3.12.15

Inclusão Social pelo Desporto

João Martins, in "Cais"

Cooperação entre clubes, federações e instituições de apoio social é uma via a seguir Inclusão Social Pelo Desporto É um caminho que tem vindo a ganhar cada vez mais adeptos na área social. O Desporto, como ferramenta para a inclusão social, tem a capacidade de fomentar a prática da actividade física e combater os vários tipos de discriminação, sobretudo entre os mais jovens. Mas para isso, é não só necessário um investimento na formação de técnicos desta área, como também uma maior cooperação entre os clubes e o apoio social. Com a crescente preocupação da população em criar hábitos de vida saudáveis, a actividade física tem vindo a assumir um papel importante. E o desporto, como fenómeno social, tem o poder aglutinador de promover as relações sociais e o espírito de equipa. "A interacção que se desenvolve no desporto, em cada modalidade, é uma ferramenta rica em termos de aprendizagem ao nível das relações sociais", defende Salomé Marivoet, professora de Sociologia e especialista em Inclusão Social Pelo Desporto. Com um maior nível de incidéncia entre os jovens, o desporto consegue potenciar a aproximação entre os mesmos.

"Pode criar 'palcos de proximidade , explica a docente universitária, "porque o facto de estarem todos a praticar desporto, com o mesmo vestuário e a participar com os mesmos objectivos (sobretudo em desporto colectivos) vai permitir que haja uma aproximação". É um mecanismo importante para evitar o preconc discriminação que levam à exclusão social dos indiv mais carenciados ou que fogem à norma, em relação suas escolhas sociais ou características físicas. "O Desport tem a capacidade de dinamizar vínculos afectivos e o estreitamento de relações", sublinha Salomé Marivoet. Sentido de pertença Portadora de deficiência mental, Inês Fernandes, 27 anos, descobriu no desporto adaptado a oportunidade de aumentar o seu sentido de pertença na sociedade, mas também de poder praticar uma modalidade pela qual é apaixonada desde pequena: o Atletismo. "Vem de outras gerações", conta a atleta, natural de Valença do Minho, Viana do Castelo, e especialista no lançamento do peso. Escolha de Muno Gomes

"Acredito que os valores no desporto devem ser de igualdade, aceitação, compreensão, independentemente das escolhas das pessoas, das suas características ou das suas próprias limitações." Abel Xavier (Ex-Futebolista)

"Tenho treinado e lutado muito. E por isso vou estar nos próximos Jogos Paralímpicos" Inês Fernandes (Atleta de desporto adaptado - Atletismo/Lançamento do Peso) "Seguimos o princípio da universalidade, que não exclui, antes pelo contrário: inclui todas as pessoas." Augusto Baganha (Presidente do Instituto Português do Desporto e Juventude) Na família, já a tia e as irmãs praticavam Atletismo. Mas para Inês esta modalidade é mais do que um hobbie: actualmente prepara-se para os próximos Jogos Olimpicos, em 2016,a acontecerem no Rio de Janeiro.

"Tenho treinado e lutado muito. E por isso vou estar nos próximos Jogos Paralímpicos", revela a atleta. Esta é a segunda vez que o seu esforço e dedicação são reconhecidos, depois de ter participado nos Jogos Olímpicos de Londres, em 2012. "O desporto é, sem dúvida, uma dimensão social que permite a afirmação pessoal de qualquer indivíduo, mas principalmente nos indivíduos com deficiência", destaca Humberto Santos, Presidente do Comité Paralímpico de Portugal (CPP). Criado em 2008, o CPP veio reforçar o trabalho integrado entre as associações nacionais de desporto de pessoas com deficiência e as federações das várias modalidades disponíveis. "Hoje, pessoas com deficiência praticam um conjunto de modalidades a que outrora não tinham acesso e nos espaços das respectivas federações", explica o Presidente. Mas Humberto Santos defende que ainda é preciso fomentar esta maneira de pensar na sociedade. E para que isso aconteça, é preciso que comece com "a actividade física na escola".

E importante que professores e alunos "sejam elementos de motivação para que a prática de modalidades adaptadas permaneça e seja desenvolvida nas escolas", salienta. Das ruas para os grandes estádios Abel Xavier, 42 anos, ex-jogador da selecção portuguesa de futebol, descobriu no desporto a sua forma de vida. "Era um jovem que jogava futebol de bairro, que era praticado sem regras, com total liberdade mas obviamente que ansiava por entrar num clube ", recorda. Xavier nasceu em Moçambique mas chegou ao nosso país em criança, quando começara a dar os primeiros toques na bola. Apesar da sua cor de pele, não se lembra de ter sido discriminado. "Não acredito que, de uma forma vincada, Portugal seja um país intolerante", refere, "porque o futebol também evoluiu com a multiculturalidade, nomeadamente através da presença de jogadores vindos dos PALOP". Desempenhando agora a profissão de treinador, Abel Xavier acredita na inclusão social pelo desporto, e por isso partilha bons valores em cada sessão de treino. "Acredito que os valores no desporto devem ser de igualdade, aceitação, compreensão, independentemente das escolhas das pessoas, das suas características ou das suas próprias limitações", defende o treinador.

