Andreia Sanches, in Público on-line
A falta de avanços legislativos no que diz respeito à parentalidade é uma das explicações para a descida de Portugal na lista da ILGA-Europa. Foram avaliados 49 países.
No ranking que mede como são respeitados os direitos de lésbicas, gays, bissexuais e transgénero, o Reino Unido continua a ocupar o 1.º lugar. Malta é dos que mais sobe na Europa — passou este ano para 3.º lugar, avançando oito posições. E Portugal desce quatro — é 10.º, numa lista de 49 países.
Chama-se Rainbow Europe, é conhecido como o Mapa Arco-íris e é elaborado anualmente pela ILGA-Europa. Todos os anos, esta organização não-governamental analisa os avanços e retrocessos legislativos, políticos e sociais que afectam as pessoas LGBTI — lésbicas, gays, bissexuais, transgénero e intersexuais. O ranking de 2015 foi divulgado neste domingo e analisa o que se passou no ano passado em cada país.
Portugal desce para o 10.º lugar na avaliação dos direitos das pessoas LGBTI — com uma pontuação geral de 67%, numa escala que vai até 100%. Paulo Côrte-Real, da direcção da ILGA-Portugal, explica, em declarações ao PÚBLICO, por que razão isso acontece: “Assistimos há vários anos a uma estagnação em termos legislativos e há mesmo alguns retrocessos políticos”, no que diz respeito à área da parentalidade, por exemplo, “onde Portugal regista atrasos substanciais quando comparado com outros”.
Côrte-Real refere-se essencialmente ao que se passou com a co-adopção. Em 2013, Portugal tinha-se tornado o quinto país (depois de Áustria, Finlândia, Alemanha e Israel) onde a co-adopção de crianças por casais homossexuais fora aprovada. O projecto do PS abria a possibilidade de, em certas circunstâncias, uma pessoa que fosse casada ou vivesse em união de facto com outra do mesmo sexo pudesse adoptar o filho do seu companheiro ou companheira.
O diploma baixou depois à especialidade, para mais debate. Mas a votação final no Parlamento foi sendo adiada. E em Janeiro de 2014, como relata o documento da ILGA-Europa, “o PSD usou a sua maioria para forçar um referendo” sobre o tema, que, por sua vez, foi chumbado, em Março, pelo Tribunal Constitucional. “Não vale a pena lutar contra crimes de ódio quando o Estado basicamente continua a recusar a parentalidade” a casais de pessoas do mesmo sexo, afirma Paulo Côrte-Real.
O caso de Malta
Um das países mais destacados no Mapa Arco-íris de 2015 é Malta — que chega ao 3.º lugar do ranking (uma subida de oito posições num só ano). Este foi o primeiro estado europeu a inserir na sua Constituição a proibição com base na identidade de género; legalizou as uniões civis para todos os casais, dando a todos os mesmos direitos de adopção e co-adopção; aprovou uma lei sobre “identidade e expressão de género e características sexuais” que proíbe cirurgias genitais normalizadoras em bebés e crianças intersexo (ou seja, que nascem com características masculinas e femininas, como os hermafroditas e os pseudo-hermafroditas) e que prevê a possibilidade de adiar até mais tarde a inclusão de um marcador legal de género em certidões de nascimento, para que a criança possa ter uma palavra. O país, consegue, por tudo isto, uma pontuação de 79%.
O Reino Unido, que está em 1.º lugar na lista, tem 86%. Um dos pontos destacados: 2014 foi ano em que entrou em vigor a lei que consagra a igualdade no casamento (desde 2005 que já existia uma figura jurídica que reconhecia as uniões civis de casais do mesmo sexo mas não se falava de “casamento”; o país também já permitia que casais homossexuais pudessem adoptar crianças ou recorrer à procriação medicamente assistida).
Azerbaijão, o pior
Sobre Portugal, a avaliação da ILGA-Europa refere aspectos negativos e positivos. Entre os primeiros, o facto de haver relatos de 258 participações relacionadas com actos discriminatórios e violência (são citados dados da ILGA-Portugal), incluindo 37 casos de “extrema violência física” contra pessoas LGBTI. “As vítimas apenas reportaram às autoridades 4% destes casos”, lê-se.
Já ao nível das políticas laborais, a ILGA-Europa destaca que o país foi o 21.º a incluir, no âmbito do Código do Trabalho, a identidade de género na lista de elementos que não podem ser usados pelas entidades empregadoras para discriminar trabalhadores. O código assegura que o trabalhador ou candidato a emprego tem direito a igualdade de oportunidades e de tratamento no que se refere ao acesso ao emprego, à formação e promoção independentemente da sua ascendência, idade, sexo, orientação sexual... e, entre outros, identidade de género.
Em matéria de asilo, Portugal registou o caso de duas pessoas vindas da Rússia a quem foi atribuído o estatuto de refugiado com base no risco de perseguição pela sua orientação sexual. Por outro lado, o relatório refere o facto de a ILGA-Portugal e a Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género (CIG) terem começado a dar formação sobre matérias relativas às pessoas LGBT a agentes da autoridade, bem como a funcionários das áreas da saúde, segurança social e judicial.
No geral, a ILGA-Europa aponta que, se 2013 foi um ano de grandes contrastes, 2014 revelou ser o ano em que esses contrastes se solidificaram, estando numa ponta os países que “demonstraram grande liderança” e, na outra, os países onde os direitos destas pessoas têm diminuído cada vez mais ou , simplesmente, estagnaram. O Azerbaijão ocupa o último lugar do ranking com uma avaliação de apenas 5%. A média europeia é 42%. A União dos 28 não consegue melhor do que 52%. com Lusa
Notícia actualizada e corrigida às 19h31: Malta está em 3.º lugar e não em 8.º