in Diário de Notícias
João Vieira Lopes, presidente da Confederação do Comércio e Serviços de Portugal, diz que as empresas não querem arriscar a contratar de forma mais permanente
Recibos verdes e contratos a prazo ultrapassaram os 800 mil. Empresários não contratam por falta de confiança na economia
Os números confirmam. Em 2015, os contratos a termo e os de prestação de serviços (a recibo verde) ultrapassaram a barreira dos 820 mil, algo que já não se verificava desde 2011. Entre os que trabalham por conta própria, e que no 3.º trimestre de 2015 ascendiam a 805 mil, não há registo de um universo tão elevado desde que a troika chegou a Portugal. Razões relacionadas com a atividade das empresas e de natureza económica explicam esta evolução, afirmam os empregadores, que recusam a criação de um regime que penalize e trate todos da mesma maneira.
"A perspetiva de que uma empresa que contrata trabalhadores a prazo é quase como um criminoso, é algo que não aceitamos." A frase é do presidente da Confederação do Comércio e Serviços de Portugal que encontra várias ordens de razão para o aumento do recurso a trabalho não permanente. Há questões relacionadas com a sazonalidade e com a duração das prestações de serviço - se uma empresa ganha um contrato de segurança por dois anos, não quer arriscar chegar ao final do prazo e ficar com todos os funcionários - e ainda com a falta de confiança. "Há incerteza em relação à situação económica e as empresas não querem arriscar a contratar de forma mais permanente", precisa ainda João Vieira Lopes.
João Camargo, da direção da associação dos "Precários inflexíveis", acentua, por seu lado, a facilidade com que se pode dispensar um trabalhador a recibo verde ou não renovar um contrato a prazo. E junta a estes "aliciantes" permitidos ao empregador, o facto de um trabalhador precário, sobretudo a recibo verde, ficar bastante mais barato: "Não recebe indemnização, a taxa social única é mais baixa, não tem direito a férias ou subsídio de Natal", exemplifica.
Precários e desempregados são mais de 50% da força trabalhadora desde 2012
Portugal entrou em 2011 com 838,1 mil pessoas em situação precária (entre 713 mil com contrato a prazo e 124,3 mil em regime de prestação de serviços). Este número subiria no trimestre seguinte para os 877,6 mil (com acréscimos entre ambos os grupos), registando, a partir daí, um movimento de descida, com algumas oscilações pelo meio, até ter caído para os 720 mil, no quatro trimestre de 2014. De então para cá, mostram os dados do Instituto Nacional de Estatística, a tendência inverteu-se: o país entrou em 2015 com 773,4 mil destes precários, no trimestre seguinte eram 826,7 mil e no final de setembro somavam já 832,2 mi l.
Entre os trabalhadores por conta própria (categoria que serve também para tomar o pulso ao número de pessoas a recibo verde), o INE dava conta, no 3.º trimestre de 2015, da existência de 805,6 mil pessoas nesta situação - últimos dados disponíveis. São menos 20 mil do que no trimestre anterior, o que, segundo João Camargo, ilustra a elevada rotatividade destes trabalhadores.
Somado, o trabalho precário e o desemprego passaram a representar mais de 50% da força de trabalho em 2012 e nunca mais desceram deste patamar. A ajudar a esta situação estiveram os motivos já referidos e o regime excecional que permitiu às empresas prolongar a duração dos contratos a prazo.
Falta de regalias dos trabalhadores precários é aliciante para as empresas
Esta foi uma das medidas que vigorou durante a estada da troika em Portugal, a par de uma forte revisão do Código do Trabalho que, entre outras matérias reduziu o valor das indemnizações em caso de despedimento e facilitou o despedimento coletivo e a extinção do posto de trabalho. Ainda assim, os credores internacionais continuam a insistir no aprofundamento da reforma de forma a facilitar o despedimento individual.
Outro dos problemas, aponta João Camargo, reside no facto de muita desta precariedade ter sido apoiada pelo Estado e dinamizada pelos serviços do Estado - que recorreram a esta forma de trabalho.
João Camargo entende, por isso, que são necessários mecanismos que promovam um efetivo combate às várias formas de trabalho precário. José Brinquete, da Confederação Portuguesa das Micro, Pequenas e Médias Empresas, discorda do recurso ao trabalho precário de forma generalizada, mas acentua que antes de se avançar para penalizações são necessárias políticas que possibilitem a sustentabilidade das empresas. Estabilidade fiscal e descida de impostos são duas das que sugere.