Ana Sanlez, in Diário de Notícias
Desde o pico do desemprego, em 2013, gastos com o subsídio caíram 45%. Sinal da retoma económica, diz o governo, mas mudança das regras também contribuiu para a descida
Maria Barata ficou desempregada em 2013. Com 40 anos e 16 de descontos, recorreu pela primeira vez ao subsídio de desemprego. Um ano antes, o governo de Pedro Passos Coelho tinha alterado o regime de acesso à prestação, e Maria, que tinha um vencimento líquido a rondar os 1200 euros, passou a levar para casa menos de 800 euros. Um valor que seria cortado em 10% seis meses depois. "Tive de aprender a viver com menos", conta ao DN/Dinheiro Vivo. Chegou a ser chamada pelo Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP) para tirar um curso sobre "como criar o próprio emprego", que, sublinha, "serviu de pouco", porque não tinha esse objetivo. Regressou ao mercado de trabalho oito meses depois.
Maria foi uma entre os mais de 500 mil portugueses que perderam o emprego durante a crise financeira. Fez parte do lote de inscritos que em 2013 levaram a que a despesa do Estado com o subsídio desemprego atingisse um recorde histórico de 2,74 mil milhões de euros, num ano em que foi atingida a taxa de desempregados mais alta de que há registo: 17,8% em abril.
Três anos depois, as contas são outras. Entre janeiro e dezembro do ano passado saíram dos cofres públicos 1,51 mil milhões de euros para a prestação paga aos desempregados. Uma descida de 1200 milhões, menos 45%. Para encontrar um número mais baixo é preciso recuar a 2008, antes do início da turbulência financeira. E com mais gente a trabalhar, a receita que entra nos cofres da Segurança Social também aumentou.
A retoma da atividade económica contribuiu para a melhoria, mas "as mudanças nas regras das prestações de desemprego terão tido algum efeito complementar na redução da despesa, designadamente a redução da duração das prestações", admite fonte do Ministério do Emprego e da Segurança Social ao DN, numa referência à lei de 2012 que além de ter estabelecido um teto máximo ao subsídio de desemprego, de 1053,30 euros, reduziu a duração máxima da prestação de 38 para 26 meses. "É preciso ter em conta que o impacto não foi imediato, vindo a estender-se no tempo, e que outra medida tomada na mesma altura, nomeadamente a redução dos prazos de garantia para o acesso ao subsídio, terá tido o efeito contrário, ou seja, o aumento da despesa, pelo que não é possível de imediato quantificar o impacto destas medidas".
Porém, a discrepância é notória. Enquanto o número de desempregados inscritos na Segurança Social recuou 30,5% entre 2013 e 2016, os beneficiários do subsídio de desemprego diminuíram 41,5%. E a taxa de cobertura da prestação nunca foi tão baixa. Em 2016 apenas 46,5% dos desempregados inscritos nos centros de emprego recebiam subsídio. Em 2009 a taxa de cobertura chegava aos 69,1%.
Nuno Raposo, especialista em economia do trabalho da Universidade Católica, reconhece que a melhoria do mercado de trabalho teve impacto nos números, mas destaca a importância de um fenómeno em particular. "É preciso ver que há um número muito significativo de pessoas que esgota o direito ao subsídio por ficar sem trabalho durante muito tempo." O desemprego de longa duração ronda os 63%. Para Nuno Raposo, a folga de 1200 milhões euros não é suficiente para alterar as previsões sobre a sustentabilidade da Segurança Social, mas sugere que "esse valor que o Estado está a gastar a menos pode, por exemplo, servir para colmatar o problema das pessoas que não conseguem regressar ao mercado de trabalho".
Carlos Pereira da Silva vai mais longe e defende que o sistema precisa de uma volta de 180 graus. O professor de Economia e Finanças, que integrou a Comissão do Livro Branco da Segurança Social, defende que Portugal deveria seguir o exemplo da Suécia. "É um sistema em que as eventualidades são todas separadas e o desemprego é tratado à parte. Há uma conta-corrente para as pensões, que é capitalizável a uma taxa virtual, e que na altura da reforma é repartido de acordo com a esperança de vida. Para o desemprego há um seguro associado aos rendimentos. O problema da nossa economia é não gerar dinheiro suficiente para as despesas da Segurança Social", observa o especialista, que aponta a "falta de investimento" como um dos problemas de fundo do mercado de trabalho.
Neste ano está prevista uma mexida na lei, que pretende impedir que o corte de 10% seja aplicado a quem recebe a prestação mínima de 421,32 euros. As mudanças deverão ir ainda mais longe em 2018, se as intenções do Bloco de Esquerda forem para a frente. O partido liderado por Catarina Martins quer eliminar definitivamente o corte de 10% aplicado ao fim de seis meses. O teto máximo é que parece que é para manter, apesar da folga ganha com a redução da despesa com subsídios.