30.8.19

Portugal sem preparação para a doença mental na terceira idade

Rafael Marchante, in SicNotícias

Aviso é da Sociedade Portuguesa de Psiquiatria que indica ainda que é preciso definir como vai ser usado o Serviço Nacional de Saúde.

A Sociedade Portuguesa de Psiquiatria avisa que Portugal não está preparado para a doença mental na terceira idade, sobretudo na questão das demências, e considera que nos 40 anos do SNS se devia tornar esta área uma real prioridade.
Na véspera do arranque do Congresso Mundial de Psiquiatria, que começa em Lisboa na quarta-feira, o vice-presidente da Sociedade Portuguesa de Psiquiatria e Saúde Mental indica que os serviços de saúde portugueses "não estão preparados para o que já está a acontecer e para o que aí vem" ao nível do problema das demências.

Em entrevista à agência Lusa, Pedro Varandas recorda o "problema demográfico" de Portugal, com uma população envelhecida e que terá uma forte carga de doença mental.

"A nossa pirâmide demográfica está completamente invertida. Devemos estar já muito preocupados com o que ainda não está a ser feito para preparar os tempos vindouros", afirmou à Lusa.


O psiquiatra entende que se trata de um "problema sério", que precisa de respostas a várias questões: "Como cuidar destas pessoas? Com que dinheiro e com que recursos? Como apoiar as famílias?".
O vice-presidente da Sociedade Portuguesa de Psiquiatria indica ainda que é preciso definir como vai ser usado o Serviço Nacional de Saúde e de que forma será feita a articulação com a rede de lares existente, que tem de estar preparada para prestar cuidados de qualidade.

Para Pedro Varandas, trata-se de uma área que "precisa de recursos", mas que não são pesados do ponto de vista financeiro.

"São recursos exequíveis e não são largas centenas de milhares de euros. É necessário sobretudo investimento em recursos humanos. Não é uma área que exige grande peso tecnológico. O que exige é organização e implementação", sustentou.
O psiquiatra recorda que Portugal tem na área maternoinfantil e no combate à toxicodependência dois grandes "exemplos de sucesso, até mundial", que deviam servir de impulso para tornar a área da saúde mental uma prioridade.

"Agora, 40 anos depois do início do SNS, devíamos pegar na saúde mental como o novo caso de sucesso", sugere.

Pedro Varandas entende que já chegou o tempo de passar da teoria à prática, deixando apenas de dizer que a saúde mental deve ser uma prioridade e passando efetivamente a tornar a área uma prioridade nacional.

Os cuidados de saúde mental na terceira idade são um dos grandes temas a abordar no Congresso Mundial de Psiquiatria, que decorre em Lisboa entre quarta-feira e sábado e onde são esperados cerca de quatro mil participantes e peritos.
Além do planeamento em saúde mental, o Congresso vai debruçar-se sobre várias áreas clínicas da saúde mental, como as psicoses ou o suicídio. Serão ainda abordados temas ligados à ética, ao estigma da doença mental e aos direitos dos doentes.

Rendas vão aumentar 0,5% em 2020

in Público on-line

O valor das rendas vai subir 0,5% no próximo ano, cerca de metade do que aumentou em 2019.

O Instituto Nacional de Estatística (INE) divulgou esta sexta-feira os dados relativos à variação média do índice de preços que, nos últimos 12 meses até Agosto, excluindo a habitação, foi de 0,51%. Esta evolução – justificada pela queda dos preços dos combustíveis e pela variação nos preços nos hotéis e restaurantes - significa que as rendas irão aumentar em 0,51 euros por cada 100 euros de renda.

Isto porque este é o valor (que terá de ser confirmado a 11 de Setembro) que serve de base ao coeficiente utilizado para a actualização anual das rendas, ao abrigo do Novo Regime do Arrendamento Urbano (NRAU).

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Este aumento surge depois dos acréscimos de 1,15% este ano, 1,12% em 2018, 0,54% em 2017 e 0,16% em 2016. Em 2015 as rendas tinham ficado congeladas na sequência de variação negativa do índice de preços excluindo a habitação registada nesse ano.

Os quatro anos anteriores, de 2011 a 2014, tinham sido de aumentos consecutivos das rendas: uma actualização residual de 0,3% em 2011 (mais 30 cêntimos por cada 100 euros de renda), de 3,19% em 2012, de 3,36% em 2013 e de 0,99% em 2014.

Por lei, os valores das rendas estão em geral sujeitos a actualizações anuais que se aplicam de forma automática em função da inflação. O NRAU estipula que o INE é que tem a responsabilidade de apurar o coeficiente de actualização de rendas, tendo este de constar de um aviso a publicar em Diário da República até 30 de Outubro de cada ano para se tornar efectivo.

Só após a publicação em Diário da República é que os proprietários poderão anunciar aos inquilinos o aumento da renda, sendo que a subida só poderá efectivamente ocorrer 30 dias depois deste aviso.
De acordo com a lei do arrendamento, a primeira actualização pode ser exigida um ano após a vigência do contrato, e as seguintes um ano depois da actualização prévia, tendo o senhorio de comunicar por escrito, com uma antecedência mínima de 30 dias, o coeficiente de actualização e a nova renda que resulta deste cálculo.

Caso não o pretendam, os senhorios não são, contudo, obrigados a aplicar esta actualização.

As rendas anteriores a 1990, contudo, foram actualizadas a partir de Novembro de 2012, segundo o NRAU, que permite aumentar as rendas mais antigas através de um processo de negociação entre senhorio e inquilino. Caso tenham sido objectivo deste mecanismo de actualização extraordinária, ficam isentos de nova subida.

A “desigualdade afectiva” é uma máquina de fazer pobres

Ana Cristina Pereira, in Público on-line

“A rede de apoio das pessoas pobres é formada por pessoas pobres como elas e por redes institucionais, que dão algum apoio, mas também controlam.” Esta foi uma das conclusões a que chegou a socióloga Elsa Teixeira, depois de entrevistar mulheres que viviam em situação de privação. De dinheiro, mas também de afecto.

Primeiro, a socióloga Elsa Teixeira escolheu Helena Costa Araújo, professora na Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade do Porto, com práticas de investigação que se debruçam sobre o modo como os contextos são trespassados por relações étnicas, idade, género, orientação sexual, classe social. Depois, escolheu Bernard Lahire, professor na École Normale Supérieure de Lyon, que “explica como é que as nossas disposições para pensar, sentir e agir se formam através da socialização”. Por fim, conheceu Kathleen Lynch, professora na University College Dublin, que “atribui à desigualdade afectiva um papel essencial.” Fez 60 entrevistas em profundidade a 20 mulheres do Norte de Portugal. Cruzou várias dimensões da desigualdade – relacionadas com falta de recursos económicos ou escolaridade, mas também com amor, cuidado, solidariedade, respeito e reconhecimento. E fez a tese de doutoramento sobre “os percursos sociais e educacionais singulares de mulheres pobres e as suas estratégias para enfrentar a pobreza”.

Não estava à espera de encontrar tanta história de negligência, violência, abuso?
Entrevistei mulheres entre os 30 e 45 anos. Todas tinham sido vítimas de violência. Isso surpreendeu-me. Não era só violência doméstica. Tinham sido vítimas de desinteresse ou violência por parte de professores e de depreciação e de bullying por parte de colegas. Foram vítimas de trabalho infantil. Uma começou a trabalhar aos oito anos. Algumas tinham sido vítimas de violência física por parte das patroas. Em crianças iam trabalhar para casa das senhoras e elas batiam-lhes.

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E algumas na vida adulta…
Este é um estudo qualitativo, na área das Ciências da Educação, mas muitos outros mostram que mulheres que assistiram ou foram vítimas de violência na infância procuram companheiros violentos. As mulheres que entrevistei conseguiram separar-se dos maridos violentos, mas eles desapareceram da vida dos filhos, o que agravou a situação económica destas famílias. As mulheres sentem que é responsabilidade delas cuidar dos filhos. Este trabalho não é pago. Assumindo essa responsabilidade sozinhas, elas não tinham tanto tempo para cuidar dos filhos como gostariam. Tinham de fazer vários turnos seguidos, por exemplo. [De acordo com a estatística oficial] há mais mulheres a receber Rendimento Social de Inserção [RSI]. Destacam-se as famílias monoparentais. E fala-se destas mulheres que ficam em casa com os filhos pequenos ou doentes…

Como se fossem preguiçosas?
Sim. Como se não existisse tudo isto, que muitas vezes não começa com elas, começa com as mães, com as avós. Como se não existisse esta desigualdade afectiva, esta falta de condições de habitabilidade, esta privação, até ao nível nutricional, que muitas vezes é a causa de dificuldade de aprendizagem. Uma questão interessante é a das redes sociais, que em alguns casos são muito pequenas.

E destituídas de poder?
Exactamente. Há redes que são de apoio e há redes que são de alavancagem. A rede de apoio das pessoas pobres é formada por pessoas pobres como elas e por redes institucionais, que dão algum apoio, mas também controlam. As redes de alavancagem são mais interessantes, porque são heterogéneas, permitem o acesso a mais informação e oportunidade. Às vezes, basta uma pessoa para haver uma oportunidade.

A sua tese é que a pobreza está “profundamente relacionada” com estas desigualdades afectivas.
Os estudos da Psicologia mostram que o trauma tem implicações na aprendizagem. Há uma desmotivação, que acaba por criar insucesso, e, muitas vezes, abandono escolar precoce. Quem tem poucas competências, só arranja trabalhos precários, repetitivos, pouco qualificados. Há este lado. E há outro lado, emocional. Estas mulheres, muitas vezes, sofrem de ansiedade, depressão.

Há sempre sequelas?
Quase todas tinham algum problema de saúde mental, o que também as podia impedir de ter ou de manter um emprego. Faltavam-lhes competências sociais. Algumas arranjavam conflitos facilmente. Tudo isto está relacionado. O facto de ter de trabalhar longe pode causar insegurança, para quem não está habituado a ter grandes horizontes. Se o emprego é longe, pode não haver transportes. Se há transportes, os horários podem não encaixar. Se há transportes e os horários encaixam, pode não haver com quem deixar os filhos. Muitas vezes, as mulheres têm de fazer uma opção entre ir trabalhar e cuidar dos filhos. São muitas variáveis que, se calhar, uma pessoa de classe média, que tem carro ou pode pagar a creche, não compreende.

São muito condicionadas?
Mas nada está determinado. Elas têm de tomar decisões estratégicas. Por exemplo, uma mulher tem duas filhas, vai receber um salário um pouco acima do salário mínimo, o que já a impede de ter algum tipo de apoio. Pode, por exemplo, ter de passar a pagar creche. No fundo, vai receber o mesmo. Qual o interesse de ir trabalhar, não estar com as filhas, se vai receber o mesmo valor? Qualquer pessoa posta perante um dilema destes tem de decidir. E é quase como se esta pessoa, por ser pobre, por receber um subsídio, não tivesse o direito de tomar decisões. As pessoas encontram estratégias para lidar com a pobreza. Na ausência de tudo o resto, a estratégia pode passar pela discussão, pelo conflito. Pode até passar pela violência relativamente a trabalhadores sociais, ou professores, se for a única forma de resolver problemas que respeitam aos filhos.

"Algumas pessoas estão em condições de privação tão fortes que não conseguem ver para lá do dia seguinte. Há uma adaptação psicológica que depois é lida como preguiça."

Às vezes, os problemas parecem simples de resolver, como o da criança com piolhos que não quer ir à escola.
É. Às vezes, as coisas parecem tão evidentes e não são tão evidentes. O champô para os piolhos é muito caro. Havia uma filha, uma mãe e uma avó e todas teriam de usar o champô, não era fácil contornar os problemas. Chamavam piolhosa à criança na escola, mas a mãe não tinha dinheiro para comprar o champô. [Num caso destes] ou a Segurança Social proporciona esse apoio ou o centro e saúde ou isso, que é um problema simples de resolver, acaba por ser um drama.
Com consequências que se podem prolongar na vida adulta…

Claro, porque depois a criança não queria ir à escola e que lhe chamassem de piolhosa. São questões básicas, mas com implicações ao nível da empregabilidade. Muitas destas mulheres com 30 e tal anos já não têm dentes ou têm dentes estragados. Se precisarem de óculos e perceberem que o filho também precisa vão dar ao filho primeiro. Os sacrifícios podem incluir passarem fome para poderem dar comida aos filhos.
Encontrou uma “estratégia de mobilidade social ascendente” relacionada com o futuro dos filhos…

Isso foi a estratégica comum a todas as mulheres que entrevistei: tentar que a vida dos filhos fosse melhor do que a delas. Elas valorizavam muito o papel da escola nesta eventual estratégia de mobilidade. Falavam na importância que davam à escola, nos sacrifícios que tinham de fazer para que os filhos pudessem estudar e ascender a um determinado nível de consumo – a determinadas roupas, a determinada aparência. Tudo isso acaba por ser importante na inclusão social. Falavam nas crianças como sendo a parte mais importante da vida delas.


