30.6.21

Pobreza persistente atingia 12,5% da população antes da pandemia

Fátima Ferrão, in Expresso


O risco de pobreza é superior entre os desempregados, nas famílias monoparentais e em indivíduos menos escolarizados

Desemprego e escolaridade são determinantes no risco de pobreza, sendo que nas famílias com menores rendimentos existe uma maior dificuldade em aceder à educação superior, aos cuidados de saúde e à habitação, revela o relatório ‘Portugal, balanço social 2020’, que será apresentado esta quinta—feira na conferência Janela da Esperança. A iniciativa, que junta a SIC Esperança com a Fundação Gulbenkian, Fundação La Caixa e BPI, pode ser acompanhada no Facebook do Expresso, a partir das 16 horas

Antes do impacto da covid-19 na economia, nos negócios e, consequentemente, nos bolsos dos portugueses, o país já apresentava indicadores de pobreza e níveis de desigualdade acima da média europeia. Apesar de uma ligeira descida entre 2008 e 2019, Portugal continuava a contar com uma taxa de risco de pobreza de 17,2% (era de 18,5% na década anterior), acima da média europeia que se situava, à data, nos 16,5%, mas abaixo de outros países da Europa do Sul, como Espanha ou Itália.

Estas são algumas das evidências do relatório ‘Portugal, balanço social 2020: um retrato de um país e dos efeitos da pandemia’, coordenado por Susana Peralta, investigadora científica na Nova School of Business & Economics, que procurou traçar um retrato socioeconómico das famílias portuguesas e facultar uma base de discussão transversal sobre as situações de pobreza e exclusão social no país. O documento descreve situações em relação ao rendimento, mas aborda também as diferenças de situação laboral, acesso à educação e saúde, condições de habitação e participação social e política.

Deste retrato destaca-se a probabilidade de o risco de pobreza ser superior entre os desempregados, nas famílias monoparentais e em indivíduos menos escolarizados, que mais frequentemente surgem entre o grupo de pessoas em contexto de pobreza persistente. Ou seja, quando os seus níveis de rendimentos, ou a inexistência dos mesmos, os colocam abaixo do limiar da pobreza durante vários anos consecutivos. Isto acontece, por exemplo, a 4,5% da população trabalhadora, percentagem que sobe para os 22,5% no grupo dos desempregados.

“Em 2020, com o impacto da pandemia, o aumento de novos inscritos nos centros de emprego ocorreu, maioritariamente, nos jovens até aos 34 anos, que antes trabalhavam como falsos independentes ou com contratos a prazo, e que são também os menos protegidos do risco de pobreza”, disse ao Expresso Susana Peralta, coordenadora do relatório

A taxa de pobreza não é, contudo, idêntica em todas as regiões do país. De acordo com os dados de 2019, o Algarve era a zona do território continental com uma taxa de risco de pobreza mais elevada (18,8%). Já os Açores eram, no mesmo período, a região com maiores desigualdades e uma taxa de risco de pobreza de 31,8%.

Por outro lado, os rendimentos condicionam as famílias, quer no acesso a uma habitação condigna, quer no acesso aos cuidados de saúde ou à educação superior. O relatório revela ainda que, em 2019, 22,3% destas famílias não conseguiram ir ao dentista e que apenas 10% completaram os estudos superiores.


11,4%

dos cidadãos empregados são pobres. Apesar de terem uma relação ativa com o mercado de trabalho são, em grande parte das situações, remunerados ao nível do salário mínimo ou inferior


JANELA DE ESPERANÇA


O que é?

É o primeiro projeto editorial que pretende divulgar as iniciativas mais relevantes do terceiro sector, mostrando e reconhecendo publicamente as instituições, as personalidades e os beneficiários das mesmas.

Quando, onde e a que horas?


Dia 1 de julho, quinta-feira, das 16 às 17 horas no Facebook do Expresso

Quem são os oradores?
Susana Peralta, Professora de economia na Nova SBE
Ricardo Reis, Economista
António Brito Guterres, investigador em desenvolvimento urbano

Porque é que este tema e debate são centrais?

A pandemia veio acentuar as desigualdades e contribuir para o aumento dos níveis de pobreza em Portugal. É fundamental conhecer o retrato do país com vista a promover o debate sobre estas situações de exclusão no país.

Como posso ver?

Pode assistir através da página de Facebook do Expresso.

Comissário europeu destaca “mérito” de Portugal nas políticas sociais durante presidência da UE

in Expresso

Nicolas Schmit, destaca “o mérito” da presidência portuguesa da União Europeia (UE), que está prestes a terminar, na área social, nomeadamente com “a inovadora” Cimeira do Porto, que estabeleceu compromissos europeus.

“Lamento que a presidência portuguesa esteja já a chegar ao fim, mas é assim que a Europa funciona. Seis meses é um período curto, mas durante estes seis meses, especialmente na minha área, […] muito já foi alcançado, nomeadamente com a Cimeira do Porto”, afirma Nicolas Schmit em entrevista à agência Lusa, em Bruxelas.

Falando sobre a Cimeira Social do Porto, organizada no início de maio pela presidência portuguesa da UE, o comissário europeu da tutela descreve-a como “inovadora”, já que “a dimensão social na Europa está agora, mais do que nunca, ancorada nas políticas europeias” e com “compromissos políticos muito claros”.

“Surpreendentemente, [a Cimeira Social deu] um forte impulso para continuar a desenvolver a Europa social e a dimensão social nas políticas europeias com objetivos bastante concretos de pobreza, sobre o emprego […] e formação e, portanto, penso que se trata de um enorme mérito da presidência portuguesa”, assinala Nicolas Schmit nesta entrevista de balanço à Lusa.

No início de maio, os chefes de Estado e de Governo da UE comprometeram-se, na Cimeira Social do Porto, “a aprofundar a implementação” do Pilar Europeu dos Direitos Sociais, defendendo que este seja um “elemento fundamental da recuperação” pós-crise pandémica.

TRÊS GRANDES METAS PARA 2030

Definida pela presidência portuguesa como ponto alto do semestre, a Cimeira Social teve no centro da agenda o plano de ação do Pilar Social Europeu, apresentado pela Comissão Europeia em março e que prevê três grandes metas para 2030: ter pelo menos 78% da população empregada, 60% dos trabalhadores a receberem formação anualmente e retirar 15 milhões de pessoas, cinco milhões das quais crianças, em risco de pobreza e exclusão social.

O comissário europeu dos Direitos Sociais realçou também o acordo fechado na semana passada pela presidência portuguesa do Conselho sobre a Garantia Europeia para a Infância, prevendo que menores em risco acedam gratuitamente a serviços essenciais como educação e saúde, que classifica como “um grande feito em tão pouco tempo”.

“A Garantia Europeia para a Infância foi adotada no prazo de dois meses desde a proposta da Comissão […] e essa é realmente uma situação muito excecional, porque isto foi feito num tempo recorde”, aponta o responsável, considerando estarem em causa “instrumentos muito concretos e centrados nas crianças”.

PORTUGAL DEU BOM EXEMPLO NOS PRR

E numa altura em que estão prestes a chegar aos países as primeiras verbas comunitárias para a recuperação pós-crise pandémica, Nicolas Schmit refere que outra das questões em que a presidência portuguesa “tem desempenhado um papel central na implementação” diz respeito aos Planos nacionais de Recuperação e Resiliência (PRR).

“Portugal deu, desde logo, um bom exemplo com o seu PRR, que foi o primeiro a ser apresentado e é um plano que respeita absolutamente a quota de investimento em projetos digitais, mas também sociais”, precisa.

Para o comissário europeu, este é “bom exemplo”.

“Portanto, há uma longa lista […] e penso que esta é realmente uma presidência que deu um contributo decisivo para ajustar o caminho da Europa a se tornar mais social”, adianta.

Rendimento mínimo

Por Lino Maia *, in Notícias de Aveiro

A inserção não se esgota no acesso à atividade profissional: o acesso à escola e à educação, aos cuidados de saúde, à habitação e às atividades culturais, são áreas determinantes e que condicionam o desenvolvimento individual.

Em 29 de junho de 1996 passou a ser reconhecido «a cada cidadão residente em Portugal o direito a um nível mínimo de subsistência, desde que se encontre numa situação de exclusão social e esteja ativamente disponível para seguir um caminho de inserção social». Era assim criado o Rendimento Mínimo Garantido, posteriormente, denominado Rendimento Social de Inserção (RSI).

Completam-se agora 25 anos sobre a louvável criação de um apoio destinado a proteger as pessoas que se encontrem em situação de pobreza extrema, com duas componentes:
Uma prestação em dinheiro para assegurar a satisfação das suas necessidades mínimas.

A contratualização de um programa de inserção estabelecido de acordo com as características e condições do requerente da prestação e do seu agregado familiar visando uma progressiva inserção social, laboral e educativa.

O RSI pode acumular com pensões, outras medidas e prestações do sistema de segurança social, donde a importância da “robustez” e diferenciação deste sistema, que poderá assumir, uma base melhor conseguida para a satisfação das necessidades fundamentais dos beneficiários.

A natureza mista do RSI traduz-se na existência de uma dupla rede institucional e administrativa, por vezes complexa: a que processa o subsídio e a que contratualiza com o beneficiário a sua inserção, que terá de ser centrada nas necessidades, promoção das capacidades e participação do próprio e da sua família.

Orientar a inserção para a atividade profissional de quem está em idade ativa permite criar autonomia, melhorar a auto-estima e a consciência de pertença à sociedade. Sabemos que para tal a formação, capacitação e educação social são determinantes. As organizações da economia social e solidária, pela sua proximidade, pela sua capacidade de criação de emprego, podem neste âmbito assumir um papel mais forte, mais empreendedor, desde que dotadas dos recursos para tal.

No entanto, a inserção não se esgota no acesso à atividade profissional: o acesso à escola e à educação, aos cuidados de saúde, à habitação e às atividades culturais, são áreas determinantes e que condicionam o desenvolvimento individual.

