Jorge Nascimento Rodrigues e Carlos Esteves, in Expresso
O crescimento económico entre 2023 e 2027 não chega a 2% ao ano, segundo o cenário apresentado no Plano de Estabilidade para aquele período apresentado esta segunda-feira pelo ministro das Finanças. Treze economias da União Europeia crescem mais que Portugal em 2024. Metas políticas no défice e na dívida são obtidas até final da legislatura
Fernando Medina atualizou esta segunda-feira para 1,8% o crescimento previsto para 2023, na apresentação do Plano de Estabilidade 2023-2027 (PE23/27) que vai enviar para Bruxelas e que deverá ser discutido a 26 de abril na Assembleia da República.
A nova previsão do ministro das Finanças é superior em meio ponto percentual à anteriormente avançada no Orçamento do Estado para 2023, aprovado em novembro passado no Parlamento, e distancia-se significativamente do crescimento muito medíocre de 1% projetado pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) na semana passada. As projeções de crescimento até 2027 apontam para um crescimento médio anual abaixo de 2%.
O processo de desinflação, de descida da inflação, vai ser, contudo, mais rápido do que o previsto pelo FMI e a meta política de obtenção, de novo, de um superavite orçamental é alcançável até 2027. O objetivo de redução do rácio da dívida pública no Produto Interno Bruto (PIB) para menos de 100% é possível até 2025, dois anos antes do projetado pelo FMI. Recorde-se que o último excedente orçamental foi conseguido por Mário Centeno em 2019 e desde 2010 que o rácio da dívida tem estado acima de 100%.
GOVERNO E BANCO CENTRAL ALINHADOS NA PREVISÃO DE CRESCIMENTO
A revisão em alta da previsão de crescimento para 2023 feita por Fernando Medina no PE 23/27 alinhou a avaliação macroeconómica do Ministério das Finanças com o Banco de Portugal (BdP). Mário Centeno tinha avançado em março com uma previsão de 1,8% e o ministro das Finanças acertou, esta segunda-feira, o passo por aquele número.
No Orçamento do Estado para 2023 apontara para 1,3% e, na semana passada, o FMI deu um soco no estômago das previsões avançando com um crescimento medíocre de 1%. Recorde-se, no entanto, que, mesmo um crescimento de 1,8%, muito superior à previsão do Fundo, significa uma desaceleração brutal em relação aos 6,7% registado no ano passado.
A projeção até 2027 apresentada no PE23/27 não revela uma descolagem da economia portuguesa nestes cinco anos. O crescimento médio anual vai ficar abaixo de 2% no horizonte deste Plano de Estabilidade. O desempenho histórico desde 2000 até ao ano passado é medíocre: a média de crescimento ficou abaixo de 1%, marcada por seis anos de recessão (com uma quebra acumulada do PIB de 19%).
GRUPO DE PAÍSES QUE CRESCEM MAIS AMPLIA-SE EM 2024
A economia portuguesa vai crescer mais do que a média da zona euro em 2023 e 2024, como referiu Medina, reforçando que vai continuar a “convergir”. O FMI aponta para um crescimento da área do euro de 0,8% este ano e de 1,4% no próximo, enquanto o Banco Central Europeu, nas projeções de março, avançou com 1% e 1,6% respetivamente. A Comissão Europeia, nas previsões de inverno, apontou para 0,9% e 1,6% naqueles dois anos.
Contudo, o grupo de economias da União Europeia que vai crescer mais do que Portugal amplia-se de um ano para o outro. Em 2023 são cinco, mas no ano seguinte alarga-se para onze (ver tabelas). Bulgária, Hungria, Polónia e Roménia, membros da UE que estão fora do euro, vão crescer mais em 2024 do que Portugal.
O nosso principal cliente, Espanha, vai crescer 1,5% em 2023, menos do que o previsto atualmente pelo governo de António Costa para Portugal, mas acelera para 2% no próximo ano, registando um crescimento superior ao português.
INFLAÇÃO DEVERÁ CAIR PARA 2% EM 2026
O processo de descida da inflação - de desinflação, no termo técnico - até 2027 vai ser mais rápido do que o governo previa e do que o FMI projeta. Desinflação é abrandamento do ritmo de subida e não quebra de preços (deflação).