Além das redes de alavancagem que referiu, por oposição às redes de apoio, mais homogéneas, com menos oportunidades, o que pode fazer a diferença na vida destas mulheres?

A desigualdade afectiva, isto é, o facto de se ter sido ou não vítima de violência doméstica na infância, de se ter ou não uma relação igualitária com o parceiro, de se ter ou não maior apoio emocional, e a ética de trabalho, o estar habituado a planear, a poupar. Algumas pessoas estão em condições de privação tão fortes que não conseguem ver para lá do dia seguinte. Há uma adaptação psicológica que depois é lida como preguiça. Na realidade, a possibilidade de se “autonomizarem” depende, em grande medida, das condições de habitabilidade, da educação, do emprego, dos cuidados de saúde e, muito importante, de condições relacionais e de afecto. Muitas vezes, as políticas sociais entram em conflito com os objectivos a que se propõem. Fazem a defesa da autonomia e da responsabilização (se está a receber um subsídio, tem de dar algo em troca, de trabalhar, de estudar ou de se tratar), mas permitem apenas a sobrevivência, mantêm a pessoa num estado de dependência. O valor é baixo (cem euros para um indivíduo e 200 para uma família, em média). A intervenção não é individualizada, negociada.
A lei fala em contratos de inserção negociados…

Muitas mulheres não se lembravam de ter negociado o contrato de inserção. Lembram-se de lhes terem perguntado: “Concorda que os seus filhos vão à escola? Concorda em arranjar trabalho?” As entrevistas foram realizadas durante a crise. Houve alterações na lei, que diminuíram o valor da prestação [e que acabaram com os apoios complementares]. Estas mulheres não conseguiam sustentar a família com o RSI. E eram criticadas porque viviam à custa de subsídios. Havia mulheres que estavam a sofrer privações e não iam aos correios buscar o vale porque lá estariam vizinhos que iriam ver e criticar.

Elas também interiorizam o estereótipo?
Sim. Algumas também diziam mal dos vizinhos que recebiam RSI. Havia uma transferência do descrédito para os ciganos, para os negros, para os imigrantes. Distinguiam-se de pessoas que percepcionavam como sendo de um estatuto inferior ao delas. Apresentavam-se como pessoas honestas, que tratam bem dos filhos.

Crise fez duplicar imigrantes abaixo do limiar da pobreza
Faziam a clássica distinção entre os “bons pobres” e os “maus pobres”?
Essa é também a linguagem dos trabalhadores sociais. Havia mulheres que resistiam a isto e tiveram conflitos. Lembro-me, por exemplo, de uma senhora que durante meses não recebeu o subsídio porque quando foi à assistente social levou uma criança vestida com um fato de uma marca cara, que lhe tinha sido oferecido, já em segunda mão. A assistente social disse-lhe que ela não precisava de apoio. Lá está a ausência de reconhecimento e respeito. Espera-se que as pessoas pobres tenham determinado tipo de comportamentos e determinado tipo de consumos.

Quem não corresponde ao esperado pode ser prejudicado…

Sim, mas os próprios trabalhadores sociais muitas vezes estão numa situação precária e são pressionados para obter resultados. Não há recursos humanos suficientes para ir às casas, conhecer as famílias. Se estiverem no gabinete, não conseguem avaliar bem.


Pensionistas de invalidez e velhice do regime geral da Segurança Social com pensões inferiores ao salário mínimo nacional (em euros)

in Pordata

Quantos pensionistas da Segurança Social recebem abaixo do ordenado mínimo mensal?
Pensões da Segurança Social: total, de sobrevivência, de invalidez e de velhice
Quantas pensões de velhice, invalidez ou sobrevivência são pagas pela Segurança Social?

Projeto promove vida saudável nas Terras de Sicó

in as Beiras on-line

A carrinha Vida+ Móvel vai percorrer a região das Terras de Sicó, nos distritos de Coimbra e Leiria, entre 4 e 22 setembro, para promover hábitos de vida saudáveis em zonas isoladas e envelhecidas do interior do país. É uma iniciativa do projeto europeu HeaLIQs4Cities e o objetivo passa por avaliar o estilo de vida das pessoas e sensibilizar para a importância de um envelhecimento ativo e saudável.

Coordenado pelo Instituto Pedro Nunes (IPN), em parceria com a Universidade de Coimbra (UC) e o Centro Médico e Universitário de Groningen (Holanda), o HeaLIQs4Cities (Healthy Lifestyle Innovation Quarters for Cities and Citizens) é um projeto apoiado pela Comissão Europeia e pelo Instituto Europeu de Inovação e Tecnologia (EIT) que pretende promover estilos de vida saudáveis, envolvendo cidadãos, universidades, empresas e governos locais da Dinamarca, Espanha, Holanda e Portugal.

Escola de Fornelos quer reabrir com métodos de aprendizagem pioneiros e inovadores

Natacha Cunha Destaque, in ExpressoFafe.pt

A Escola de Fornelos ambiciona ser reativada no próximo ano letivo, com um projeto pioneiro em Portugal, orientado pela Comunidade de Aprendizagem 7 Pétalas.

Apresentando-se como uma “Escola do Futuro”, o projeto piloto aposta em métodos pedagógicos inovadores centrados no desenvolvimento bio-integral do ser humano, tendo como princípios a Felicidade, a Sustentabilidade e a Cultura de Paz.
Segundo os responsáveis, esta escola diferencia-se por procurar o sucesso escolar respeitando as características singulares de cada aluno. “Para isso, implementa um sistema colaborativo que se gere pelos ritmos e interesses de cada criança, que trabalha conteúdos relevantes em vez de disciplinas, que fomenta a criatividade, que utiliza as novas tecnologias e que promove o contacto com a natureza e o mundo exterior humanizado. A escola tem ainda por base a participação da família e da comunidade envolvente”, explicam.

“Contribuir para uma geração de cidadãos mais autónomos, conscientes e íntegros, perseverantes, inovadores, solidários, livres e felizes é o objetivo”, acrescentam.

O projeto assume-se como um convite pedagógico flexível em que as ‘7 Pétalas’ representam diferentes áreas de crescimento: o bem-estar físico e desporto (não competitivo); a área cognitiva articulada de alto nível académico; a área social e multi- cultural; as artes; a ecologia; as ciências aplicadas (produção e workshops) e o desenvolvimento pessoal.

Depois de ter merecido aprovação do Agrupamento de Escolas Montelongo, onde surge integrado, o projeto aguarda aprovação do Ministério da Educação e ganha força no âmbito da autonomia e flexibilidade curricular defendidos pelo Governo.
Segundo os responsáveis pelo projeto, cerca de vinte alunos estão já na lista de interessados a integrar a turma, a maior parte proveniente de fora do concelho de Fafe, como Guimarães, Vizela, Braga, Barcelos e Póvoa de Varzim. “Algumas famílias mostraram mesmo interesse em virem para cá viver, pela oportunidade de educarem os seus filhos desta forma inovadora”, revelam ao Expresso de Fafe.

Os responsáveis sublinham que esta é uma escola pública para qualquer criança dos 3 aos 13 anos, mas alertam que “não é uma escola para qualquer pai, que deverá estar alinhado com os princípios aqui defendidos”.

O projeto é um dos setes do género a implementar em Portugal, com o impulso e orientação do especialista em educação Professor José Pacheco, que esteve recentemente em Fafe no âmbito do “Ciclo de Encontros FAFéDUCAÇÃO”.

INE confirma crescimento do PIB de 1,8%. Travagem nas importações impede abrandamento

Sónia M. Lourenço, in Expresso

O Instituto Nacional de Estatística confirmou esta sexta-feira que a economia portuguesa cresceu 1,8% no segundo trimestre do ano. Um ritmo idêntico ao trimestre anterior. O investimento abrandou, depois de ter sido a estrela no arranque do ano, mas a travagem a fundo das importações sustentou a expansão do PIB

Está confirmado. A economia portuguesa resisitiu à degradação da conjuntura internacional e cresceu 1,8% no segundo trimestre em termos homólogos, revelam os dados do Instituto Nacional de Estatística (INE), publicados esta sexta-feira.
Com os receios de uma nova crise global a subir de tom, o Produto Interno Bruto (PIB) manteve o mesmo ritmo de expansão dos primeiros três meses de 2019. Resta saber como evoluirá a eocnomia durante o Verão e, aí, a informação ainda é muito escassa.



“Cães que Ladram aos Pássaros”, de Leonor Teles: cinema que denuncia e comove

in Comunidade e Cultura

A realizadora Leonor Teles, de 27 anos, mostra que já encontrou um equilíbrio cinematográfico perfeito (difícil de se chegar) entre o afectivo e o político no seu quarto filme, “Cães que Ladram aos Pássaros”. A curta-metragem estreia-se mundialmente no Festival Internacional de Cinema de Veneza, nesta quinta-feira (29). Com outras exibições nos dias 5 e 7 de setembro, ela integra a secção competitiva Horizontes (veja detalhes).
Após falar do preconceito e da discriminação contra os ciganos nas curtas bem pessoais “Rhoma Acans” (2012) e “Balada de um Batráquio” (2016, Urso de Ouro em Berlim), Leonor segue agora o mesmo modelo da sua primeira longa-metragem, a maravilhosa “Terra Franca” (2018).

“Cães que Ladram aos Pássaros”, de Leonor Teles

Ao misturar a narrativa de documentário com trechos de ficção, ela escolhe filmar novamente a rotina de uma família comum portuguesa que é impactada por políticas locais. Enquanto a guerreira comunidade piscatória é tema de “Terra Franca”, “Cães que Ladram aos Pássaros” traz a história da família Gil, representada pela mãe Maria e os quatro filhos Vicente, Salvador, Mariana e António. Na curta de vinte minutos de duração, eles são obrigados a sair da casa no centro do Porto por causa da especulação imobiliária que se agravou em 2018.

Sim, a gentrificação chegou ao Porto. A procura acelerada de turistas por casas no Centro Histórico faz com que os edifícios antigos sejam destruídos – e os antigos moradores despejados – para a construção de hotéis, alojamentos ou apartamentos com preços desmedidos. Como é possível ver no noticiário, estes valores são o suficiente para que alguns senhorios se esqueçam de que ainda há pessoas a receber salário mínimo em Portugal.
Numa das cenas mais realistas do filme, Vicente vai com a mãe visitar um apartamento que está para arrendar. O senhorio a enche de perguntas e de comentários desnecessários e inconvenientes sobre sua vida. Desde “És portuguesa mesmo? Tens fiador?” a “Quatro filhos é muito este espaço” e “Onde está o marido?”.

Então, o que deveria ser apenas as férias de verão do adolescente Vicente transformam-se num momento de viragem para a vida adulta. O que deveria ser apenas um passeio de bicicleta pela cidade é interrompido por pensamentos depressivos pois a cidade está irreconhecível (“dois guindastes ali, mais dois por lá”, diz o portuense). Ele não sabe se ri ou se chora. Interessante registar que essa curta foi financiada pela Câmara Municipal do Porto no âmbito do projecto Cultura em Expansão, numa residência artística que a realizadora, que nasceu em Vila Franca de Xira, fez por um ano na cidade.

Leonor sabe captar de forma comovente problemas pessoais que acabam por ter a ver com todos. Detalhes são importantes para o seu cinema, que emociona e denuncia o que se passa no país. Portanto, esperamos muito que essa história possa vir a ser argumento de uma próxima (e segunda) longa-metragem da carreira de Leonor.

28.8.19

Tomás Magalhães e Catarina Aires. “Temos medos que são quase ofensivos” para um sem-abrigo

Laurinda Alves, in o Observador

Abandonaram outros projetos, apaixonaram-se e ajudaram perto de 30 mil sem-abrigo na Índia. Tomás e Catarina contam a Laurinda Alves como a perspectiva muda junto de quem dorme "de cabeça no passeio".

