Virgínia Alves, in Dinheiro Vivo
Têxtil e construção são dos setores mais afetados pelos baixos salários, mas o fenómeno chega agora aos jovens licenciados.
Agora, os jovens licenciados vieram reforçar as estatísticas das remunerações mais débeis. Sindicalistas e empresários explicam a mudança. Para a CGTP, a existência de salários mínimos entre os trabalhadores altamente qualificados tem a ver com o crescimento do desemprego. O sindicalista Manuel Guerreiro nota que “são muitas as empresas de informática e novas tecnologias que contratam os jovens que saem das universidades, muito bem preparados, e pagam-lhes o salário mínimo, ou por vezes menos, e sem horários”. Pedro Lopes, do Sindicato dos Trabalhadores e Técnicos de Serviços, vai mais longe: “No setor terciário, de serviços, onde não existe contratação coletiva, banalizou-se a chamada prestação de serviços. Isso sucede nas empresas de tecnologias de informação, com programadores, mas também na hotelaria e turismo, onde não há vínculos de trabalho e os ordenados são até inferiores ao salário mínimo nacional”.
Setores tradicionais A par desta nova realidade, os setores tradicionais, como o têxtil e a construção, continuam a ser dos que mais pagam o salário mínimo, como assinala o Banco Central Europeu no seu último boletim, onde dá igualmente conta de que o desemprego real é o dobro dos valores divulgados pelos países da União Europeia. Armando Farias, da CGTP, sublinha que aqueles dois setores “continuam numa política de baixos salários, de mão de obra intensiva e pouco qualificada”. Osvaldo Pinho, do Sindeq-UGT, refere que “o aumento do salário mínimo [de 505 para 530€] vai ter um grande impacto no setor têxtil, que no global pode abranger cerca de 210 mil trabalhadores”. Salienta que, nesta área, há três convenções diferentes: a têxtil, “que abrange cerca de 100 mil trabalhadores, o vestuário, cerca de 70 mil operários, e o têxtil-lar, com cerca de 40 mil trabalhadores. Neste último caso, várias empresas já pagam acima do salário mínimo”. Quanto à construção civil, todos afirmam que é um setor em crise, com elevado desemprego, o que faz baixar os ordenados. Já no calçado, várias empresas pagam acima do salário mínimo, ou então criaram “um sistema de prémios, mensais ou anuais, por objetivos, disponibilidade ou até idade, que valem em média 3 a 4% do salário”, adiantou Osvaldo Pinho. O presidente da APICCAPS, a associação industrial do setor, Fortunato Frederico, já afirmou que o aumento do salário mínimo vai ter impacto no setor, porque algumas empresas estão bem estruturadas e financeiramente saudáveis, mas o tecido empresarial é composto por muitas pequenas empresas, muitas pouco estruturadas, descapitalizadas, sem reservas financeiras”.
Enquanto empresário e presidente da Kyaia, o maior grupo português de calçado, revelou que, na sua empresa, optou por um modelo de prémios no final do ano, em função dos lucros e do desempenho de cada trabalhador. Este ano, o prémio vai oscilar entre 700 e 250 euros. Grande distribuição Algumas empresas da grande distribuição anteciparam-se à subida do salário mínimo e anunciaram que vão fazer aumentos acima do valor de referência. É o caso do Lidl, do Pingo Doce e do El Corte Inglés, que já pagavam acima desse valor e vão aumentar no próximo ano. João Vieira Lopes, presidente da Confederação de Comércio e Serviços, explica que o setor “é muito heterogéneo. Os grandes grupos pagam acima da média, mas representam 10% dos 680 mil trabalhadores”. Acrescenta que “os grossistas pagam cerca de 510€, as empresas quase todas pagam mais e o comércio tradicional paga muito menos”. Mesmo assim, no setor terciário, Vieira Lopes dá como exemplos de baixos salários os serviços de limpeza (com mais de 130 mil trabalhadores), empresas de segurança (com dezenas de milhares de trabalhadores, “embora algumas já tenham melhorado os ordenados”) e ainda a restauração, “essencialmente nas cozinhas”.