Porque o risco de pobreza aumenta e afeta novos grupos de cidadãos e ainda:

Sabendo que para ultrapassar um fenómeno desta natureza, que viola os Direitos Humanos, é necessária a mobilização e participação de um conjunto alargado de parceiros e decisores políticos;

Sabendo que a pobreza não pode ser combatida sem envolver os próprios indivíduos na identificação dos seus problemas e das soluções para os mesmos, sem os escutar, sem os capacitar e sem motivar que participem nos processos de decisão que dizem respeito às suas vidas;

Sabendo ainda da importância da identificação dos processos que podem conduzir a situações de pobreza, numa abordagem dinâmica e preventiva

Há que agir, centrando nas pessoas e nos Direitos Humanos, para:

Garantir a coordenação, articulação e eficácia das políticas sociais e económicas e promoção de políticas “à prova de pobreza” (existência de um mecanismo legal que obrigaria que parte substancial da legislação proposta fosse submetida a uma análise sobre qual o impacto que tais decisões sectoriais, de todas as áreas de governação, terão sobre a pobreza);

Conseguir uma mais consistente e consequente cooperação entre todos os atores para um consenso alargado sobre a prioridade estrutural deste combate, como premissa para o desenvolvimento económico e social, encontrando soluções estruturais;

Promover um novo paradigma que crie as condições para a permanente prevenção da pobreza;

Promover o recurso a mecanismos de alerta precoce;

Dinamizar a sensibilização massiva e transversal da opinião pública para o fenómeno da pobreza, suas causas e consequências, no sentido da tomada de consciência coletiva sobre a responsabilidade que todos temos de prevenir e combater a pobreza e a exclusão social.

* Presidente da CNIS – Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade Editorial do jornal Solidariedade de junho publicado originalmente em http://www.solidariedade.pt/site/detalhe/14238

Beneficiários de prestações de desemprego aumentam 19,8% em maio

in EcoOnline

Subiu para 276.665 o número de beneficiários de prestações de desemprego, mais 19,8% do que no período homólogo. Este é o valor mais elevados desde maio de 2015.

O número de beneficiários de prestações de desemprego subiu 19,8% em maio face ao mesmo mês de 2020, para um total de 276.665, sendo este o valor mais elevado desde maio de 2015, segundo as estatísticas da Segurança Social.

Desempregados inscritos no IEFP caem para 402 mil


De acordo com os dados divulgados esta segunda-feira, as 276.665 prestações de desemprego registadas em maio traduzem um aumento de 2,7% face a abril (269.212 beneficiários), sendo este o sétimo mês consecutivo de subida. A série longa disponibilizada pela Segurança Social mostra que é necessário recuar a maio de 2015 para encontrar um universo de beneficiários mais elevado (havendo então 286.503 pessoas).

A análise da tipologia de prestações de desemprego revela, contudo, evoluções diferenciadas, em termos homólogos e mensais, dos subsídios de desemprego e social de desemprego – nas versões inicial e subsequente.

Em maio, o número de beneficiários do subsídio de desemprego foi de 195.743, refletindo um aumento de 463 destas situações face a maio de 2020 e de menos 13.282 por comparação com o mês anterior.

A síntese do Gabinete de Estratégia e Planeamento (GEP) do Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, assinala, no entanto, que “na prorrogação da concessão do subsídio de desemprego, observou-se um acréscimo mensal de 6.265 beneficiários”, para um total de 35.743.

Já o subsídio social de desemprego inicial (dirigido a desempregados que não têm registo de remunerações suficiente para serem abrangidos pelo subsídio de desemprego) chegou a 9.471 pessoas, valor que traduz uma diminuição de 10,1% face a maio de 2020 e de 11,2% em relação ao mês anterior.

O subsídio social de desemprego subsequente (dirigido aos que terminam o subsídio de desemprego e preenchem a condição de recursos), por seu lado, abrangeu 16.591 pessoas, registando um decréscimo homólogo de 8,4% e de 13,3% face ao mês anterior.

O GEP indica que o sexo feminino representava 58% dos beneficiários de prestações de desemprego em maio e que as faixas etárias dos 40 aos 59 anos representavam 46,9% do total de beneficiários. Porém, na comparação com maio de 2020, os maiores acréscimos das prestações processadas continuam a registar-se nos grupos mais jovens: o grupo de 29 ou menos anos (+21,3%) e entre os 30 e os 39 anos (+25,6%). O valor médio do subsídio por beneficiário foi de 523,03 euros em maio.

Segundo os dados divulgados esta segunda-feira, pelo Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP) no final de maio, estavam registados, nos Serviços de Emprego do Continente e Regiões Autónomas, 402.183 desempregados, número que traduz um recuo de 1,7% em termos homólogos e de 5,1% face a abril.

Crise provocada pela pandemia atirou 400 mil pessoas para a pobreza

in Público on-line

Estudo da Universidade Católica conclui que sem os apoios extraordinários aplicados em 2020, “o confinamento inicial de oito semanas teria produzido aproximadamente o mesmo impacto sobre a pobreza do que o calculado para um ano inteiro”

Cerca de 400 mil pessoas caíram abaixo do limiar da pobreza devido à crise provocada pela pandemia da covid-19, o que agravou o fosso entre os ricos e os pobres em Portugal, revela um estudo divulgado nesta terça-feira.

“Em comparação com o cenário sem crise, 400 mil novos indivíduos caíram abaixo do limiar de pobreza, definido como 60% do rendimento mediano equivalente, aumentando a taxa de risco de pobreza em 25% como consequência da pandemia de covid-19”, concluiu o estudo do Observatório Social da Fundação “la Caixa”, da autoria do Center of Economics for Prosperity (PROSPER) da Universidade Católica de Lisboa.

O documento considera que as medidas do Governo minimizaram em parte o aumento da pobreza e da desigualdade, mas a pandemia resultou numa “perda substancial de rendimentos para a população portuguesa”, com o rendimento mediano anual a cair de 10.100 euros no cenário sem crise para 9100 euros no cenário com crise.

A crise provocada pela covid-19 “teve efeitos assimétricos”, uma vez que as classes baixa e média-baixa, a região do Algarve e as pessoas com escolaridade até ao nono ano “foram os grupos mais afectados por esta crise, com perdas claramente acima da média nacional”, refere o estudo.

Desigualdade cresce

A maior parte das pessoas mais afectadas pela crise já se situava na metade inferior da distribuição de rendimento no cenário sem crise, o que fez com que aumentasse a desigualdade.

“Os resultados mostram que a pandemia levou a um impressionante aumento de 25% da pobreza ao longo de um ano, quando comparados os cenários com e sem crise, pondo em risco os progressos feitos nos últimos vinte anos e invertendo a tendência de redução continuada da pobreza iniciada em 2015, quando a taxa de pobreza era de 19%”, refere o documento.

O estudo, da autoria de Joana Silva, Anna Bernard, Francisco Espiga e Madalena Gaspar, salienta ainda que as políticas de protecção aplicadas pelo Governo em 2020 atenuaram o aumento da pobreza e da desigualdade em Portugal.

“Sem a sua implementação, o confinamento inicial de oito semanas teria produzido aproximadamente o mesmo impacto sobre a pobreza e a desigualdade que aquele calculado para um ano inteiro”, adianta o documento do PROSPER, ao avançar que o regime de lay-off simplificado, destinado a trabalhadores por conta de outrem, e os apoios extraordinários para trabalhadores por conta própria “foram eficazes para atenuar o impacto da crise”.

Impactos negativos

“A pandemia, ainda em curso, e a crise económica resultante, trazem consigo desafios orçamentais substanciais, uma vez que esforços governamentais de grande magnitude podem ser difíceis de sustentar por um período prolongado”, alerta o PROSPER, para quem é “evidente que, sem uma forte recuperação, uma redução das políticas de protecção pode causar um impacto negativo substancial na pobreza e na desigualdade”.

O Observatório Social da “Fundação la Caixa” é um novo projecto a ser desenvolvido em Portugal com o objectivo de analisar a realidade social nas áreas social, da educação e da cultura.

Portugal com mais 19.430 milionários em ano de pandemia. Os 1% mais ricos detêm um quinto da riqueza

Beatriz Ferreira, in o Observador

Numa altura em que subiu o número de pessoas em situação de pobreza, o grupo dos mais ricos também engrossou. Os 1% mais ricos em Portugal concentram 20% da riqueza. Metade mais pobre só tem 6,5%.

Mesmo apesar da pandemia, e dos seus efeitos na economia nacional e no rendimento das famílias, Portugal ganhou milionários ao longo do ano passado. Segundo o mais recente The Global Wealth Report, referente a 2020 — ano maioritariamente marcado pela Covid-19 —, Portugal tem 136.430 milionários, mais 19.430 do que no relatório de 2019.

De facto, o número de milionários — pessoas com fortunas avaliadas acima de um milhão de dólares (cerca de 840 mil euros) — em Portugal está a subir, nas contas do banco, desde 2015, ano em que foram contabilizadas 51.000 pessoas com uma riqueza superior a um milhão de dólares. Nesse ano, verificou-se uma queda face a 2014 (76.000), possivelmente devido aos efeitos da crise financeira. Já no relatório divulgado em outubro de 2019, com dados até meados desse ano, o Credit Suisse identificava 117 mil milionários no país, número que subiu para os 136.430 em 2020. O banco só começou a publicar dados para Portugal sobre o número de milionários a partir de 2014.

Em termos desagregados, os dados do Credit Suisse mostram que Portugal tinha, em 2020, 128.772 pessoas com uma fortuna avaliada entre um milhão e cinco milhões de dólares, 5.505 com entre cinco e dez milhões, 2.056 com riqueza entre 10 de 50 milhões. No grupo dos mais ricos, estão 72 com entre 50 e os 100 milhões e 24 entre os 100 e os 500 milhões. Uma pessoa tem uma fortuna acima dos 500 milhões de dólares.

Esta estimativa difere de outros rankings, como o da Forbes (que, em 2019, contabilizava pelo menos dez portugueses com fortunas acima dos 500 milhões de euros). Os cálculos da Forbes são tidos em conta pelo Credit Suisse porque, “embora possam ser criticados nalguns aspetos”, aplicam “métodos consistentes a vários países”. Mas há mais fatores a pesar nas contas do banco.

O Credit Suisse nota que há outros relatórios com números inferiores aos que o banco tem divulgado e avança explicações para as discrepâncias: diz que muitos rankings só têm em conta “ativos de investimento” (que incluem os saldos de contas bancárias, certificados de depósito, fundos mútuos, ações e títulos), que, por sua vez, “não consideram as casas ocupadas pelo proprietário”. O banco pondera, assim, tanto ativos financeiros, como não financeiros, assim como dívidas.

As estimativas são também baseadas em dados das agências nacionais de estatísticas sobre o rendimento das famílias. “O objetivo é fornecer uma cobertura abrangente dos ativos que as pessoas reconheceriam como parte de sua riqueza pessoal: moradias, terras, poupanças, investimentos, etc”, incluindo também fundos de pensões.

Segundo o relatório, foi o grupo dos 5 aos 10 milhões que, em termos percentuais, mais cresceu (uma subida de 19%, mais 885), mas em termos absolutos foi a faixa de um milhão a cinco milhões que mais ricos recebeu (foram mais 18.075, um aumento de 16%).

Estes crescimentos foram suficientes para compensar as quebras nos grupos dos mais ricos (entre os mais ricos). Por exemplo, em 2019, contabilizavam-se duas pessoas com fortunas além dos 500 milhões; em 2020, esse número reduziu-se em metade. Outro exemplo: nas fortunas avaliadas entre 100 e 500 milhões, o número de milionários desceu 14%, passando de 28 em 2019 para 24 em 2020.