Conheceram-se por causa de um post no Facebook “abençoado” pelo Dalai Lama e rapidamente perceberam que tinham um mundo em comum: a urgência de sair da vida padronizada, uma sede de fazer a diferença na vida dos outros. Criaram a Kolkata Monsoon Relief, associação sem fins lucrativos, que tem uma equipa de voluntários e mecenas, graças aos quais puderam ajudar cerca de 30 mil pessoas que vivem “com a cabeça nos passeios” de Calcutá, vítimas das monções na Índia. Usam um sitar, instrumento indiano, para angariar fundos e distribuem kits de sobrevivência. Mapearam todos os sem-abrigo e tornaram os dados públicos, para que outras ONG humanitárias os possam usar .

Catarina Aires deixou para trás o sonho de se tornar bailarina quando este se transformou em fardo. Tomás Magalhães partiu à procura de si próprio depois do mestrado em Nanotecnologia. São os convidados “Imperdíveis” de Laurinda Alves, o programa da Rádio Observador, aos domingos, às 11h.

[Tomás Magalhães e Catarina Aires já ajudaram 30 mil indianos com uma cítara:]

Catarina e Tomás, peço a cada um que se apresente.
Catarina Aires (C): O meu nome é Catarina Aires e sou do Porto. Conheci o Tomás há dois anos e foi há dois anos que também me apaixonei pelo projeto que ele criou sozinho. E há quase três anos que andamos numa aventura: ir para a Índia uma vez por ano. Neste momento, também estou a terminar a minha licenciatura em jornalismo. Sou professora de dança, de ballet clássico, contemporâneo e também gosto muito de cantar. E é isto.
Então já vamos falar sobre esses talentos. Tomás, pedia também que te apresentasses.

Tomás Magalhães (T): Sou o Tomás Magalhães, estudei Física e depois fiz um mestrado em Nanotecnologia. Fui empreendedor for profit durante uns anos, montei umas empresas e correram bem. Depois, a certa altura da minha vida, fui viajar e um bocado à procura daquilo que queria fazer a seguir. E, quase sem querer, montei este projeto que ajuda os sem-abrigo de Calcutá.

Como é que se chama o projeto?
T: Chama-se “Kolkata Monsoon Relief”.
Ou seja, vocês levam alguma ajuda, algum apoio, algum alívio aos pobres, entre os mais pobres de Calcutá.

T: Exato.
E o que é que fazem?

C: O primeiro ano em que fui foi no ano passado e criámos uns sacos, que entregamos durante a noite.
Uma espécie de um kit.
C: Sim, uma espécie de um kit. Dentro do saco temos uma rede mosquiteira, para proteger de picadas de mosquitos…

Isto tudo no tempo das monções, não é?
C: Antes de as monções acontecerem. Um telhado de plástico para os proteger quando a chuva vier.
Porque estamos a falar de pessoas sem-abrigo, que vivem na rua.

C: Famílias e muita, muita gente que vive na rua, com a cabeça no passeio sem condições nenhumas. Mais um kit de primeiros socorros e um livro para crianças.
Uma espécie de alfabeto e de um manual para princípios básicos de higiene e de saúde.

T: Sim, cada artigo dentro do kit tem uma função muito própria. A lona, que foi a primeira ideia, é para proteger estas pessoas da chuva; a rede mosquiteira é para ajudar a proteger da malária e do dengue e também dá algum conforto; o kit de primeiros socorros evita que aconteçam amputações absolutamente desnecessárias. Quem já passou algum tempo na Índia vê muita gente amputada e, às vezes, aquilo é uma picada de mosquito…
Que infetou…

T: Ou um tropeço [que causou uma ferida] que eles foram deixando infetar e só têm atenção médica quando já só dá para amputar. O kit de primeiros socorros é para tentar evitar essas situações. E depois, finalmente, o livro é para as crianças mais novas começarem a ser expostas ao alfabeto inglês, ao alfabeto bengali, tabuada e alguns bons costumes de higiene.

Há bocadinho a Catarina disse “as pessoas dormem com a cabeça no passeio”, ou seja, não há uma almofada, não há teto, não há casa, não há cama. Pais, avós, netos, filhos, a família inteira dorme com a cabeça no passeio. Foi essa visão da miséria extrema, da pobreza mais pobre e mais despojada que vos fez agir?

C: Sim, quando o Tomás foi sozinho, quando o conheci, ele tentou explicar-me o que viu e eu, se calhar, não percebia bem o porquê de ele ter iniciado isto sozinho. Porque, de facto, Calcutá é assustador para quem é estrangeiro e para quem não conhece o que é viver ali. Só quando eu fui é que consegui perceber o que o Tomás estava a dizer. E, de facto, dói, dói olhar.
Para tanta miséria, tanto despojamento. Ou seja, as pessoas não são só despojadas e despidas de bens mas também de dignidade e de tudo o que é próprio do ser humano.

C: Aceitam a sua condição. Mas nós, que conhecemos e sabemos que há outras formas de viver, com melhores condições, acho que aceitamos pior do que eles.

Tomás, o clique foi este, não é? É ver a miséria, perceber o que se pode fazer e agir. Podemos voltar aí e perceber como é que tudo aconteceu?

T: Decidi viajar um ano e sabia que metade desse ano queria passar em Calcutá, na Índia. Comecei pelo norte, pelos Himalaias, e acabei por visitar quase todos os cantos da Índia nesses seis meses. Entretanto, fui fazendo voluntariado. Depois disso fui viajar para outros sítios, nomeadamente a Austrália e Malásia, e sabia que quando voltasse para a Índia mais um mês seria para aprender sitar, porque tinha decidido nessa altura começar a levar mais a sério [o estudo do instrumento indiano].

Estava encantado com o sitar.

T: Exatamente, era isso. Já era encantado com o sitar há muitos anos, sem nunca ter tocado.
Porquê?

T: Pelo som. E acho que é um instrumento que, sozinho, nos consegue comunicar muitas camadas de coisas de uma forma muito profunda. Sei lá, um violino a tocar sozinho também é muito bonito, também nos fala de muito, não é? E também adoro. Aliás, quando era mais novo tocava violino. Mas o sitar era talvez por causa do reverb.

Mas, então, fechando o parênteses em relação ao sitar…

T: Então, voltei para Calcutá. Tinha feito um amigo na noite de Natal, da primeira vez que tinha estado em Calcutá, e reencontrei-o lá. Um dia estava a andar com ele ao meu lado e passei por uma família. Estava a chover muito. Eu já os conhecia de passar lá e eles chamaram-me e pediram-me uma lona para se protegerem da chuva. Mostraram-me que dentro do pequeno barraco deles estava a cair muita água. Tinham três filhos pequeninos. Eu disse: “Claro que sim, quanto é que isso custa?” Eram 120 rupias, se não me engano, que é para aí um euro e meio. Disseram-me onde se comprava, fui ao mercado, comprei essa primeira lona, voltei e entreguei.

E a primeira reação à primeira entrega, para mim, foi absolutamente inesquecível. Porque eu entreguei-lhes a lona e a mãe dessa família, que se chama Pooja, ficou contente, mas percebi que havia ali qualquer coisa que não estava bem. Ela não estava assim tão feliz. Então aproximei-me e perguntei: “O que é que se passa?” E ela: “Ah, não queria dizer porque não queria parecer mal agradecida, mas os ratos gostam muito de comer esta lona específica, por isso não é a melhor”. E eu [pensei]: “Caramba, a realidade destas pessoas”.

O problema dela é o rato mastigar esta lona que parece mais palha. Então disse: “Olha, Pooja, vem comigo, vamos ao mercado e tu vais-me dizer qual é a melhor lona de todas”. E assim, desde o segundo dia, comecei a envolver os próprios sem-abrigo na resolução dos seus problemas. Que é muitíssimo importante, porque não falta aí gente com ótimas intenções, mas a falta de contacto…
"Ajudei a primeira [família] e depois pensei: 'Vou ajudar as vinte desta rua com o meu dinheiro. Vou filmar e pôr no Facebook'. (...) Nesse primeiro ano angariámos mais ou menos oito mil euros e conseguimos ajudar duas mil famílias, que foi uma surpresa enorme para mim."

No fundo, dão aquilo que acham que o outro precisa, mas não necessariamente aquilo que os outros realmente precisam.
T: Este kit que fizemos foi com eles. A única coisa que não foi um sem-abrigo a sugerir foi o livro, e acho que isso é porque eles não têm sequer noção da importância da educação. Como a educação pode levar tão longe.
O que é que aconteceu depois? Voltaste a Portugal, ao Porto, tanto quanto julgo saber, e ficaste sempre a pensar “vou voltar e vou criar qualquer coisa”.

T: Não, não. Foi nessa primeira vez, em que eu ajudei uma família. Aliás, ajudei a primeira e depois pensei: “Vou ajudar as vinte desta rua com o meu dinheiro”. Nessa altura só entregava o livro, a rede mosquiteira e a lona. [Pensei:] “Vou filmar e pôr no Facebook”, porque apercebi-me que com quatro euros — hoje em dia cinco, por causa do kit de primeiros socorros — podia ajudar uma família destas. Então fiz um vídeo, pus no meu Facebook e não sei se posso dizer que ficou viral, mas teve pelo menos atenção suficiente para…
Para imensas pessoas quererem ajudar e quererem contribuir.

T: Exato, nesse primeiro ano angariámos mais ou menos oito mil euros e conseguimos ajudar duas mil famílias, que foi uma surpresa enorme para mim. Aliás, no fim desse vídeo eu escrevo “let’s help hundreds of families”, “vamos ajudar centenas de famílias”, e acabou por ser milhares.
Criei então uma página, dei este nome e as coisas muito naturalmente foram crescendo. Acho que as coisas mais bonitas na vida são essas, as que acontecem naturalmente.
Tomás e Catarina são dois jovens, apaixonados por si, um pelo outro, mas sobretudo apaixonados pela vida e pelos outros. Quem vos conhece diz que cada um de vocês sente que os outros estão sempre primeiro. E que tudo o que vocês podem fazer para ajudar, fazem. Catarina, o que é que te apaixonou no Tomás?

C: Essa pergunta… Várias coisas, por acaso. No nosso primeiro encontro, eu lembro-me de me apaixonar pelos olhos dele, este azul…
Atlântico…

C: Atlântico, que transmite muita paz. Nós conseguimos ver muito do que é outra pessoa lá dentro pelo olhar. E no Tomás, não sei, senti familiaridade, senti-me um bocado em casa, logo no início, e entre conversas e natas e um sumo qualquer que pedimos naquela tarde, fomo-nos apercebendo que tínhamos muito em comum. O Tomás também tem um lado muito artístico, e eu também gosto muito desse lado artístico…

Entretanto o Tomás já deu a mão à Catarina [risos]. E eu aproveito a deixa para perguntar ao Tomás: o que é que o fez apaixonar-se pela Catarina?
T: Grande pergunta. Acho que tem tanto, podia escrever um livro sobre isso. Mas da forma mais curta possível, ela é muito genuína e tem muito, muito, muito amor para dar. É incansável o amor dela.
E tem um sorriso contagiante e um olhar que diz tudo, que brilha. Portanto, tudo o que fazem é “with shinning eyes”.

T: É incrível, ela conhece pessoas e passado três minutos já estão a chorar no ombro dela, quase. Ela consegue criar uma ligação com as pessoas que eu nunca vi nada assim.
"As pessoas falam muito sem saber. (...) Nunca fui assediada, nunca nos tentaram assaltar. (...) Mas aproveito sempre, nas relações novas que vou fazendo com mulheres, para perceber o quão oprimidas elas se sentem e tentar explicar-lhes que é importante que elas lutem pela sua liberdade e que há muito mais do que o que elas, se calhar, conhecem."

No vosso projeto só há rapazes, só há homens, a Catarina é única rapariga, é a única mulher. Isso é fácil ou é difícil, Catarina?
C: Às vezes é difícil…

T: Tu és a menina.

C: Eu sou a menina e já percebi que é muito importante eu assumir o meu papel de mulher. E consigo… Eles têm todos muito respeito por mim, mas admito que passado uma semana digo às minhas amigas ou à minha mãe: “Ai, estou com saudades, assim, de ter uma conversa de mulheres.”

