Por Lucília Tiago, in Dinheiro Vivo
O número de portugueses em risco de pobreza aumentou em cerca de 100 mil entre o início da crise (em 2008) e o ano em que a economia regressou a terreno positivo (2014), o que significa que no ano passado estavam nesta situação 2,86 milhões de pessoas. A situação é menos grave quando se têm em conta as transferências socais mas, mesmo assim, os dados divulgados esta sexta-feira pelo Eurostat mostram que a tendência se agravou ao longo daqueles seis anos.
Em média, um em cada quatro cidadãos da União Europeia (ou seja 24,4%) apresentava em 2014 um perfil e nível de rendimentos que o colocava em risco de pobreza. Traduzindo em números, esta percentagem equivale a 121,86 milhões de pessoas. Deste total, 2,85 milhões vivem em Portugal, o que equivale a 27,5% da população nacional.
Os dados do Eurostat, divulgados a propósito do Dia Internacional de Erradicação da Pobreza, mostram que a crise deixou marcas na maioria dos países que integram a UE, que viram o universo de pessoas em risco de por base aumentar entre 2008 e 2014. As exceções a esta regra são poucas e nem a Alemanha escapou.
Mesmo quando este risco é medido depois de se terem em conta as transferências sociais, verifica-se que a tendência se agravou entre 2008 e 2014. O que pode ser explicado pelo facto de muitos Estados se terem visto obrigados a reduzir as despesas em apoios sociais. Esta tendência de corte nos apoios terá sido mais expressiva nos países que estiveram ou se encontram ainda sob o efeito de programas de ajustamento financeiro.
Por cá, entre 2008 e 2014, vários fatores terão contribuído para esta situação já que neste período registou-se uma redução do universo de famílias elegíveis para receber o abono de família, assistiu-se a um corte do valor do subsídio de desemprego, ao congelamento das reformas ou ainda a um aperto nos critérios de concessão do rendimento mínimo ou do complemento social para idosos. Considerando o impacto destas transferências sociais, constata-se que em 2008 se encontravam em risco de pobreza 18,5% dos portugueses e que em 2014 eram 19,5% (igual ao valor observado em 2013).
Portugal está ainda assim, longe de ser dos países com piores indicadores. A lista de Estados-membros com maior percentagem de pessoas em risco de pobreza é liderada pela Roménia (40,2%) e pela Bulgária (40,1%), seguindo-se a Grécia (36%), Espanha (29,2%) e Itália (28,1%). No extremo oposto desta tabela, surgem a República Checa, Suécia, Holanda, Finlândia e Dinamarca, todos com menos de 18%.
Grécia lidera subidas
Por trás desta fotografia de valores finais, esconde-se a movimentação registada de 2008 para 2014 que coloca a Grécia no topo da lista dos países que viram aumentar de forma mais expressiva a população em risco de pobreza (que disparou naquele período, quase 8 pontos percentuais). O efeito dos vários planos de austeridade (a Grécia prepara-se para entrar, de forma consecutiva, no terceiro) contribuíram para que o risco de pobreza entre os gregos se tivesse acentuado mesmo quando este indicador têm em conta as transferências sociais - que ajudam a equilibrar o rendimento das famílias mais pobres.
Os indicadores utilizados pelo Eurostat consideram encontrar-se em risco de pobreza os portugueses que que em 2014 tinham um rendimento anual inferior a 4937 euros - ou 10368 euros quando está em causa um casal com duas crianças.
Famílias com crianças estão mais vulneráveis
O Instituto Nacional de Estatística revelou também esta sexta-feira os resultados do seu inquérito ao rendimento e condições de vida em 2013 que mostram que 19,5% das pessoas estava em risco de pobreza (mais 0,7 pp do que em 2012). Destes, um em cada cinco já estava nesta situação em pelo menos dois dos três anos anteriores.
As crianças foram o grupo mais afetado pelo aumento da pobreza e onde este risco é mais elevado, atingindo 25,6%. Por este motivo, as famílias com crianças foram as mais afetadas e são as que apresentam uma situação mais frágil.
O INE mostra ainda que cerca de 73,6% das pessoas em risco de pobreza travou idas ao médico ou a realização de exames por não ter capacidade financeira para os pagar. Esta percentagem é ainda maior, atingindo os 96,4% quando estão em causa tratamentos dentários.