Os dados contrastam fortemente com os da pobreza, que tem crescido em Portugal no último ano. Um estudo divulgado esta terça-feira, feito pela Universidade Católica, revela que mais 400 mil pessoas ficaram abaixo do limiar da pobreza devido à crise pandémica, o que agravou o fosso entre ricos e pobres em Portugal.

Além disso, cada um dos 8,3 milhões de portugueses adultos tem, em média, uma riqueza de 142.537 dólares, uma subida face aos 131.088 dólares registados em 2019. É quase três vezes mais face o início do milénio (52.357). Já quanto a dívidas, os dados do Credit Suisse apontam para que, em média, cada adulto português tenha um passivo de 20.389 dólares.

Parcela dos 1% mais ricos em Portugal concentra 20% da riqueza. Metade mais pobre só tem 6,5%

Os números permitem também ver como Portugal continua um país desigual. Em 2020, a parcela restrita dos 1% mais ricos detinha 20,1% da riqueza do país, mais uma décima do que em 2019. Já os 10% mais ricos concentram mais de metade da riqueza — 56,2%. No outro extremo da balança, metade da população apenas detém 6,5%, um valor que está a cair: em 2019, no pré-pandemia, estava nos 7,2%.

A nível global, os dados são ainda mais alarmantes: “Estimamos que os 50% mais pobres na distribuição global da riqueza representem, em conjunto, menos de 1% da riqueza global no final de 2020. Em contraste, o decil dos mais rico (os 10% mais ricos) tem 82% da riqueza global e o percentil mais alto (1% mais rico) sozinho tem quase metade (45%) de todos os ativos”, escreve o Credit Suisse.

Escreve o banco que “as repercussões da pandemia Covid-19 levaram a aumentos generalizados da desigualdades na distribuição da riqueza em 2020“. Nos países que não implementaram medidas de apoio como o layoff e outras de transferência monetárias “o impacto económico da pandemia no emprego e nos rendimento em 2020 é provável que tenha penalizados os grupos mais baixos de detenção da riqueza, forçando-os a recorrem às suas poupanças e/ou a incorrer num aumento da dívida”. Por outro lado, os mais ricos “saíram relativamente ilesos da redução nos níveis de atividade económica e, mais importante, beneficiaram do impacto das baixas taxas de juro nos preços das ações e das casas”.

Em todo o mundo, há agora mais cinco milhões de milionários para um total de 56,1 milhões de pessoas. Aliás, de forma geral, a riqueza das famílias aumentou no último ano 28,7 biliões de euros, totalizando 418,3 triliões. Como é que isso — e o facto de os países mais afetados pela pandemia Covid-19 terem sido “muitas vezes os que registaram os maiores ganhos de riqueza por adulto” — aconteceu, dado os impactos da pandemia na economia?

A resposta, diz o banco, está na ação dos governos e bancos centrais. “Muitos governos e bancos centrais nas economias mais avançadas, ansiosos por evitar os erros cometidos durante a crise financeira global, tomaram medidas preventivas de duas maneiras: primeiro, organizaram programas massivos de transferência de rendimento para apoiar os indivíduos e as empresas mais adversamente afetados pela pandemia e, segundo, reduzindo as taxas de juro — muitas vezes para níveis próximos de zero — e deixando claro que as taxas de juros vão permanecer baixas por algum tempo”, explica o Credit Suisse.

Há, assim, “poucas dúvidas” de que estas intervenções foram “altamente bem sucedidas”. Só que trouxeram com elas outros custos. “A dívida pública em percentagem do PIB aumentou em todo o mundo em 20 pontos percentuais ou mais em muitos países. No essencial, tem havido uma enorme transferência do setor público para as famílias, o que é uma das razões pelas quais a riqueza das família tem sido tão resiliente”. A isso acresce o “aumento das poupanças” devido às restrições no consumo determinadas na resposta à pandemia.
Na UE a 27, Portugal é 14.º na riqueza por adulto. Só subiu um lugar desde a última crise

Em Portugal, um adulto tem, em média, uma riqueza de 142.537 dólares, o que inclui riqueza financeira, mas também não financeira (por exemplo, imóveis, carros, etc.). Com este número, o país está, praticamente, a meio da tabela da União Europeia a 27 — em 14.º, um lugar acima do que estava em 2014, um ano ainda afetado pela crise financeira. Nesse ano, a riqueza média por adulto era de 122.423 dólares.

Desde então, Portugal ultrapassou a Grécia, que desceu três posições e até viu a riqueza média por adulto cair na comparação direta entre 2014 e 2020 (de 128.602 para 104.603 dólares).

Ainda assim, Portugal está abaixo da média da UE (184.000) e tem uma riqueza que é 77% deste valor (quando, em 2014, era de 81%).

A liderar a tabela continua o Luxemburgo (477.306 dólares em 2020 e 470.632 em 2014). No ano passado, completaram o pódio os Países Baixos (377.092) e a Dinamarca (376.069). Já no extremo oposto, os últimos três lugares continuam a ser ocupados pelos mesmos países: a Bulgária (36.443), a Roménia (50.009) e a Hungria (53.664), que, ainda assim, melhoraram face a 2014.


“400 mil novos pobres são mais importantes do que mil infetados por dia”

Marta Grosso, in RR

Henrique Raposo responde ao ralhete de Merkel a Portugal sobre a permissão para a entrada de turistas ingleses e insiste: está na hora de mudar a matriz de risco.

Não é um ralhete justificado”, diz o comentador d’As Três da Manhã. “Porque recebemos turistas ingleses? Porque temos 400 mil novos pobres. São mais importantes do que mil infetados por dia”, responde.

“Dão quatro estádios da Luz antigo que eram da classe média e caíram na pobreza”, sublinha, lembrando que estes novos pobres são também “400 mil novas pessoas que vão desenvolver novas doenças”.

Henrique Raposo critica a narrativa que se mantém na comunicação social e entre os políticos.

“Temos de mudar a matriz de risco”, insiste. “As televisões parece que não mudaram a narrativa, quando temos três milhões de pessoas vacinadas. Isto é desrespeitar a ciência”, que não nega que, mesmo com vacinas, o vírus continuará a ser transmitido.

Na opinião do comentador das quartas-feiras, se o foco continuar a ser a Covid-19, “vamos ter mais doenças a crescer, como a psiquiatria, que está a rebentar pelas costuras”.

Universidade Católica revelou o impacto da crise na pobreza

por RTP


Um estudo da universidade concluiu que cerca de 400 mil pessoas caíram abaixo do limiar da pobreza devido à crise provocada pela pandemia.

[Veja a reportagem aqui.]

5 dicas para ONGs digitalizarem a mobilização de recursos

Por: Mariana Lima, in Observatório do Terceiro Setor

Palestra do Festival ABCR 2021 ressaltou a importância da digitalização da mobilização de recursos para a sustentabilidade financeira das ONGs na pandemia

A pandemia trouxe diversas mudanças para o Terceiro Setor, principalmente em relação às formas de captação. Repensar e planejar a mobilização de recursos no espaço digital se tornou peça-chave para manter as Organizações Não Governamentais (ONGs) em funcionamento. Contudo, a questão ainda traz muitas dúvidas para as organizações.

Buscando sanar algumas delas, o Festival ABCR 2021, realizado pela Associação Brasileira de Captadores do Recursos, reuniu a empresa de e-commerce Mercado Livre e a plataforma de voluntariado Atados para oferecer a palestra ‘Como digitalizar a sua mobilização de recursos’, no primeiro dia do evento.

“Desde 2016, o Mercado Livre vem colocando em prática o Programa Mercado Livre Solidário, que reúne mais de 2 mil ONGs de toda a América Latina para aprimorar suas estratégias de arrecadação através da plataforma, tendo acesso também a treinamentos. Na pandemia, percebemos a dificuldade dessas organizações em criarem mobilizações digitais. Nos unimos à Atados para conseguir oferecer conteúdo e apoio dentro deste contexto”, conta Pamela Ribeiro, coordenadora de Sustentabilidade do Mercado Livre.

4 conceitos norteadores

Daniel Morais, fundador da Atados, maior plataforma de voluntariado do Brasil, destacou 4 conceitos que precisam estar claros para as ONGs na hora de planejar a mobilização digital.
O Digital é o real (o real é o digital): “Se você não consegue captar no online, você não está conseguindo captar efetivamente e isso pode afetar sua organização futuramente. É preciso atuar no online e offline de forma unificada, integrando os canais. Essa atuação no online não é algo temporário que acaba com a pandemia”.
Mobilização depende da criação de rede – “Só é reconhecido na causa quem tem autoridade para falar sobre o assunto. E só se faz isso mostrando dados, resultados e impacto aliados a uma rede de atores, como especialistas e parceiros. A comunicação é essencial nesta etapa. A organização precisa ter voz, personalidade e saber mobilizar nas redes sociais pensando em cada público”.

Nesta etapa, Daniel destaca a importância de se pensar no conteúdo. “Os dados sozinhos não mobilizam. Esses dados precisam de um contexto e de histórias reais que façam o doador se sensibilizar e saber que não é apenas um dado, mas diversas histórias como essa”.
Faça junto – “Cada público tem seu papel na mobilização de recursos. A empresa, por exemplo, está buscando visibilidade e formas de colocar os ESG em prática, enquanto o funcionário busca o desenvolvimento social e o parceiro, atender o público almejado. A mensagem para cada um é diferente, mas todos precisam estar envolvidos para a mobilização funcionar”.
Inove – “Temos que estar inovando a todo momento, porque os públicos mudam. Estamos competindo com todos que estão criando conteúdo nas redes. Sua campanha precisa acompanhar o contexto atual e ter um elemento diferenciador para conseguir contagiar outras pessoas”.

É com esses conceitos em mente que as ONGs devem seguir para o planejamento das mobilizações digitais.

“O passo zero é planejar. Parece óbvio, mas esquecemos de fazer esse planejamento na hora de mudar os processos, pulando perguntas fundamentais para entender se estamos no caminho certo, como ‘Por que estou fazendo?’, ‘Quais ferramentas estão ao meu alcance?’, e ‘O que eu preciso para ter sucesso?’. Sem esse roteiro é mais fácil se perder na execução de fato”, esclarece Pamela Ribeiro, coordenadora de Sustentabilidade do Mercado Livre.
5 passos para se estruturar a mobilização

1. Mude o modelo mental da organização (e das pessoas) – Fortaleça a equipe para uma atuação online com agilidade; mantenha um contato próximo com o público que se relaciona com a ONG; coloque o doador como o centro das decisões; saiba lidar com as mudanças para buscar inovações e melhorias.

