10.3.15

Burocracia custa 152 mil horas de trabalho às empresas de distribuição

Ana Rute Silva, in Público on-line

Todos os dias os 125 associados da APED têm de responder a quatro pedidos de informação diferentes. O custo da burocracia ascende aos quatro milhões de euros e é o fisco que mais recurso das empresas consome.

A burocracia custa 4,1 milhões de euros por ano às empresas da grande distribuição, o que equivale a 152 mil horas de trabalho. A Associação Portuguesa das Empresas de Distribuição (APED) há muito reclama contra a sobrecarga burocrática, agora feita nas plataformas digitais, e para comprovar que o fardo é cada vez mais pesado divulgou, nesta segunda-feira, um estudo completo sobre as obrigações de reporte ao Estado.

O documento, intitulado Burocracia da Administração Pública – Impacto das obrigações de reporte no sector do Retalho conclui que anualmente, as empresas associadas da APED (125) gastam 152.028 horas a cumprir as obrigações, sendo que a maior fatia (82.492 horas) é absorvida pela Autoridade Tributária e Aduaneira (AT). Em termos de custos, o Fisco é a “instância que mais recursos consome para a totalidade das empresas”: mais de 2,7 milhões de euros. Segue-se o INE, com 884 mil euros; o Ministério da Solidariedade, Emprego e Segurança Social, com 353 mil euros; e o Banco de Portugal, com 78 mil euros.

Na lista das obrigações ao Fisco está, por exemplo, a obrigação de comunicar inventários, iniciativa que a APED diz “já estar em vigor” e, por isso, é “uma duplicação de informação sobre os consumos”. O mesmo sucede com a nova taxa ambiental sobre os sacos de plásticos, de oito cêntimos, cujas formalidades de reporte serão mais uma “questão burocrática” que traz “grave prejuízo para as empresas em actividade”. A AT pede dez mil informações obrigatórias por ano, mas é o Ministério da Solidariedade, Emprego e Segurança Social quem solicita maior número de pedidos (perto de 70 mil). Na lista incluem-se a comunicação de admissão e cessação de trabalhadores, comunicação de remunerações ou o relatório único (com dados económicos, quadros de pessoal, entre outros).

O estudo baseou-se nas obrigações de reporte a quatro organismos públicos: AT, Ministério do Emprego, INE e Banco de Portugal.

Luís Reis, presidente da APED, diz que o custo burocrático calculado, de 4,1 milhões de euros, “é o menor dos números” a que o estudo poderia chegar. As contas, garante, foram feitas por baixo, já que incluem apenas quatro instituições e deixam de fora as obrigações na área ambiental e de resíduos. Além da despesa, entre 2013 e 2014, as empresas da grande distribuição (a associação representa desde a Ikea ao grupo Auchan), gastaram 20 milhões de euros na adaptação dos sistemas às obrigações de informação.

“Todos os dias os associados da APED tem o prazer de receber quatro inquéritos ou quatro informações de reporte. São cinco horas por dia”, disse Luís Reis, defendendo que o Estado deve aplicar três princípios base para contornar o problema: o princípio de contenção e moderação, o princípio de ponderação e auscultação (ao perguntar se há forma mais rápida e eficiente de ter a informação, por exemplo) e, finalmente, o princípio da não redundância (evitando pedir o mesmo dado mais do que uma vez). Outra das propostas é a criação de uma plataforma única que as empresas pudessem utilizar para entregar todos os inquéritos solicitados.

Maria Manuel Leitão Marques, professora da Faculdade de Economia da Universidade Católica, acredita que mudar os procedimentos burocráticos “é um sonho possível”, mas admite que “há resistências do lado da Administração Pública”. “Cada administração é uma quinta”, sublinhou nesta segunda-feira, durante o debate que precedeu a apresentação do estudo. Também Luís Paes Antunes, advogado e ex-secretário de Estado do Trabalho, disse que o Estado “tem um apetite voraz” porque “informação é poder”.

A burocracia “é um instrumento de poder, de financiamento e condicionamento”, disse, acrescentando que o país “tem uma história de condicionamento económico e industrial muito grande”.

Por seu lado, João Duque professor do ISEG, defende que é preciso mudar a cultura, para que os funcionários públicos encarem o seu trabalho como um acto de servir.