22.2.10

Bolsas de estudo atrasadas criam dificuldades a universitários

Por Maria João Lopes, in Jornal Público

Estudantes universitários e do politécnico estiveram vários meses sem bolsas de acção social. Alguns só agora começaram a receber


Atrasos na atribuição das bolsas de acção social estão a provocar dificuldades aos estudantes do ensino superior. Apesar de a situação variar de instituição para instituição, muitos alunos do universitário e politécnico estiveram vários meses sem qualquer apoio financeiro e só este mês estão a começar a receber as primeiras prestações de 2009/2010. Para enfrentar as dificuldades, uns reduzem as despesas de alimentação ao mínimo, outros abdicam de livros, outros recorrem a trabalho extra.

Sónia Neves e Marlene Santos, estudantes do Instituto Politécnico de Coimbra, estiveram sem bolsa durante quatro meses. Sónia, de 20 anos, a frequentar o 3.º ano do curso de Animação Sócio-Educativa, garante que a bolsa "nunca foi regular", mas este foi o ano em que ficou mais tempo sem receber: só agora, em Fevereiro, chegou o dinheiro de Outubro, Novembro, Dezembro e Janeiro. A situação destas jovens não é única. Na Universidade de Coimbra havia, no início do mês, cerca de 1200 alunos com bolsas em atraso (ver texto ao lado). Na Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, segundo um responsável da Associação Académica, houve também estudantes com o pagamento atrasado, no início do ano lectivo. Mas há instituições como as Univerdades de Lisboa e Porto que garantem ter recebido as verbas necessárias para pagar as bolsas a horas.

Filha de pai metalúrgico e mãe que serve às mesas, Sónia recebe 90 euros por mês de bolsa e esforça-se por pedir o mínimo aos pais. Mas tem que o fazer. "Os meus pais juntos, por mês, não devem ganhar mil euros. E tenho uma irmã de 13 anos." Tem direito a residência, mas, mesmo assim, não chega. Só as propinas são o equivalente à bolsa. E ainda é preciso pagar alimentação (cerca de 20 euros por semana) e passe (17,50). Saídas à noite? Livros? Nem pensar.

"O dinheiro não dá para tudo. Em Janeiro não comprei passe. Nesse mês, compensou-me andar a pé. Raramente saio à noite e, quando faço jantares, é em casa e dividido por todos", explica. Também não participa na famosa boémia coimbrã: "Não vou aos jantares de curso, fui a um ou dois. Só fiz uma queima e uma latada", conta.

Tanto ela como Marlene conhecem amigos na mesma situação que tiveram ou têm que trabalhar para pagar os estudos. Só que não declaram o que recebem, sob pena de verem a bolsa reduzida ou de a perderem. Mas Sónia é uma optimista nata. Apesar das dificuldades, nunca lhe passou pela cabeça desistir.

Marlene tem a mesma crença no futuro, apesar de já ter pensado abandonar o curso de Arte e Design. Em parte, é Ângelo, o filho de 15 meses, que a faz crer que o futuro será melhor com estudos. Combinou com o companheiro: primeiro estuda ela e ele trabalha, depois ela trabalha e ele deixa a construção civil para estudar. "Queremos os dois melhorar o nosso futuro e o do nosso filho", explica.

Marlene recebe 250 euros por mês de bolsa. Também só este mês recebeu os quatro meses atrasados. Ficaram contas por pagar. O vencimento do companheiro é pouco mais que o ordenado mínimo. O pai do Ângelo ainda arranja trabalhos extras, mas há a renda da casa, creche, transportes, propinas, alimentação... "Já ponderei deixar de estudar. Às vezes, questiono-me se não estarei a ser egoísta... É complicado, mas acredito que não é impossível." com André Jegundo