25.1.23

O burnout é real: como identificar e prevenir?

Kelyn Soong, in Público online


Um esgotamento é descrito como sentir-se emocionalmente esgotado pelo trabalho e, apesar de a demissão aparecer muitas vezes como solução, não é - ou não deveria ser - o único escape.

Quando Jacinda Ardern anunciou que tinha decidido desistir do cargo de primeira-ministra da Nova Zelândia, não apresentou um esgotamento como razão, mas descreveu-o.

“Eu sei o que este emprego exige e sei que 'o meu tanque' já não tem energia suficiente para lhe fazer justiça”, disse. “É simples.”

Em 2019, a Organização Mundial de Saúde (OMS) reconheceu o burnout como um “fenómeno ocupacional”, mas o esgotamento profissional continua a afectar de forma significativa a saúde física e mental e está directamente relacionado com depressão e ansiedade.

O burnout é comum entre profissionais de saúde, estudantes de medicina e prestadores de cuidados. No entanto, também pode acontecer noutras profissões. Recentemente, o guitarrista da banda Fall out Boy , Joe Trohman, anunciou que iria deixar a banda por questões de saúde mental. A tenista Naomi Osaka estava a passar a melhor fase da carreira quando, em 2021, anunciou que precisava de uma pausa.

Mostramos-te o que os especialistas têm a dizer sobre um burnout, como o identificar e como lidar com ele.

O que é um esgotamento?

Um esgotamento - ou burnout - “pode significar muitas coisas diferentes para diferentes pessoas”, afirma Jud Brewer, directora de pesquisa e inovação de questões mentais da Universidade de Brown, e directora médica do ShareCare, uma empresa de saúde digital. “Um burnout aplica-se a qualquer pessoa. Então, em boa verdade, é quando uma pessoa já não está à altura das tarefas de que foi incumbida.”

De acordo com o registo do inventário Maslach, uma ferramenta de apoio ao diagnóstico, um burnout acontece quando três factores se juntam: exaustão emocional, perda de identidade e diminuição do sentimento de conquista pessoal.

Um burnout é, muitas vezes, descrito como estar emocionalmente esgotado pelo trabalho e simplesmente não se importar tanto, sentir-se cínico ou parecer insensível e distanciar-se das situações.

“Por exemplo, médicos têm a reputação de não serem pessoas acolhedoras”, diz Brewer. “Uns são bestiais mas, quando médicos têm um esgotamento, eles tendem a distanciar-se dos pacientes e isso é interpretado, muitas vezes, como insensibilidade.”

Como é sentido um burnout?

Elissa Epel, professora no departamento de psiquiatria e ciências comportamentais na Universidade da Califórnia, em São Francisco, afirma que o discurso de demissão de Arden apresenta uma intensa descrição de um esgotamento.

“Eu adoro a analogia de 'o meu tanque está vazio'. Um burnout dá a sensação de que o tanque está para lá de vazio”, disse Epel, autora de The Stress Prescription: Seven Days to More Joy and Ease. “Tu estás realmente a sofrer porque perdeste toda a energia. Perdeste-a fisicamente. E também perdeste a motivação que permitia que o teu tanque tivesse combustível durante anos ou décadas. Portanto, é muito desmotivador ter um esgotamento.”

Um burnout não é definido pela exaustão física ou por estar apenas cansado depois de longas horas de trabalho. Mas pessoas esgotadas muitas vezes sentem-se exaustas, diz Epel.

“Sentires-te emocionalmente exausto significa que não te sentes tu mesmo”, ela acrescentou. “Não estás mais em contacto com as tuas emoções. E, de facto, as tuas emoções ficaram restritas e ficas adormecido, quanto te costumavas importar tanto".

Um burnout pode levar à sensação de sobrecarga. “Não estamos mais capazes de sentir emoções específicas e a resposta dos nossos corpos a essa mensagem de sobrecarga que a mente envia é manter o sistema de resposta a situações de stress sempre em alerta máximo, mesmo quando estamos a dormir”, diz Epel.

Como é que sei se estou realmente esgotado ou apenas a trabalhar arduamente?

Uma forma de saber se tens um burnout é simplesmente pensar sobre o trabalho e interpretar a reacção, aconselha Brewer.

“O que acontece?”, pergunta. A pessoa pode estar menos do que entusiasmada sobre o trabalho e não estar esgotada. Mas se a reacção for “oh não, odeio isto” e se a pessoa está a tentar evitar o trabalho, então podem ser sinais de um esgotamento.

Qual é a diferença entre um esgotamento, ansiedade e depressão?

Apesar de um esgotamento estar relacionado com ansiedade e depressão, há grandes diferenças. Há até quem se refira ao burnout como “depressão de trabalho”, relata Epel.

Alguns dos sintomas físicos são os mesmos, tais como sentires-te cansado, sem energia e irritadiço, triste ou ansioso. “Algumas pessoas podem perder a esperança no próprio papel e eficácia e sentir que as coisas nunca vão mudar no trabalho”, conta Epel. “E isso é um paralelo com o pensamento depressivo em que sentimos falta de esperança e não vemos 'nenhuma luz' ou o fim da nossa angústia no futuro”.

A depressão muitas vezes centra-se na própria pessoa e no sentir-se inútil e autocrítico, continua Epel. Um burnout está centrado no “stress crónico insustentável das solicitações no trabalho, seja ele não remunerado, em casa como prestador de cuidados, ou no trabalho diário”.

Epel afirma que os estudos identificaram altos níveis de suicídio e depressão como resultado do esgotamento.

"Portanto, o stress crónico é, por si só, prejudicial para o corpo e bem-estar emocional", diz. "O burnout é uma resposta específica ao stress crónico avassalador, geralmente causado pelo trabalho. E a depressão é uma resposta emocional mais grave ao stress crónico e ao esgotamento."

O que posso fazer para lidar com um burnout? Desistir ou despedir-me é a única opção?

As razões por detrás de um burnout podem variar de pessoa para pessoa, diz Brewer. Como tal, é importante que as pessoas tentem chegar à origem do problema.

Alguns factores associados ao estilo de vida, como uma dieta pobre, falta de sono e falta de tempo para praticar exercício físico, desempenham um papel importante no burnout. Também questões de saúde mental como ansiedade e depressão devem ser tidas em conta. Pontos sobre os quais as pessoas têm menos controlo como longas horas de trabalho, prazos de entrega e pouco tempo para recuperar podem ser factores para o burnout.

"É realmente olhar e perceber o que está a criar esse esgotamento e, em seguida, chegar às causas e ver o que pode ser feito", diz Brewer. Focar em hábitos saudáveis e tratar problemas como a ansiedade, por exemplo, pode ajudar. "Existem elementos individuais e elementos institucionais relacionados com um burnout."

Embora abordar questões individuais possa ajudar, o problema geral não será resolvido se as mudanças não forem possíveis no local de trabalho.

"A maneira mais dramática de lidar com o esgotamento é deixar o local de trabalho", diz Epel. “E é lamentável que as pessoas muitas vezes tenham isso como a única opção, porque, como indivíduos, não podem mudar o sistema e as estruturas existentes que criam uma cultura de burnout”.

Uma gestão de proximidade, no entanto, pode fazer a diferença.

"Acho que os gestores, em todos os níveis, podem mudar o ambiente e atenuar a cultura de burnout", considera Epel. "E parte disso é criar horários flexíveis, fornecer pausas necessárias. Incentivar uma cultura de bem-estar ao modelar a própria vulnerabilidade ao stress".

Exclusivo PÚBLICO/The Washington Post