Partindo de um nível elevado de 7,8% em 2022, Medina espera que a inflação desça para 5,1% este ano - ficando abaixo da média de 5,3% para a zona euro - e 2,9% no próximo. Deverá chegar a 2% em 2026, antecipando em um ano a previsão do FMI. O pressuposto destas projeções é que o surto inflacionista terá atingido um pico em 2022 e que a dinâmica será invertida em todos os componentes da inflação.
Nas projeções macroeconómicas apresentadas pelo Banco Central Europeu (BCE) em março para o conjunto da zona euro, a inflação ainda estará acima de 2% em 2025 e só durante o ano seguinte deverá chegar à meta de 2% da política monetária na zona euro.
Os pressupostos dos cenários-base do BCE e do FMI partem do princípio que não há um novo surto inflacionista na energia, onde, entretanto, a turbulência voltou com a decisão de corte de produção diária por parte do cartel alargado OPEP com a Rússia. Um agravamento das tensões geopolíticas em várias partes do mundo, e não só na Europa, afetando as cadeias de fornecimento e diversas matérias-primas cruciais, não está, também, considerado no cenário-base.
MEDINA TRAVA A FUNDO NA CONSOLIDAÇÃO ORÇAMENTAL
“Não é o momento de ir mais além” na consolidação orçamental, frisou Fernando Medina ao avançar com a opção política de estabilizar em 2023 o défice orçamental em 0,4% do PIB. “Não se justifica fazer uma redução adicional no défice”, acrescentou.
Tendo fechado 2022 com um défice orçamental de apenas 0,4% do PIB, depois de uma consolidação de mais de 5 pontos percentuais desde o início de 2021, o ministro das Finanças adianta que até ao fim da legislatura o corte no défice será apenas de quatro décimas, até atingir o equilíbrio orçamental em 2026. Para o ano seguinte, as projeções de Medina preveem um excedente, pela segunda vez desde o 25 de abril.
Medina referiu que a meta de estabilização do défice em 2023 já permitiu ao governo injetar 2,5 mil milhões de euros em medidas de resposta à carestia de vida. Adiantou ainda que o desagravamento de carga fiscal no IRS vai permitir reduções de mais de 780 milhões de euros em 2023 e de 525 milhões no ano seguinte. Até 2027, o desagravamento somará, em termos acumulados, mais de 2 mil milhões de euros, sem beliscar as ‘contas certas’.
Portugal é uma das economias do euro com uma das melhores situações orçamentais até final do horizonte do Plano de Estabilidade, segundo as próprias projeções do FMI. O Fundo prevê que quatro economias do euro registarão défices acima de 3% do PIB em 2027: Bélgica (5,7%), Espanha (4%), França (3,9%) e Eslováquia (3,9%). Mesmo o autointitulado grupo dos ‘frugais’ mais radicais, como a Áustria, a Finlândia e os Países Baixos, ainda registará, em 2027, défices acima de 1%.
META POLÍTICA DE BAIXAR DÍVIDA PARA MENOS DE 100% DO PIB
A meta política de retirar Portugal do clube dos mais endividados à escala mundial e dentro da zona euro está ao alcance do governo no quadro da legislatura. As projeções do PE 23/27 apontam para a redução do rácio da dívida pública abaixo de 100% do PIB em 2025, dois anos antes das previsões do FMI avançadas na semana passada.
Reduzir para 99% em 2025 é fazer regressar o nível de endividamento público português ao quadro anterior a 2010 (quando fechou o ano em 100,2%). No ano anterior registava 88%.
O esforço de redução do rácio da dívida em quase 15 pontos percentuais entre o final de 2022 e o fecho de 2025 colocará Portugal fora do clube dos mais endividados na zona euro, onde ficarão a Grécia, Itália, França, Bélgica e Espanha, por ordem decrescente de peso da dívida no PIB.
O nível de juros que Portugal está a pagar situam-no abaixo de um grupo de periféricos do euro. No final deste ano, os juros nas obrigações a 10 anos - que servem de referência - deverão ter subido para 4,1%, segundo as projeções do algoritmo do portal World Government Bonds. Esse nível de juros é inferior ao projetado para sete periféricos do euro (ver tabela).
O spread em relação ao custo de financiamento da Alemanha (que serve de referência) vai descer de 83 pontos-base atualmente para 65 pontos, um pouco mais do que meio ponto percentual. O spread representa o prémio de risco que os investidores exigem para comprar títulos portugueses. E é medido em relação aos juros das obrigações germânicas a 10 anos.