ANA CRISTINA PEREIRA, in "Público"
Observatório dos Direitos Humanos sustenta que os 260 euros da pensão de alimentos dos filhos não podem ser encarados como rendimento da mãe
Observatório dos Direitos Humanos (ODH) considera inconstitucional cortar o rendimento social de inserção (RSI) a alguém que tenha começado a receber pensão de alimentos a favor dos dois filhos menores. Entende que tal norma prejudica o seu “direito fundamental à segurança social”.
Na origem do parecer está uma queixa apresentada por Joana Salgado. Vítima de violência doméstica, a mulher requereu RSI ao sair de casa com as duas crianças. A prestação social, destinado a pessoas que vivem em pobreza extrema, foi-lhe atribuída. Dois meses depois, quando o tribunal decretou uma pensão de alimentos de 130 euros por cada criança, cortaram-lha.
A atribuição do RSI depende do rendimento e do tamanho do agregado familiar. Uma mulher com dois filhos recebe, no máximo, 178, 15 euros em seu nome e 53,44 por cada criança, o que dá 285,03 euros. Ultrapassaria esse valor quando passou a receber 260 euros de pensão de alimentos.
De acordo com a lei, são considerados no apuramento do rendimento mensal do agregado: os rendimentos de trabalho dependente ou independente, os rendimentos prediais e de capitais, as pensões, as prestações sociais, os subsídios de actividades ocupacionais e os apoios regulares à habitação.
De acordo com o parecer, assinado pela jurista Sara de Almada Domingos, “a norma em que se sustenta a decisão, ao imputar rendimentos teleologicamente vinculados à satisfação de necessidades de determinados indivíduos a outros, absolutizando o conceito de agregado, desvirtuando a posição individual dos seus elementos – neste caso, negando a existência de necessidades próprias da queixosa mais parecendo encerrar um incentivo implícito à violação de dever fundamental de manutenção dos filhos – carece de qualquer fundamento constitucional”.
A senhora tem direito a segurança social. “O direito à segurança social que inclui uma pretensão de exigência da dignidade dos menores deve ser considerado da mesma forma que o direito à segurança social da queixosa”, advoga o documento, a que o PÚBLICO teve acesso. “Os menores são excluídos da atribuição do RSI porque recebem alimentos. A mãe é excluída da atribuição do RSI porque os filhos recebem alimentos. A única circunstância que os diferencia é o facto de uns receberem rendimentos e outro não.”