Mas num país como a Índia, onde as raparigas culturalmente estão hierarquicamente abaixo do homem, onde elas não têm muitos direitos, onde, infelizmente, ainda há violações coletivas em que os violadores não são castigados… É duro ser mulher lá, entre homens?

C: Já tinha ido à Índia antes de conhecer o Tomás, aliás, nós conhecemo-nos também por causa da Índia. E achava que ia ser muito pior. Cortei o meu cabelo muito pequenino antes de ir pela primeira vez.
Para, no fundo, cortar um sinal de feminilidade.

C: Sim. E tapei-me muito, tapei os ombros, a cabeça, mas acho que o medo que eu senti antes de ir desapareceu quando lá cheguei. Fui com a minha tia Inês, foi ela que me convidou para ir para naquela aventura, e lá percebi que não tinha que ter medo. As pessoas falam muito sem saber. Já não tapo tanto os ombros, já vou de cabelo solto e eles respeitam-me. Nunca fui assediada, nunca nos tentaram assaltar. Há o olhar e eu ou me habituo ao olhar e não tenho de me tapar toda ou, se me sentir desconfortável perante certos olhares, tapo-me. Mas aproveito sempre, nas relações novas que vou fazendo com mulheres, para perceber o quão oprimidas elas se sentem e para tentar explicar-lhes que é importante que elas lutem pela sua liberdade. E que há muito mais do que o que elas, se calhar, conhecem.

E elas…há uma abertura para isso?

C: Há, há uma abertura. Mas às vezes a língua é um obstáculo, é um entrave.
Um bocado este “women for women”, não é? Mulheres pelas mulheres, é importante para elas de certeza. Voltando ao projeto, o “Kolkata Monsoon Relief” existe há três anos?

T: Não, já houve três verões em que fomos para lá trabalhar, ou seja, já houve três edições. Começou em 2017.

Portanto, estas trinta mil famílias foram ajudadas em três entregas.

T: Exatamente, em três épocas das monções.

"Em todas as entregas entrevistámos a matriarca de cada família. Fizemos várias perguntas, desde o nível de educação, quanto ganham por dia, quais são os maiores problemas, profissão dela, profissão do marido, número de filhos, localização GPS. E criámos um mapa de todos os sem-abrigo de Calcutá, todas as famílias."


Acabaram de voltar de lá. O que é que mudou desde as primeiras famílias ajudadas até agora, podem quantificar? Menos amputações, menos doenças, menos malária… Isso é quantificável?

T: Pois, é muito complicado. Umas das dimensões onde gostaríamos de evoluir é na avaliação do impacto da nossa intervenção. Nós temos ideia, mais ou menos, do impacto que aquilo tem na vida das pessoas através de estatísticas sobre mortes com malária e dengue. Sobre amputações não temos. Não conseguimos medir quanto é que estamos a ajudar as pessoas a nível de anos incrementais de qualidade de vida, nem unidades de conforto com a lona. Há coisas que é muito difícil…

Sobretudo em pessoas que vivem na rua e se calhar nem estão no Census.
T: No entanto, este ano fizemos uma coisa que foi, para mim, a parte mais incrível de tudo o que fizemos até agora. Em todas as entregas entrevistámos a matriarca, a mãe de cada família. Fizemos várias perguntas, desde o nível de educação, quanto ganham por dia, quais são os maiores problemas, profissão dela, profissão do marido, número de filhos abaixo de cinco, localização GPS. E criámos um mapa de todos os sem-abrigo de Calcutá, todas as famílias.

Ou seja, vocês têm uma cartografia afinadíssima destas famílias.

T: E são dados abertos, ou seja, qualquer ONG, pessoa, médico, grupos de amigos com vontade de distribuir arroz, o que quer que seja, pode ir ao nosso site, abrir esse mapa e ir ajudar uma família.
Às vezes não ouvem: “Porque é que vão ajudar tão longe invés de ajudar aqui os que estão mais próximos?” O que é que respondem a isso? Ou qual é a demanda interior que sentem para atravessar o oceano e para ir para o outro lado do mundo?

T: Eu em 2015 ou 2016 envolvi-me num movimento que se chama “altruísmo eficaz”. Vamos imaginar que eu hoje, ao sair daqui do estúdio, encontro uma nota de 500 euros no chão e penso: “500 euros de que eu não estava à espera, vou fazer um donativo”. O que o “altruísmo eficaz” nos diz é que devemos aplicar esses 500 euros na intervenção em que conseguimos ter a certeza que ele vai acrescentar mais valor.
Imediato, no fundo, quase sem intermediários. Assim como vocês quando entregam lonas, redes mosquiteiras, percebem que a partir desse dia as pessoas têm teto, digamos assim, e estão protegidas dos ratos e dos mosquitos. É nesse sentido?
T: Não é necessariamente no imediatismo. Por exemplo, se forem a um site que se chama “Give Well” podem ver, dentro desta comunidade do “altruísmo eficaz”, quais é que são as intervenções que têm maior impacto no dia de hoje. Neste momento são redes mosquiteiras…
"Todos os seres humanos valem o mesmo e eu não posso valorizar a vida de um português que eu não conheça mais do que a vida de um indiano que eu não conheça"
Tomás Magalhães
Portanto, tem a ver com o impacto e não necessariamente com o imediatismo.
T: Exato, não tem de ter imediatismo. Neste momento são redes mosquiteiras em África, desparasitar crianças e há uns programas que são até de dar dinheiro diretamente às pessoas.

Mas, para voltar à pergunta: o dinheiro vai mais longe na Índia, muito mais do que cá. E porquê a Índia? Também porque eles lá falam inglês e é praticamente a minha primeira língua, porque nasci em Inglaterra. É o sítio onde consigo negociar, falar com as pessoas, onde posso ter o maior impacto. Ou seja, nasce um bocado de uma perspetiva humanista, que é: todos os seres humanos valem o mesmo e eu não posso valorizar a vida de um português que eu não conheça mais do que a vida de um indiano que eu não conheça, não é?

C: Eu já fiz voluntariado em Portugal e em Calcutá. Lá, de facto, deparamo-nos com as pessoas a viver na rua, é diferente…
Ou seja, aqui ainda há uma entreajuda, uma vizinhança…

C: Ali eles estão esquecidos, percebe? Foram abandonados. Acho que é também muito por aí.

Vocês são do Porto. A vossa formação não teve necessariamente a ver com esta área. Como é que as coisas começaram na vida da Catarina, que também canta e que também dança?
C: Vou começar pelos meus 15 anos, quando entrei no Conservatório Nacional de Lisboa e estive a viver cá três anos. O meu sonho era ser bailarina, clássico e contemporâneo, e mais tarde coreógrafa. Estive cá três anos, foram anos muito bonitos e dolorosos ao mesmo tempo…

Imagino, muito dolorosos…

C: Sim, com os pais lá no Porto, os amigos também…

Mas dolorosos também em termos de treino e em termos de exigência física e emocional.

C: Muito.
É preciso ter muita endurance para manter aqueles níveis de performance.

C: Sim, eu não sabia para o que vinha na altura, mas sei que também me fez muito bem, porque tinha 15 anos e, de repente, estava a passar para o décimo ano. Nós estudávamos de manhã, no Conservatório, Humanidades, Filosofia, Português, História e depois à tarde começavam os nossos treinos físicos intensos em ballet clássico, técnica Vaganova, contemporâneo, jazz, improvisação, criação de espetáculos. As minhas tardes eram passadas a ouvir música clássica e a experimentar o meu corpo.

"Um dia, numa aula de ballet, ao pôr a minha mão na barra e ao esticar o meu pé… parecia que nada fazia sentido. (...) Eu já me perguntava: 'Mas estou a dançar por mim, por paixão, ou simplesmente ando a seguir regras e a ter que ser perfeita aos olhos de um coreógrafo?"

Tocada ali no piano?

C: Sim, apesar de duro foi muito bonito. E depois, quando acabei estes três anos, fiz bastantes audições e entrei em Nova Iorque e em vários sítios do mundo, mas acabei por ir para a Holanda.
Para Roterdão?

C: Sim, para a University of Codarts. Fui para Performing Arts. Passado um ano e meio, estava tudo a correr muito bem até que o meu avô morreu num acidente de carro e eu comecei a questionar a minha vida de uma forma intensa. Tinha vinte…

Agora tem vinte e quatro.

C: Quando isso aconteceu vim ao Porto, depois voltei para continuar a minha vida. E houve um dia, numa aula de ballet, que ao pôr a minha mão na barra e ao esticar o meu pé… parecia que nada fazia sentido, eu estava a olhar pela janela e não queria…

Como se fosse espectadora da sua vida…

C: Estava a ver-me de fora, a colocar muitas questões e os meus pais, a minha família, estavam a chamar mais por mim e não esta vida de espetáculo contínuo. Já me perguntava: “Mas estou a dançar por mim, por paixão, ou simplesmente ando a seguir regras e a ter que ser perfeita aos olhos de um coreógrafo, aos olhos do meu professor de ballet?”

A não comer quase nada, não é?

C: A comer muito pouco e, lá está, a tentar chegar a uma imagem perfeita que não existe.

E um bocado narcísica também, não é?

C: Sim, bastante narcísica.

Uma pessoa vive ao espelho.
C: Vive ao espelho e eu não estava a gostar da pessoa que estava a ser naquele momento, estava a ser tão dura comigo própria…

Ou seja, não comer, fazer exercício, ter o corpo perfeito, tudo isso é…

C: Tudo muito intenso…

Ou temos essa demanda interior e essa vocação ou então…

C: Essa vocação que também tinha que ser bastante competitiva. E eu não sou, gosto de fazer as coisas por paixão.

Percebe-se [risos].

C: Sou uma apaixonada por arte, não quero ter que fazer nada por obrigação e a dança tinha-se transformado nisso. Estava a ter uma espécie de inferno e estava farta. Então pronto, foi rápido: decidi parar, decidi voltar para a família.

Ou seja, o seu avô morreu e de alguma forma…

C: Intrometeu-se.

De alguma forma salvou-a…

C: Eu até dancei no funeral dele.

Ele adorava vê-la dançar?

C: Sim, ele gostava muito. Dizia que não queria ver os espetáculos, mas quando ele morreu encontrei quatro pontas de ballet em forma de sabão nas gavetinhas dele. E ele ligava-me sempre a marcar pedicure, queria que eu fosse sempre ver os meus pés, porque achava que eu ia apanhar uma doença…

T: Podologista, não é?

C: Exato.

"Caí numa espécie de vazio profundo. E sabe o que é que aconteceu? Eu apercebi-me de que a coragem que eu tive ao desistir da dança foi imensa, muito mais do que eu achava que tinha."
Catarina Aires

Porque ele achava que ia ter sempre os pés em sofrimento, digamos assim.

C: Sim, ele estava sempre super preocupado. Voltei, foi uma decisão que não foi muito ponderada, mas acredito que o nosso coração é mais forte do que a nossa razão e o meu coração estava a dizer “volta, sai daqui, sai da Holanda, volta para as tuas raízes, volta para os teus pais e para os teus amigos”. Eu voltei e foi um choque, foi assim um baque. Uma pessoa mudar de uma vida em que está sempre a ser posta à prova e, de repente, isso tinha acabado.

E caiu assim numa espécie de um vazio…

C: Caí numa espécie de vazio profundo… [risos]. E sabe o que é que aconteceu? Apercebi-me de que a coragem que eu tive ao desistir da dança foi imensa, muito mais do que achava que tinha.
Exatamente ao contrário, é preciso ter muita coragem, é verdade.

C: Muitos bailarinos e amigos meus ligavam a perguntar o que é que eu estava a fazer, como é que tinha tido coragem para desistir, como é que se desiste… E eu não sabia. É quando o coração fala e nós tomamos consciência daquilo que precisamos que, de facto, mudamos. Não temos que ser só uma coisa e acho que não conseguimos ser apaixonados por uma coisa para o resto da nossa vida. A paixão…

T: Hey!

C: Não… [Risos].

T: Pronto, acho que vou abandonar… [Risos].

Tomás, eu ouvi bem, é “não se pode ser apaixonado por uma coisa”, não é por uma pessoa.