“Transformação digital não é apenas adotar tecnologias para resolver problemas antigos. É transformar a organização também, incluindo as pessoas que fazem a organização acontecer”, reforça Pamela.

2. Contato com parceiros – A organização não vai dar conta de tudo sozinha. Para digitalizar alguns processos é mais estratégico acionar parceiros especialistas do que construir soluções próprias. Busque responder: “Quais são as nossas necessidades?”; “O que temos em casa e o que precisamos buscar fora?”.

3. Conheça seu público – Entender a facilidade de acesso e o nível de consciência da pessoa em relação à causa ajuda as ONGs a atuarem de forma mais efetiva, uma vez que muitos podem ser potenciais doadores. Nesta etapa, Pamela reforça ser fundamental pensar na jornada do doador.

“Reconhecer a jornada de doador para conseguir construir experiências que façam sentido para cada público. É o relacionamento a longo prazo, que se fortalece na relação criada com a ONG, que vai torná-lo um doar recorrente”.

Outro ponto a ser destacado é o papel das bases de dados sobre os doadores, de acordo com a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). “Aproveite todas as oportunidades de contato com o seu público para gerar dados que possam ser transformados em informação para basear suas ações. É possível construir essa análise no Excel, por exemplo. Mas toda organização precisa ter um CRM [Customer Relationship Management, que significa Gestão de Relacionamento com o Cliente] para conseguir criar uma base de dados robusta sobre seus doadores”.

4. Comunicação e Ativação de Marketing – Não adianta planejar a jornada do doador se a comunicação não consegue informar, encantar e engajar. Realize a régua de e-mail, ou seja, cada passo da jornada do relacionamento tem um e-mail culminando aquele momento; estruture a imagem da organização através do site, que é o cartão de visitas da ONG, além de espaço para prestar contas aos doadores; e defina os papéis de cada rede social para inovar e engajar.

“É necessário entender a jornada do usuário para conseguir criar uma boa jornada do doador. O site oferece uma oportunidade para se promover a autoridade e gerar confiança em relação à organização. Tem que ter tudo o que a pessoa possa, eventualmente, querer buscar”.

5. Construir relacionamentos de longo prazo – Essencial trabalhar a jornada do doador pensando na fidelização para evitar campanhas focadas na doação que se restringem ao momento de divulgação. “É mais fácil cultivar um doador do que conseguir novos”.

Daniel e Pamela ainda destacam o uso do WhatsApp para engajar doadores. “Criar uma lista de transmissão, por exemplo, em que os doares possam se cadastrar para receber informações, ou grupos de doadores para que eles sejam ouvidos sobre as ações realizadas são caminhos para explorar essa ferramenta”, sugere Daniel.

Já Pamela ressalta a necessidade de incluir o planejamento neste meio. “Como trazer as pessoas para mais um grupo de WhatsApp? O grupo precisa ter um propósito que faça sentido para as pessoas e cumpri-lo”.

Algarve: 900 mil euros em fundos europeus para projeto de apoio aos sem-abrigo

in EP - diariOnline

A Comissão Diretiva do Programa Operacional do Algarve - CRESC Algarve 2020 aprovou uma candidatura para um projeto inovador de apoio às pessoas em situação de sem-abrigo, com financiamento de 900 mil euros em fundos europeus.

Trata-se de uma candidatura em parceria, apresentada por instituições da região, com o apoio dos municípios e respetivos Núcleos Locais para a Integração de Pessoas em Situação de Sem-Abrigo (NPISA), tendo em vista a prestação de auxílio à população que se encontram em risco de exclusão social, e, designadamente, em situação de sem-abrigo.

A abordagem promovida pela parceria, constituída em torno do Projeto LEGOS, constitui “uma abordagem local inovadora de desenvolvimento social e de promoção de estratégias locais de inclusão ativa”, prosseguindo respostas no âmbito na Estratégia Nacional para a Integração de Pessoas em Situação de Sem-Abrigo.

O Projeto LEGOS é desenvolvido por cinco entidades beneficiárias parceiras: MAPS – Movimento de Apoio à Problemática da Sida, que assume a coordenação da parceria; GATO – Grupo de Ajuda a Toxicodependentes; CASA – Centro de Apoio aos Sem-Abrigo; GRATO – Grupo de Apoio aos Toxicodependentes; e APF – Associação para o Planeamento da Família.
Ganhar fôlego para criar sinergias

Estas instituições, que contam com vasta experiencia de terreno em ações de apoio a pessoas em situação de sem-abrigo, ganharam agora “um novo e importante fôlego para criar sinergias” e assim intervir, de forma articulada, nos sete concelhos da região que possuem NPISA: Albufeira, Faro, Lagos, Loulé, Portimão, Tavira e Vila Real de Santo António.

A parceria contou, desde a primeira hora, com o apoio do Centro Distrital de Faro do Instituto de Segurança Social e de outras instituições, designadamente do Banco Alimentar Contra a Fome – Algarve; EAPN Portugal - Rede Europeia Anti Pobreza / Delegação Algarve; Fundação António Aleixo – Projeto CASULO - Incubadora de Inovação Social Loulé; Universidade do Algarve e Comunidade Intermunicipal do Algarve (AMAL), entre mais de 80 parcerias.

O Projeto Legos contempla, de acordo com as necessidades dos concelhos, as três ações elegíveis no âmbito do aviso de concurso, nomeadamente a criação de equipas que assegurem o acompanhamento psicossocial e o acesso aos recursos existentes na comunidade, bem como a respostas integradas dirigidas a pessoas em risco de exclusão social, nomeadamente em situação de sem-abrigo; o desenvolvimento de respostas que implementem ações ocupacionais adequadas às características e vulnerabilidade das pessoas em situação de sem-abrigo, promovendo a empregabilidade e a inserção profissional; e ações que favoreçam o combate ao estigma sobre a condição de sem-abrigo, designadamente: iniciativas de informação e de sensibilização das comunidades locais e sobre o fenómeno das pessoas em situação de sem-abrigo, com vista à prevenção e combate à medida das competências cognitivas, psicológicas, emocionais e estados de saúde física e mental das pessoas em situação de sem-abrigo.

Como principal meta, o projeto compromete-se a dotar as 593 pessoas classificadas em situação de sem-abrigo com gestor de caso.

Criar equipas multidisciplinares para intervenção especializada com pessoas em situação de sem-abrigo, nomeadamente para exercer o papel de gestor de caso; proporcionar atendimento e acompanhamento psicossocial adaptado às necessidades das pessoas em situação de sem-abrigo; apoiar na construção do plano individual de intervenção a nível pessoal, educacional (profissional/emprego), de formação, de atividades ocupacionais, desportivas, culturais, lúdicas entre outras, como potenciadores de uma integração plena; implementar um gestor de caso para todas as pessoas em situação de sem-abrigo; apoiar na ligação aos recursos e serviços da comunidade, numa ótica de otimização; apoiar nos cuidados pessoais, de saúde e justiça; desenvolver ações de capacitação de competências específicas/profissionais e transversais, fundamentais para a adequada promoção da empregabilidade, da inserção social e profissional e da valorização enquanto pessoa e cidadão; envolver a comunidade geográfica e relacional; desenvolver ações de informação e de sensibilização junto das comunidades locais sobre o fenómeno das pessoas em situação de sem-abrigo, tendo em vista a prevenção e o combate ao estigma e à discriminação; e promover a articulação regional e a estratégia de intervenção multiconcelhia, são os outros objetivos.

Neste momento as equipas já se encontram formadas, no terreno e em processo de formação, tendo o projeto já dado os primeiros passos, interagindo com os NPISA regionais e iniciando o contacto com os beneficiários.

O Projeto LEGOS nasce como um forte pilar na estratégia que tem vindo a ser definida, sendo um degrau importante no processo que contempla diversas respostas que articularam intimamente com o mesmo, nomeadamente respostas de continuidade como os apartamentos partilhados para pessoas em situação de sem abrigo: o Algarve conta com 65 camas em seis concelhos, com a esperança de ver esse número aumentar ainda este ano.

“Acredita-se assim que o Algarve seja uma importante referência na meta estabelecida pela estratégia nacional, que ninguém fique na rua por falta de opção”, salienta a Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR) do Algarve.

Presidência portuguesa da UE: faltou ouvir mais a sociedade civil

Ângela Roque, in RR

Plataforma das Organizações Não Governamentais para o Desenvolvimento faz balanço positivo da liderança portuguesa dos 27. Rita Leote elogia prioridade dada ao desenvolvimento humano e à relação com África, mas entende que devia ter havido mais envolvimento e participação da sociedade civil nos processos políticos e de decisão.

Rita Leote é a diretora executiva da Plataforma Portuguesa das Organizações Não-Governamentais para o Desenvolvimento. Em entrevista à Renascença analisa as principais decisões e marcos da presidência portuguesa da União Europeia, do ponto de vista das ONGD que representa.

A Cáritas, a União das Misericórdias, a FEC (Fundação fé e Cooperação), a Oikos, a Helpo, o Conselho Português para os Refugiados, ou a EAPN Portugal - Rede Europeia Anti-Pobreza são algumas das instituições e associações que integram a Plataforma e que atuam nas áreas da cooperação e educação para o desenvolvimento, combate à pobreza, ajuda Humanitária e de emergência.

Que balanço faz da presidência portuguesa da União Europeia? Esteve à altura dos muitos desafios que a pandemia também fez aumentar?

Nós fazemos um balanço positivo da presidência portuguesa num contexto que foi especialmente adverso, marcado pela pandemia, que dificultou alguns processos e impossibilitou outros. Na nossa área de trabalho, a área do desenvolvimento internacional, lamentamos que não tenha sido possível realizar a Cimeira com África, mas foram especialmente relevantes alguns processos que a presidência portuguesa conseguiu avançar, nomeadamente a aprovação do acordo pós-Cotonu, entre a UE e a Organização dos Estados de África, Caraíbas e Pacífico.

São também de assinalar as conclusões do Conselho sobre o reforço do compromisso da Europa com o desenvolvimento humano. A importância da dimensão humana e de políticas centradas nas pessoas é fundamental para responder aos desafios e às consequências da crise pandémica.

Destaco, ainda, a aprovação da Lei Europeia do Clima, e a prioridade dada às relações União Europeia/ África, através da organização de diálogos relacionados com a transição verde e o investimento no continente. Estes são, talvez, os aspetos mais importantes na área de trabalho das ONGD.

Houve alguma temática em que esperavam mais desenvolvimento?

