3.7.17

Em 28 países, Portugal está na 22.ª posição no índice europeu da habitação

Joana Gorjão Henriques, in Público on-line

Relatório da ONU sobre habitação em Portugal denuncia violações de direitos humanos que a relatora já tinha assinalado em Dezembro, na sua visita ao país. “A habitação e os preços do arrendamento estão a subir a uma taxa que gera preocupação”, diz.

É um ranking de 28 países e Portugal está em 22.º lugar no Índice Europeu de Exclusão da Habitação, publicado pela FEANTSA, a federação europeia de organizações nacionais que trabalham com população sem-abrigo, apoiada pela Comissão Europeia. Este lugar é calculado a partir do cruzamento de indicadores como o peso da habitação no orçamento pessoal, as dívidas por causa de pagamento de renda ou de empréstimo ao banco, a incapacidade de manter a casa quente, problemas sérios nas condições de habitalidade (como buracos nas paredes ou humidade) e sobrelotação. A posição ocupada por Portugal é uma das piores, já que o número "um" corresponde ao melhor classificado.

O ranking foi citado por Leilani Farha, Relatora Especial da Organização das Nações Unidas (ONU) que esteve em Portugal em Dezembro para avaliar o impacto das medidas de austeridade nas populações vulneráveis, e que acaba de publicar o seu relatório final no site do Alto Comissariado para os Direitos Humanos da ONU. No documento, Leilani Farha sublinha que uma em cada quatro pessoas em Portugal tem sérios problemas para manter a sua casa quente (23,8%), quase três vezes mais do que no resto da União Europeia. E que a falta de habitação é um problema sobretudo para jovens entre os 20 e os 29 anos.   

Relatora da ONU sobre habitação em Portugal: “Algumas das condições que vi são deploráveis”

Natural do Canadá, advogada, Leilani Farha já tinha afirmado em Dezembro, numa entrevista ao PÚBLICO, que estava chocada com algumas situações que vira, nomeadamente no bairro da Torre, em Loures, nas "Ilhas" do Porto (casas minúsculas sobrelotadas) ou no bairro 6 de Maio, na Amadora. No relatório final voltou a referir estes exemplos lembrando que “são condições de habitabilidade que nunca esperamos ver, e não certamente num país desenvolvido que ratificou vários instrumentos internacionais de direitos humanos”. 

No documento de 33 páginas, a relatora, que elogia Portugal por consagrar na sua Constituição o direito a uma habitação condigna, afirma que houve violação dos direitos humanos nos despejos feitos pela Câmara Municipal da Amadora por deixar famílias sem casa. Também considera que as condições das "Ilhas" são contrárias aos standards internacionais de direitos humanos, bem como o bairro da Torre, em que não há electricidade nem água potável em algumas zonas: chama-lhe uma “ferida vergonhosa”. A relatora mostra preocupação com a discriminação e exclusão de populações de etnia cigana e afrodescendente que habitam nestes bairros informais.

Numa análise exaustiva, surpreende-se com o facto de não existir uma lei-quadro da habitação (algo que a deputada Helena Roseta tem proposto). O retrato que faz é baseado em várias estatísticas que recolheu: considera francamente baixo os 2% de habitação social, “uma das taxas mais baixas da Europa”. Citando o INE, diz que 11% das pessoas que vivem na pobreza estão em situação de graves carências habitacionais e quase 10,3% vivem em casas sobrelotadas.

Recomenda, assim, que Portugal faça uma revisão da política de despejos de modo a assegurar que os direitos dos inquilinos estejam protegidos. E diz que o Governo deve fazer uma “avaliação da necessidade real de habitação social e da habitação subsidiada ou controlada por renda em todo o país”, comprometendo-se “a pôr termo à situação dos sem-abrigo”.

Deixa ainda um recado: apesar do enorme afluxo de capitais, a política dos Vistos Gold não teve como consequência a criação de empregos, nem “uma parte dos seus rendimentos foi aplicada para desenvolver habitação a preços acessíveis”. Esta política, juntamente com a falta de arrendamento de longo prazo, e o acesso mais fácil ao crédito para a compra de casas, “pode ter exacerbado as questões de acessibilidade para famílias de rendimento médio e baixo”, sublinha. “A habitação e os preços do arrendamento estão a subir a uma taxa que gera preocupação”, completa a relatora que dedica também uma parte do relatório ao turismo e ao arrendamento de curta duração dizendo que é necessário regulá-lo.