C: Mas o teu já se tornou em amor, e amor é eterno, por isso… [Risos] Pronto, para terminar, que já estou a falar há muito tempo…
Não. É bom porque há muitas pessoas que têm agora vinte anos, ou vinte e pouco, e que têm exatamente esta situação de não saber por onde é que hão de seguir, o que é que hão de optar. É preciso ter coragem para seguir e é preciso ter coragem para desistir. Portanto, estes testemunhos ajudam imenso e nem sabe a Catarina quanto.

C: Uma coisa que eu percebi: é muito importante nós sabermos olhar para nós e perceber o que é que se está a passar.

E se calhar olhar para nós e sabermos o que é que não queremos, o que é que não é para nós.

C: Mas, às vezes, só a experimentar é que percebemos o que não queremos. Por isso, acho que nunca devemos ter medo de experimentar coisas diferentes ou coisas que os pais ou os amigos acham que não são para nós…
Portanto, uma pessoa gerir as expectativas próprias e não em função das expectativas dos outros.

C: Isto é muito importante, porque se eu não me tivesse ouvido aos quinze anos, se eu não tivesse experimentado dançar e se não tivesse ido fazer audições e lutar por isto…
"Saber viver é, de certa forma, sabermos ter presentes, simultaneamente, a nossa insignificância e a nossa preciosidade. Insignificância porquê? Porque somos um em biliões, mesmo o nosso planeta é um sítio arbitrário do cosmos. E, ao mesmo tempo, cada momento é precioso e cada vida é preciosa. Porquê? Porque é a única que eu vou ter. Ou, pelo menos, a única que eu tenho a certeza que vou ter."

Tomás Magalhães
Não tinha legitimidade para desistir e ter a força para continuar noutro caminho.

C: Exatamente. E, se calhar, hoje eu dizia à minha mãe: “Olha, por tua causa sou frustrada porque não experimentei a dança e hoje não sou bailarina”. Não, a culpa nunca é de ninguém, é apenas nossa.
T: Mas isso é outra coisa, que na Índia ainda me põe a pensar muito. Toda a gente tem um amigo que, sei lá, é advogado ou consultor e que está a tentar não ser isso há dez anos, não é? E uma das razões para não conseguir desistir é o medo, certo? Só que os medos que elas têm, ao lado destas pessoas que nós vemos na Índia, são medos quase ofensivos. Ou seja, muitas vezes olho até para amigos que são nossos trabalhadores lá na Índia e penso: “Se estas pessoas tivessem um décimo da oportunidade da maior parte das pessoas que eu conheço em Portugal, não tenho a menor dúvida que elas só fariam as coisas pelas quais eram apaixonadas. Nós temos muita riqueza social, somos do primeiro mundo.

Sim, nós não somos milionários, somos bilionários.

T: Exato, temos riqueza social, temos mecanismos que nos protegem de desgraças grandes e de repentes, pelo menos. Não somos o melhor país do mundo nisso, mas temos uma almofada social gigante e muitas vezes não temos noção. Não basta ver pobrezinhos na televisão. É preciso…

Tocá-los e deixar-se tocar.
T: Sim, conversar e perceber os problemas deles.
Falou nesta riqueza, neste tesouro que são as relações sociais, a rede, a teia. Vocês têm os dois famílias muito grandes. O Tomás tem sete irmãos, portanto vocês são oito. E a família da Catarina também é grande e já falaram do avô que partiu. Pergunto ao Tomás se posso falar da mãe, que partiu também?

T: Claro.

Posso ou custa-lhe?

T: Não, não. O nome da associação é o nome da minha mãe.

Como é que o nome da associação tem o nome da sua mãe e o que é que aconteceu lá para trás?

T: Antes disso, há uns tempos fui falar à Casa da Música, n’”O Que De Verdade Importa”, e é uma pergunta muito difícil de se responder. Eu comecei por dizer às pessoas que o melhor começo é percebermos que nada importa. E as pessoas ficam “Uau, convidam-no para vir aqui falar e ele diz que nada importa?” Porquê? Porque acho que saber viver é, de certa forma, sabermos ter presentes, simultaneamente, a nossa insignificância e a nossa preciosidade.

Insignificância porquê? Primeiro porque somos um em biliões, mesmo o nosso planeta é um sítio arbitrário do cosmos. Toda a gente vai ser esquecida, não é? Até o Tolstoi — que, no fim da vida, teve uma depressão quando se apercebeu que tinha livros dele em todos os cantos do mundo, mas que um dia, quando a humanidade acabasse, ele seria mais um que foi esquecido.

E, ao mesmo tempo, cada momento é precioso e cada vida é preciosa. Porquê? Porque é a única que eu vou ter. Ou, pelo menos, a única que eu tenho a certeza que vou ter. Acho que comecei a pensar muito nestas coisas quando tinha 12 anos e a minha mãe morreu num acidente de automóvel.

Vocês eram quatro irmãos?

T: Éramos quatro, a minha irmã mais nova tinha um ano e meio.

E a sua mãe morreu num acidente de carro?

T: Sim, na África do Sul.

E isso foi brutal, como é óbvio.

T: Sim, foi. A vida desmontou-se. Lembro-me quando o meu pai nos deu a notícia, à minha irmã e ao meu irmão João, foi assim uma reação, parecia que tinha… Fiquei drogado, não sei, fiquei tonto e toda a realidade… Parece que se inverteu.

Uma espécie de uma bolha.

T: Sim, porque uma mãe é… isto está provado, não é? As crianças muito novas não conseguem distinguir o “eu” do da mãe e do pai, é uma espécie de existência mútua. “Eu, mãe e pai.”
Uma existência simbiótica.

T: Exatamente. Depois a criança começa a perceber que tem identidade. Aos 12 anos eu já sabia que era uma pessoa, mas acho que, por causa da morte da minha mãe, comecei a pensar muito nessas coisas desde muito cedo.
E teve a sorte de o seu pai voltar a casar e ter mais quatro filhos e de serem uma família muito grande, muito unida e muito feliz.

T: Exatamente, foi muito importante.

E a sua mãe ficou no seu coração, como é óbvio, e o nome dela está no seu projeto.

T: Sim.

Onde é que está o nome dela?

T: A associação que abrimos cá em Portugal chama-se Associação Stella e o único projeto desta associação, neste momento, é o “Kolkata Monsoon Relief”. Mas eu e os meus irmãos já há uns anos tínhamos pensado que um dia era bom termos uma associação com o nome da nossa mãe. Então tomei a iniciativa. E agora pode haver mais projetos dentro desta associação.

Qual era a maior herança da sua mãe, o maior legado? Do testemunho dela, da sua maneira de ser?

T: Acho que é o Pico, o João, o Tomás e a Sofia. São os quatro filhos dela.

Quais são os vossos projetos de futuro? Agora falando em termos de casal, vocês têm uma certa diferença de idades.

C: Sete.

E continuam a pensar em ter projetos de voluntariado, esta ONG, esta associação, mas no futuro mais imediato o que é vocês estão a pensar fazer? Angariar mais dinheiro para ajudar mais famílias, diversificar os projetos?
C: Claro que estamos a pensar expandir o projeto “Kolkata Monsoon Relief”, estamos juntos nisto e vamos ficar juntos nisto até ao fim.

T: Temos várias ideias. Gostávamos de ter mais artistas a vir connosco, para depois, talvez em Portugal e na Índia, fazer exposições, quer seja de fotografia, pintura, poesia, o que for.

"Há muitas crianças que têm a hipótese de ir à escola, mas os pais, que vivem no passeio, não percebem a importância de levar a criança todos os dias. Ou, se calhar, alguns nem têm dinheiro para o autocarro. Uma das ideias que tivemos foi criar uma espécie de autocarro escolar"


E música também?

T: Música já estou eu, mais ninguém pode [risos]. Estou a brincar, música claro que sim. Nós agora temos várias parcerias com várias ONG lá. Temos uma parceria com uma ONG de saúde, onde entregamos as pessoas que encontramos em pior estado; temos outra com uma escola que se chama “Future Hope”, que é um projeto incrível começado por um inglês… Há muitas crianças que têm a hipótese de ir à escola, mas os pais, que vivem no passeio, não percebem a importância de levar a criança todos os dias. Ou, se calhar, alguns nem têm dinheiro para o autocarro para levar o filho. Então, uma das ideias que tivemos este ano foi: se nós conseguíssemos criar uma espécie de autocarro escolar para pegar em algumas das crianças…

Que recolhesse as crianças todas e as deixasse na escola e depois as fosse apanhar.

T: Exato. Seria complicado, porque elas não estão sempre no mesmo sítio do passeio. Há escolas que levam, acolhem crianças, ficam lá internadas, mas há pais que não querem fazer isso.
Claro, e hoje em dia…

T: Além disso há a hipótese de estender geograficamente para Bombaim ou para Deli, há a hipótese também de nós montarmos lá uma escola pequena, de montarmos uma escola móvel…

C: Era perfeito.

Se bem vos conheço, entre o sonho, a hipótese e a concretização é um passo muito curto. Sei que, de alguma forma, foi por causa do Dalai Lama que vocês se conheceram e depois se apaixonaram, é verdade? Por causa de uma fotografia que a Catarina publicou no Facebook em que estava com o Dalai Lama…

C: Temos ambos fotos com o Dalai Lama, em tempos diferentes da nossa vida, mas foi o marido da minha irmã, da Mariana Aires, o Afonso Salcedo de Guimarães, que num post que o Tomás publicou escreveu o meu nome, e o Tomás mandou ali uma mensagem… e “zuca”.

T: Grande Afonso. Quando ia os primeiros seis meses para a Índia, saquei da internet um mapa grande da Índia, publiquei no meu Facebook e escrevi: “Pessoal, vou para a Índia seis meses, vou estar a fazer muito voluntariado, mas também quero visitar coisas. Dicas?” Muitos amigos escreveram coisas, uma das pessoas que escreveu foi o Afonso Salcedo, escreveu “Catarina Aires e Inês Aires”, que é a Catarina e a tia dela.
Que tinham ido à Índia e que tinham estado com o Dalai Lama.

T: Exatamente. Que já tinham ido.

Então, de certa forma, o Dalai Lama também…
C: Juntou-nos…

Para tratamento igual entre os sexos: Universidade Politécnica cria Núcleo de Género

in a Verdade on-line

Para desenvolver acções com vista ao tratamento igual para ambos os sexos, em relação a qualquer tipo de actividade, particularmente na esfera universitária, a Universidade Politécnica criou, recentemente, o Núcleo de Género, cujas políticas serão aprovadas nos Conselhos Universitários, a realizarem-se em Outubro próximo.

Trata-se de um núcleo que vai incidir as suas actividades sobre três pontos principais, nomeadamente as questões de género, o assédio e a protecção às minorias.

Para a directora das Bibliotecas da Universidade Politécnica, Sara Laísse, mais do que elaborar uma política sobre o género, a maior instituição privada de ensino superior, no País, pretende dar visibilidade à questão da equidade do género a vários níveis da universidade e fazê-la constar dos processos do acesso dos alunos à universidade, da selecção dos colaboradores e da atribuição de cargos de responsabilidade.

“Enquanto a política não é aprovada, nós pretendemos sair do papel e começar a desenvolver actividades que possam dar uma perspectiva sobre onde nós queremos chegar, que é garantir que se tenha em consideração a questão da equidade do género, o assédio e a protecção das minorias, nos processos universitários”, referiu Sara Laísse.

Com efeito, o núcleo já está a auscultar a sociedade, para se inteirar das acções desenvolvidas por outras organizações com o intuíto de acrescentar valor àquilo que tem sido realizado em relação à equidade de género, evitando repetições.

Neste sentido, o Núcleo de Género da Universidade Politécnica promoveu, na quarta-feira, 21 de Agosto, em Maputo, uma palestra subordinada ao tema “Mulher e Desenvolvimento: És Capaz de Transformar o Mundo­­­?”. A palestra foi proferida por Sónia Catingue, da Academia 'Girl Move', uma organização que trabalha com jovens raparigas moçambicanas, cujo objectivo é contribuir para a criação de uma nova geração de mulheres, com potencial de liderança para transformar o mundo usando o seu talento.

