Camilo Soldado, in Público on-line
Estudo envolveu cinco autarquias de vários pontos do país e elaborou guiões de boas práticas a adoptar pelos municípios.
Com o objectivo de medir as desigualdades de género no território nacional, um projecto de investigação do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra (UC) em que participaram cinco autarquias propõe a criação de um índice municipal que classifique o trabalho dos municípios nesta área.
A coordenadora do projecto Local Gender Equality, Virgínia Ferreira, conta ao PÚBLICO que a criação deste mecanismo parte da necessidade de estabelecer linhas de intervenção. “Sem uma métrica, sem a possibilidade de medir como é que essa realidade se vai alterando de ano para ano, é difícil estabelecer objectivos”, justifica a investigadora.
Considerando que este “fenómeno muito complexo” não se pode “traduzir exclusivamente por um indicador”, Virgínia Ferreira explica que esta espécie de ranking contemplaria 20 indicadores de três tipos: os estruturais (que remetem para a existência ou não de instrumentos como os planos para a igualdade de género), os de resultados (se as políticas em vigor têm impacto) e os de processo (que têm em conta a existência ou não de serviços a nível local, como por exemplo os de apoio a vítimas de violência doméstica).
“Este índice poderia permitir que a câmara avaliasse ano a ano o seu desempenho e ter uma noção de melhores práticas a seguir por comparação com outros concelhos”, sublinha a também docente da Faculdade de Economia da UC.
Esta proposta é um dos resultados do projecto de investigação financiado pelo Mecanismo Financeiro do Espaço Económico Europeu através da Comissão para a Cidadania e a Igualdade de Género (CIG) e que foi desenvolvido ao longo de 15 meses com vários parceiros. No processo, cujo objectivo era produzir instrumentos para que as autarquias promovam a igualdade de género, estiveram envolvidas as câmaras de Lagoa, Ferreira do Alentejo, Pombal, Mangualde e Póvoa de Lanhoso, bem como o Centro de Estudos e Formação Autárquica (CEFA) e uma consultora.
Sobre a monitorização deste índice, a investigadora menciona que esta poderia ser assumida pela CIG. “Aqui não haveria muito que fazer”, explica, afirmando que houve “uma preocupação fundamental de que os indicadores todos estivessem disponíveis em bases estatísticas nacionais comparáveis, acessíveis”, ou seja, os dados estão disponíveis, basta juntá-los e fazer um trabalho de ponderação.
A coordenadora do projecto refere que os resultados, que incluem também oito guiões que abordam várias áreas de actuação, traduzem o trabalho com os parceiros a nível municipal. Ou seja, estes documentos são fruto de reuniões e troca de ideias com os técnicos e líderes políticos dos municípios. Cada guião oferece “instrumentos de diagnóstico e sugestões de solução dos problemas sectorialmente” e é dirigido a “problemas de gestão que, necessariamente, qualquer tipo de câmara municipal tem”. Os documentos abordam oito temáticas tão distintas como mobilidade e transportes, violência no trabalho ou cultura, desporto, juventude e lazer.
Cada guião está dividido em quatro partes. Começam por enquadrar a importância da igualdade de género em determinada área, seguem-se os princípios e metodologias que devem ser observados, depois instrumentos práticos como questionários ou checklists e, por fim, os exemplos de boas práticas, tanto a nível nacional como internacional.
Foi também elaborado um livro branco que aborda “questões mais transversais” e visa oferecer “orientações de como os bons princípios podem ser postos em prática”. Os problemas abordados neste manual passam por questões como a da linguagem utilizada ao nível interno e da comunicação externa (utilização do masculino como representante dos géneros) ou pela elaboração de orçamentos sensíveis a género. “Por exemplo, em relação ao desporto, pode haver uma maior desagregação das despesas para que haja uma identificação de quem beneficia dessa alocação de recursos. Isto pode traduzir-se em constatar que há uma injustiça na alocação de recursos”, sugere.
Virgínia Ferreira distingue este tipo de documentos dos planos municipais para a igualdade. “A primeira leva de planos municipais para a igualdade no país foi toda virada para a própria estrutura autárquica”, analisa, sendo que apenas “só mais recentemente tem havido apoios para as câmaras fazerem planos municipais virados mais para o exterior”.
O projecto é apresentado nesta segunda-feira num colóquio em Lisboa com a presença do ministro adjunto Eduardo Cabrita, que tutela a secretaria de Estado para a Cidadania e a Igualdade.