José Manuel Boavida e Carolina Neves, opinião, in Expresso
O mote da campanha do Dia Mundial da Obesidade 2023 foi “Mudar Perspetivas: Vamos falar sobre obesidade”, mas parece que a mensagem não passou e a obesidade continua a ser abordada de forma estigmatizada.
Os números alarmantes de obesidade e de excesso de peso já sobejamente conhecidos têm também uma raiz histórica. A geração conhecida como baby boomers, foi aquela que viveu na juventude uma transformação social em vários domínios, incluindo uma maior abundância alimentar e calórica, realidade que se acentuou até hoje.
Uma reflexão sobre o estilo de vida contemporâneo implica pensarmos não só em mudanças de comportamento alimentar, mas também da exposição a um ambiente que é marcadamente obesogénico. Ao ambiente, juntemos a componente já referida da genética. A mesma herança genética favorável à sobrevivência, há 100 anos, é aquela que no século XXI predispõe à obesidade.
As implicações da obesidade nas populações são graves e merecem uma atenção urgente em duas frentes: na prevenção e no tratamento. A obesidade aumenta o risco de múltiplas outras doenças, como diabetes tipo 2, hipertensão, doença coronária, 13 tipos de cancro, doença renal crónica, doença respiratória, numa lista que chega a mais de 200. Podemos incluir ainda a depressão e a ansiedade, que agravam e são agravadas pela obesidade. Qualquer superficialidade na sua abordagem é um erro.
Há muito que se fala em prevenção, em medidas que alterem o ambiente obesogénico da sociedade. Mas quase nada foi feito. O acesso a alimentos saudáveis, o consumo maior de vegetais, o incentivo à atividade física, a melhoria das condições laborais, socioeconómicas e a educação para a saúde são ainda uma miragem. E se há que prevenir, para 2/3 dos portugueses estas medidas (quando vierem) já vêm tarde. É necessário tratar o quanto antes. A obesidade é uma doença progressiva e quanto mais cedo interviermos, menos complicações surgirão no futuro.
Por tudo isto, a abordagem à obesidade não pode ser feita à custa da humilhação, do estigma e do facilitismo, mas antes da compreensão da complexidade desta doença e da necessidade de suporte às pessoas que dela sofrem.
Os medicamentos podem ser muito importantes e o seu acesso tem de ser enquadrado, pois sem um acompanhamento organizado e multidisciplinar, sem educação, motivação e suporte, o insucesso e o retrocesso continuarão.
Ninguém garante hoje que “ser magro vai estar à distância de uma injeção por semana”, como titulava a Revista do Expresso, porque as condições de base não estão resolvidas.
Assoc. Protetora dos Diabéticos de Portugal