Por Lusa, PÚBLICO, in Público on-line
A ‘troika’ que negoceia com Portugal as condições para o resgate financeiro vai tentar destruir os mecanismos sociais de protecção dos trabalhadores portugueses, considerou, em entrevista à agência Lusa, o antigo primeiro-ministro dinamarquês Poul Rasmussen, o criador da flexissegurança.
Economista, actual presidente do Partido Socialista Europeu e, enquanto primeiro-ministro da Dinamarca, entre 1993 e 2001, o primeiro a adoptar esta nova forma de regular as relações laborais – com mais flexibilidade para contratar, despedir e organizar o trabalho em troca de medidas compensatórias de protecção do trabalhador e dos desempregados – Rasmussen mostrou-se pessimista face ao futuro das relações laborais em Portugal.
A troika da Comissão Europeia, do Banco Central Europeu e do Fundo Monetário Internacional (FMI) “esqueceu-se do que é a flexissegurança”, acusou Poul Rasmussen, numa entrevista à agência Lusa, culpando o que chama de “maioria conservadora” na Europa e nas instituições comunitárias.
Disse também que este mecanismo falhou porque os governos conservadores europeus manipularam o conceito para prejudicar os trabalhadores. “Eu vejo o meu bebé a ser manipulado e incompreendido. Vejo o presidente Sarkozy, em França, a falar só da flexibilidade e a esquecer tudo sobre a segurança, e o mesmo se passa com a maioria conservadora na Europa”, afirmou Rasmussen.
Rasmussen foi o primeiro líder europeu a adoptar um pacote de medidas que prevêem alguma desregulamentação no mercado laboral, nas relações e na organização do trabalho, mas que, ao mesmo tempo, tentam compensar os trabalhadores com vantagens em termos de prestações sociais e possibilidades de formação com vista a maior facilidade de obtenção de emprego.
“Fui eu que tomei a iniciativa de criar um mercado laboral moderno, justo e flexível. E o que eu tenho visto na Europa é que a maioria dos Governos europeus, conservadores, adoram a palavra flexibilidade mas esqueceram-se da palavra segurança”, acrescentou.
“Por isso, receio que a pressão da União Europeia (UE) e do FMI seja no sentido de desmantelar a protecção dos trabalhadores, de questionar os mecanismos de negociação colectiva. E, deixe-me dizer, eu desaconselharia profundamente a UE e o FMI a exigir a Portugal que acabe com a negociação colectiva”, acrescentou.
Portugal precisa de “ser duro” nas negociações
Admitindo estar “muito, muito preocupado” com as exigências que a troika vai fazer a Portugal, no que toca ao mercado de trabalho, o antigo primeiro-ministro dinamarquês afirmou que cabe agora a Portugal lutar para conseguir os melhores resultados das negociações.
“Quando se ouve a Comissão Europeia a falar convosco, com Portugal, esse não é o meu caminho. Vocês precisam de negociar e de ser duros nas novas negociações. (...) Há que perceber que não enfrentamos uma ditadura do FMI e da UE, são é negociações duras sobre o resgate e sobre as condições para receber a ajuda e auxílio”, afirmou.
“A negociação colectiva é parte fundamental da moderna democracia e, basta olhar para a Escandinávia, para o meu país. Nós temos tido acordos colectivos em todos os anos desde 1945, e somos uma das economias mais fortes da Europa. A Alemanha tem também acordos colectivos. Por isso, penso que [a troika] tem de dizer – vamos para boas negociações com Portugal, vamos olhar para a economia, mas vamos perceber que os acordos colectivos vieram para ficar”, frisou Poul Rasmussen.
A ‘troika’ composta pelo Fundo Monetário Internacional, Banco Central Europeu e Comissão Europeia iniciou na segunda-feira as negociações com os responsáveis portugueses para delinear um plano de ajuda financeira a Portugal, após o pedido feito pelo primeiro-ministro demissionário, José Sócrates, a 6 de Abril.