11.8.20

Idosos do Baleizão têm um programa de rádio para quebrar o isolamento

Ana Cristina Pereira, in Público on-line

Iniciativa alia o Centro Social Nossa Senhora da Graça, a Voz da Planície e o Departamento de Psiquiatria da Unidade Local de Saúde do Baixo Alentejo.

Chama-se “Avós com Voz” e vai para o ar às 17h30 de cada sexta-feira, mas pode ser ouvido a qualquer hora na página da rádio Voz da Planície. Começou no dia 8 de Maio e deverá prolongar-se até ao dia 18 de Setembro. Junta as vozes de idosos, familiares e funcionários do centro de dia de Baleizão, em Beja.

Vivem sozinhos muitos dos 30 idosos que frequentam aquele centro de dia. “Arranjámos uma estratégia de comunicação que permite quebrar o isolamento”, resume João Cascalheira, presidente do Centro Social Nossa Senhora da Graça e coordenador da Incubadora de Inovação Social do Baixo Alentejo. “É uma oportunidade de se ouvirem uns aos outros, de ouvirem familiares, funcionários, de falarem sobre o que lhes faz falta neste momento, no que irão fazer quando tudo isto terminar.

A iniciativa alia o Centro Social Nossa Senhora da Graça À Voz da Planície e ao Departamento de Psiquiatria da Unidade Local de Saúde do Baixo Alentejo. Integra o projecto “Há D'Escampar – Tudo Há-de Ficar Bem”, financiado pela Fundação Calouste Gulbenkian e Instituto da Segurança Social, no âmbito do fundo de emergência destinado a reforçar a capacidade de resposta aos idosos durante a pandemia.

António Fonseca, professor da Universidade Católica e consultor da Gulbenkian na área do envelhecimento, fez parte da equipa que seleccionou 69 projectos em mais de mil. Ficou impressionado com a “malha de serviços de proximidade que hoje existem um pouco por todo o Portugal – da pequena aldeia à grande cidade”. Coloca este entre os doze mais inovadores, muitas das quais empenhadas na saúde mental. A ideia já está a fazer escola. Em plena pandemia, “outros estão a começar a fazer uso desta estratégia para manter a comunicação com os utentes”.

Um centro de dia não é um centro de convívio. Entrando por volta das 9h e saindo por volta das 17h, muitos ali satisfaziam algumas das suas necessidades básicas e faziam quase toda a sua vida social. Entenderam que não bastava domiciliar a prestação de cuidados básicos – relacionadas com a alimentação, a higiene, o acompanhamento a consultas ou a toma de medicamentos. “Queríamos que entendessem que não os abandonamos, que continuamos a acompanhá-los”, sublinha Cascalheira.

Ajudou ter alguma escala. Através de um projecto de envelhecimento activo, o COM-VIDA, podiam assegurar aulas online, kits de actividades para fazer em casa, contacto telefónico regular, com apoio psicossocial. Mesmo assim, Cascalheira fala em perda de força anímica e na necessidade de “impedir que isso tudo se agrave”. Desde o início de Junho, uma equipa técnica roda pelas casas, com exercícios para retardar a degradação cognitiva e motora. Não dá mais de meia hora a cada um, mas ajuda a desentorpecer.

Numa das edições do “Avós com voz”, ouve-se um familiar, Jorge David, descrever a experiência da mãe, Guilhermina, que sofreu uma queda, passou a usar uma prótese, enfrentou um difícil processo de reabilitação. No início do ano, começou a frequentar o centro de dia. “Ela tinha uma rotina até ao início da covid. E aquela rotina foi quebrada.” O seu processo de reabilitação retrocedeu. Agora, que vão lá a casa, tornou a avançar. A diferença, afiança, é “do dia para a noite”. E nem ela, nem os filhos podiam estar mais gratos.