22.2.16

Viver numa república depois dos 65. Independência para quem vive com dificuldades

Dina Soares, Joana Bourgard, in RR

Na freguesia de Arroios, em Lisboa, os idosos com dificuldades económicas estão a ser realojados em casas renovadas. O programa “República Sénior”, criado pelo Centro Social e Paroquial de Arroios em conjunto com a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, tem já dois apartamentos operacionais onde vivem seis homens, sem família nem dinheiro para pagar uma renda.
Viver numa república depois dos 65. As histórias de vida dos "repúblicos"

Os apartamentos ficam a poucos metros um do outro, ambos próximos do Centro Social e Paroquial de São Jorge de Arroios, em Lisboa. Foram arrendados e sujeitos a obras de reabilitação.

Cada um tem três quartos, casas de banho e uma pequena cozinha usada sobretudo para aquecer o jantar que os seus habitantes trazem pronto do centro, onde tomam as outras refeições.

Não há uma sala comum porque o convívio entre os habitantes parece ser pouco. Cada um tem o seu quarto, em cada quarto uma televisão.

A diferença para a situação anterior prende-se com as condições. De quartos velhos, sujos, estragados, passaram para quartos arranjados, limpos e confortáveis, embora ainda bastante impessoais, talvez porque habitados há muito pouco tempo.

A limpeza é assegurada pelo centro social, assim como a lavagem das roupas. Cada um paga estes serviços consoante as suas reformas. A renda é suportada pela Santa Casa da Misericórdia de Lisboa.
António Costa vivia num quarto alugado antes de se mudar para a república

A ideia partiu do Centro Social e Paroquial de São Jorge de Arroios, que estabeleceu um protocolo com a Misericórdia.

O objectivo é reinstalar, com dignidade, os 25 idosos pobres que, segundo um levantamento feito pelo próprio centro, vivem actualmente na freguesia de Arroios em quartos sem condições mínimas.

Para já, há dois apartamentos a funcionar. O primeiro foi inaugurado a seguir ao Natal de 2015. O segundo, no início de Janeiro. Outros dois foram já arrendados e estão neste momento em obras. Mais seis pessoas poderão, em breve, mudar-se para lá.

“Repúblicos” da terceira idade

António Costa chegou à sua nova casa logo a seguir ao Natal. Antes vivia num quarto sem condições, numa casa onde chegou a ser vítima de violência.

Para trás fica uma carreira profissional desafogada, mas que não acautelou o futuro, juntamente com um drama familiar que prefere guardar para si. Hoje, os dois companheiros de casa e as pessoas do centro fazem as vezes da família. No apartamento partilhado, sente-se “em casa”.
António Jantareta aos 17 anos

Bem perto da casa do António, Carlos e António Jantarete partilham o segundo apartamento.

Carlos tem 66 anos e está cego desde os 25. Durante dois anos, viveu num quarto, pago com a sua magra reforma. Hoje tem um quarto muito melhor, que não paga, e que até fica mesmo ao lado do café e da mercearia onde gosta de passar umas horitas à conversa.

No quarto ao lado, António Jantarete ainda está a habituar-se a dormir debaixo de um tecto. A sua história está longe de ser original. Desemprego, alcoolismo, ausência de laços familiares acabaram por o atirar para a rua. Dormia na Estação do Oriente quando o padre Paulo o encontrou e o trouxe para o centro.

Os anos sem regras ainda tornam difícil a aceitação das rotinas do dia-a-dia. A convivência com os companheiros nem sempre é fácil mas, para já, vai ficando. “Se não estivesse bem, já me tinha ido embora”.