“Isto funciona através de um modelo de mentoria racional, em que temos jovens licenciadas, denominadas girl movers, que dão apoio a um grupo de três universitárias, constituindo uma equipa que faz mentoria a um grupo de trinta adolescentes em fase de transição do ensino primário para o secundário, passando-lhes a mensagem da importância de continuar na escola”, explicou Sónia Catingue.
Trata-se, conforme realçou, de incutir nos menores, a importância da educação para o seu futuro, com vista a quebrar o ciclo de pobreza de algumas famílias de uma forma programada, para que tenham uma perspectiva de um mundo diferente, uma vez que são capazes de fazer mais do que elas acreditam.

7.8.19

Imprensa: EAPN Portugal distingue jornalismo que analisa a «pobreza» de «forma digna, livre de preconceito»

in Ecclesia

Porto, 07 ago 2019 (Ecclesia) – A Rede Europeia Anti-Pobreza (EAPN) Portugal escolheu as reportagens “Esta escola já não é só para ciganos” e “Esta é uma vitória nossa”, dos jornais ‘Público’ e ‘O Setubalense’, como vencedores do prémio ‘Analisar a Pobreza na Imprensa’.

“O jornalismo sempre teve um papel fundamental no desenvolvimento da vida democrática, denunciando os abusos dos direitos humanos; as notícias sobre pobreza e exclusão social podem, por vezes, ter por base simplificações excessivas e imagens estereotipadas de culpabilização”, afirma a EAPN Portugal em comunicado enviado hoje à Agência ECCLESIA.

Na primeira edição, o prémio de jornalismo ‘Analisar a pobreza na Imprensa’ atribuiu o primeiro prémio, na categoria imprensa nacional, ao trabalho “Esta escola já não é só para ciganos”, da jornalista Ana Cristina Pereira e do fotojornalista Adriano Miranda, publicado no jornal ‘Público’ a 28 de outubro de 2018; na imprensa regional, “Esta é uma vitória nossa”, do jornal ‘O Setubalense’ (de 21 de dezembro), de Ana Martins Ventura e Alex Gaspar.

A EAPN Portugal destaca que o prémio distingue trabalhos que abordem a pobreza e a exclusão social “de forma digna, livre de preconceito e de outras representações negativas”.
No segundo prémio foram distinguidas as reportagens “Um milhão e 700 mil portugueses têm incapacidade. Somos uma sociedade inclusiva?” (2 de dezembro), da jornalista Ana Mafalda Inácio e do fotojornalista Reinaldo Rodrigues do ‘Diário de Notícias; e “Inclusão – Quando as empresas abrem portas à diferença todos saem a ganhar” do Jornal Região de Leiria (22 de novembro), do jornalista Carlos S. Almeida e do fotojornalista Joaquim Dâmaso.

O jornal ‘Público’ venceu também o 3º prémio na categoria imprensa nacional com “Lurdes vive na carcaça de uma antiga escola. Para onde irá agora?”, de Ana Cristina Pereira e Paulo Pimenta, publicado a 8 de novembro, enquanto na imprensa regional foi escolhido o trabalho “Sementes da Globalização”, da jornalista Daniela Franco Sousa e do fotojornalista Ricardo Graça do Jornal de Leiria, com data de 20 de dezembro.
A EAPN Portugal/Rede Europeia Anti-Pobreza informa ainda que o 1.º lugar das duas categorias vai receber um prémio, uma peça do artista plástico João Carqueijeiro.
A cerimónia de entrega dos prémios vai realizar-se às 18h00, do dia 16 de outubro, no Museu Nacional da Imprensa, no Porto, inserida no Fórum Nacional de Pessoas em Situação de Pobreza e Exclusão Social, que vai ter como tema ‘A pobreza é notícia? O papel dos media no combate à pobreza’.

Ao todo foram recebidos 58 trabalhos jornalísticos – 28 nacionais e 30 regionais.

O prémio de jornalismo foi criado em 2010 pela EAPN Áustria; a EAPN Portugal quer “dar-lhe continuidade e alargar o seu âmbito a outras categorias”.

A EAPN – European Anti Poverty Network (Rede Europeia Anti Pobreza) foi fundada em 1990, em Bruxelas, e está em 31 países, nomeadamente em Portugal desde 17 de dezembro do ano seguinte, com sede no Porto.
CB/OC

Salário mínimo e demografia no centro dos programas eleitorais

in RTP

Centenas de páginas com centenas de propostas - umas mais concretas do que outras. Os vários partidos prometeram aumentar o salário mínimo. A natalidade e o envelhecimento ativo ocupam grande parte dos programas eleitorais.

O Salário Mínimo Nacional entra sempre nas campanhas eleitorais e quase sempre com os partidos defenderem um aumento. As diferenças estão no quanto e no como.

O valor mais ambicioso está na CDU: 850 euros. O programa não fixa uma data, mas a medida está inserida naquilo a que a coligação chama de "emergência salarial".

O PSD quer um aumento progressivo que chegue, pelo menos, aos 700 euros no último ano da legislatura. No público e no privado. Sempre negociado na concertação social.

O PS também quer mais Salário Mínimo. Não adianta valores. Apenas refere que deve ser uma subida sustentada, tendo em conta a evolução global dos salários e os principais indicadores económicos.

Para além de um aumento, o Bloco de Esquerda defende a harmonização entre o sector público e o privado. Mas não há referência a valores.

Bloco de Esquerda e CDS ainda não têm o programa fechado. Sobre o Salário Mínimo, os centristas dizem que é uma matéria que deve ser acordada em concertação social.

A demografia é uma das grandes preocupações dos programas eleitorais. Os partidos querem ver mais crianças a nascer e procuram respostas para um país com cada vez mais cabelos brancos.

Da esquerda à direita: alargar e flexibilizar as licenças parentais; aprofundar a partilha desse tempo entre os pais.

O CDS quer ainda que uma parte da licença possa ser gozada pelos avós. O partido defende creches para todas as crianças e para isso o Estado deve criar um regime de contratualização com o setor social e privado.
O PS pretende "estimular" o alargamento da rede de creches e criar o "complemento-creche" - um valor garantido e universal que apoie as famílias a partir do segundo filho.

Aumentar o abono de família até aos seis anos é outra das propostas. Neste capítulo, o PSD quer rever os escalões do abono de família para aumentar o número de beneficiários. A partir do segundo filho o valor será maior. Os sociais-democratas também querem criar uma rede nacional de creches e jardins-de-infância "tendencialmente gratuitos".

No programa da CDU está a construção de uma rede pública de creches: crianças até aos três anos não pagam. A coligação defende ainda Abono de família para todos e uma valorização dos montantes atribuídos.

O Bloco de Esquerda propõe que o horário de trabalho dos pais de crianças até aos três anos seja reduzido e que os direitos sejam alargados para quem tem filhos com doenças crónicas.

Ser sénior não é ser velho. Os partidos sabem disso e querem uma terceira idade mais ativa e menos isolada.

O PSD quer uma transição mais lenta para a aposentação: ou seja, que antes de chegar à idade da reforma seja possível trabalhar a tempo parcial.

Portugal é o primeiro país da UE a legalizar o projeto que combate o abandono escolar

By Daniela Mendes Carvalho, in Comumonline

As Escolas de Segunda Oportunidade têm como objetivo combater casos graves de abandono escolar e consequente exclusão social. Este projeto entra em vigor no próximo ano letivo 2019/2020.

O Ministério da Educação publicou, esta terça-feira, um despacho que reconhece legalmente o projeto das Escolas de Segunda Oportunidade, que trabalham com jovens que abandonaram a escola sem dar por concluída a sua formação. Este modelo destina-se a jovens com mais de 15 anos que tenham deixado a escola há pelo menos um ano e que não tenham qualificação profissional.

O plano já existe há cerca de 11 anos em Portugal, com a criação da Escola de Segunda Oportunidade de Matosinhos, tendo-se desenvolvido mais nos últimos anos. A nível europeu estas escolas surgiram em 1999 após o reconhecimento, por parte da Comissão Europeia, da educação de segunda oportunidade. Portugal é o primeiro país a reconhecer formalmente este projeto.

O secretário de Estado da Educação, João Costa, explica que o despacho publicado vai permitir “institucionalizar um modelo que até agora não tinha enquadramento legal”. João Costa acredita ainda que haverá um alargamento da oferta neste tipo de formação, especialmente em zonas onde existem “focos grandes de exclusão social”, como é o caso da área metropolitana de Lisboa.

Os alunos que frequentem as Escolas de Segunda Oportunidade têm de estar formalmente inscritos num agrupamento de escolas pertencentes à rede pública. Apesar do despacho permitir a adoção de um “modelo pedagógico personalizado” enquadrado legalmente, estas escolas têm que garantir a formação dos alunos nos instrumentos de certificação disponíveis na lei. Os jovens podem integrar os cursos de Educação e Formação de Adultos (EFA), se tiverem mais de 18 anos, ou o Programa Integrado de Educação e Formação (PIEF), indicado para idades dos 15 aos 18 anos em risco de exclusão escolar e social.

Em Portugal, as Escolas de Segunda Oportunidade existem na sua maioria na zona do Porto, encontrando-se espalhadas na Maia, Valongo, Arco Maior e a já referida em Matosinhos. Perto da capital apenas existe uma escola, em Samora.

Embora a taxa de abandono escolar tenha atingido o valor mais baixo de sempre no último ano – 11.8% – o diploma assinado esta terça-feira tem estabelecidas orientações para a criação de um plano a nível nacional que visa dar resposta aos jovens que abandonaram o sistema educativo e estão em risco de exclusão social.
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Educação de segunda oportunidade

Jornalistas do DN Ana Mafalda Inácio e Reinaldo Rodrigues ganham prémio

in DN

A jornalista Ana Mafalda Inácio e o fotojornalista Reinaldo Rodrigues ganharam o 2º prémio de jornalismo "Analisar a pobreza na Imprensa", atribuído pela EAPN Portugal/Rede Europeia Anti-Pobreza, com a reportagem "Um milhão e 700 mil portugueses têm incapacidade. Somos uma sociedade inclusiva?"

Na Semear, um grupo de jovens portadores de uma defiência faz formação para procurar um lugar no mercado de trabalho. Hoje, é diferente de ontem e têm esperança, querem ter.© Reinaldo Rodrigues

Um milhão e 700 mil portugueses têm incapacidade. Somos uma sociedade inclusiva?
A sociedade portuguesa é inclusiva? A pergunta serviu de ponto de partida para o trabalho da jornalista Ana Mafalda Inácio e do fotojornalista Reinaldo Rodrigues que fizeram um retrato da população com deficiência. Histórias na primeira pessoa de quem lida diariamente com esta realidade foram dadas a conhecer na reportagem "Um milhão e 700 mil portugueses têm incapacidade. Somos uma sociedade inclusiva?", publicada a 2 de dezembro de 2018, e que acaba de ser distinguida com o 2º lugar (na Categoria Imprensa Nacional) na primeira edição do prémio de jornalismo "Analisar a pobreza na Imprensa", atribuído pela EAPN Portugal/Rede Europeia Anti-Pobreza.

"Acho que é um trabalho importante a partir do qual tentamos chamar a atenção para uma realidade da sociedade portuguesa que tem estado escondida", diz a jornalista Ana Mafalda Inácio, "grata pelo reconhecimento do trabalho que o DN fez".

"'O medo está na base de todas as formas de exclusão, tal como a confiança está na génese de todas as formas de inclusão'. A frase é de Jean Vanier, o homem que fundou a Arca, L'Arche, a comunidade no norte de França que acolhe homens e mulheres portadores de deficiência mental. E que ao longo do trabalho que o DN agora inicia, com um ciclo de reportagens, histórias na primeira pessoa, de crianças, jovens, pais, que lidam com esta realidade, nos remeteu para uma única questão: do que temos medo? "Ou melhor, do que tem medo a sociedade portuguesa quando se olha para o mercado de trabalho e a taxa de desemprego com pessoas com deficiência aumentou nos últimos anos, quando a taxa da população geral diminuiu? Do que tem medo a sociedade quando as queixas por discriminação a pessoas com deficiência aumentaram em 2017, do que se tem medo quando ainda nas escolas, nas empresas, nos transportes, nos cafés, na rua, não somos ainda capazes de olhar para os outros não pela sua incapacidade mas pela pessoa que são?", escreveu Ana Mafalda Inácio no artigo que foi agora premiado.
"Tentamos alertar a sociedade portuguesa para uma realidade que afeta mais de um milhão de pessoas e que há muito está escondida", refere a jornalista.

