3.2.11

De crianças desprotegidas a jovens delinquentes

in Jornal Público

A Comissão de Fiscalização dos Centros Educativos analisou processos, estudou casos, e confirmou "uma ligação muito estreita" entre desprotecção e delinquência: "Uma parte significativa dos jovens que passaram pelos centros educativos foi sinalizada como criança em risco."

"Não é possível analisar em profundidade o processo de enquadramento de jovens com comportamentos sociais problemáticos [acolhidos] em centros educativos sem ter em conta as condições em que muitos nasceram e cresceram, como foram indevidamente acompanhados por adultos, negligenciados, abusados, sempre sem um modelo de referência positivo", adverte o relatório anual, remetido na semana passada à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias. Foram crianças em risco sem que lhes tivesse sido prestada "a devida atenção e acompanhamento - por deficiência dos serviços" ou por "resistência" sua.

Muitos, salienta o documento, foram retirados às famílias biológicas "por motivos julgados necessários para garantir o seu desenvolvimento". E entregues a "instituições pressupostamente adequadas que - por não o serem, ou por não possuírem meios adequados, financeiros, humanos e técnicos, nomeadamente em saúde mental - se viram impossibilitadas" de lhes darem o que precisavam. "Uma parte significativa" acabou por cometer crimes e, no limite, por ir parar aos centros educativos.

Com esta constatação, os membros da comissão alertam para "a inexistência de intervenção precoce" capaz de travar "muitos destes percursos" de delinquência. Assinalam, por exemplo, a falta de "medidas contentoras para atitudes desadequadas de jovens em processo de protecção". Se um deles resolve agredir um monitor, nada se pode fazer, nota o coordenador, Norberto Martins.

Inquietam "os atrasos significativos na aplicação da justiça". Há jovens que só encaram um tribunal depois de terem praticado seis a sete actos graves. Até por crimes como o furto dependeram de queixa para avançar. Sem "medidas correctivas" instala-se "um natural sentimento de impunidade". Não por acaso, a maior parte dos jovens acolhidos em centro educativo tem 16 ou mais anos. Tais estruturas funcionam em edifícios "vetustos", mas o que mais incomoda os membros da comissão é a sua "visível desumanização". E não terem "resposta satisfatória" no que concerne a competências sociais e pessoais. A.C.P.