, tenho uma puxada de uma vizinha para o quintal e pago–lhe a ela.» Cinquenta vão para os medicamentos, dez para o telefone. «O meu filho vem cá comer todos os dias, mas carne já não faço há muito tempo.» Às vezes vai ao talho pedir umas sobras de carne para o cão. Não são para o cão. Perder forças seria um luxo. Se não trabalhar, Custódia vai passar fome – ela, o filho, a neta. A Liga Nacional contra a Fome vai dando uma ajuda, arroz e massa, uns pacotes de leite de vez em quando.

«Isto é uma nova forma de escravatura», diz, de forma crua, Adalberto Dias de Carvalho, professor da universidade do Por to que coordena o Observatório da Solidão e autor do livro An tropologia da Exclusão ou o Exílio da Condição Humana. «Um indi víduo que tenha chegado à idade de se reformar mas não pos sa sequer pôr em causa a ideia de parar está a ser despojado da sua identidade. Não é ninguém, a não ser o trabalho que execu ta. Não pode decidir, não pode pensar o presente nem projetar o futuro.»

Sónia Silva, psicóloga da associação de solidariedade portuense, anda assustada com o número de idosos que antes tinham vidas dig nas e agora têm de recorrer à ajuda alimentar. «De 2012 para cá as coisas pioraram muito. Os filhos estão no desemprego ou emigra ram, estas pessoas foram perdendo as estruturas de apoio e estão so zinhas. Mas também estão velhas, sem forças, vulneráveis. Tentam arranjar trabalhos não declarados, para não perderem nem um cên timo. É um mundo escondido, à vista de toda a gente.» A Lei Geral de Aposentações permite aos reformados trabalharem em empresas privadas, sem risco de perderem as pensões. Já para o sistema públi co, trabalho remunerado retira o direito à reforma.

DEPOIS HÁ CASOS COMO O DE FÁTIMA LOPES, 56 anos, que há 12 teve de se aposentar por invalidez. «Metade de mim é metal», brinca. Foi operada três vezes à coluna, três hérnias. Da última vez puseram-lhe um aparelho nas costas e nas pernas. Foi reformada compul sivamente, contra a sua vontade. «Marcaram-me a junta médi ca, nem sabia ao que ia. Pedi para continuar a trabalhar, disse ram-me que na minha condição não era possível. O mundo fu giu-me dos pés.» Passava a contar com 345 euros por mês, pela reforma antecipada. Só a renda de casa eram 250. Antes trabalha va como administrativa na Marinha Mercante, os certificados de importação e exportação eram sua responsabilidade. «Ganha va bem, 1500 euros caíam na conta mensalmente, podia propor cionar uma boa razoável aos meus filhos.» Tem três, dois rapazes e uma rapariga. O marido saiu de casa quando a saúde dela piorou. O filho mais velho quis fazer carreira na tropa, o segundo trabalha va, mas tinha também alguns problemas de saúde e teve de parar. A rapariga, Cláudia, era o orgulho da casa, tão boa aluna que ganhou uma bolsa de estudos – toda gasta a pagar a renda dos meses seguin tes. «Mudei-me para casa da minha mãe, que entretanto faleceu. A reforma dela era o que nos valia. Enquanto durou.»

Durante um ano vendeu todo o ouro da casa, pediu dinheiro a fami liares, gastou o que tinha posto de parte. «Chegámos ao Natal de 2002 a comer massa com massa ou arroz com arroz. Houve um dia em que pensei que era mais fácil parar com tudo, enfrascar-me em compri midos e acabar com a minha vida. Se não fossem os meus filhos era is so que eu tinha feito.» Decidiu pedir ajuda alimentar. Valter, o filho do meio, começou a trabalhar como segurança. Cláudia acabou o 12.º ano com média 17 e começou a trabalhar nos serviços administrativos de um hotel, 580 euros que iam para as contas de casa.
Há cinco anos, a ajuda alimentar começou a escassear e Fátima voltou a temer. E então decidiu-se: «Vou trabalhar.» É isso que faz hoje, na Liga Nacional contra a Fome. «Faço telemarketing, tento convencer pessoas a patrocinarem a associação.» Começou o dia inteiro, mas o corpo não aguenta – tem ordens dos médicos para não passar demasiadas horas sentada. Agora faz as manhãs, dois auto carros para chegar ao outro lado da cidade e o resto do percurso a pé, de muletas. «Não recebo dinheiro, recebo comida. Eu trabalho a troco de comida», diz. E desata num pranto.

A socióloga Maria João Valente Rosa insiste que estas pessoas não podem cair num «véu de abandono» e que um país europeu tem obri gação de não permitir a quem trabalha viver no limiar da sobrevi vência. «Temos de pensar como vamos evitar os casos mais graves no futuro. A maior parte destas pessoas não pensava que teria vin te anos de vida pela frente depois de se reformar, porque a realidade mudou e o envelhecimento é um facto.» Continuará a sê-lo. Segun do estimativas do Instituto Nacional de Estatística, o país terá três milhões de idosos em 2070. «Aumentar a idade da reforma, dimi nuir pensões ou fazer subir as contribuições são cuidados paliativos. Temos seriamente de nos preparar para o futuro.»

