Alexandra Campos, in Público on-line
Governo quer modernizar o Serviço Nacional de Saúde. Propostas de reforma foram apresentadas em Lisboa.
Imagine que passa a ter consultas de oftalmologia ou de saúde oral (dentista) no seu centro de saúde e que pode escolher o hospital onde se vai tratar. São duas ideias entre muitas outras que podem vir a tornar-se realidade em breve, se as propostas para reformar o Serviço Nacional de Saúde (SNS) – que esta quarta-feira foram apresentadas em Lisboa – tiverem condições para se concretizar no curto prazo, como pretende o Governo.
O objectivo é modernizar o SNS e direccioná-lo para as pessoas, explicou o secretário de Estado Fernando Araújo, numa conferência de imprensa que serviu para listar as linhas prioritárias da reforma e apresentar os especialistas convidados para a coordenar. Algumas das propostas até já são realidade em alguns locais e unidades de saúde. Um exemplo: ter equipas fixas nos serviços de urgência/emergência (profissionais de saúde dedicados, em vez do actual sistema em que todos os médicos fazem rotativamente urgências) já é a regra em vários hospitais que pagam mais aos clínicos que asseguram este serviço tão exigente.
Mas esta proposta, tal como as outras, ainda vai ter de ser trabalhada e testada no terreno. A concretizar no prazo de três anos, a hipótese das chamadas "equipas dedicadas nas urgências" será discutida com "cada um dos hospitais” e poderá não ser um “um modelo único” em todos, podendo haver equipas mistas, esclareceu o governante.
Mas a reforma na área hospitalar não se fica por aqui. O presidente do conselho de administração do Centro Hospitalar S. João (Porto), António Ferreira, o perito convidado pelo Governo para apresentar propostas de reforma na área dos cuidados hospitalares, disse que os objectivos das mudanças que preconiza passam pela melhoria da acessibilidade, da transparência e da eficiência.
Fernando Araújo foi mais específico e precisou que se pretende avançar com algumas “experiências reais” de liberdade de escolha no SNS – permitindo que o doente possa escolher com o seu médico de família o hospital onde vai ser seguido, tendo em conta os tempos de espera que passarão a ser publicitados. A ideia é promover uma espécie de "mercado interno", o que na prática implicará que as unidades com mais capacidade possam executar mais actos e ser financiadas por isso.
Nos centros de saúde também estão previstas várias melhorias: a ideia é equipá-los com meios auxiliares de diagnóstico e terapêutica (análises clínicas) e arrancar com projectos-piloto para, por exemplo, introduzir consultas de saúde oral (médicos dentistas), de oftalmologia, de psicologia, de nutrição ou de fisioterapia.
De resto, tal como estava expresso no programa do Governo, pretende-se criar mais unidades de saúde familiar (USF) e, para promover a qualidade dos serviços, investir nas figuras do enfermeiro de família e do secretário clínico. O serviço de secretariado clínico, explicou Henrique Botelho, o dirigente da Federação Nacional dos Médicos escolhido para coordenar a reforma na área dos cuidados de saúde primários, é o primeiro ponto de contacto com o utente e é necessário ter “um sistema simpático, disponível para as pessoas, para as ouvir”.
Medicamentos para cancro e VIH nas farmácias
Já no próximo ano, o Ministério da Saúde quer também avançar com projectos-piloto para distribuir medicamentos a doentes com cancro e com VIH/sida nas farmácias, evitando que tenham de ir aos hospitais levantar os fármacos. Fernando Araújo adiantou, a propósito, que o debate com a Ordem dos Farmacêuticos e as associações de farmácias já está em curso e que vão ser seleccionados os "melhores locais" para avançar.
Outra área crucial da reforma é a dos cuidados continuados integrados, considerando o Ministério da Saúde prioritários os investimentos nas redes de saúde mental e na pediátrica. Na saúde mental, já houve um conjunto de candidaturas para a criação de unidades que ainda não arrancaram, especificou Manuel Lopes, do Observatório Português dos Sistemas de Saúde, o coordenador para a reforma nesta área. "Vamos ver caso a caso as unidades contratualizadas por que não arrancaram e pô-las a funcionar o mais rapidamente possível", disse. Admitiu que na pediatria o processo vai demorar mais tempo, porque não existem ainda sequer tabelas de financiamento publicadas.
Prioritário é também o levantamento das carências e das deficiências na articulação entre os hospitais e esta rede. "Há carências de cuidados continuados em áreas geográficas do país, algumas bem no centro de Lisboa, carências quase escandalosas para as quais é preciso resposta bem rápida", afirmou Manuel Lopes.
Também é intenção do Governo investir nos cuidados domiciliários, outra área que está "subutilizada”, lamentou o especialista. “Há equipas grandes já criadas e que estão utilizadas a 50% ou 60%", observou. É preciso igualmente apoiar os cuidadores dos doentes em casa: "Há muitas pessoas que fazem isso por obrigação familiar, com enorme sofrimento". com Lusa