por Helder Robalo, in Diário de Notícias
Vinte anos depois da entrada na moeda única, as opiniões dividem-se. Mas eventual saída é vista como um erro
Se ainda estivesse em circulação, o escudo cumpriria no próximo domingo 100 anos de existência. A moeda da República Portuguesa foi criada a 22 de Maio de 1911 e vigorou até 28 de Fevereiro de 2002. A substituição do escudo pelo euro não foi pacífica e ainda hoje divide opiniões. Mas, face à actual conjuntura económica e financeira, poucos têm dúvidas de que o abandono do euro para regressar ao centenário escudo teria custos demasiado elevados.
O fiscalista Tiago Caiado Guerreiro não tem dúvidas ao afirmar que "se estivéssemos no escudo não havia este sobreendividamento público, porque os investidores internacionais deixavam de nos emprestar dinheiro". "Portugal é um país de modas. Foi moda aderir ao euro e nós aderimos", diz. "Se estivéssemos no escudo teríamos a economia mais disciplinada pelo exterior, pois os outros países deixavam de nos financiar quando a dívida pública atingisse 50 ou 60% do PIB."
Porém, sublinha, é preciso ter em conta que "estamos num momento muito difícil, temos a dívida valorizada em euros" e, por isso, "estamos numa camisa-de-onze-varas", em que sair da Zona Euro "poderá ser ainda pior para a economia".
Tiago Caiado Guerreiro sublinha que "Portugal nunca fez as reformas estruturais que deveria ter feito", mas que também não se pode "manter na Zona Euro sem disciplina orçamental". E exemplifica: "Numa altura de contenção, continuamos a ter as autarquias a pedir mais dinheiro, a aumentar impostos, a dar cabo das empresas."
Tudo isto reforça a ideia do fiscalista de que a entrada no euro foi um erro. "Portugal perdeu um instrumento importantíssimo, a política cambial", adianta. É que "estando na moeda única não podemos desvalorizar a nossa moeda".
Já para o economista Manuel dos Santos não há qualquer dúvida de que a entrada no euro foi um marco positivo na história de Portugal. "Entramos num espaço único integrado, provocou um grande de-senvolvimento económico e de consumo, que colocou as famílias em níveis de riqueza nunca antes vistos", frisa.
Sublinhando que "o abuso do consumo colocou-nos um problema grave", Manuel dos Santos garante que "mesmo que se tivesse cometido um erro ao entrar no euro, o que não aconteceu, a saída seria uma tragédia, quer para a Zona Euro quer para Portugal". A explicação, adianta, é simples: "Para Portugal seria dramático porque iria assistir-se à multiplicação da nossa dívida pública para um valor pelo menos do dobro perante os nossos credores, sobretudo os internacionais". O economista diz ainda que "iríamos assistir à falência das empresas e ao aumento do incumprimento".
Manuel dos Santos não tem dúvidas em afirmar que "este é um cenário impensável mesmo para quem não seja adepto do euro". O economista adianta igualmente que "a saída de Portugal, ou de outro país, teria o condão de dar início à desintegração da Zona Euro".
Também João Duque considera que, na actual conjuntura, "é perigosíssimo" sair do euro. E assegura mesmo que "se fosse Governo faria tudo para garantir que Portugal não saia do euro". O economista admite que uma eventual saída da Zona Euro apenas poderia ser minimizada "se fosse feita uma reestruturação da dívida pública".
Apesar desta certeza, e olhando para as quase duas décadas de existência do euro, o economista admite que "teria valido a pena entrar no euro se tivéssemos feito o que devíamos". "Devíamos ter alterado a estrutura económica", garante João Duque, salientando que se cometeram erros como por exemplo no que respeita à massa salarial. "Não é a adequada para a nossa realidade", assegura.
Não obstante apontar erros na adesão à moeda única europeia, o economista admite que, "na altura fazia sentido aderir ao euro, convergimos em termos de desenvolvimento". "Mesmo que não tenhamos ajustado a nossa economia à nova realidade."