Ana Correia Costa, in Jornal de Notícias
Fernando perdeu o emprego quando a sua empresa têxtil fechou em 2006. Em Abril passa a pré-reformado
Há muito que Fernando não se via "tão ansioso por fazer anos". Na verdade, desde a adolescência, quando sonhava poder "ver filmes para adultos" e a maioridade parecia inatingível. "Palavra de honra que estou sempre a ver quanto falta", ri. O 55º aniversário chega em Abril, altura em que irá engrossar o número de pré-reformados.
Não que algum dia o tenha desejado. Pelo contrário. O encerramento, em 2006, da têxtil Flor do Campo, em Santo Tirso, onde laborou quatro décadas, empurrou-o para o desemprego e para essa "única segurança". A ele e a Isaura - são um dos "muitos casais" que uniram destinos naquela fábrica. "Faz confusão", desabafa ela. "Agora, já estamos mentalizados, porque, acabando o subsídio [de desemprego], não temos rendimento", explica. "Quem nos emprega agora, com a quarta classe? E aqui não há trabalho…", lembra.
Antecipar a reforma não foi, de qualquer forma, desfecho que alguma vez tenha, sequer, assomado ao pensamento de um ou de outro, ambos dispostos a trabalhar até ao fim, garantem. Apesar de terem iniciado a labuta, naquela mesma empresa do Vale do Ave, ainda crianças… "Adorava o trabalho que fazia, adorava as amigas. Aquele convívio faz-me falta", solta Isaura, cujas 55 primaveras se cumprem em Outubro.
"Ia fazer 12 anos quando entrei para a fábrica. Foi em 1967", precisa Fernando Ferreira. "Aos 55, tenho 43 anos de descontos", contabiliza, indeciso entre a mágoa e a resignação que lhe merecem os 6% de penalização na reforma com que o Estado português o brindará. "Não acho justo ser penalizado", declara, o tom de voz inalterado.
"Às vezes penso: 'Queres ver que vou chegar a Abril e apanhar mais [redução]?'", conta, temendo que alguma cambalhota da legislação lhe reduza mais ainda a pensão, após uma carreira contributiva que só não se alongou porque uma das maiores e outrora mais pujantes têxteis do Norte do país se afogou em dívidas e afundou.
Com ela, levou vários meses de salários e indemnizações dos operários, dívida sobre a qual um gestor judicial propôs o pagamento de 30% em… 10 anos. Com a aprovação da Segurança Social, credor maioritário da Flor do Campo.
"É fazer pouco do povo", insurge-se Isaura. O casal perdeu as esperanças de receber o dinheiro, que seria aplicado em ajuda aos filhos.
"Meio ano por pagar mais 40 de trabalho. Olhe o dinheiro que nós temos lá. Nem falo da indemnização, mas do trabalho que temos ali", indigna-se a mulher. Hoje, é com o neto, o pequeno Francisco, que os dois enganam as horas mortas do desemprego…