Só uma redefinição do modelo de trabalho permitirá um sistema viável para o futuro, segundo a opinião desta socióloga. E que põe a tónica também no sistema laboral. «Em Portugal, as empresas es tão interessadas no cumprimento de horários, quanto mais horas se trabalhar, melhor.» Se o foco fosse colocado nos trabalhadores, isso, além de torná-los mais autónomos, permitia-lhes adquirir no vas competências, o que era bom para as empresas e os ajudava a preparar o futuro. «As pessoas precisam de tempo para se prepa rarem para novas circunstâncias. O que está a acontecer é uma re petição de um modelo gasto, que retira aos cidadãos a capacidade de se adaptarem. É uma questão de dignidade humana, tem de ser trabalhada pelos trabalhadores, pelos empresários, por toda a gen te. E tem de ser o Estado a dar o exemplo.»

NO VERÃO COMEÇAM ÀS CINCO, agora que chegou o outono já po dem dormir até às seis e meia. Francisco Patrício, 76 anos, e Catarina Pires, 75, guiam a vida ao ritmo da terra. Ela dedica-se à horta e às ga linhas, ele ainda pega no trator para lavrar trigo ou aveia, e na época da apanha da azeitona supervisiona os trabalhos. «Mas a minha pai xão são as abelhas», diz o homem com sotaque alentejano. «Tenho quarenta colmeias que me dão mel para o ano inteiro.»

Francisco tem um cancro, e não tem qualquer problema em admi ti-lo. «Hei de trabalhar até morrer, que remédio. Nós, alentejanos, nascemos com terra no sangue.» E poesia na boca, está visto. Já teve dias piores, quando a quimioterapia o impedia de amanhar o cam po. Mas nem nos piores tempos se esquivava a ir aos favos. Nem po dia. «Juntos, eu e a minha mulher temos uma reforma de 600 euros. Produzimos quase tudo o que comemos e o dinheiro vai todo para os medicamentos.» Ainda pensaram em inscrever-se num lar das re dondezas, mas é 350 euros por pessoa – e não lhes chega a carteira.

Não bastavam os problemas de saúde para lhes tirar o sono, o go verno quer agora tirar-lhes a terra. O casal é rendeiro da Herdade dos Machados, no concelho de Moura. Em junho, receberam uma carta do Ministério da Agricultura, a pedir o abandono dos hecta res que cultivam desde 1980. Ao todo, foram contactadas 14 pesso as, todas reformadas há uma boa dezena de anos. «Como já não te mos idade de trabalhar, dizem-nos que já não temos direito de ex ploração», queixa-se Francisco Farinho, porta-voz da indignação. «Mas agora explique-me lá como é que vamos sobreviver sem ter ra para cultivar?»

A divisão de terra nos Machados foi a resposta de Sá Carneiro à reforma agrária dos anos 70. O Estado tinha nacionalizado a her dade em 1975 e o então primeiro-ministro decidiu dividir cerca de 3000 hectares em 338 lotes de terreno. Os 94 funcionários da pro priedade passaram a pagar ao Estado uma renda anual para pode rem explorar as terras em seu proveito e os anteriores proprietários não receberam mais de 490 hectares. Antes da revolução, tinham 6100. «Quando aqui veio, Sá Carneiro prometeu-nos que isto seria nosso para sempre. Agora vem a Assunção Cristas dizer o contrá rio», diz Farinho. «Não se tira o tapete do chão assim a pessoas que já estão velhas.»

FERNANDO GROSSO, 59, ANDA COM A CABEÇA ÀS VOLTAS, se os pais per dem as terras vão viver onde? Os velhotes estão já nos oitentas, ele an da a ajudá-los porque o emprego nas obras escasseia. «Se for preciso emigro, mas eles vivem aqui, se os mandam embora vão viver para a rua.» Por mais barata que encontrem uma casa, não lhes dá para co mer e pagar medicamentos. «E eu não os posso ajudar.»

É fácil perceber o dilema. Para quem vive no campo há sempre uma horta, disfarça-se a pobreza com uma enxada. Sem terra pa ra trabalhar, esta gente não tem como viver. Mas nas cidades e nos subúrbios são aos milhares os idosos que continuam a fazer pela vi da. São velhas a cuidar de velhos em lares. São outras que vendem comida e bordados. Limpam escadas, limpam casas, passam a fer ro de tornozelos inchados. São motoristas de táxi, vendedores de tupperware, tiram bicas nos balcões dos cafés, vendem jornais nos quiosques. Fazem trabalhos de pintura, eletricidade, canalizações. O que podem. Atrás destas histórias está um drama que é do país inteiro e, ao mesmo tempo, a tragédia de cada um.