Um milhão e 700 mil portugueses têm incapacidade. Somos uma sociedade inclusiva?
Na Categoria de Imprensa Nacional, o 1º lugar foi atribuído à reportagem "Esta escola já não é só para ciganos", dos jornalistas Ana Cristina Pereira e Adriano Miranda, do jornal Público, e 3º lugar foi para "Lurdes vive na carcaça de uma antiga escola. Para onde irá agora?", também da autoria de Ana Cristina Pereira, mas com o fotojornalista Paulo Pimenta.

"Este é um prémio importante que destaca trabalhos que mostram uma realidade escondida da sociedade portuguesa", realça Ana Mafalda Inácio, referindo-se às reportagens que também foram premiadas nesta primeira edição do prémio de jornalismo "Analisar a pobreza na Imprensa".

A iniciativa tem como objetivo distinguir trabalhos jornalísticos que abordem a pobreza e a exclusão social "de forma digna, livre de preconceito e de outras representações negativas sobre estas matérias". Em 2018, foram selecionados e analisados pelos 18 Conselhos Locais de Cidadãos 28 notícias de âmbito nacional e 30 notícias de âmbito regional.
Na Categoria de Imprensa Regional, Ana Martins Ventura e Alex Gaspar (O Setubalense) foram distinguidos com o 1º lugar com a peça "Esta é uma vitória nossa". Carlos Almeida e Joaquim Dâmaso (Jornal Região de Leiria) com o trabalho "Inclusão - Quando as empresas abrem portas à diferença todos saem a ganhar", e Daniela Franco Sousa e Ricardo Graça (Jornal de Leiria) com "Sementes da Globalização" foram premiados com o 2º e 3º lugar, respetivamente.

Nas duas categorias, nacional e regional, o primeiro lugar vai receber como prémio uma peça assinada pelo artista plástico João Carqueijeiro. O segundo e o terceiro lugar serão agraciados com um galardão simbólico.
A atribuição dos prémios está prevista para o dia 16 de outubro, a partir das 18:00, no Museu Nacional da Imprensa, no Porto.

Cidade sueca obriga mendigos a tirar licença para pedir na rua

in Público on-line

Esquiltuna, a oeste de Estocolmo, é a primeira cidade sueca a introduzir uma taxa para quem praticam a mendicidade. O objectivo confesso é “dificultar” a vida a quem vive de pedir dinheiro”.

As pessoas que forem descobertas a pedir dinheiro sem licença podem ter de pagar uma multa até 272 euros PP PAULO PIMENTA

A partir de 1 de Agosto, a cidade sueca de Esquiltuna exige aos mendigos que obtenham uma licença oficial de 23 euros, aproximadamente, antes de poderem exercer a mendicidade. A licença é válida por três meses e pode ser obtida através do preenchimento de um formulário numa esquadra. Para o efeito, será necessário mostrar um documento de identidade válido. Se alguém for apanhado a pedir sem licença pode ter de pagar uma multa até 272 euros.

Acorda, vem ver a Lua: a mensagem de esperança de um fotógrafo para um menino cigano
Jimmy Jansson, vereador social-democrata, assumiu que esta nova regra pretende diminuir a mendicidade. “Estamos a tornar o processo mais burocrático e difícil”, declarou a jornais suecos, citados pelo Guardian britânico. Críticos desta medida dizem, no entanto, que legitima a mendicidade, e deixa ainda mais vulneráveis as pessoas que já se vêem reduzidas a pedir nas ruas para sobreviver, muitas delas ciganos vindos de outros países, como a Roménia e a Bulgária.

“A pobreza, a desigualdade, a discriminação vão fazer explodir os paióis”
Grupos criminosos podem pagar pela licença e depois exigir pagamentos com juros exorbitantes, como acontece noutros casos de redes de prostituição e mendicidade, disse Tomas Lindroos, de um grupo de uma organização de apoio aos mais necessitados de Esquiltuna, citado pelo Guardian.

Jimmy Jansson defendeu, em declarações ao ao jornal Aftonbladet a abordagem da autarquia local. “Não se trata de importunar pessoas vulneráveis, mas de tentar resolver a questão maior: a mendicidade”, explicou. “Há muitas críticas às tentativas de regular a mendicidade, mas não ao facto de as pessoas serem forçadas a pedir dinheiro”, defendeu.

A introdução deste pagamento prévio surge alguns meses depois de várias cidades suecas terem proibido a mendicidade.

Um terço dos jovens até 24 anos disponível para emigrar em 2020

in Negócios on-line

Para a geração dos nativos digitais, nascidos a partir de 1995, é mais interessante sair de Portugal do que ir trabalhar para outra zona do país. Os destinos mais apelativos para a emigração são EUA, Espanha e Alemanha.

Um em cada três (34%) jovens trabalhadores, com idades entre os 18 e os 24 anos, mostra disponibilidade para ir trabalhar para o estrangeiro já no próximo ano, subindo a percentagem para 44% quando esta pergunta é colocada sem um horizonte temporal tão próximo.

A Geração Z, também conhecida por nativos digitais, mostra a mesma propensão para emigrar que a geração anterior (Millennials, nascidos entre 1981 e 1994). Curiosamente, a disponibilidade para uma experiência no exterior é maior entre os Baby Boomers (1946-1964) do que na Geração X (1965-1980), com 33% e 28%, respetivamente.

Segundo os dados recolhidos pela consultora de recursos humanos Hays, para os jovens nascidos a partir de 1995 é mais interessante sair de Portugal do que ir viver para outra zona do país (só 12% o admitem). Os países mais apelativos para a emigração são Estados Unidos, Espanha e Alemanha. À medida que a idade aumenta, surgem outros destinos preferenciais, como Reino Unido, Angola ou Austrália.

"As gerações mais recentes estão mais predispostas para uma mobilidade internacional do que qualquer outra geração, pois nasceram num mundo digital e sem barreiras geográficas. Por isso, conceitos como o ‘gap year’, onde a pessoa tira geralmente um ano sabático para poder viajar, conhecer novas culturas e línguas, ou fazer voluntariado, são cada vez mais uma tendência entre os jovens", aponta Paula Baptista, diretora da Hays Portugal.

No relatório "Talento Z: Os nativos digitais no mercado laboral", que mostra também que a possibilidade de trabalhar a partir de casa (72%), o seguro de saúde (72%) e a flexibilidade de horários (70%) são os três principais benefícios valorizados, a empresa de recrutamento analisou as preferências e tendências no mercado laboral português, dividindo a amostra por quatro gerações diferentes, num total de mais de 855 inquiridos.

Ansiedade A epidemia silenciosa

Texto Nelson Marques Ilustrações Alex Gozblau, in Expresso</i>

Durante a adolescência, Sara Pereira, hoje com 32 anos, sempre foi muito exigente com ela própria. Era aluna de 18 valores, soube desde cedo que queria seguir o mundo da comunicação, tinha objetivos e sonhos bem definidos. “Na minha cabeça, desenhei uma linha do tempo para a minha carreira e para a minha vida pessoal. Aos 25 anos teria casa própria, aos 30 um relacionamento sério, aos 35 iria para fora trabalhar numa multinacional como diretora ou chefe de equipa.” Tirando a asma, nunca tivera grandes problemas de saúde. Lembra-se apenas de ficar nervosa antes dos testes e dos exames nacionais. Mas ‘ficar nervosa’ “não é sofrer de ansiedade”. Isso só veio mais tarde.

Chegou sem aviso, como uma explosão inesperada. Foi no início do verão após o primeiro ano na Universidade do Porto. Sara foi com dois amigos a um festival de música em Lisboa, era a primeira vez longe de casa sem os pais. “À noite, e depois de um dia mal alimentada, acordei e pensei que ia morrer. O meu melhor amigo estava ao meu lado e segurou-me a mão enquanto perguntava o que é que eu tinha. Vomitei, quase desmaiei. Tinha a cabeça à roda e chorei durante o que me pareceram horas.” Ela ainda não o sabia, mas tinha acabado de ter o seu primeiro ataque de pânico. “A partir desse dia a minha vida mudou. E eu ainda não imaginava quanto.”
Quando regressou ao Porto, marcou uma consulta num psiquiatra, que lhe diagnosticou um esgotamento e um início de depressão, e lhe receitou um antidepressivo e um ansiolítico. Por causa dos medicamentos, passou as duas semanas seguintes “sem conseguir sair de casa ou ver a luz do dia”. Ficava exausta, parecia “um zombie”.

Ao longo dos últimos 13 anos, sentiu todo o tipo de sintomas físicos. A lista parece interminável: “Taquicardia, tonturas, tremores, formigueiros nos membros superiores e inferiores, sensação de falta de ar, de sufoco, de desmaio, de estar a perder o controlo ou até de ‘desrealização’, visão turva e em túnel, secura da boca, náuseas e dores abdominais, perda de força nas pernas, transpiração excessiva, medo de vomitar e, claro, medo de morrer.” Sara sabe bem que um ataque de ansiedade ou de pânico não a vai matar, mas nem sempre consegue convencer-se disso. Não é fácil explicar a quem a rodeia que não existe um botão para desligar a ansiedade. “Muita gente diz-me o clássico ‘tens de ter calma, não stresses’. Há muito estigma em relação às doenças mentais e os ataques de pânico ainda são vistos muito como ‘ataquezinhos de gente mimalha que quer tudo e está frustrada’.”
Portugal está entre os países da UE onde o problema mais se faz sentir: cerca de 16,5% da população sofre de perturbação de ansiedade, sendo a doença mental mais prevalente
O pior, garante, são os evitamentos, o deixar de fazer as suas rotinas com medo de ter uma nova crise. O medo de ter medo. É um círculo vicioso que a leva a alterar as suas rotinas. “Por exemplo, tive um ataque de pânico no comboio, então evitei durante anos andar de comboio. Se tinha um numa determinada rua, evitava passar por lá. Nada disto faz sentido nem para quem tem ansiedade, mas é quase uma obrigação respeitar o medo.”
Sara não tem medo das palavras: viver com ansiedade “é uma prisão”. Aos poucos, foi perdendo autonomia e isolando-se cada vez mais. Não por vergonha, mas por receio de estragar o dia ou a noite aos outros. Sai quase sempre sozinha, para, se se sentir mal, voltar para casa quando quiser, sem ter de dar grandes explicações. “Quando dei por mim, tinha deixado de conduzir, de sair à noite, na pior fase até de sair de dia para tomar um café, de trabalhar fora da minha cidade, de ir ao ginásio, de ir ao cinema, ao teatro, a concertos ou a reuniões, de viajar, de ter liberdade e autonomia, de deixar de ser eu própria e de acreditar nos meus sonhos.” Em espaços fechados fica sempre perto das saídas, nos espetáculos escolhe uma cadeira colada ao corredor, evita andar de transportes públicos. Nunca sai sem a medicação. Por causa da doença, perdeu muitos empregos. “Quando me perguntam se há problema em ter muitas viagens, respondo sempre que não. Depois, quando me ligam a dizer que fui escolhida, desisto. Já tentei ser honesta. Não passei para a fase seguinte.”
Quando olha para fotografias antigas, tem saudades da miúda que era antes da ansiedade se ter instalado na sua vida. “Essa miúda ainda está dentro de mim, mas, muitas vezes, está coberta por um manto de medo que a isola e paralisa.”

25 MILHÕES DE ANSIOSOS NA EUROPA
Sara não está só. A sua história podia ser a de milhões de outras pessoas que sofrem de perturbação de ansiedade em todo o mundo. Só na Europa, de acordo o relatório “Health at Glance 2018” da OCDE, estima-se que a doença afete 25 milhões de pessoas. Portugal está entre os países da UE onde o problema mais se faz sentir: cerca de 16,5% da população sofre dele, sendo a doença mental mais prevalente, de acordo com o último estudo epidemiológico realizado no país. Perto de um terço das pessoas irá sofrer uma perturbação de ansiedade num dado momento das suas vidas.

A doença faz-se sentir sobretudo nas gerações mais jovens, em particular os millennials (pessoas que têm hoje entre 20 e 37 anos, aproximadamente), o que não é uma surpresa, uma vez que ela prospera num mundo de incertezas e o de hoje está cheio de ameaças potenciais para os jovens adultos: desemprego, baixos salários, dificuldade em comprar casa própria, dívidas… Os estudos demonstram também que a ansiedade parece ser mais frequente nas cidades do que nos meios rurais, e é quase o dobro nas mulheres. É algo para o qual são apontadas várias razões, desde fatores biológicos, nomeadamente hormonais, a “uma maior exposição a fatores indutores de stresse nas mulheres, relacionados com o trabalho, o ambiente familiar, pressões sociais, etc.”, explica o médico psiquiatra Diogo Telles Correia, autor do livro “A Ansiedade nos Nossos Dias”, editado no ano passado.