Consideramos que haveria espaço para uma melhoria no que se refere a uma maior integração da sociedade civil no quadro dos processos políticos. A Plataforma, em particular, teve um trabalho de articulação e colaboração, nomeadamente com O Instituto Camões, mas ao longo da presidência haveria oportunidades, várias, para haver um maior envolvimento e uma maior participação no que se refere às iniciativas, aos eventos realizados no quadro da presidência, e na generalidade a sociedade civil esteve ausente desses processos. No fundo entendemos - e a Plataforma tem vindo a veicular isso ao longo do trabalho que fez durante a presidência - que só convocando os atores relevantes para a mesma mesa, incentivando ao diálogo e a uma participação democrática, os processos podem ser melhorados e podem responder às necessidades das pessoas, contribuindo para melhores políticas futuras, tendo em conta o papel da União Europeia a nível global.

Nestes seis meses de presidência, a Plataforma Portuguesa das ONGD implementou o projeto 'Por uma Europa aberta, justa e sustentável no mundo'. Que resultados saem desta iniciativa?

Este projeto foi bastante importante em três sentidos particulares: contribuiu para trazer para a sociedade civil portuguesa temas relacionados com as políticas europeias, que são temas relevantes e que, no fundo, são enquadrados pelo trabalho que as organizações fazem, portanto, contribuiu para a sua capacitação e para aumentar o seu envolvimento nas políticas europeias e na área de influência política para construir, definir e implementar melhores políticas; depois teve outro objetivo muito importante, que foi sensibilizar o público em geral, em particular a juventude, para questões como os direitos humanos, a cooperação para o desenvolvimento, a implementação da Agenda 2030, o papel da sociedade civil e o espaço cívico como elemento essencial para a democracia e para o avanço das nossas sociedades; por outro lado, também permitiu que a Plataforma e as ONGD pudessem ter mais oportunidades de articulação com os decisores políticos, e veicular aquilo que entendem que são as condições para a melhoria das políticas, para avançar nestes temas no quadro da União Europeia, e contribuir para um mundo mais justo, sustentável e propício ao combate às desigualdades e à erradicação da pobreza, no fundo contribuindo para a implementação dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável.

Há boas perspetivas para a concretização da Agenda 2030 para o desenvolvimento sustentável?

Naquilo que temos vindo a perceber, a pandemia provocou retrocessos significativos no que aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável e metas diz respeito.

O que as grandes organizações - e aí a União Europeia, como um bloco regional, também tem essa preocupação – estão a procurar é uma aceleração das políticas com vista ao cumprimento das metas definidas. No entanto não podemos deixar de dar a devida importância aos impactos que a pandemia provocou e às dificuldades que a crise vai colocar para o cumprimento total da Agenda 2030.

Como olha para o futuro?

No nosso trabalho - em articulação com outras plataformas dos países que já ocuparam a presidência, que a ocuparão no futuro, e com a rede europeia CONCORD - temos muita expectativa relativamente ao contributo que a sociedade civil tem dado para colocar na agenda questões importantes como a da sustentabilidade e da Agenda 2030, dos direitos humanos, da cooperação para o desenvolvimento, mas que incentive a uma maior igualdade e a um maior equilíbrio entre os parceiros. Prevê-se que na presidência francesa se realize a cimeira União Europeia/União Africana, esperamos que contribua para uma relação de mais igualdade, numa parceria genuína, em que as prioridades políticas respondam às aspirações e interesses de ambas as partes, e não sejam decididas de forma unilateral, como no passado, por parte do parceiro mais forte, neste caso a União Europeia, em detrimento daquilo que são as necessidades e aspirações dos países africanos. Essa é a nossa grande expectativa para o futuro, e vamos continuar deligentemente a trabalhar nesse sentido com os nossos parceiros, dentro do enquadramento do espaço cívico da sociedade civil europeia e da sociedade civil africana, não podemos esquecer.

29.6.21

Lisboa. Pandemia mudou perfil de famílias que recorrem ao Rendimento Social de Inserção

por Antena 1

No último ano, mais 800 famílias em Lisboa pediram este apoio e nesta altura são mais de oito mil famílias.

Há um novo tipo de família que foi obrigada a pedir o Rendimento Social de Inserção.

Vera Serras, directora da Santa Casa da Misericordia refere que a pandemia mudou o perfil de quem precisa deste tipo de ajuda.

Vera Serras acha ainda que o Rendimento Social de Inserção é demasiado baixo e devia ser aumentado.

Estratégia de Combate à Pobreza entra em consulta pública em setembro e dará “especial importância” a crianças e jovens

 Raquel Albuquerque, in Expresso

Com o objetivo de “quebrar ciclos de pobreza”, olhando para a vulnerabilidade dos mais jovens, a proposta de Estratégia está em discussão entre as várias áreas governativas e deverá entrar em consulta pública em setembro, segundo o Ministério do Trabalho e Segurança Social. Grupo de trabalho criado para rever as regras do RSI terá também de apresentar propostas até final de setembro

A comissão criada pelo Governo para elaborar uma proposta de Estratégia Nacional de Combate à Pobreza entregou o documento ao Executivo em dezembro, dois meses depois de ter sido constituída, e a proposta está agora a ser discutida entre as diferentes áreas governativas. “Prevê-se que entre em consulta pública no início de setembro”, indica ao Expresso o gabinete de Ana Mendes Godinho, ministra do Trabalho e da Segurança Social.

“A Estratégia Nacional de Combate à Pobreza está a ser desenhada em função das diferentes etapas do ciclo de vida das pessoas, com enfoque nos grupos-alvo mais vulneráveis e dando especial importância ao combate à pobreza infantil e juvenil, com o objetivo de quebrar ciclos de pobreza”, refere o Ministério.

A comissão é composta por vários especialistas dedicados aos temas da pobreza e das desigualdades, como os economistas Carlos Farinha Rodrigues ou Amélia Bastos, e é coordenada por Edmundo Martinho, provedor da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa. O grupo ouviu várias entidades e instituições sociais antes de elaborar a proposta que foi apresentada ao Governo.

O objetivo é que este documento, inserido no âmbito do Pilar Europeu dos Direitos Sociais, “apresente medidas concretas, cruzando diferentes instrumentos e dimensões de política pública”, e criando em particular “um quadro de monitorização único da evolução dos indicadores”.

PROPOSTAS DE REVISÃO DO RSI TAMBÉM EM SETEMBRO

Associado a este esforço e aproveitando os 25 anos da existência do Rendimento Social de Inserção (RSI), criado por lei a 29 de junho de 1996, o Governo também criou um grupo de trabalho para rever as regras da atribuição desta prestação social.

Segundo o Ministério da Segurança Social, o “trabalho de reflexão interna tem estado em curso” e a equipa que está a avaliar as regras “tem de apresentar as suas propostas ao Governo até final de setembro”. O grupo é constituído por representantes da Direção-Geral da Segurança Social (a quem compete a coordenação), do Gabinete de Estratégia e Planeamento (GEP), do Instituto da Segurança Social, do Instituto de Informática da Segurança Social e do Instituto de Emprego e Formação Profissional (IEFP).


“Poderão ainda ser convidadas a participar nos trabalhos personalidades de reconhecido mérito no âmbito do combate à pobreza e exclusão social, bem como outras entidades, como os parceiros sociais, os parceiros do sector social e solidário, representantes dos municípios ou membros da comissão responsável pela Estratégia Nacional de Combate à Pobreza.”

Associação Agora Aveiro cria “mapa de solidariedade”

 in AveiroMag

A associação Agora Aveiro está apostada em dar visibilidade às diferentes instituições que trabalham incansavelmente as causas sociais e em promover a solidariedade e o voluntariado na comunidade local. Para isso, decidiu implementar o projeto “Mapa Solidário de Aveiro”.

Ao dar visibilidade à missão e compromisso de cada instituição para com a comunidade, a Agora Aveiro entende estar “a abrir uma porta para que estas instituições recebam mais apoio de pessoas e empresas”.

Neste momento, o “Mapa de Solidariedade de Aveiro” inclui 10 organizações (mais a Agora Aveiro), e os projetos significativos que elas estão a desenvolver e a implementar na cidade. Mas este projeto vai mais longe. Porque o “Mapa Solidário de Aveiro” fornece informação precisa e atualizada sobre estas organizações, como trabalham e com quem, é fácil identificar as oportunidades de voluntariado que mais chamam cada indivíduo. “Criar este mapa é construir uma ponte entre as pessoas que querem ajudar, mas não sabem como, e aquelas que precisam de ajuda, mas não sabem onde procurá-la”, destaca a Agora Aveiro.

Pessoas proativas, empresas locais, outras instituições, qualquer pessoa, na realidade, pode encontrar aqui uma forma de estabelecer e fortalecer as suas redes. Podemos aproximar-nos enquanto comunidade para abraçar a solidariedade e promover uma cultura de colaboração em vez de uma cultura de divisão.

Este projeto é financiado pelo programa Corpo Europeu de Solidariedade da Comissão Europeia. Nos próximos dias, a Agora Aveiro vai continuar publicar partes do “Mapa de Solidariedade de Aveiro” nas redes sociais. Terá oportunidade de ouvir mais sobre 10 organizações locais que trabalham em diferentes campos, todas de alguma forma relacionadas com a solidariedade.

 

28.6.21

Há 402 mil desempregados inscritos nos centros de emprego. São menos 21 mil do que em abril

Cátia Mateus, in Expresso

Desemprego registado desce pelo segundo mês consecutivo. Dados do Instituto do Emprego e Formação Profissional sinalizam uma redução de 5,1% em cadeia, ou seja face ao mês anterior, do número de inscritos nos serviços públicos de emprego. Em maio, só duas regiões de país viram o desemprego registado aumentar: Madeira e Lisboa e Vale do Tejo.

São menos 21.705 desempregados inscritos nos centros de emprego do que em abril, mês em que o desemprego registado também já tinha invertido a trajetória de subida iniciada em janeiro. Maio fechou com 402.183 desempregados registados, o menor número desde dezembro de 2020. Os dados esta segunda-feira divulgados pelo Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP) sinalizam uma redução homóloga, face a maio de 2020, de 1,7% (-6.751) no número de desempregados. Mas é na comparação em cadeira que o desemprego mais cai: 5,1%.

Só duas regiões contrariaram em maio a tendência de descida do desemprego registado: Madeira, onde o desemprego aumentou em termos homólogos 13,9% e Lisboa e Vale do Tejo com um agravamento de 4,2%. As restantes regiões registaram variações negativas, com o decréscimo mais acentuado a ocorrer no Alentejo, onde o número de inscritos recuou 11,7%, tendo como referência maio de 2020.

"Para a diminuição do desemprego registado, face ao mês homólogo de 2020, na variação absoluta, contribuiu o grupo dos que estão inscritos há menos de um ano (-50.161) e, em sentido inverso, contribuiu com o maior aumento no desemprego aqueles que permanecem inscritos há mais de um ano (+43.410)", destaca a nota do IEFP.

