Amadeu Araújo, in Expresso
A crise na habitação está a provocar o aparecimento de novas soluções habitacionais, como as residências colaborativas ou multifamiliares, em que os espaços comuns são partilhados e que possibilitam uma redução dos custos do arrendamento.
Todavia, a legislação atual ainda não consegue dar resposta a este modelo de residência e a solução tem sido utilizar o conceito de unidades hoteleiras, que tornam o processo mais flexível.
PARTILHA DE ESPAÇOS COMUNS
Ao contrário do coliving, em que “é normal a partilha de casa, a habitação colaborativa permite a individualidade dos residentes, que dispõem de espaços comuns”, explica a arquiteta Maria João Andrade, do Atelier MJARC. Cozinha, sala e lavandaria “são comuns, todas as outras áreas são individuais”, complementa.
Um destes espaços está a ser construído no Barreiro e resulta de um investimento de €300 mil feito pela autarquia com recurso aos fundos comunitários. Estas habitações colaborativas estão preparadas para acolher 14 residentes, podendo chegar a 37 moradores.
No país há outros exemplos, como em Cabanas de Viriato, no concelho de Carregal do Sal, onde a Cooperativa Habitacional — Bairro Angelina de Sousa Mendes se prepara para construir habitações para 32 pessoas, num investimento de €826 mil. No seu conjunto, são oito edifícios destinados à habitação, acrescidos de um edifício polivalente.
Paulo Catalino, presidente da autarquia, explica que estas habitações vão “dar resposta social habitacional a famílias com carências financeiras”.
‘BARREIRAS LEGAIS’ TORNAM O PROCESSO MAIS LENTO
Espaços que são destinados a “quem procura flexibilidade, mas que ainda têm falta de enquadramento legal”, sinaliza Maria João Andrade. Em causa está “o ajustamento do mercado a este modelo, que é um processo lento, devido às barreiras legais”. A Lei de Bases da Habitação apenas menciona “infraestruturas e equipamentos coletivos”, mas não define o conceito. Já o Regime Geral de Edificações Urbanas, de 1951, não prevê espaços comuns para uso privado.
A alternativa tem sido erguer habitações colaborativas “para respostas sociais ou como unidades hoteleiras, que tornam o processo de edificação mais flexível”, explica a arquiteta. “A economia colaborativa está a alterar a noção de propriedade, e esta é uma solução capaz de dar resposta às muitas carências habitacionais que persistem, mas, no entanto, é preciso alterar a legislação.”
Isto sobretudo para que a habitação colaborativa, “pequenos espaços residenciais, possa responder à muita procura existente”, sustenta Maria João Andrade, que está a preparar um projeto residencial com estas características. Habitações que “respondem à evolução da sociedade e que se adaptam a quem procura alojamento de curta duração ou uma residência para um período mais alargado de tempo”, afirma.
RENDA MAIS BAIXA E PARTILHA DE CUSTOS
Entre as vantagens deste modelo estão o valor da renda, que é mais baixo, e a partilha de custos relativos à manutenção e benfeitorias, distribuídos por todos os residentes em função do espaço que ocupam. Com outra vantagem, pois, além dos espaços comuns da casa, é possível dispor de “piscina, ginásio ou outros equipamentos”, exemplifica a arquiteta.
No país, os projetos de habitação colaborativa estão a ser desenvolvidos maioritariamente por autarquias e por instituições sociais. No seu todo, respondem por 22 habitações, que irão permitir alojar 800 pessoas, e cuja construção é financiada com fundos comunitários.
Porém, assinala Maria João Andrade, este é “um modelo de negócio que também se ajusta aos investidores privados e que pode dar um grande contributo à crise na habitação”.
O único projeto privado de habitação colaborativa está a surgir em Palmela, onde a Cooperativa das Formas pretende construir habitações e um edifício polivalente, com cozinha, lavandaria, ginásio e suítes para visitas, num terreno de 20 hectares, mas que ainda está em fase de projeto.
INVESTIR EM ‘USOS' ALTERNATIVOS
No último estudo para o mercado residencial, a consultora imobiliária JLL prevê uma “contração” no mercado residencial, porém assinala que “continua a existir muita liquidez e também um crescente interesse em desenvolver e investir em imobiliário de usos alternativos”.
Também a consultora Savills, na perspetiva global do sector imobiliário para 2023, aponta no mesmo sentido. Alexandra Portugal Gomes reconhece que “o aumento dos custos de financiamento está a criar um desequilíbrio de expectativas entre compradores e vendedores”, porém, sustenta, haverá “maior diversificação das carteiras como estratégia adotada pelos investidores que desejem equilibrar o seu grau de exposição, tais como o investimento em segmentos residenciais e alternativos”.