Mariana Anjos, 26 anos, consultora de recursos humanos e caça-talentos, é outro nome que engrossa as estatísticas. Teve o primeiro ataque de pânico, “o mais assustador” até hoje, aos 13 anos. Estava a fazer um teste de História e era a única que ainda não tinha entregado a prova. De repente, o ruído na sala começou a incomodá-la imenso. “Só me lembro de chorar muito e começar a arranhar-me toda. Tentaram tudo para me acalmar, mas era impossível. Um professor chegou a dar-me um estalo, mas eu não parava. Fui para o hospital e sedaram-me para dormir, mas nem assim consegui.”
Até aos 22 anos foi “sempre a piorar”. Os ataques passaram a ser diários, especialmente quando estava a dormir. “A dor que sentia no peito era horrível.” Aos 18 anos, por causa da ansiedade, perdeu “grande parte do cabelo”. O resultado: mais ansiedade. Como uma bola de neve. “Estava constantemente medicada, tomava demasiados comprimidos, mas não sentia que surtissem efeito.”
Na hora de ir para a universidade, decidiu tirar Psicologia. Antes de cada exame ou apresentação, tinha um ataque. Foi então que percebeu que a sua ansiedade tinha origem sobretudo em situações em que estava a ser avaliada. O medo de falhar estava sempre presente. “A pressão que coloco em mim é demasiada. Os meus pais também não ajudavam, diziam-me que ia chumbar ou falhar. Dei por mim a viver numa agonia constante, não conseguia aproveitar nada.”

Há quatro anos, cansada da medicação, e apesar de “muito cética”, deixou-se convencer por uma amiga a fazer terapia num centro de ioga especializado em ataques de pânico e de ansiedade. “Fiz duas sessões que me custaram muito. É uma autoanálise dolorosa, porque desconstruímos as coisas e vamos à sua origem, mas depois sente-se um alívio enorme.” Nos três anos seguintes não voltou a ter ataques. “Comecei a aproveitar muito mais a vida, a ser mais focada no trabalho e a conseguir desvalorizar muito mais facilmente os problemas.”

UMA COMPANHEIRA DE VIAGEM DA DEPRESSÃO
Apesar do impacto profundo que pode ter na vida das pessoas, nem toda a ansiedade é má. Ela é, aliás, uma emoção fundamental para ajudar a identificar situações de perigo e permitir que nos preparemos melhor para as enfrentar. Nas doses adequadas, pode até ter efeitos positivos. “Alguns autores chamam a atenção para o facto de, em baixos níveis, ela poder favorecer o desempenho profissional”, sublinha Telles Correia, psicoterapeuta que é também professor na Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa. É a chamada Lei Yerbes-Dodson, segundo a qual até determinados níveis de ansiedade há “um aumento da atenção e do interesse”. Mesmo níveis “moderados altos” podem ter um efeito positivo, nota a psicóloga Isabel Lourinho, do Instituto CUF Porto. “Na minha tese de doutoramento concluí que os estudantes mais ansiosos tinham melhores resultados académicos do que os não ansiosos.”

Onde se traça então a fronteira entre o que é uma ansiedade “normal” e a que constitui uma perturbação psicológica? A linha que as separa é muito subjetiva e varia de pessoa para pessoa, mas, explica a especialista, “o problema acontece quando a ansiedade paralisa ou bloqueia o indivíduo, que não é capaz de utilizar nenhuma estratégia positiva para lidar com ela”. Ou seja, quando controla a sua vida, ao invés de ser este a controlá-la.
O consumo elevado de ansiolíticos, nomeadamente aqueles que têm na sua base a benzodiazepina, como o Victan ou o Xanax, o mais famoso de todos, é algo que está a preocupar os especialistas
Em grande parte dos casos, está associada à depressão. “São companheiras de viagem”, afirma Telles Correia. “As pessoas que sofrem dos vários tipos de ansiedade acabam, devido ao peso que esta impõe nas suas vidas, e à disfunção social e ocupacional que imprime, por desenvolver sentimentos de tristeza que podem chegar à depressão.” Da mesma forma, os sintomas de ansiedade, os medos constantes e os comportamentos de evitamento “podem ocorrer com frequência” nos doentes com depressão.

É muito difícil apontar uma causa para um problema tão complexo como este. “As causas são, na grande maioria dos casos, de natureza reativa a acontecimentos da vida”, nota João Marques Teixeira, presidente da Sociedade Portuguesa de Psiquiatria e Saúde Mental. “No entanto, nem toda a gente reage com perturbações de ansiedade a acontecimentos traumáticos semelhantes, o que significa que também é necessário que os indivíduos apresentem uma determinada organização da sua personalidade para que reajam desta forma. Em síntese, podemos dizer que elas resultam de uma combinação entre fatores próprios da constituição genética da pessoa e fatores ambientais.” O especialista sublinha que um aspeto importante para o desenvolvimento das perturbações da ansiedade é a “aprendizagem desta forma de reagir aos acontecimentos”. É algo que ocorre durante o desenvolvimento da pessoa “e muitas vezes é aprendido a partir de estilos comportamentais dos familiares próximos”.

As perturbações de ansiedade podem assumir várias formas, cada uma delas com sintomas diferentes, sendo as mais frequentes a doença obsessiva compulsiva, as fobias, os ataques de pânico, o stresse pós-traumático e a perturbação de ansiedade generalizada, que se caracteriza por uma preocupação praticamente permanente e duradoura (pelo menos seis meses).

Andreia Reis tinha 16 anos quando lhe foi diagnosticada doença obsessiva compulsiva, mas os sintomas da sua ansiedade começaram dois anos antes. “Nessa altura andava bastante revoltada com tudo. Tinha um ódio enorme por mim mesma, um medo terrível dos outros e o desejo de ter mais experiência. Foi pouco depois disso que decidi sair do colégio da terrinha e ir estudar teatro.”

Aos poucos, os sintomas foram-se intensificando. Tinha episódios sufocantes, em que sentia engasgar-se “com o próprio ar”. Teve ataques de pânico “tão graves e tão repentinos” que nem sabia o que se estava a passar. Num momento estava a dormir “descansada da vida”, no outro acordava com dores no peito tão fortes que tinha de ir para o hospital. Começou a automutilar-se. “Era o mecanismo que na altura parecia resultar comigo.”

Quanto mais os ataques se agravavam mais ela se esforçava para que ninguém reparasse que algo de errado se passava. Faz parte de um grupo de pessoas a quem Daniel Smith, autor do best-seller “Monkey Mind”, onde descreve a sua experiência com a doença, chama “repressores”. “Aprendem a esconder a sua ansiedade dos olhares públicos. Fecham-na dentro delas como ácido num tubo. Não é agradável. A mente humana não é um Pyrex, pode corroer.”
Foi isso que um médico cardiologia do Hospital de Santo António, no Porto, lhe explicou quando foi lá parar depois de ter desmaiado no chão da faculdade, coberta de suores frios. “Disse-me que estava a ter ataques de pânico e que podiam vir em muitas formas e quando menos esperava. Dava para perceber que eu era uma pessoa que engarrafava toda a minha ansiedade e depois o meu corpo tinha de descarregá-la.”

Já tentou “de tudo”: consultou psicólogos e psiquiatras, tomou “várias medicações”, que começavam em doses pequenas e “aumentavam até doses de cavalo”, experimentou a hipnose e “terapias não convencionais”, do reikki a taças de som tibetanas (que se diz ajudarem a equilibrar o corpo e a mente). “Só me falta ir a bruxa ou à missa!”, atira, esboçando um sorriso. A psiquiatra que a segue agora quer tirar-lhe a medicação. “Estou só com uma dose baixa de fluoxetina [um antidepressivo] e faço Victan [um ansiolítico] em SOS, mas ela também quer acabar com isso.”

O consumo elevado de ansiolíticos, nomeadamente aqueles que têm na sua base a benzodiazepina, como o Victan ou o Xanax, o mais famoso de todos, é algo que está a preocupar os especialistas. Portugal é um dos países da Europa que mais consomem este tipo de medicamentos: em 2017, venderam-se nas farmácias 10,6 milhões de embalagens, ou seja, mais de uma por habitante, facto que levou o diretor do Programa Nacional de Saúde Mental, Paulo Xavier, a afirmar que, no país, “quase não há respostas além das farmacológicas”.

Estarão os ansiolíticos a ser usados como panaceia para todos os males da ansiedade? Isabel Lourinho responde com cautela. “Ao contrário de alguns colegas, não sou antifármacos. Sendo uma psicóloga com formação na área das ciências e doutoramento em biomedicina, reconheço o valor que os fármacos podem ter. Aliás, existem situações em que tomar o comprimido adequado pode ser a estratégia de resolução mais eficaz”, explica. Porém, a psicóloga lembra que, tão importante como resolver o sintoma, é descobrir a causa do mesmo. “E, aí, a psicoterapia aliada ao estilo de vida adequado, com uma maior consciência de si mesmo e dos outros, e em harmonia com o mundo, faz toda a diferença.”

Onde se traça então a fronteira entre o que é uma ansiedade “normal” e a que constitui uma perturbação psicológica? A linha que as separa é muito subjetiva e varia de pessoa para pessoa
Apesar de combaterem os sintomas, acalmando de forma transitória a ansiedade, os ansiolíticos não vão à raiz do problema e expõem os pacientes à dependência. Se estes tomarem a mesma dose durante vários anos, o corpo habitua-se e para conseguir o mesmo efeito é preciso subir a dose. Caem assim num círculo vicioso de tolerância e dependência, até a um ponto em que deixam de funcionar com normalidade, surgindo efeitos secundários como a perda de memória e de atenção. Sem saberem o que fazer, muitos acabam com frequência por tomar diversos fármacos. Dos ansiolíticos passam aos antidepressivos.

Diogo Telles Correia desfaz um dos mitos muito associados a estes últimos: “Ao contrário do que se publicita, não se conhecem efeitos secundários importantes deste tipo de medicamentos quando tomados por largos períodos de tempo”, garante. “Os mais usados na ansiedade são os inibidores seletivos da recaptação de serotonina (ISRS). Embora se denominem antidepressivos, porque foram inicialmente testados e usados na depressão, são os medicamentos mais eficazes para o tratamento a médio e longo prazo da ansiedade.” Um comprimido não deve nunca substituir a terapia, mas isso não significa que a medicação não seja, muitas vezes, parte da resposta ao problema.

As estratégias adequadas para cada caso “dependem sempre do diagnóstico”, explica Marques Teixeira. “Nas situações de extrema gravidade o tratamento terá de ser um tratamento médico; nas situações menores, uma abordagem psicológica que ajude a pessoa a encontrar recursos para lidar com os seus níveis elevados de ansiedade pode ser suficiente.” Absolutamente fundamental é apostar na prevenção, adotando um estilo de vida saudável, que inclua uma alimentação adequada, horas de sono suficientes e atividade física, “que é o melhor ansiolítico”, garante Isabel Lourinho.

Andreia ainda tem ataques de pânico “traduzidos em crises de meia idade”, o que é estranho porque só tem 19 anos “e a vida pela frente”. A diferença é que, pela primeira vez, sente-se preparada para “tomar as rédeas” da sua ansiedade. “A minha psiquiatra deu-me essa confiança. Foi a primeira que me disse: ‘Tu és responsável. E eu sei que és capaz dessa responsabilidade e dessa evolução’.” Depois de um período de tréguas, os ataques de ansiedade de Mariana voltaram, por culpa de uma experiência profissional que não a deixava dormir muito. Desta vez, está a lidar “com o monstrinho” sozinha. “Tento fazer a minha autoanálise e falar muito sobre as coisas. Acho que já tenho essas competências.” Sara sabe que o caminho rumo à paz interior é longo. Lutar contra a ansiedade “é uma maratona, não um sprint. Há que treinar pouco a pouco até recuperarmos a nossa vida. E os nossos sonhos”. Ninguém devia passar os dias a ter medo de ter medo.