por Luís Reis Ribeiro, in Diário da República
Alemanha é o país que mais desviou crescimento de Portugal
Exportações de bens subiram 1,9% em 2014, o registo mais fraco desde o tempo de Sócrates. Maiores prejuízos vêm da zona euro.
A Alemanha foi o país que, em 2014, mais crescimento desviou da economia portuguesa via comércio de mercadorias, isto é, levando em conta o impacto do saldo comercial (exportações menos importações). Esta conclusão não conta com a balança de serviços (ainda não apurada). Nesse caso, Portugal passa a ser excedentário.
Num ano marcado por uma aceleração rápida das importações e por um enfraquecimento pronunciado do ritmo das exportações de bens, o défice de Portugal com a Alemanha piorou de 962 milhões para 1645 milhões de euros entre 2013 e o final do ano passado.
Os dados de base, ontem divulgados pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), vêm mostrar, uma vez mais, que o sucesso e os excedentes de uns países europeus são os prejuízos de outros, não havendo ainda nesta altura mecanismos que compensem os desequilíbrios.
O semestre europeu e os novos pactos de estabilidade, que visam penalizar países com economias deficitárias, mas também as estruturalmente excedentárias (como a Alemanha), ainda não estão a ter consequências práticas.
Assim, a existência de excedentes externos em alguns países (sobretudo os do Centro e Norte da Europa) também acontece à custa de posições deficitárias noutros Estados europeus mais fracos (ver texto na página seguinte).
Tal como acontece com o saldo orçamental e as condições de acesso ao crédito bancário, é mais uma forma de divergência e de fragmentação económica, mais grave quando se pensa na zona euro, que é uma união monetária. Reflete também o grau de avanço tecnológico, de produtividade e de competitividade das economias. Portugal, por exemplo, é altamente dependente de tecnologia importada, que usa depois para investir e criar emprego.
Cálculos do DN/Dinheiro Vivo a partir desses dados do comércio de mercadorias até final de 2014 mostram que a Alemanha é, de longe, o país que mais ganha em termos económicos nas relações comerciais com Portugal.
No ano passado, o défice comercial português agravou-se em 682 milhões de euros. Os alemães compraram 5624 milhões em exportações nacionais, mais 2,2% do que em 2013. Mas, em compensação, Portugal comprou aos alemães 7269 milhões de euros, um aumento de 12,4% no período em causa.
Portugal compra à Alemanha bens de alto valor acrescentado, como automóveis, produtos petroquímicos e farmacêuticos. Para a Alemanha, Portugal também vende carros (a Autoeuropa, dos alemães, é a maior exportadora a seguir à Galp), mas depois exporta aparelhos mecânicos e elétricos, calçado e vestuário.
No ranking da expansão do défice, surge Espanha, o segundo país que tira mais crescimento ao PIB via comércio de bens. A tradicional relação desequilibrada entre Portugal e o país vizinho, que é o maior parceiro no volume de importações e de exportações, também se aprofundou no ano passado. O défice comercial de bens estava em 7161 milhões de euros e subiu para 7714 milhões no final de 2014. É 553 milhões de euros pior.
Quanto maior a expansão destes défices, maior o impacto negativo no ritmo do PIB. Do outro lado da balança há contributos positivos para o crescimento.
Em 2014 e na Europa, a maior ajuda vem de fora da moeda única, do Reino Unido. Portugal tem com a economia britânica uma relação comercial favorável (exporta mais mercadorias do que importa) e até conseguiu melhorar um pouco a posição. O excedente comercial passou de 938 milhões para 1131 milhões de euros, mais 193 milhões.
O país com o qual Portugal mais lucra em termos de crescimento é, sem sombra de dúvida, Angola. O excedente comercial subiu 1088 milhões de euros, para 1570 milhões.
Mas o comércio com a Europa continua a dominar amplamente as relações comerciais portuguesas (mais de 70% das exportações e das importações). Apesar de minoritária e deficitária, a relação com as economias não europeias ofereceu um impulso favorável ao crescimento do PIB. Portugal conseguiu reduzir esse défice em 1063 milhões de euros entre 2013 e 2014. A maior ajuda veio da economia angolana.
Até aqui vimos como foi a evolução dos saldos comerciais. Já os saldos finais apurados em 2014 mostram os países que mais beneficiam (ou não) do comércio com Portugal. Espanha é, de longe, a relação mais desequilibrada, prejudicando o nível do produto interno bruto em 7713 milhões de euros.
Os seis países que mais penalizam as contas portuguesas são todos da zona euro. A seguir a Espanha vem Alemanha (com a qual Portugal tem um défice de 1645 milhões), Itália (1512 milhões de euros), Holanda (1083 milhões), Irlanda (426 milhões) e Bélgica (défice de 260 milhões de euros em 2014).
Fora da União Europeia, as relações mais desvantajosas para Portugal acontecem com os produtores de petróleo e gás e com a China. Com o Cazaquistão, o défice comercial ascende a 810 milhões de euros e com a Arábia Saudita o desequilíbrio chegou aos 673 milhões de euros no final do ano transato.
Com a China, de onde Portugal importa grande variedade de produtos, o défice português é 758 milhões de euros, o segundo maior fora do espaço europeu.
Ontem, o vice-primeiro-ministro, Paulo Portas, disse que "é evidente que quanto mais se cresce mais difícil é continuar a subir, mas as exportações portuguesas voltaram a crescer em 2014", "o melhor ano de sempre".
Estaria a falar no valor nominal em euros porque em termos de taxa de crescimento as vendas cresceram apenas 1,9%, o pior registo desde 2009 (-18%), quando o PS estava no poder e o país a ser atingido em cheio pela crise económica global.
(Notícia alterada às 10.15, com a transcrição completa da versão publicada na edição de hoje do DN)