OFERTAS AUMENTAM

Ao longo do mês inscreveram-se nos serviços públicos de emprego nacionais 34.083 desempregados, menos 27,6% (-13.008) do que no mês homólogo e menos 8,5% (-3.166) do que em abril deste ano. "As ofertas de emprego recebidas ao longo deste mês totalizaram 17.563 em todo o País, número superior ao do mês homólogo de 2020 (+10 592 ; +151,9%) e ao mês anterior(+4 657; +36,1%)", explica a nota do IEFP que acompanha os indicadores. As atividades económicas com maior expressão nas ofertas de emprego recebidas ao longo deste mês no continente (únicos dados disponíveis) foram, por ordem decrescente, o "Alojamento, restauração e similares" (21,7%), as "Atividades imobiliárias, administrativas e dos serviços de apoio"(21,0%) e "Comércio por grosso e a retalho" (10,6%).

Já as colocações realizadas durante o mês de maio totalizaram aumentaram para 10.123. São mais 5.656 (+126,6%) face ao mês homólogo e mais 2.275 (+29%) face ao mês anterior. "A análise das colocações por grupos de profissões mostra uma maior concentração nos “Trabalhadores não qualificados”(28,4%), nos "Trabalhadores dos serviços pessoais, de proteção e segurança e vendedores"(23,4%) e nos "Trabalhadores qualificados da indústria, construção e artífices"(11,9%)", explica o IEFP:

Considerar o número de filhos no cálculo das pensões “pode proteger as mulheres que optam” por ser mães

Natália Faria e Rui Gaudêncio (fotografia), in Público on-line

Ana Fernandes, presidente da Associação Portuguesa de Demografia, diz que os Censos de 2021 vão mostrar uma pirâmide etária semelhante ao “cogumelo da bomba atómica”. Quanto a medidas para contrariar a descida dos nascimentos e dos jovens em idade activa, admite que a beneficiação das mulheres com filhos no cálculo das pensões possa ser uma via, além de uma aposta muito clara em creches a preços acessíveis.

A mortalidade excessiva provocada pela covid-19 não é por si só suficiente para encurtar a esperança de vida dos portugueses, segundo Ana Fernandes, presidente da Associação Portuguesa da Demografia, para quem, além das mortes provocadas directamente pelo novo coronavírus, há ainda que estudar a mortalidade excessiva decorrente do medo, da ansiedade e do menor acesso aos cuidados de saúde. Mas a pandemia vai alterar a estrutura demográfica da população, sobretudo porque a incerteza instalada quanto ao futuro já está a fazer baixar a natalidade e não há imigrantes a entrar para compensar o envelhecimento populacional. Para contrariar esta tendência, importava discutir medidas como a indexação do cálculo das pensões ao número de filhos, como se fez em França, diz a também investigadora do Centro Interdisciplinar de Ciências Sociais da Universidade Nova de Lisboa.

Que impacto terá a pandemia na estrutura demográfica do país? Concorda com o INE quando este calcula que, no triénio 2019-2021, e na comparação com o triénio anterior, a esperança de vida possa recuar cerca de três meses, quer à nascença quer aos 65 anos?
Não creio. Para que isso acontecesse, era preciso que houvesse uma persistência da mortalidade, ou seja, que esse aumento da mortalidade por covid-19 alastrasse por todo o ano e isso não acontece.

Tivemos uns picos (um no Verão do ano passado e outro, maior, já em Janeiro deste ano) mas isso não me parece suficiente para justificar o recuo na esperança de vida. Para que esta mortalidade tivesse um efeito na esperança de vida à nascença, era preciso que tivesse morrido mais gente e mais jovem. Além disso, para que o INE pudesse aferir três meses no cálculo da esperança de vida, precisávamos de ter números muito correctos em relação à população, que não temos, estamos à espera dos resultados do recenseamento.
A pandemia vai continuar a ter um efeito muito negativo na decisão de ter uma criança

E aos 65 anos?
Aos 65 anos é provável que haja uma ligeira baixa ou estabilização, porque, apesar de não termos tido um aumento de mortalidade estrutural ao longo destes dois anos, as pessoas que morreram por covid-19 foram sobretudo pessoas com mais de 65 anos. E, tivemos, por exemplo, no Verão do ano passado, um pico de mortalidade por outras causas de morte que não covid-19, e que pode ser explicado pelo facto de ter havido poucas ambulâncias em determinado momento e pelas pessoas que morreram de ataque cardíaco e por AVC por falta de atendimento específico nas urgências ou por terem deixado de ir ao médico com receio.

Era preciso analisar melhor essas causas de morte que resultaram indirectamente da covid-19, mas não me parece, por aquilo que já sabemos da mortalidade excessiva, que esta seja suficiente para haver um recuo na esperança de vida.

Poder-se-á então dizer que o impacto da pandemia na estrutura demográfica será reduzido?
Será reduzido. A minha percepção é que este foi um fenómeno muitíssimo relevante e muitíssimo importante do ponto de vista social, que criou incerteza ao nível daquilo que era certo que era o controlo da mortalidade, mas que, em termos de impacto estatístico populacional e ao nível da estrutura etária, não terá relevância.
Quando às creches não temos visto grandes preocupações políticas. As creches privadas continuam a ser demasiado caras, mais do que a universidade.

Mesmo considerada a diminuição da natalidade?
Isso é outra coisa. E aqui já não estamos a falar directamente da covid-19, mas daquilo que ela provoca nas pessoas. E, ao nível da natalidade, a pandemia está a ter um impacto pela incerteza que introduziu em termos económicos, para além das situações objectivas de precariedade que veio criar.

Portanto, a pandemia não só veio criar objectivamente situações precárias como, naqueles em que não chegou a fazê-lo, criou incerteza. E é esta incerteza instalada face à vida social e face ao amanhã que põe fortemente em causa a decisão de se ter uma criança.

Corremos o risco de voltar a um número semelhante aos 82.367 nascimentos de 2014 — ano em que batemos no fundo em termos de natalidade?
É provável, sim, que continuemos a baixar, até porque não me parece que as condições se tenham alterado, pelo menos ao nível da percepção da sociedade face àquilo que nos aconteceu. Não temos ainda dados para crer que as coisas estejam certas face ao futuro. E, nessa medida, a pandemia vai continuar a ter um efeito muito negativo na decisão de ter uma criança.

É o problema de o trabalho ser uma espécie de pedra de toque na decisão reprodutiva?
Completamente. É por aí que passa muito a decisão de ter um filho. Pela perspectiva de uma situação estável em termos de rendimento e de situação económica.

É de prever que tenhamos assim um estreitamento ainda maior na base da pirâmide etária?
Esse é um enorme problema que se vai reflectir no futuro e que não tem retrocesso: a base da pirâmide vai apertando, e, pelo facto de termos cada vez menos jovens por efeitos anteriores de recuo na natalidade, teremos também o estreitamento da pirâmide na parte central.

E isto é combatível por via de medidas de apoio à natalidade ou já não vamos a tempo?
O Governo está naturalmente a querer transmitir uma ideia de confiança no futuro e na recuperação da economia por via do dinheiro europeu que aí vem, mas não me parece que o rombo seja recuperável de imediato.
A França conseguiu chegar aos 2,1 filhos em média por mulher em idade fértil com a ajuda dos imigrantes, evidentemente, embora também com uma política muito orientada para a distribuição de creches por todo o lado. Essa preocupação não se tem visto por cá

No início do ano passado, ainda se pensava que as portas das empresas que tinham fechado, dos restaurantes e do comércio, voltariam a reabrir rapidamente, mas hoje já sabemos que não é assim e que muitas empresas fecharam mesmo. Do ponto de vista político, os estudos mostram que, entre os europeus, a chave de toque que faz com que possam ter mais filhos está na existência de creches acessíveis, no espaço e do ponto de vista económico: é o apoio fundamental de que as famílias precisam para decidirem ter um filho, quando há alguma segurança do ponto de vista económico, até porque as mulheres não querem ficar em casa, têm carreiras profissionais e não as querem perder.

E aqui até temos medidas bastante boas no sentido de uma maior participação dos pais na relação com os filhos, que ajudam a que as mulheres possam proteger um pouco melhor o seu local de trabalho e a sua carreira profissional. Mas quando às creches não temos visto grandes preocupações políticas. As creches privadas continuam a ser demasiado caras, mais do que a universidade.

A normalização do teletrabalho poderá ajudar a alavancar um bocadinho a maternidade, uma vez que a conciliação trabalho/família é outra das dificuldades frequentemente apontadas pelos pais?
Poderíamos teoricamente pensar que sim, mas, na prática, o trabalho em casa tem muitos ónus e muitas dificuldades, principalmente para as mulheres que passaram a funcionar a dois ritmos dentro de casa e sentiram as dificuldades de terem de se concentrar no trabalho ao mesmo tempo que têm de dar apoio à criança ou ao bebé, atender às refeições e organizar a casa. É muito complicado. E mesmo com as crianças na escola não penso que mudar o escritório para casa possa ter grande impacto na maternidade.

E temos por outro lado o menor afluxo de imigrantes, que poderá também agravar a queda da natalidade.
Exactamente. E a natalidade em Portugal beneficiou durante algum tempo das mulheres brasileiras que vinham para Portugal e que tinham filhos, ajudando assim a compensar a descida no número de nados-vivos e o défice de população jovem no país. E a França conseguiu chegar aos 2,1 filhos em média por mulher em idade fértil com a ajuda dos imigrantes, evidentemente, embora também com uma política muito orientada para a distribuição de creches por todo o lado.

Essa preocupação não se tem visto por cá e, desde que Manuela Ferreira Leite fechou as creches públicas, como as que existiam ao nível das universidades e dos locais onde havia jovens, o problema das creches está totalmente entregue à sociedade civil, privados e instituições particulares de solidariedade social.

A natalidade em Portugal não poderia beneficiar de medidas como a adoptada recentemente em Espanha, cujo Governo decidiu incluir as famílias monoparentais com dois filhos no conceito de famílias numerosas?
Isso poderá beneficiar as famílias, mas já não vem promover a natalidade, porque é uma medida a jusante disso. Há uma discussão que pode ser lançada neste domínio e que tem a ver com o facto de o cálculo das pensões poder ter em conta o número de filhos, nomeadamente para as mulheres. No fundo, pensar-se em introduzir no cálculo das pensões um coeficiente de ponderação consoante o número de filhos, multiplicando um pouco o valor que a mulher vai receber como pensão. Não vejo que no princípio da vida activa isto possa ser muito estimulante, mas é uma medida que os franceses adoptaram e que pode proteger mais as mulheres que optam por ter filhos.
Um sueco que anda numa cadeira de rodas faz a sua vida normal, apesar da sua incapacidade é uma pessoa autónoma, enquanto em Portugal não é, pode até ser um acamado ou, pelo menos, estar reduzido à janela de casa

Ainda em Madrid, Isabel Diaz Ayuso anunciou há pouco a decisão de apoiar as mulheres com rendimentos inferiores a 30 mil euros anuais com um cheque de 500 euros mensais, desde o quinto mês de gravidez até aos dois anos da criança, num apoio total de 14.500 euros, já a partir de 2022.
É uma medida que poderá ter algum impacto, não posso dizer que não, principalmente nas mulheres que não tenham uma aposta na carreira profissional. No fundo, é um abono que começa antes de a criança nascer. E os abonos em Portugal não são nada estimulantes da natalidade porque são muito baixos e são só para as crianças de categorias sociais muito baixas. Mas pensar que o nascimento de uma criança é um beneficio para o país pode passar por medidas dessas.

