9.1.18

Emprego: que desafios traz o novo ano?

Glória Rebelo, in Diário de Notícias

Neste início de ano, importa pensar o emprego em Portugal e os seus desafios. A verdade é que vivemos uma realidade social inquietante: de acordo com o INE, nos últimos sete anos Portugal vem perdendo população. Isto não só porque a sociedade portuguesa está envelhecida mas também porque uma parte significativa da população em idade activa emigra. E segundo os dados do Observatório da Emigração, só em 2016 emigraram cem mil portugueses.

Acresce que um dos principais desafios da atualidade continua a ser o de responder à questão de saber como é possível assegurar justiça social num período em que Portugal vive ainda as sequelas de um forte ajustamento salarial e laboral, especialmente decorrente das sucessivas alterações ao Código do Trabalho ocorridas entre 2011 e 2015.

Nestes últimos anos, a criação de emprego tem-se registado, principalmente nas atividades de comércio, de alojamento, restauração e similares, sendo que este emprego, baseado em sazonalidade e incerteza contratual, vem acompanhado de baixos salários.

Além do mais, o recurso quer aos contratos de trabalho não permanentes (contratos de trabalho a termo e de trabalho temporário) quer ao subemprego a tempo parcial têm aumentado ao nível dos novos contratos. Esta situação reforça a precariedade a muitos trabalhadores que, no conjunto, acumulam contratos de trabalho a termo com trabalho a tempo parcial, sujeitando-os a uma forte instabilidade profissional e a baixos salários. Acresce que Portugal é também um país com uma muito elevada proporção de desempregados de longa duração (desempregados à procura de emprego há 12 e mais meses) no conjunto dos desempregados, e que, de acordo com o INE, em 2016, das 573 mil pessoas desempregadas, 62,1% encontravam-se em situação de desemprego de longa duração. Os desempregados, incluindo jovens com elevadas qualificações, enfrentam hoje uma escolha difícil: continuarem desempregados, aceitarem um emprego muito abaixo das suas qualificações, ou emigrarem.

Quando a economia tem tantos trabalhadores em situação de subemprego, que não produzem de acordo com o seu potencial, tantos desempregados de longa duração e pessoas a emigrar, está a desperdiçar fatalmente preciosos recursos.

E se Portugal apresenta uma distribuição salarial caracterizada por uma forte compressão salarial na primeira metade da distribuição, medida pelo rácio entre o decil 50 e decil 10, e a mais elevada desigualdade na segunda metade da distribuição, aferida pelo rácio entre o decil 90 e o decil 50, esta distribuição salarial (extrema quando comparada com os outros países europeus) significa que a desigualdade salarial no nosso país é muito elevada - facto consistente com o valor do índice de Gini de 33,9 em 2015, de acordo com o INE.

Ora, quando a nossa sociedade se encontra tão desigual, o propósito de reforçar justiça social deve ser atendido sobretudo considerando o forte desgaste da denominada "classe média". Em Portugal este desgaste - dada a forte instabilidade profissional e o elevado número de trabalhadores com baixos salários (recorde-se que, segundo o INE, em Portugal, em 2015, o salário médio era de 913,9 ) - tem tido amplas consequências, designadamente na emigração e na baixa natalidade. De facto, a crescente incerteza do emprego, assim como a pressão fiscal a que está sujeita, vai penalizando sobretudo a denominada "classe média", tornando-a mais insegura.

Como, avisadamente, refere o economista Joseph Stiglitz, estamos "a pagar um preço excessivo pela nossa crescente desigualdade (...): um sentido de justiça e de equidade reduzidos". Assegurar igualdade de oportunidades pelo mérito, assim como proporcionar condições para que a economia crie emprego digno para a grande maioria dos seus cidadãos é o maior desafio de qualquer sociedade. Como também alerta Stiglitz, muita da desigualdade actual resulta de políticas governamentais, tanto as que o governo aplica como as que se abstém de aplicar. E, de certo modo, o que se pede é um sistema socialmente mais justo que, como enfatiza Stiglitz, pugne pela "defesa dos interesses gerais, e não os interesses particulares de alguns" pois, como refere este economista, "o êxito de uma economia só pode ser avaliado se olharmos para o que acontece aos padrões de vida da maioria dos cidadãos."

Professora universitária
Por decisão pessoal, a autora do texto não escreve segundo o novo Acordo Ortográfico