18.4.23

Governo compensa perda dos pensionistas oito meses depois

Raquel Martins, Sérgio Aníbal e Pedro Crisóstomo, in Público



Pensões terão aumento intercalar de 3,57% a partir de Julho, para evitar perda em 2024. Fórmula de actualização seguirá as regras habituais e não será alterada, pelo menos para já.


Foi preciso esperar oito meses para que o Governo assumisse que iria corrigir o valor base das pensões, evitando que os reformados tivessem um corte nos seus rendimentos de 2024 em diante. A partir de Julho, todas as pensões até 5765 euros (12 vezes o valor do indexante dos apoios sociais) terão um aumento extraordinário de 3,57% e o novo valor será o ponto de partida para os aumentos do próximo ano.

A correcção começou por ser divulgada pelo ministro das Finanças, Fernando Medina nesta segunda-feira ao final da manhã, durante a conferência de imprensa para apresentar o Programa de Estabilidade (PE). Três horas mais tarde, o primeiro-ministro, António Costa, concretizou a medida, dizendo que iria aplicar-se a partir de Julho e que abrangeria igualmente as pensões de quem se reformou durante o ano de 2022.


A actualização das pensões relativa a 2023 não seguiu os mecanismos habituais e foi paga em dois momentos. Em Outubro de 2022, o executivo decidiu pagar um complemento aos pensionistas (equivalente a meia pensão) e, em Janeiro, fez uma actualização mais baixa do que o previsto pela fórmula (para pensões até 960 euros foi de 4,83%, em vez de 8,42%).

Sem a correcção agora anunciada, esta solução levaria a que os pensionistas ficassem, de 2024 em diante, com uma pensão menor do que a que teriam se o aumento tivesse sido pago integralmente em 2023, uma vez que o complemento de Outubro não foi integrado no valor da reforma.

A solução, aprovada no Conselho de Ministros extraordinário desta segunda-feira, custará, de acordo com o que está previsto no Programa de Estabilidade, 500 milhões de euros.

Tomando com exemplo uma pessoa com uma reforma de 500 euros em 2022: recebeu, em Outubro do ano passado, um adiantamento de 250 euros e, em Janeiro de 2023, teve um aumento de 4,83%, passando a receber 522,15 euros. Com a medida agora aprovada, entre Julho e Dezembro passará a receber 542,1 euros por mês. Esta será a base onde irá incidir o aumento de 2024, ficando este pensionista com uma reforma de 574,8 euros, num cenário em que a inflação média sem habitação em Novembro seja de 5,1% e em que a economia cresça 1,8% em 2023. Se nada tivesse sido feito, o aumento a aplicar teria como ponto de partida os 522,15 euros.

Ao lado do primeiro-ministro, a ministra do Trabalho, Ana Mendes Godinho, anunciou que este aumento de 3,57% abrangerá também as pessoas que se reformaram em 2022.​ Trata-se de uma alteração às regras em vigor, que excluem dos aumentos a fazer em Janeiro do ano seguinte as pensões atribuídas no ano anterior.

Na conferência de imprensa, António Costa sublinhou que o Governo disse sempre que iria garantir a reposição integral das pensões no próximo ano. Mas a verdade é que, até esta segunda-feira, o executivo nunca tinha sido taxativo quanto a este assunto e permanecia a dúvida sobre se o valor base das pensões seria reposto ou se haveria uma perda para os pensionistas.


"Em 2024, não há dúvidas nenhumas, todos terão um aumento que corresponderá à pensão a que têm direito de acordo com a aplicação estrita da Lei de Bases da Segurança Social", afirmou o primeiro-ministro, rebatendo a ideia de que haveria um corte nas pensões de 2024 em diante.

“Não houve truque, não houve ilusão, não houve corte nas pensões”, sublinhou.

Afinal, sustentabilidade sai reforçada

Quando, em 6 de Setembro do ano passado, anunciou que a actualização das pensões em 2023 não iria ser feita da forma habitual, o primeiro-ministro justificou a decisão com a necessidade de garantir a sustentabilidade futura da Segurança Social.

Num documento de três páginas enviado na altura aos deputados – e que foi muito criticado – o Governo concluía que a aplicação “integral” em 2023 levaria a que o saldo da Segurança Social entrasse em terreno negativo no final da década de 2020, meia década mais cedo do que estava previsto.

Agora, o executivo não só faz a correcção do valor base das pensões, como garante que, afinal, a sustentabilidade da Segurança Social sai reforçada.

A ministra do Trabalho salientou a melhoria que se está a verificar na receita e no saldo do sistema de previdência da Segurança Social, graças a um aumento do número de trabalhadores activos que contribuem para o sistema, do valor dos salários e do número de imigrantes trabalhadores e a uma redução do número de cidadãos desempregados.

Ana Mendes Godinho revelou que se prevê “um aumento do saldo previdencial durante a próxima década”, o que permitirá adiar para 2033 “o cenário dos primeiros saldos negativos" do mesmo sistema.

Este cálculo, explicou, já inclui o impacto deste aumento intercalar das pensões, “assim como a garantia da base da actualização para 2024”. “Conseguimos ganhar 17 anos para os primeiros saldos negativos face às projecções que existiam em 2015 e temos um ganho de três anos face às projecções de 2022”, frisou.

Fórmula das pensões mantém-se em 2024

Também nesta segunda-feira ficou claro que, ao contrário do que vinha sendo assumido, uma revisão da fórmula de actualização das pensões não será para já, nem terá efeitos no próximo ano.

Em meados de Março, o secretário de Estado da Segurança Social, Gabriel Bastos, afirmou que o Governo pretendia alterar os parâmetros da fórmula de actualização das pensões, para que seja “menos sensível aos picos da inflação” e estava à espera de receber o contributo da comissão para a diversificação das fontes de financiamento e sustentabilidade da Segurança Social que está a estudar o assunto.

“Já fomos pensando como é que isso pode ser feito e há maneiras, sem mudar a fórmula, de considerar períodos de referência mais alargados”, de modo a alisar o impacto dos indicadores que são tidos em conta, nomeadamente a inflação, disse na altura, dando conta da expectativa de que as mudanças tivessem efeitos em 2024.

Afinal não será assim. “Em 2024 não há nenhuma alteração da fórmula”, garantiu o primeiro-ministro.

“Aquilo que temos constatado, durante os anos em que tivemos uma inflação anormalmente baixa, e em que foi necessário haver aumento extraordinário, ou no ano passado, em que houve um pico absolutamente anormal de inflação, é que a fórmula não é adequada. Daí a haver uma alteração vai um passo maior que a perna. Está a ser estudado e depois se verá. Em 2024, não há nenhuma alteração da fórmula”, insistiu.