©Joseba Zarate Randez "A interacção que se desenvolve no desporto, em cada modalidade, é uma ferramenta rica em termos de aprendizagem ao nível das relações sociais." Salomé Marivoet (Professora de Sociologia e especialista em Inclusão Social pelo Desporto) "O desporto é, sem dúvida, uma dimensão social que permite a afirmação pessoal de qualquer indivíduo, mas principalmente nos indivíduos com deficiência." Humberto Santos (Presidente do Comité Paralímpico de Portugal)

O projecto Futebol De Rua Como instrumento de capacitação, no desenvolvimento de competências pessoais e sociais, nasceu em 2004 um dos mais importantes projectos sociais na área do desporto: o Futebol de Rua. Ao longo dos últimos anos tem crescido e reunido importantes apoios, como é o caso do programa "Football for Hope". Criado pela Associação CAIS, em parceria com inúmeras entidades públicas e privadas, o Futebol de rua promove a prática desportiva e a sua utilização como estratégia de intervenção, pela inclusão social. Há 4 anos que O Companheiro é uma das 110 IPSS que integram o projecto Futebol de Rua no seu plano de actividades de acção social. "Tem sido algo muito produtivo e proveitoso, não só para a prática da actividade física mas acima de tudo para a organização das pessoas com quem trabalhamos [reclusos e ex-reclusosj", destaca José Brites, Presidente d'O Companheiro. O coordenador do projecto Futebol de Rua, Gonçalo Santos, refere que "o grande objectivo é que o Futebol de Rua seja mais uma ferramenta, útil, para o desenvolvimento da motivação, auto-estima, assertividade, resiliência, respeito, trabalho de equipa de todos os participantes". São estes valores que Faduley Baía, 23 anos, aprendeu ao longo dos 3 anos de participação no Futebol de Rua.

"A parte social do Futebol de Rua é muito importante porque conhecemos pessoas, convivemos, ouvimos histórias", explica o jovem oriundo de São Tomé e Principe. O projecto tem vindo a aumentar o número de participantes (no ano passado foi alcançado um total de mais de 900 participantes) e isso reflecte-se na importância que tem para cada um dos jogadores, ao permitir-lhes "ganhar alguma confiança para enfrentarem o dia-a-dia", defende Francisco Seita, treinador da selecção nacional de Futebol de Rua. "E dentro de campo somos todos iguais, independentemente das nossas diferenças", conclui. A importância das políticas A noção e importância da inclusão social pelo desporto tem vindo a crescer, tanto a nivel de políticas europeias, como nas práticas adoptadas em cada país. Em 2008, Salomé Marivoet integrou uma equipa de investigadores do projecto FRA (Agência Europeia para os Direitos Fundamentais) para encontrar iniciativas de prevenção contra o racismo e a discriminação étnica no e pelo desporto e, em 2011, contribuiu para a criação de um guia de boas práticas de inclusão dos migrantes pelo desporto, através do projecto European Sport lnclusion Network. Foi graças à assinatura do Tratado de Lisboa (2007) que o desporto passou a ser matéria de interesse comum.

Em Portugal, o programa Desporto Para Todos, do Instituto Português do Desporto e Juventude (IPDJ), de âmbito nacional, apoia e financia iniciativas de clubes e associações que promovam a actividade física e desportiva, dirigidas a todos. "Seguimos o princípio da universalidade, que não exclui, antes pelo contrário: inclui todas as pessoas",destaca Augusto Baganha, Presidente do IPDJ. Mas por todo o país, o desporto inclusivo vai ganhando o seu lugar na área social. "Existem projectos que surgem de instituições privadas de solidariedade social (IPSS), que trabalham a nível de bairro e aí há uma grande sinergia com outras actividades de serviço social", explica a professora. "Nos clubes, surgem projectos ligados à própria vertente política do clube, de responsabilidade social", acrescenta. Salomé Marivoet defende o envolvimento entre os clubes e as IPSS, num trabalho conjunto. "É o ideal, mas a 'cultura de rede' em Portugal ainda oferece algumas resistências". "Não se trata de substituir o papel de cada um, mas sim de criar parcerias e haver um esforço de cooperação", conclui esta especialista em Inclusão Social pelo Desporto. 23