No caso de Madrid, a medida aplica-se apenas às mulheres até aos 30 anos de idade, pelo que se depreende que há aqui um esforço para tentar baixar a idade a que as mulheres têm filhos.
Essa preocupação percebe-se porque, em Portugal, por exemplo, a idade da mulher ao nascimento do primeiro filho está nos 30 anos, o que é muito alto. E isto compreende-se porque a entrada no mercado de trabalho dá-se muito tardiamente e os jovens demoram muito tempo a conseguir alguma estabilidade laboral e até uma relação conjugal estável. É tudo mais tardio. E isso também pode ser o reflexo do aumento da longevidade: como se vive muito mais tempo, foi tudo atrasado.
Calculei o impacto da crise anterior na esperança de vida aos 65 anos e realmente verificou-se uma redução, também porque muitas pessoas tiveram medo de perder as pensões e passaram a ter um menor acesso a cuidados de saúde, e isso traduziu-se em ataques de pânico, ataques de coração, e provavelmente, mortes prematuras. Agora estamos um bocadinho no mesmo padrão

Vamos continuar a somar ganhos na esperança de vida ou estamos perto do limite?
Estamos já perto do limite daquilo que é possível, porque, se retirarmos de uma tábua de mortalidade tudo o que é morte evitável (acidentes de viação, infecções...) e calcularmos novamente a esperança de vida, ela já ronda os 86 anos. Para as mulheres espanholas, aliás, já temos uma esperança de vida que ronda os 86 anos. Portanto, nós estamos no limiar daquilo que é possível em termos de estender a esperança de vida humana.

No entanto, entre os portugueses a esperança de vida saudável aos 65 anos é relativamente curta.
Nós temos das esperanças de vida saudável aos 65 anos mais baixas da Europa. Mas este cálculo é feito com base em indicadores de avaliação subjectiva e não objectiva, ou seja, são as pessoas que dizem se têm saúde ou não, se têm incapacidade ou não, e, portanto, isto vale o que vale, ou seja, tem um valor muito relativo porque em Portugal as pessoas são sempre muito pessimistas, olham para a sua saúde sempre pelo lado negativo. E depois a nossa cultura é muito dependentista, promovemos pouco a autonomia. Enquanto os nórdicos são muito promotores da autonomia da pessoa, nós somos muito proteccionistas. E, portanto, um sueco que anda numa cadeira de rodas faz a sua vida normal, apesar da sua incapacidade é uma pessoa autónoma, enquanto em Portugal não é, pode até ser um acamado ou, pelo menos, estar reduzido à janela de casa porque não sai, não tem autonomia.

Vê paralelismos e diferenças do impacto desta crise na estrutura populacional relativamente à crise anterior, que motivou a vinda da troika?
Penso que as duas crises se estão a encontrar. Porque a crise financeira provocou uma crise económica, tivemos empresas fechadas, negócios que deixaram de funcionar, pessoas desempregadas, e também se instalou a incerteza. E, do ponto de vista sociológico, podemos dizer que o perfil destas duas crises é idêntico, ainda que esta que estamos a viver esteja agravada pela incerteza relativamente à saúde. Mas há uma similitude muito grande entre uma e a outra.

Eu calculei o impacto da crise anterior na esperança de vida aos 65 anos e realmente verificou-se uma redução, também porque muitas pessoas tiveram medo do que ia acontecer, medo de perder as pensões e passaram a ter um menor acesso a cuidados de saúde, e isso traduziu-se em ataques de pânico, ataques de coração, e provavelmente, mortes prematuras. E agora estamos um bocadinho no mesmo padrão de incerteza, não em relação às pensões, não tivemos o mesmo tipo de cortes, mas na incerteza em relação ao dia de amanhã.

Mas na altura pesou o medo ou o efectivo menor acesso a cuidados de saúde?
Penso que foi um misto dos dois, porque, na velhice, a insegurança quanto ao dia de amanhã causa muita inquietação. Eu apanhei algumas pessoas de idade com esta inquietação, que causa muito desespero, tristeza, depressão e problemas de saúde, evidentemente.

É certo que os Censos de 2021 não vão espelhar ainda os efeitos da pandemia na população, mas que mudanças espera encontrar na estrutura populacional portuguesa quando forem divulgados os resultados?
O que nós esperamos é uma aproximação da pirâmide etária àquilo a que chamo a imagem do “cogumelo da bomba atómica”, explosivo e algo assustador, em que a parte central e a base da pirâmide se encolhem acentuadamente e o topo aumenta. Penso que continuaremos acima dos dez milhões de residentes, mas a reduzir, e que vamos ter défice de população activa, de população jovem. Teremos mais espaço nas escolas e mais pessoas em lares e a viver sozinhas. Portanto, teremos um acentuar do encolhimento na parte central e da base e um alargamento do topo na pirâmide etária.

E não devíamos estar a olhar mais seriamente para este problema?
Com certeza, porque é o futuro. A demografia é traiçoeira, quando ela se apresenta é como facto consumado já não há nada a fazer, porque já se devia ter feito para trás.

"SE NÃO HOUVESSE RENDIMENTO MÍNIMO HAVIA MILHARES DE CRIANÇAS QUE NÃO TERIAM IDO À ESCOLA"

in TVI24

O presidente da Assembleia da República, Eduardo Ferro Rodrigues, defendeu a realização de um inquérito ao Rendimento Social de Inserção, que nos 25 anos da prestação social avalie o impacto da medida

O presidente da Assembleia da República defendeu a realização de um inquérito ao Rendimento Social de Inserção (RSI), medida em vigor há 25 anos e que nasceu como Rendimento Mínimo Garantido.

Em entrevista à agência Lusa, por ocasião dos 25 anos de existência do RSI, Eduardo Ferro Rodrigues, que era o ministro da Solidariedade e Segurança Social na altura da criação do então Rendimento Mínimo Garantido (RMG), desafiou os atuais responsáveis políticos a realizarem um inquérito não só junto das pessoas que atualmente recebem a prestação social, mas também entre as que receberam no início.

Na opinião de Ferro Rodrigues, importa saber, nomeadamente junto daqueles que há 25 anos eram crianças, “qual foi a importância do Rendimento Mínimo para a sua própria sobrevivência”.

O ex-ministro lembrou que o RMG “era sobretudo um ataque à miséria e à exclusão social”, que “nunca se apresentou como a resposta total à pobreza porque isso não era possível”.

Foi sobretudo a resposta à indignidade por que passavam os mais pobres neste país, que eram tratados como pessoas que não existiam, transparentes, que se passava por elas na rua e nem se olhava para elas”, defendeu.

Segundo Ferro Rodrigues, essas pessoas “passaram a ter direitos e passaram a ter uma dignidade reconhecida pelo governo e pelo Estado”, sublinhando que “essa é que é a questão fundamental”.

Deixo esse desafio porque 25 anos depois era uma boa forma de comemorar o lançamento do Rendimento Mínimo, um inquérito geral a todos aqueles, independente da idade, que tiveram direito a essa prestação e como é que correu a inserção social, os apoios à habitação, os apoios à saúde e os apoios à educação porque isso no fundo é que é a questão essencial”, observou.

Entende, por isso, “que era necessário saber exatamente o que se passou”, justificando assim o desafio que disse ter a certeza de que terá “uma resposta francamente positiva”.

Para o atual presidente da Assembleia da República, “uma coisa é clara”: a partir do momento em que a prestação social foi criada deixou de haver quem dissesse que não tem como sobreviver ou que vai “morrer em qualquer esquina” porque não tem direito a qualquer apoio.

Se não houvesse rendimento mínimo havia milhares de crianças que não teriam ido à escola, havia milhares de famílias que não tinham tido cuidados de habitação que desta maneira tiveram e pessoas que nem sequer reconheciam ou sabiam os seus direitos em matéria de saúde e de segurança social”, salientou, acrescentando que se a prestação fosse tão má como algumas pessoas criticam, ela já teria acabado.

“Eu continuo a dizer que é um grande orgulho do ponto de vista político na minha vida”, destacou.

Sobre uma possível análise e reforma da medida, defendeu que são sempre necessárias e possíveis, apontando que “mesmo com alguns recuos”, a partir de 2015 houve melhorias nas condições de acesso.

Lembrou que o país está a viver consecutivamente duas crises, a económico-social e a pandémica, e que “seria bom” que qualquer análise que venha a ser feita evite tirar conclusões das consequências destas crises para questões tão importantes como a do RSI.

O desafio que faço é que, deixando a pandemia passar e para comemorar os 25 anos, que haja a possibilidade de fazer uma análise clara e sem preconceitos e estou convencido de que os resultados serão francamente favoráveis à medida”, antecipou.

Independentemente de qualquer análise, Ferro Rodrigues não receia em defender o valor da medida, salientando que o sucesso afere-se pela capacidade que esta prestação social teve de gerar ascensão social ou de tirar pessoas da miséria, dando como exemplo o trabalho feito ao nível da erradicação das barracas nas zonas urbanas, o incentivo para que as crianças fossem à escola ou o acesso aos serviços de saúde.


Apontou também que entre as centenas de milhar de beneficiários do RSI há uma grande parte de crianças e que esta prestação tem desde o seu início o “grande” desafio da inserção.

Olhando para trás, o político diz não recordar “grandes oposições” no momento da aprovação da medida, mas admite que o que foi mais difícil na altura continua a sê-lo agora, ou seja, “explicar às pessoas que é necessário haver um instrumento de política social que garanta a dignidade básica de qualquer cidadão e sobretudo a possibilidade de haver um combate contra a miséria”.

Ao fim destes anos todos foi um momento, não direi o mais importante da minha vida política, mas foi o mais gratificante sem dúvida", rematou.

O Rendimento Social de Inserção (RSI) nasceu como Rendimento Mínimo Garantido há 25 anos e é uma prestação social para as pessoas que estão numa situação de pobreza extrema. É constituída por uma prestação em dinheiro e por um programa de inserção, ao qual está associado um contrato que estabelece as condições e os objetivos para uma progressiva inserção social, laboral e comunitária dos seus membros.

