Por Maria José Oliveira, in Jornal Público
Carta enviada aos beneficiários do RSI, abono de família e subsídio social de desemprego diz que declarações são "obrigatoriamente" feitas no site. Tutela apresentou alternativas ontem
Mais de dois milhões de portugueses, beneficiários do abono de família, Rendimento Social de Inserção (RSI) e subsídio social de desemprego, devem "obrigatoriamente" prestar provas de rendimentos através do site da Segurança Social. Esta ordem consta da carta que os beneficiários já começaram a receber, depois de, em Junho passado, ter sido publicado em Diário da República o decreto-lei que estabelece as novas regras para o reconhecimento e manutenção do direito a estas prestações sociais.
"As provas são, obrigatoriamente, efectuadas no sítio da Internet da Segurança Social, em www.seg-social.pt, no Serviço Segurança Social Directa, para o que deve ler, com atenção, as instruções que seguem nas folhas em anexo [ver caixa]", pode ler-se nas missivas. E mais à frente, reincide-se na obrigatoriedade: "Tenha em atenção que, mesmo que receba mais do que um ofício, deverá efectuar a prova de condição de recursos uma única vez, através do canal da Segurança Social Directa (SSD)."
Os beneficiários são avisados de que devem respeitar o prazo estabelecido para realizar as suas provas (de 10 a 30 de Setembro), sob o risco de verem suspensos os apoios públicos durante dois anos, e ainda aconselhados a telefonar para o centro de contacto Via Segurança Social "em caso de dúvidas". Foi o que o PÚBLICO fez, tentando averiguar se existia alguma alternativa à Net. "Não tem nenhum conhecido ou familiar que a ajude?", perguntou a operadora. "Não. Não posso ir à Loja do Cidadão?" "A carta que recebeu diz que terá de ser através da Segurança Social Directa. Por isso tente solicitar ajuda a alguém." O decreto-lei de Junho define que a prova de rendimentos "deve ser apresentada nos competentes serviços de segurança social", sendo utilizada para "verificação das condições de recurso".
Tiago Duarte, professor de Direito na Universidade Nova de Lisboa, nota que as cartas "não possuem qualquer força jurídica" e que a omissão no diploma sobre as declarações electrónicas obriga à aplicação das normas do Código do Procedimento Administrativo: os requerimentos dirigidos a órgãos administrativos podem ser remetidos por correio com aviso de recepção. "Se as cartas não forem consideradas e a administração decidir suspender a prestação, então estamos perante um procedimento ilegal", afirmou.
Ontem de manhã, o PÚBLICO contactou por e-mail o Ministério do Trabalho e Solidariedade Social (MTSS) para saber quais os motivos que levaram a exigir a realização exclusiva das provas electrónicas, uma vez que a vasta maioria dos beneficiários não tem acesso à Internet. Na resposta escrita, remetida pelo assessor de imprensa, Mário Ribeiro, o MTSS informa que está a "implementar um conjunto de medidas" para garantir a entrega das provas. E lê-se que "foram reforçados" os serviços de atendimento da Segurança Social com quiosques de acesso à SSD, "onde os beneficiários sem acesso à Internet ou com dificuldades de preenchimento da prova poderão realizar a sua prova de rendimentos, com apoio presencial de técnicos habilitados".
Esta alternativa, contudo, não consta das cartas enviadas aos beneficiários. E os restantes dados fornecidos ao PÚBLICO também não. Nomeadamente o recrutamento de "jovens voluntários" para dar apoio nos serviços localizados em "zonas mais críticas", o auxílio das técnicas de acção social aos beneficiários do RSI e a abertura dos postos de atendimento ao sábado. Em negrito lê-se que as provas poderão ser feitas nas Lojas do Cidadão (munidas com os quiosques) ou "em qualquer serviço de atendimento da Segurança Social". "Nenhum cidadão que tenha dificuldades na realização da prova de rendimentos ficará impossibilitado de a realizar", assegura agora o MTSS.