in Público on-line
O Observatório Europeu da Droga e da Toxicodependência descreve Portugal como um país que tem registado alguns progressos no combate à toxicodependência, mas alerta que as medidas de austeridade já tiveram um impacto sobre serviços, num relatório hoje divulgado.
O relatório sobre o combate à toxicodependência em Portugal é o primeiro de uma série de documentos de análises a políticas seguidas por países da União Europeia.
O Observatório realça que Portugal tem desenvolvido políticas abrangentes, integradas e detalhadas e que a descriminalização do consumo, adoptada há dez anos, é convergente com as políticas que têm sido observadas na União Europeia nas últimas duas décadas.
Apesar de considerar positivo que a responsabilidade pelas políticas de combate à toxicodependência tenham passado progressivamente do ministério da Justiça para o da Saúde, onde o consumidor de drogas é visto “como uma pessoa que precisa de ajuda e não como um criminoso”, o Observatório realça também que as medidas adoptadas até agora não são “uma bala mágica”.
Segundo o organismo, o país “tem ainda altos níveis de consumo problemático de droga e de infecção pelo HIV e não mostra desenvolvimentos específicos na sua situação que permitam claramente distingui-lo de outros países europeus que têm uma política de droga diferente”.
Novos desafios
O documento considera também que os “próximos anos podem muito bem trazer novos desafios para as políticas de droga em Portugal”. Sublinha que a situação financeira tem obrigado Portugal “a implementar planos de austeridade diversos, que já tiveram um impacto sobre serviços relacionados com o combate às drogas”, e alerta que o empréstimo de resgate financeiro pedido à União Europeia, ao Banco Central Europeu e ao Fundo Monetário Internacional terá “associadas medidas adicionais de austeridade”.
Também a mudança de Governo “pode traduzir-se em novas orientações em saúde pública e políticas de segurança”, realça o relatório, que remete para “futuras investigações” a verificação de como “todos estes desenvolvimentos afectarão o conteúdo e os recursos da política de drogas portuguesa nos próximos anos”.
Numa mensagem por ocasião do dia internacional contra o abuso e o tráfico ilícito de drogas, que se assinala domingo, Wolfgang Gotz, o director do Observatório, considera que o consumo de droga “ainda representa uma ameaça importante para a saúde pública” na Europa, onde anualmente entre sete a oito mil pessoas morrem por overdose e onde está a aumentar o consumo de drogas estimulantes, como a cocaína, “e de novas substâncias que, cada vez mais, têm vindo a surgir no mercado europeu”.
Gotz defende que o fenómeno das drogas, devido à sua complexidade, não tem apenas uma solução e realça que a Estratégia da União Europeia de Luta contra a Droga (2005--12) está a ser alvo de uma avaliação externa, na qual o Observatório participa com um relatório sobre as principais tendências do consumo e as medidas de combate adoptadas pelos governos.
Península Ibérica a perder importância como porta de entrada de narcóticos
A Península Ibérica e outras das principais portas de entrada de drogas na Europa estão a perder importância para países a leste, como a Rússia, Turquia, Grécia e Polónia, afirma o gabinete anti-narcotráfico das Nações Unidas (UNODC).
O Relatório Mundial sobre as Drogas, hoje divulgado pela UNODC, dá conta de um declínio “forte” e constante das apreensões de drogas nas habituais portas de entrada de drogas, a par de um igualmente forte aumento de casos de tráfico detectados em países a leste do continente.
“Em termos relativos, as tendências de apreensões na Europa em anos recentes parecem encaixar-se num contínuo de fortes declínios próximo dos pólos de tráfico que servem como grandes pontos de entrada ou distribuição no continente, e forte aumento noutros países, sobretudo mais a leste”, refere o relatório.
Entre estes países que “historicamente não têm sido associados ao tráfico de cocaína em grandes quantidades” estão Rússia, Turquia, Polónia, Grécia, Ucrânia e Roménia, que registaram aumentos de mais de 30 por cento nas apreensões. “Este padrão sugere que, enquanto as rotas de tráfico de cocaína estabelecidas continuam a ser importantes, a cocaína pode estar a entrar pela Europa através de novas rotas”, adianta a UNODC. Na Roménia em 2009 foram apreendidas de uma só vez 1,3 milhões de toneladas de cocaína, e a investigação subsequente levou ao arresto de mais 3,8 milhões no país de origem, o Brasil. A Península Ibéria regista continuamente as maiores apreensões de cocaína na Europa, mas estas caíram de 50 milhões de toneladas em 2006 para metade em 2009.
Em Portugal, a quebra “tem sido mais acentuada”, de 34 milhões de toneladas em 2006, o segundo mais alto nível de apreensões na Europa nesse ano, para 2,7 milhões de toneladas, o sétimo mais alto.
Também na Holanda, outra tradicional “porta” e placa giratória de estupefacientes, a tendência foi a mesma. O relatório da UNODC dá ainda conta de fortes quebras nas apreensões de cannabis, que atingiu os 62 por cento em Portugal, 43 por cento em Itália e 21 por cento em França.
No período de 2005 a 2009 as apreensões de resina de cannabis (haxixe) recuaram, mas as de erva de cannabis aumentaram 88 por cento, “confirmando indicações de maiores níveis de produção de cannabis dentro da Europa para consumo local”.