Por Mariza Tavares, in Globo.com
Jornalista, mestre em comunicação pela UFRJ e professora da PUC-RIO, Mariza escreve sobre como buscar uma maturidade prazerosa e cheia de vitalidade.
Estereótipos e preconceitos podem inclusive levar a distorções nos tratamentos de saúde
A médica geriatra Louise Aronson tem uma missão: incentivar a visão de que as décadas de vida depois dos 60 anos devem ser celebradas, em vez de temidas. Isso inclui as faculdades de medicina e os profissionais de saúde, que precisam entender e apoiar as muitas fases que compõem a velhice. Afinal, se há diferentes abordagens para tratar um ser humano do nascimento à adolescência, o mesmo se aplica quando somos velhos. Essa é a tese do livro “Elderhood: redifining age, transforming medicine, reimagining life” (“Velhice: redefinindo idade, transformando a medicina, reimaginando a vida”, em tradução livre), lançado em junho.
Louise também é professora na Universidade da Califórnia, em São Francisco, e tem mais de 20 anos de experiência em geriatria, o que a transformou numa militante da causa de que devemos encarar o envelhecimento com outros olhos. No livro, ela se vale de História, literatura e antropologia para mostrar como o preconceito está impregnado em nossa cultura.
“Temos que nos livrar da carga negativa que envolve o fato de ser velho. Há muita coisa boa acontecendo nesse período da vida e é importante lembrar que todas as fases têm seus prós e contras. Quem está na casa dos 60 e 70 apresenta menos estresse e mais satisfação do que os adultos mais jovens. Dos 60 aos 100 anos, há inúmeros estágios, a velhice não pode ser vista como um bloco. Há alegrias, prazeres, contribuições e prioridades que não podem ser esquecidos!”, enfatiza.
Dentro da medicina, aponta duas distorções graves. “Os estereótipos relacionados à velhice podem levar a excessos no tratamento (“overtreatment”) ou, na ponta oposta, a subtratamentos (“undertreatment”). Ela gosta de contar a história de um homem de 90 anos que, ao se queixar de dor num joelho, ouviu do médico que o problema era compatível com a sua idade. “No entanto”, respondeu o paciente, “meu outro joelho tem a mesma idade e não me incomoda”. Um outro idoso foi levado às pressas para a emergência por causa de uma trombose, deixando para trás seu aparelho de surdez. No hospital, foi diagnosticado com demência porque não respondia às perguntas que, obviamente, não ouvia. “O sistema tem falhado com os mais velhos”, sentencia.
“Os corpos se comportam de outra forma com a progressão dos anos, o que deve ser levado em conta na hora da prescrição de medicamentos. O fígado e os rins mudam, o cérebro muda, o risco de efeitos adversos cresce. É essencial considerar o que o paciente quer e como a intervenção vai impactar em sua qualidade de vida”, afirma.
Uma de suas preocupações é o pouco treinamento que os médicos recebem para lidar com os mais velhos, embora eles representem 40% dos pacientes tratados por esses profissionais. Nos EUA, por exemplo, há cerca de 7 mil geriatras para 49 milhões de idosos. No Brasil, esse número não chega a 2 mil, para um contingente de 30 milhões. A OMS (Organização Mundial de Saúde) recomenda um especialista para cada mil idosos, ou seja, temos um déficit de 28 mil profissionais.
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