6.8.20

Alice Ramos. Estereótipos, preconceito e racismo

José Maria Pimentel, in Público on-line

Esta semana, no podcast 45 Graus, ouvimos Alice Ramos, doutorada em Ciências Sociais, com especialidade em Sociologia pelo Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, onde é actualmente investigadora. Tem-se dedicado a analisar o impacto conjugado de factores individuais e contextos sociais nas atitudes face aos imigrantes e no preconceito racial.

Desde Janeiro de 2018, é também a coordenadora nacional do Inquérito Social Europeu e do Estudo Europeu dos Valores. O Inquérito Social Europeu é uma sondagem realizada a cada dois anos, desde 2001, com o objectivo de avaliar as atitudes e comportamentos dos cidadãos de 24 países europeus sobre um leque muito variado de assuntos. No caso português, uma área específica trouxe recentemente os resultados do inquérito para a ribalta: o nível do racismo em Portugal, que o inquérito indica ser desconfortavelmente mais elevado do que tendemos a achar.

Os resultados da versão mais recente do inquérito foram divulgados há cerca de um mês e mostram que quase dois terços dos portugueses manifestam pelo menos uma forma de racismo, e apenas cerca de 10% da população discorda de todas as crenças que o inquérito identifica como racistas. Estes números caem como uma bomba no debate público e na discussão sobre a dimensão do racismo em Portugal, um debate antigo mas que tem ganho tracção nos últimos anos, à boleia de estudos como este mas, talvez mais ainda, de um activismo crescente que chama a atenção quer para desigualdades estruturais quer para a violência policial sobre minorias e crimes com motivações racistas. Foi isso que aconteceu no caso recente do assassinato do actor Bruno Candé, que aconteceu poucos dias depois da gravação deste episódio (sendo que, neste caso, tudo indica que o preconceito racista do homicida teve, no mínimo, influência no crime).

Avaliar a dimensão do racismo em Portugal é, evidentemente, um exercício muito complexo, até por ter várias dimensões. A discussão nas redes sociais rapidamente se encarrega, com a sua pulsão para o pensamento binário e comportamento tribal, de politizar a discussão e de a reduzir a um debate entre dois campos opostos: o dos que garantem que Portugal “é um país racista” (excluindo, claro, depreende-se, os virtuosos autores do diagnóstico) e o campo dos que continuam a negá-lo.

A convidada Alice Ramos ajuda a compreender, com a calma que um podcast proporciona, a dimensão, as expressões e, sobretudo, as causas do racismo em Portugal, fazendo-o a partir da base, isto é, começando por tentar compreender por que existem e como funcionam aspectos quase universais da psicologia humana e da sociedade, como os estereótipos, o preconceito e os comportamentos discriminatórios.

Há alguns conceitos que a convidada convoca que, nesta área, têm um significado mais específico do que o seu uso no quotidiano: os valores são os princípios com que orientamos a nossa vida, são aquilo que nos permite distinguir o que é bom do que é mau; os nossos valores influenciam as nossas atitudes, que são predisposições para agir de uma determinada forma, avaliações sobre situações específicas; o preconceito é uma atitude, mas também o é a nossa opinião face à legalização do aborto ou face à intervenção do Estado na economia, etc; finalmente, os comportamentos, são as atitudes em acção: é o que verdadeiramente fazemos. A discriminação é um comportamento.