Atualmente, recebem esta prestação quase 218 mil pessoas.


RSI: a quem interessa uma sociedade desigual?

Amílcar Correia, editorial, in Público on-line

Vinte e cinco anos depois, justifica-se que se estude o impacto da medida nos actuais beneficiários e no trajecto dos que, na altura, eram crianças, como sugere Eduardo Ferro Rodrigues, ministro da Segurança Social na altura do lançamento do programa.

O Rendimento Mínimo Garantido foi criado para dar um mínimo de dignidade a quem vivia em situações de pobreza extrema e evoluiu para uma medida de reinserção a cumprir por quem é culpado da sua pobreza. As palavras não são inócuas. Num Estado social incipiente, como era o português há 25 anos, quando esta prestação foi atribuída pela primeira vez, no demolido Bairro dos Pescadores, em Quarteira, a pobreza era uma fatalidade hereditária. O Estado Novo sempre a abençoou, casta, abnegada e conformada com a esmola à porta da igreja.

A ideia de um rendimento mínimo sempre gerou clivagens ideológicas acentuadas e sempre foi usada, como ainda, recentemente, nas eleições regionais nos Açores e nas presidenciais, como argumento político para separar os portugueses bons dos outros. Não há prestação social cujos custos e efeitos tenha sido politicamente tão manipulada, por quem prefere o assistencialismo que infantiliza quem precisa de apoio de emergência.

E, mais de duas décadas depois, discute-se a atribuição de um Rendimento Básico Incondicional, para garantir condições de vida decentes, que permita que alguém viva sem os constrangimentos económicos que conduzem à exclusão.

Entre Março de 2020 e Março de 2021, o número de beneficiários do Rendimento Social de Inserção (RSI) cresceu 8,3%: há mais 16.636 pessoas a receber este apoio do Estado porque precisam dele para sobreviver à devastação económica que o vírus provocou e não por opção de estilo de vida (o estereótipo mais frequente entre os seus detractores). O RSI não elimina a pobreza, atenua a sua gravidade.

Os seus principais beneficiários sempre foram as crianças. Ninguém deixa de ser pobre por auferir uma prestação tão baixa. O que aquele aumento traduz é o efeito directo da pandemia no emprego, invertendo a tendência de redução em 16% do número de pessoas em risco de pobreza, segundo os dados do INE relativos a 2019.

Vinte e cinco anos depois, justifica-se que se estude o impacto da medida nos actuais beneficiários e no trajecto dos que, na altura, eram crianças, como sugere Eduardo Ferro Rodrigues, ministro da Segurança Social aquando do lançamento do programa. Talvez os seus resultados positivos se sobreponham, de vez, ao discurso da fraude, como se Rabo de Peixe fosse responsável pelos défices do Estado. Mais do que nunca no passado recente, também se justifica a sua revisão e adaptação às necessidades actuais, para que seja mais eficaz. Não há cidadania na desigualdade.

UE não deve voltar às regras pré-pandemia, avisa o BCE

Isabel Patrício, in EcoOnline

"Um regresso das políticas macroeconómicas ao status quo pré-pandémico seria uma oportunidade perdida", defende Fabio Panetta, membro da Comissão Executiva do BCE.

Um retorno às políticas macroeconómicas que existiam antes da pandemia de coronavírus seria uma “oportunidade perdida“. Quem o diz é Fabio Panetta, membro da Comissão Executiva do Banco Central Europeu (BCE), que, citado pela Bloomberg, propõe uma estratégia marcada por um grau “inconvencional” de flexibilidade para manter os custos de financiamento baixos até que os gastos dos Governos puxem pela inflação.

“Seria um erro” Pacto de Estabilidade regressar sem mudanças

Fabio Panetta apela a que os Governos reconheçam que os atuais estímulos orçamentais e monetários são “claramente superiores” ao cenário pré-pandémico, altura em que os líderes estavam concentrados sobretudo na redução da dívida. Assim, o responsável diz considerar que “um regresso das políticas macroeconómicas ao status quo pré-pandémico seria uma oportunidade perdida”. “Devemos reconhecer que o que víamos como inconvencional no passado é agora convencional”, atirou o mesmo, na VI Conferência dos Bancos Centrais do Mediterrâneo.

Também o Comissário Europeu da Economia, Paolo Gentiloni, tem defendido essa perspetiva, sublinhando que as regras orçamentais do bloco comunitário devem der “realistas” ou “não serão aplicáveis”. O responsável acrescentou ainda que a Comissão Europeia irá rever, este outono, o Pacto de Estabilidade e Crescimento.

De notar que essas regras orçamentais foram suspensas face ao impacto da pandemia nas economias europeias, o que tem permitido aos países da União Europeia gastarem o que precisam, sem se preocuparem com o incumprimento do referido pacto.

Por outro lado, Fabio Panetta fez questão de salientar que as economias têm recuperado à boleia do recuo dos casos de Covid-19 e do levantamento das restrições, mas o futuro permanece incerto. Logo, este não é ainda o momento certo para ponderar a retirada dos apoios, disse. “Não parece que estejamos no caminho para ‘aquecer’ a economia”, defendeu o membro da Comissão Executiva do BCE. E acrescentou: “Os Governos que gastam sensatamente hoje podem estar seguros de que não serão penalizados por um aumento prematuro dos custos de financiamento“.





Famílias a receber RSI aumentam 10% em Lisboa, com casos nos bairros nobres da cidade

in Econoline

Há 8.176 famílias na capital que recebem Rendimento Social de Inserção (RSI), um número que aumentou 10% com a pandemia. Santa Casa diz que surgiram casos nos bairros nobres de Lisboa.

As famílias apoiadas pelo Rendimento Social de Inserção (RSI) que vivem em Lisboa aumentaram 10% no último ano, revelou a Santa Casa da Misericórdia, que tem acompanhado casos de pobreza extrema nos bairros nobres da cidade.

Atualmente há 8.176 famílias na capital que recebem RSI. Entre março de 2020 e abril de 2021, apareceram “mais de 800 novas famílias” numa situação financeira desesperada a quem foi atribuída esta ajuda, segundo dados do Instituto de Segurança Social (ISS) disponibilizados à Santa Casa da Misericórdia de Lisboa (SCML).

Em plena crise pandémica, assistiu-se “ao aparecimento de novos públicos”, disse à Lusa Vera Serras, diretora da SCML, a entidade que acompanha a medida na capital. Além dos casos identificados nas zonas mais pobres da cidade, começaram a surgir também pedidos de ajuda de quem vive em bairros habitualmente associados a classes sociais mais altas, como Alvalade, Avenidas Novas, São Domingos de Benfica ou Olivais, contou.

Os processos revelam histórias de desemprego mas também apresentam casos de redes familiar de apoio que de repente falharam, explicou a diretora da Unidade de Desenvolvimento de Intervenção de Proximidade e interlocutora do RSI da SCML junto do ISS. Vera Serras sublinhou que “nem todos são fruto da pandemia”, mas reconheceu que a época tem agravado situações.

Com trabalhos precários e sem descontos para a Segurança Social, o confinamento atirou-os para o desemprego e deixou-os sem nada. O RSI foi “a única medida que lhes permitiu ter rendimentos para assegurar a sua subsistência”, explicou a diretora. Mas, quando os casos chegam ao conhecimento dos técnicos da Santa Casa, há muita gente já “em situação limite de sobre-endividamento”.

Entre a crença de que vão conseguir resolver sozinhos a situação financeira e a vergonha de pedir ajuda, as famílias aparecem com vários meses de rendas em atraso ou outras contas por saldar, contou. No entanto, para a diretora da SCML, estes não são os casos mais complicados. Quando o confinamento acabou, muitos conseguiram arranjar emprego e “deixaram de beneficiar da prestação”. “São pessoas motivadas, com vontade de regressar ao mercado de trabalho, a quem esta prestação serviu, essencialmente, como um trampolim. Foi um rendimento mínimo na altura em que mais precisavam”, explicou.

Nos processos do RSI acompanhados pela SCML existem também histórias de doença mental. Nestes mesmos bairros mais organizados, há adultos que vivem com os pais, de quem dependem financeiramente. A morte dos progenitores deixa-os sem nada. Para uns pode ser “apenas” um problema de dinheiro, para outros vem somar-se a uma saúde mental já frágil, que se agrava nestas situações. Mais uma vez, sem descontos feitos para a Segurança Social, o RSI surge como solução.

Nestes casos de saúde mental, é a rede de proximidade quem lança o alerta. São os vizinhos que percebem que algo está errado. “Porque as pessoas deixam de fazer a sua higiene pessoal ou porque deixam de manter a casa limpa”, explicou Vera Serras. Mas também há alertas que chegam das juntas de freguesia, da polícia ou centro de saúde local. “Os centros sociais e paroquiais assim como as escolas e os centros de emprego também estão atentos e conseguem, muitas vezes, detetar precocemente quando surge um novo caso”.

Mas existe o outro lado do RSI. De quem prolonga este apoio anos a fio. Vera Serra reconhece que existe uma franja da população dependente: “Há quem beneficie desta medida há muitos anos. Mas a esses beneficiários estão associados outros constrangimentos”.

A maioria das 8.176 famílias atualmente apoiadas vive nos bairros mais pobres da cidade, situados nas freguesias de Santa Clara, Marvila e Penha de França. O perfil tipo é facilmente traçado: Abandonaram a escola antes do tempo, havendo mesmo quem não saiba ler nem escrever, e “muitos deles têm uma ausência de hábitos de trabalho”. Por estas razões, diz Vera Serras, “muitas famílias não reúnem condições para a inserção no mercado de trabalho”.

Apesar de a atribuição do RSI implicar a celebração de um contrato em que quem recebe o apoio promete empenhar-se na procura de um emprego, a realidade é bem mais complicada. Existem muitos casos em que viver dependente de subsídios é um hábito que vai passando de pais para filhos. Apesar disso, Vera Serras mantém-se uma adepta da medida, defendendo que o valor mensal deveria ser aumentado. Atualmente, o titular beneficiário da prestação recebe 189,66 euros e, depois, por cada adulto do agregado é atribuído mais 70% do valor e por cada criança mais 50%.

Rendimento Social de Inserção foi prolongado para 18,5 mil


“Exige uma criatividade muito grande para poder subsistir”, disse, explicando que há beneficiários que procuram alternativas para fazer face às necessidades: “temos vindo a assistir é a uma economia paralela, de pessoas que arranjam trabalhos com vínculos precários, para dar resposta às necessidades do dia-a-dia”.

Vera Serras considera fundamental este apoio que surgiu há 25 anos com o nome de Rendimento Mínimo Garantido. Atualmente recebem esta prestação quase 218 mil pessoas, sendo o distrito de Lisboa o que concentra mais beneficiários no país, com quase 56 mil pessoas.